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Guias e Dicas
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Metodologia de Pesquisa em Cien - Raul Sidnei Wazlawick, Manuais, Projetos, Pesquisas de Administração Empresarial

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Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2017

Compartilhado em 10/12/2017

graziano-rosa-9
graziano-rosa-9 🇧🇷

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Baixe Metodologia de Pesquisa em Cien - Raul Sidnei Wazlawick e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Administração Empresarial, somente na Docsity! RSI DADOS DE COPYRIGHT Sobre a obra: A presente obra é disponibilizada pela equipe Le Livros e seus diversos parceiros, com o objetivo de oferecer conteúdo para uso parcial em pesquisas e estudos acadêmicos, bem como o simples teste da qualidade da obra, com o fim exclusivo de compra futura. É expressamente proibida e totalmente repudiável a venda, aluguel, ou quaisquer uso comercial do presente conteúdo Sobre nós: O Le Livros e seus parceiros disponibilizam conteúdo de dominio publico e propriedade intelectual de forma totalmente gratuita, por acreditar que o conhecimento e a educação devem ser acessíveis e livres a toda e qualquer pessoa. Você pode encontrar mais obras em nosso site: LeLivros.link ou em qualquer um dos sites parceiros apresentados neste link. "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e não mais lutando por dinheiro e poder, então nossa sociedade poderá enfim evoluir a um novo nível." Capítulo 3. Preparação de um Trabalho de Pesquisa 3.1 Escolhendo O Objetivo De Pesquisa 3.2 A Revisão Bibliográfica 3.3 O Objetivo 3.4 O Método De Pesquisa 3.5 Justificativa 3.6 Resultados Esperados 3.7 Limitações Do Trabalho 3.8 Discussão Capítulo 4. Análise Crítica de Propostas de Monografia 4.1. Análise Da Contextualização E Colocação Do Problema 4.2. Análise De Objetivo Geral 4.3. Análise De Objetivos Específicos 4.4. Análise De Justificativa 4.5. Análise De Método De Pesquisa Capítulo 5. Escrita da Monografia 5.1 Como Os Capítulos De Uma Monografia São Ordenados 5.2 Como Uma Monografia Poderá Ser Lida Pela Banca Examinadora 5.3 Como Uma Monografia Poderia Ser Escrita 5.4 O Título 5.5 O Resumo 5.6 A Introdução 5.7 O Capítulo De Revisão Bibliográfica 5.8 O Capítulo De Desenvolvimento 5.9 O Capítulo De Conclusões 5.10 Seção De Bibliografia Ou Referências Bibliográficas 5.11 A Forma Do Texto Científico Capítulo 6. Escrita de Artigo Científico 6.1 Autores 6.2 Motivação Para Escrever 6.3 Trabalhos Correlacionados 6.4 A Contribuição Do Artigo 6.5 Tipos De Artigos 6.6 Veículos De Publicação 6.7 Ética No Envio De Artigos 6.8 Qualis Capítulo 7. Plágio 7.1 Antecedentes 7.2 Proteção Aos Direitos Autorais 7.3 A Lei Brasileira Capítulo 8. Níveis de Exigência do Trabalho de Conclusão 8.1 Graduação 8.2 Especialização 8.3 Mestrado E Doutorado Referências Cadastro Preencha a ficha de cadastro no final deste livro e receba gratuitamente informações sobre os lançamentos e as promoções da Elsevier. Consulte também nosso catálogo completo, últimos lançamentos e serviços exclusivos no site www.elsevier.com.br Dedicatória Este livro é dedicado aos meus anjinhos: Júlia, Amanda, Alice E Carlinha. Agradecimentos Agradeço a este livro pela compreensão por tantas horas em que não o escrevi porque estava dedicado à minha família. Biografia do Autor Raul Sidnei Wazlawick é professor associado II da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), lotado no Departamento de Informática e Estatística. Graduado em Ciência da Computação, UFSC, 1988. Mestre em Ciência da Computação, UFRGS, 1991. Doutor em Engenharia de Produção, UFSC, 1993. Pós-doutorado pela Universidade Nova de Lisboa (UNL), 1998. Conselheiro da Sociedade Brasileira de Computação (SBC). Exmembro da Comissão de Especialistas de Ensino de Computação e Informática do Ministério da Educação (MEC). Ex-representante do Brasil na International Federation for Information Processing (IFIP). Ex-coordenador do IFIP Working Group on Higher Education (WG 3.2). Ex-coordenador do Curso de Bacharelado em Ciência da Computação, UFSC. Ex-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação, UFSC. Ex-coordenador de vários cursos de pós-graduação lato sensu da UFSC. Ex-membro da Câmara de Pesquisa da UFSC. Criador e ex-editor da Revista Brasileira de Informática na Educação da SBC. Coordenou vários eventos científicos no Brasil e no exterior, incluindo o Congresso da SBC (2002). Foi presidente de comitês de programa de eventos científicos no Brasil e exterior. Membro de comitê de programa de dezenas de eventos científicos. Membro de comitê de revisores de periódicos científicos. Orientador de dezenas de dissertações de mestrado, teses de doutorado, monografias de especialização e trabalhos de conclusão de cursos de graduação. Membro de mais de uma centena de bancas de mestrado, doutorado, especialização e graduação em várias universidades brasileiras. Conta com quase uma centena de publicações em periódicos e eventos científicos e é autor do livro Análise e Projeto de Sistemas de Informação Orientados a Objetos, de 2004, pertencente à série didática Campus/SBC. Coordenador de vários projetos de pesquisa na UFSC e interinstitucionais, com intensa atividade de consultoria em Engenharia de Software. Não é pesquisador do CNPq. Entre outras disciplinas, leciona Metodologia da Pesquisa em Ciência da Computação, no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação, trimestralmente, desde 2003, de onde partiu a inspiração para escrever este livro. Eliminou o uso do paraquedas, que causava pelo menos 20% de perda sobre o rio, e instalou um colchão de ar na margem oposta. Realizou um novo teste com mais indivíduos e verificou que 95% das vezes os indivíduos sobreviviam à travessia, sendo que apenas 5% dos casos aterrissaram fora do colchão de ar. Nesse momento, já satisfeito com os resultados, o aluno encerrou os experimentos (até porque estava ficando difícil encontrar voluntários). Como trabalho futuro ele já havia pensado em propor um algoritmo de cálculo da velocidade da catapulta baseado no peso do passageiro e no seu índice de pânico, com vistas a diminuir ainda mais a taxa de erro observada. Ele não ia programar esse algoritmo porque não teria tempo. Então, deixou isso como trabalho futuro para outro fazer. Escreveu, portanto, o capítulo do desenvolvimento e entregou o texto para o orientador, sendo que só faltava escrever as conclusões e o resumo. O aluno foi reprovado. Por incrível que pareça, exageros à parte, a história contada corresponde à história de muitas dissertações de mestrado em Ciência da Computação. Ao longo deste livro se tentará mostrar por que o aluno foi reprovado. Apesar de seu trabalho ter ares de ciência, ele pecou em vários aspectos no que concerne ao seu comportamento e à metodologia científica. Apenas para citar alguns: a) Desde o momento da definição do tema até a conclusão dos experimentos, ele não voltou a entrar em contato com seu orientador, que poderia tê-lo redirecionado. b) Não realizou uma revisão bibliográfica adequada, pois estudou muita coisa sobre rios, mas não sobre as formas que já existiam para cruzá-los, como, por exemplo, pontes, barcos, teleféricos etc. Por ter feito uma revisão bibliográfica inadequada, ele concluiu, erroneamente, que era a primeira pessoa no mundo a tentar resolver esse tipo de problema. c) Ele escolheu uma ferramenta a priori e começou a trabalhar com ela sem uma justificativa adequada para ter eliminado outras ferramentas candidatas. d) Seus resultados consistem na comparação do seu trabalho com o seu próprio trabalho, ou seja, não há comparação com trabalhos correlatos de outros autores. e) O aluno escolheu como problema-alvo algo que ele observou apenas na sua cidade. Problemas locais nem sempre são problemas para todo mundo. Soluções locais nem sempre podem ser generalizadas. Este livro tem como objetivo apresentar aos estudantes de Ciência da Computação e áreas correlatas teoria e técnicas para a execução de bons trabalhos científicos, no nível de exigência adequado aos cursos de graduação, especialização, mestrado e doutorado. Casos semelhantes ao citado já aconteceram muitas vezes, mas podem ser evitados com alguma orientação. A propósito, nenhuma pessoa ou animal foram feridos pelo autor deste livro enquanto ele escrevia a história da catapulta. Pelo menos não que ele tivesse conhecimento, já que a ciência o leva a não crer em verdades absolutas (ele poderia ter pisado em uma formiga sob a mesa sem perceber). 1Usualmente no Brasil diz-se “dissertação” de mestrado e “tese” de doutorado. Em outros países usam-se os termos indistintamente ou até com significados diferentes. Neste livro o trabalho individual para obtenção de um grau, seja graduação, especialização, mestrado ou doutorado, será denominado “monografia”, para simplificar o texto. CAPÍ T ULO 2 Estilos de Pesquisa Correntes em Computação Com alguma frequência se ouve dizer que a Computação ou Informática é uma área nova no campo das ciências, e que está em franco desenvolvimento. Mas isso não justifica que o método científico específico da área de Computação tenha de ser vago e que tantas monografias sejam escritas sem um embasamento metodológico adequado. Essa discrepância de estilos de pesquisa e baixa conformação à metodologia científica acontecem não só pelo fato de a área ser nova, mas também pelo fato de que a Computação permeia praticamente todas as atividades humanas, e, portanto, se inter-relaciona com muitas outras disciplinas. A própria observação do surgimento dos primeiros cursos de Ciência da Computação no Brasil é evidência dessa variedade de abordagens e inter- relacionamentos. Alguns cursos surgiram nas faculdades de Engenharia. Em outras universidades, os cursos de Computação foram oriundos das faculdades de Matemática ou de Física. Em alguns casos ainda, cursos de Computação surgiram a partir de departamentos de processamento de dados cuja finalidade era a prestação de serviços e não o ensino. A variedade de cursos, e mesmo de denominações, causou grande confusão no cenário nacional até aproximadamente o ano 2000. Até essa data, cursos na área poderiam ser denominados “Bacharelado em Ciência da Computação”, “Análise de Sistemas”, “Bacharelado em Informática”, “Engenharia de Computação”, “Engenharia de Informática”, e assim por diante. Usualmente, não havia nenhum tipo de correspondência entre a denominação do curso e o tipo de formação que era oferecido. Após o ano 2000, os cursos da área foram definidos pela Comissão de Especialistas de Ensino de Computação e Informática, do Ministério da Educação, em apenas quatro denominações: a) Bacharelado em Ciência da Computação. b) Bacharelado em Sistemas de Informação. c) Licenciatura em Informática. d) Engenharia de Computação. Tal classificação, porém, ainda é imprecisa, sendo que em muitos casos um licenciado em Informática poderá perfeitamente exercer as atribuições de um bacharel em Sistemas de Informação. Por outro lado, um engenheiro de Computação poderá dar aulas de Informática, e assim por diante. bases de dados para testar teorias empiricamente, ou quando o tempo e os recursos necessários para realizar a pesquisa empiricamente são inviáveis. Para que esse tipo de pesquisa funcione é necessário que se tenha uma boa hipótese de trabalho, uma boa teoria construída para sustentá-la e uma boa argumentação para fazer com que um eventual leitor se convença da validade da teoria, mesmo sem poder testá-la com métodos estatisticamente aceitos. Em relação à hipótese, convém mencionar que ela é o coração da monografia. Se a hipótese for mal escolhida, o trabalho pode não alcançar os objetivos. Nesse caso, quem é penalizado? O aluno! Portanto, uma boa hipótese com evidências de efetividade deve ser buscada. Trabalhos de mestrado e doutorado, em geral, propõem algo: um novo método, uma nova ideia, um novo sistema etc. Porém, “propor” algo é fácil. Difícil é mostrar que a proposta apresenta algum tipo de melhoria em relação a outras propostas semelhantes que existem por aí. Por exemplo, propor um método de compressão de textos mais eficiente do que os que atualmente estão no mercado é possível e até louvável como objetivo de uma tese. Mas daí o problema é: como criar um método mais eficiente do que os atuais? É necessário ter uma boa hipótese. Uma hipótese, segundo a Wikipédia (2008), é uma teoria provável, mas ainda não demonstrada, ou uma suposição admissível. A hipótese norteia o trabalho de pesquisa justamente porque ainda não se sabe se ela é efetivamente verdadeira. Ela será testada ao longo do trabalho. Caso se confirme, o trabalho terá sido um sucesso. Caso não se confirme, será necessário juntar os cacos e tentar outra linha de pesquisa. Por isso é que é necessário ter uma hipótese bem embasada e justificada. O risco é sempre do aluno. Uma das formas de aumentar a chance de sucesso desse tipo de trabalho é estruturá-lo na forma de uma tabela comparativa. A ideia é que não se vai criar algo simplesmente diferente daquilo que já existe, mas algo que incorpore várias características importantes em um mesmo artefato. Idealmente o trabalho começa com uma boa pesquisa bibliográfica para se descobrir quais são as formas correntes usuais para se resolver o problema em questão. Em seguida, analisam-se diferentes propriedades de cada uma das abordagens, construindo uma tabela como a da Figura 2.1. FIGURA 2.1 Exemplo de tabela comparativa de artefatos e características. Uma vez identificados os artefatos usados para resolver o problema em questão e as principais características desses artefatos, pode-se proceder à criação ou definição de um novo artefato que abranja todas as características, conforme a Figura 2.2. FIGURA 2.2 Proposta de um novo artefato que tenha todas as características dos anteriores. Esse novo artefato será diferente dos demais, pois seu conjunto de características não é possuído por nenhum dos outros artefatos isoladamente. O novo artefato será útil na medida em que as características forem efetivamente relevantes. E a tabela comparativa será uma boa ferramenta para a pesquisa, caso as características possam ser efetiva e independentemente verificadas. 2.3. Estilo “Apresentação de algo Presumivelmente Melhor” Áreas um pouco mais amadurecidas do que as anteriores exigem que qualquer nova abordagem apresentada seja comparada quantitativamente com outras da literatura. Na falta de bancos dados (benchmark) internacionalmente aceitos ou acessíveis, o próprio autor do artigo acaba criando e realizando os testes que demonstram que a sua abordagem é melhor do que outras. Um problema com esse tipo de pesquisa é que o autor terá de testar a sua abordagem e também as outras, que constam da literatura, resultando em excesso de trabalho, além de, possivelmente, introduzir o risco de erro, visto que não há garantias de que as abordagens apresentadas na literatura estejam testadas nas melhores condições pelo autor do trabalho. Sendo assim, tais comparações muitas vezes são temerárias. Para que uma pesquisa desse tipo seja bem aceita, é necessário que o autor deixe bem claro a forma como aplicou cada uma das técnicas e que isolou todos os fatores que poderiam possivelmente afetar os resultados. De qualquer maneira, uma abordagem para um determinado problema que se revela melhor do que outras abordagens requer alguns cuidados. Em primeiro lugar, o pesquisador deve se certificar de que está comparando a nova abordagem com alguma outra que seja do estado da arte. Em computação, muitas vezes é inadmissível apresentar um método e compará-lo com outro de uma referência bibliográfica de 15 anos atrás. Mesmo que o novo método seja melhor que o antigo, o artigo terá pouca credibilidade, a não ser que o autor deixe bem claro que nos últimos 15 anos não houve nenhum avanço nessa área. Um artigo, porém, que apresente melhorias em relação a um processo publicado recentemente, digamos, no máximo um ou dois anos, terá mais credibilidade. Não é necessário, porém, que o autor de algum método novo demonstre que o seu método é melhor que outro método do estado da arte para toda e qualquer situação. É possível, muitas vezes, apresentar métodos ou abordagens que funcionam melhor em determinadas situações. Nesse caso, o artigo deve deixar bem claro quais são as situações nas quais a nova abordagem funciona melhor e o porquê disso. Experimentos deverão ser feitos para demonstrar tal melhoria. Aqui entra em foco um aspecto muito importante na pesquisa que leva em consideração o uso de dados comparativos: a métrica. Afirmações do tipo “O sistema x é mais fácil de usar” não terão fundamento a não ser que se defina claramente o que significa “ser fácil de usar”. Um exemplo de definição nesse caso poderia ser a quantidade de cliques de mouse que o usuário tem de usar para executar uma tarefa dada em um ou outro sistema. Poderia ser questionado se a métrica é boa e eficiente, mas dentro da definição dada é possível confirmar qual sistema é mais fácil de usar. 2.4. Estilo “Apresentação de algo Reconhecidamente Melhor” O nível mais maduro da pesquisa desta linha, em que a apresentação de dados empíricos é relevante para a aceitação dos resultados, é aquele no qual um trabalho é desenvolvido e seus resultados são apresentados em função de testes padronizados e internacionalmente aceitos. Nesse caso, o autor do trabalho não precisa testar outras abordagens, pois seus resultados já estão publicados. O autor deverá buscar os dados de entrada para testar a sua abordagem em um banco de dados conhecido e apresentar os resultados usando uma métrica aceita pela comunidade. Dessa forma, os experimentos poderão ser reproduzidos por equipes independentes. Se for demonstrado que a nova abordagem é superior às abordagens anteriores, esta passará a ser considerada como estado da arte. Pesquisas que apresentam resultados desse tipo são típicas de boas teses de doutorado. Supõe-se que após a publicação dos resultados ninguém mais possa ignorar essa nova abordagem em função das vantagens que ela oferece em relação às anteriores. Isso é o que se entende por “avançar o estado da arte”. Por incrível que pareça, essa é a pesquisa mais fácil de executar, desde que o autor tenha uma boa hipótese de trabalho. Por que isso? Porque os testes-padrão já estão definidos e os dados já estão disponíveis. Basta implementar a abordagem e realizar os testes. O grande problema e dificuldade inerente, então, consistem em encontrar uma boa hipótese de trabalho, que faça sentido e que seja promissora (isso, infelizmente, em geral não é trivial). Portanto, esse tipo de pesquisa exigirá, por parte do autor, amplo estudo sobre o CAPÍ T ULO 3 Preparação de um Trabalho de Pesquisa A preparação de um trabalho de pesquisa é uma etapa que deve ser realizada antes que se comece a escrever sobre a pesquisa. Parece estranho, mas muitas vezes esse é um ponto que deve ser ressaltado. Alunos, ansiosos por escrever a monografia, começam a escrever páginas e páginas sem terem feito nenhuma pesquisa. Uma ressalva: é necessário diferenciar o termo “pesquisa”, que pode ser entendido como revisão bibliográfica, da sua significação como pesquisa científica, ou seja, produção de conhecimento novo. A revisão bibliográfica, diga-se de passagem, não produz conhecimento novo, mas apenas supre ao estudante conhecimentos que lhe faltavam. Portanto, não se recomenda que o aluno comece a escrever sua monografia ou trabalho de conclusão de curso sem ter realizado alguma pesquisa que tenha produzido conhecimento novo. Explicando melhor: não há necessidade de sair escrevendo o capítulo de revisão bibliográfica antes de saber o que efetivamente será feito em termos de produção de conhecimento. A revisão bibliográfica de um trabalho de pesquisa em Computação, em geral, não deve ser um tratado sobre a área de pesquisa. Muitas vezes, um aluno que começa a escrever o capítulo da revisão antes de decidir o objetivo da pesquisa acabará escrevendo demais e desnecessariamente. Esse capítulo será cansativo para o leitor, e muitas vezes ele não compreenderá por que determinados assuntos são ali colocados se não são abordados na monografia em si, que vai iniciar mais adiante. O segredo de um trabalho de pesquisa de sucesso consiste em ter um bom objetivo. Uma vez definido o objetivo do trabalho, tudo o mais gravita em redor dele. A justificativa vai dizer por que vale a pena buscar esse objetivo; o método informa como o objetivo pode ser alcançado; os resultados esperados mostram o que muda no mundo após o objetivo ser atingido; o capítulo de revisão bibliográfica vai apresentar os conceitos necessários para a compreensão do objetivo e os trabalhos relacionados ao objetivo. 3.1 Escolhendo o Objetivo de Pesquisa A escolha de um objetivo de pesquisa é frequentemente a tarefa mais difícil em um trabalho de mestrado ou doutorado. Muitas vezes, o objetivo é confundido com o tema da pesquisa. O tema da pesquisa pode ser a influência da batata inglesa na língua portuguesa. Mas nesse caso qual é o objetivo? Ou seja, o que se quer provar? O objetivo normalmente comporta uma hipótese de trabalho. Um bom objetivo de pesquisa normalmente terá a forma “demonstrar que a hipótese x é verdadeira”. Nem todo objetivo pode ser considerado um bom objetivo de pesquisa. Por exemplo, algo do tipo “o objetivo deste trabalho é aumentar os meus conhecimentos na área de estudo” pode até ser muito sincero, mas não convence ninguém de que algum conhecimento novo para a humanidade será produzido. Portanto, isso deve ser evitado. Outro objetivo algumas vezes encontrado é a forma “propor…”. Alguma coisa é proposta, normalmente um método, uma abordagem, uma técnica, um algoritmo, uma comparação, ou qualquer outra coisa. A questão é: se o autor fizer a proposta, então o objetivo estará atingido? Se o aluno se propõe a propor e propôs, então está proposto! O que for proposto não é necessariamente melhor ou diferente daquilo que já existia antes. Então, o estágio da pesquisa neste caso ainda é dos mais ingênuos. É necessário que o objetivo diga que aquilo que está sendo proposto é melhor do que alguma outra coisa ou que resolve algum problema que antes não podia ser resolvido. Segundo Chinneck (1988), a descrição de um problema de pesquisa tem três partes: a) Um enunciado preciso da questão ou problema de que trata a monografia. b) Uma explicação por referência direta à bibliografia de que tal questão de pesquisa ainda não foi tratada. c) Uma discussão sobre por que é importante tratar essa questão de pesquisa. O item (b) falhará se o aluno não conseguir deixar claro que a questão de pesquisa nunca foi tratada. Uma boa revisão bibliográfica é necessária para apresentar tal justificativa com suficiente autoridade. Devem ser evitadas afirmações do tipo “não encontrei nada parecido”. O aluno deve sempre mostrar o que encontrou nas fontes relevantes que examinou e comparar aquilo que foi encontrado com aquilo que ele pretende fazer. Se ele disser que não encontrou nada, a banca examinadora provavelmente pensará que ou ele não pesquisou direito ou está tratando um problema de pouco interesse. Em alguns casos pode ocorrer que efetivamente nada de muito semelhante seja encontrado, mas em todo o caso, sempre existe algum problema que possa ser considerado o mais próximo possível. Haverá situações em que serão encontradas abordagens quase idênticas, variando em poucos detalhes; e, em outros casos, a abordagem mais próxima será tão distinta que será necessária uma boa dose de explicação para que se possa entender por que ela é relevante. Leonardo da Vinci não conhecia a tecnologia utilizada pelos modernos aviões, então baseou seus estudos sobre máquinas voadoras no modelo mais próximo que estava disponível na sua época, a estrutura de voo dos pássaros. Por outro lado, é importante que um trabalho de pesquisa se relacione principalmente com conhecimentos que sejam inerentes ao estado da arte, ou seja, que sejam recentes. Não faria muito sentido hoje, com todos os conhecimentos de engenharia aeronáutica disponíveis, ignorar essas informações e tentar construir máquinas voadoras baseadas nos modelos de Leonardo. Apesar disso, os conhecimentos antigos não devem ser de todo ignorados. Muitas vezes o conhecimento antigo aliado ao estado da arte pode produzir resultados muito interessantes. No caso da indústria aeronáutica, por exemplo, tenta-se hoje produzir aviões flexíveis que, de certa forma, imitam as estruturas de voo dos pássaros. Mas isso é feito com base em conhecimentos atuais, não se está reinventando a roda, mas aperfeiçoando conceitos já existentes. 3.1.1 O Caminho Para A Escolha De Um Objetivo De Pesquisa Para que alguém seja capaz de pensar em um objetivo de pesquisa relevante, essa pessoa deve conhecer a área de pesquisa na qual está trabalhando. Portanto, o caminho lógico consiste de três passos: a) Escolher um tema de pesquisa, ou seja, uma área de conhecimento na qual se vai trabalhar. b) Realizar a revisão bibliográfica. A não ser que o autor já seja especialista na área escolhida, ele vai precisar ler muitos trabalhos já publicados nessa área para saber o que está sendo feito (estado da arte) e o que ainda precisa ser feito (problemas em aberto). c) Definir o objetivo de pesquisa. Uma vez feita a revisão bibliográfica, o objetivo de pesquisa possivelmente será fortemente relacionado com um dos problemas em aberto verificados no passo anterior. Em poucos casos, a revisão bibliográfica será feita depois da definição do objetivo de pesquisa. Não é razoável conceber que alguém decida por um caminho de pesquisa sem conhecer exatamente a área onde vai atuar. Essa atitude possivelmente levará a objetivos mal definidos e que precisarão ser revistos quando o pesquisador perceber que está reinventando a roda. Mas é possível ainda que os passos (b) e (c) devam ser repetidos algumas vezes de forma a refinar o objetivo (Figura 3.1). De fato, ao realizar a revisão bibliográfica sobre um determinado tema, o pesquisador terá ideias sobre aspectos do tema que ainda não foram explorados, e esses aspectos darão origem a um objetivo de pesquisa. Mas antes de começar a gastar energia tentando atingir esse objetivo, o pesquisador deve ainda refinar sua pesquisa bibliográfica tentando verificar se tal objetivo já não foi perseguido em trabalhos anteriores e que tipo de resultados foi obtido. Uma monografia deve apresentar uma solução para um problema. Inicialmente, portanto, um problema deve ser identificado. Seria errado iniciar a monografia simplesmente resolvendo criar um novo método para isso ou aquilo. No caso da catapulta, o aluno propôs e testou um novo método para cruzar rios. Aqui vem uma questão interessante. Segundo o aluno, o problema consistia em cruzar o rio. Mas esse problema identificado já não é mais um problema sem solução, porque existem diferentes abordagens para cruzar um rio: ponte, balsa, teleférico etc. Então, caso o aluno quisesse insistir neste tema, teria de indicar quais problemas as soluções existentes apresentam. Ou seja, quais os problemas encontrados quando se tenta cruzar um rio com uma ponte ou com uma balsa? Ele poderia descobrir, por exemplo, que pontes são muito caras e balsas são muito lentas. Se todas as soluções existentes apresentarem algum tipo de problema, então é possível que se esteja abrindo caminho para uma nova abordagem. Caso contrário, as pessoas continuarão a cruzar rios com os meios usuais e não com a nova abordagem. Algumas propostas de pesquisa são apresentadas inicialmente sem ter um problema claramente identificado. Por exemplo: “este trabalho propõe usar a metáfora de formigueiro para modelar pacotes em uma rede”. Esse tema até pode vir a ser um trabalho interessante, mas qual é o problema que essa modelagem vai resolver? O que há de errado com outras formas de modelagem, sejam elas quais forem, que essa metáfora do formigueiro vai possivelmente resolver? Segundo Griffiths (2008), se o autor não consegue estabelecer claramente qual é o problema tratado em sua monografia, será muito difícil para outras pessoas especularem sobre os possíveis usos dela. Também será difícil avaliar se ela obteve sucesso. 3.1.4 Perspectiva Profissional O tema de pesquisa a ser escolhido, em qualquer nível de formação, além de ser do agrado do aluno, deve estar relacionado com a sua perspectiva de desenvolvimento profissional. Não faz sentido gastar vários anos investindo em uma pesquisa na área X, para depois trabalhar o resto da vida na área Y. O ideal seria que cada pesquisa gerassse algum tipo de produto ou uma melhoria a um produto existente que pudesse, após o final do curso, gerar algum tipo de perspectiva de trabalho e de renda para o pesquisador. Isso é mais difícil quando se trata de pesquisa básica, mas mesmo assim esse tipo de pesquisa pode gerar patentes que em algum momento poderão se tornar produtos e gerar riquezas para o país. Não é admissível que todo um esforço despendido durante o mestrado ou mesmo durante um doutorado acabe sendo depois simplesmente guardado em uma gaveta. 3.2 A Revisão Bibliográfica A revisão bibliográfica, conforme já comentado, não produz conhecimento novo, mas apenas supre as deficiências de conhecimento que o pesquisador tem em uma determinada área. Portanto, ela deve ser muito bem planejada e conduzida. Supondo que o pesquisador seja praticamente iniciante em uma determinada área, ele deveria iniciar a pesquisa lendo algum tipo de survey sobre o assunto. Não é difícil encontrar artigos ou mesmo livros que abordem toda uma área de conhecimento na forma de survey. Os livros, aliás, servem exatamente a esse propósito. Pode-se iniciar a pesquisa com uma leitura de trabalhos mais abrangentes que deem uma visão do todo para depois ir se aprofundando cada vez mais em temas cada vez mais específicos. Quando se faz uma pesquisa em que alguma técnica de computação é aplicada a alguma outra área do conhecimento, é necessário que se faça a revisão bibliográfica sobre a técnica em si, sobre a área de aplicação e, mais do que tudo, sobre as aplicações que já foram tentadas com essa técnica ou com técnicas semelhantes na mesma área ou em áreas equivalentes. Exemplificando, um aluno pretende desenvolver um sistema multiagentes para auxiliar controladores de voo. Esse aluno deve conhecer profundamente os sistemas multiagentes e deverá conhecer também os problemas que os controladores de voo enfrentam para exercer sua profissão. Porém, ele não deve pensar, como algumas vezes acontece, que essa é a primeira vez que alguém vai tentar desenvolver um sistema multiagentes para esse tipo de aplicação. O aluno da catapulta, mencionado anteriormente, estudou rios e estudou catapultas, mas não procurou saber se alguém já tinha tentado atravessar um rio usando uma catapulta. Se essa pesquisa existisse e ele tivesse acesso a ela, teria visto que os resultados não eram animadores e talvez tivesse escolhido outro tema de pesquisa antes de ter dedicado a maior parte do seu tempo de mestrado a algo infrutífero. Uma monografia sobre pesquisa aplicada que apresenta uma boa revisão bibliográfica da ferramenta de computação e da área de aplicação, mas que não menciona nenhuma tentativa anterior de aplicação dessa ferramenta na área sofre da “Síndrome da Intersecção Esquecida”. Uma monografia com esse problema estará possivelmente “reinventando a roda”. A Síndrome da Intersecção Esquecida em geral é justificada pelos alunos com frases do tipo “mas não encontrei nada parecido com o que estou fazendo”. Esse raciocínio negativo deve ser evitado. Nunca se deve dizer que não se achou nada semelhante. Algo sempre deve ser apresentado como referência. Essa referência poderá ser mais semelhante ou menos semelhante à abordagem usada de um ponto de vista relativo. Mas sempre a abordagem mais semelhante de todas (por menos semelhante que seja) deve ser buscada. Pode ser interessante pensar assim: “Ninguém fez algo parecido com o que estou fazendo, mas muitas coisas já foram feitas pelos seres humanos ao longo da sua história. Então, eu poderia classificar as coisas que já foram feitas em termos de grau de semelhança com aquilo que estou fazendo. As coisas mais parecidas com o meu trabalho serão minha referência, mesmo que a semelhança seja pequena”. Assim, evita-se o fundamento vazio, ou seja, dizer que seu trabalho é original porque ninguém nunca fez nada parecido. Não se deve fundamentar todo um trabalho de pesquisa em uma negação. Deve-se mostrar o que outros fizeram, e depois mostrar que o trabalho feito é diferente ou melhor do que essas referências. 3.2.1 Fichas De Leitura Durante todo o processo de leitura, é fundamental que sejam feitas anotações. Conceitos-chave e ideias novas devem ser anotados sempre que forem detectados na leitura. É necessário que se saiba de onde tais ideias e conceitos saíram. Em geral, inicia-se uma ficha de leitura, seja em papel, seja no computador, escrevendo a referência bibliográfica da obra sendo consultada. Em seguida são feitas as anotações relevantes. Essas fichas serão extremamente importantes no futuro para saber de onde as ideias saíram. Depois de ler algumas dezenas de artigos sobre um determinado assunto, será difícil lembrar-se de onde saíram determinadas ideias. Porém, deve-se ter em mente que o conjunto das fichas de leitura não é o mesmo que o capítulo de revisão bibliográfica. As fichas são apenas um registro, com memória, de leituras feitas, que é organizado por fonte bibliográfica. Esse trabalho normalmente será desenvolvido antes da definição do objetivo de pesquisa, pois, como foi comentado, consiste exatamente na busca de informações para que esse objetivo possa ser definido. Já o capítulo de revisão bibliográfica será organizado após a execução da pesquisa. Ou seja, após definir o objetivo, definir o método de trabalho, executar os experimentos, coletar os resultados e esboçar as conclusões, é que o pesquisador vai organizar o capítulo de revisão bibliográfica onde ele vai inserir os principais conceitos e trabalhos correlatos relevantes para a compreensão da sua pesquisa. Se as fichas de leitura são organizadas por fonte bibliográfica, o capítulo de revisão bibliográfica não deve ser organizado dessa forma, mas por conceitos. Ou seja, em vez de dizer tudo o que um autor pensa sobre vários conceitos, deve-se dizer o que vários autores pensam sobre um conceito de cada vez. 3.2.2 Tipos De Fontes Bibliográficas Há vários tipos de fontes bibliográficas. Cada uma terá sua utilidade em determinados momentos da pesquisa. Os livros normalmente contêm informação mais completa, didática e bem amadurecida. O objetivo do livro é justamente apresentar uma determinada área da ciência de forma didática e bem fundamentada. Raramente serão encontradas em livros informações sobre trabalhos futuros, que pela Internet tem crescido muito ao longo dos últimos anos”. Uma afirmação como esta, embora, à primeira vista, seja consensual, não pode deixar de ter uma base. Essa base pode ser uma referência a outro trabalho, que tenha realizado uma pesquisa sobre o assunto. A base também pode ser um levantamento estatístico realizado pelo próprio autor que demonstra a validade da afirmação. Mais adiante será visto que essa frase específica ainda comporta vários outros problemas, por exemplo: a) Como se define e se mede “interesse”? b) Como se conceitua “crescer muito”? c) Que período de tempo compreende os “últimos anos”? Em relação à segunda pergunta geradora, “o que exatamente foi obtido como resultado deste trabalho em particular?”, se não houver possibilidade de resumir em poucas palavras a contribuição real do trabalho, então, possivelmente, o texto será confuso e mal organizado, não deixando clara a efetiva contribuição do artigo para a comunidade científica. Em relação à terceira pergunta geradora, “como este trabalho se relaciona com outros na mesma área?”, espera-se, a princípio, que o próprio artigo deixe bem claro, citando adequadamente os trabalhos correlatos. Caso isso não seja feito, o leitor poderá tentar estabelecer as relações entre o trabalho lido e outras obras. Muitas vezes, aspectos importantes sobre o trabalho (falhas) são descobertos através dessas comparações. Em relação à quarta pergunta geradora, “qual seria um próximo passo razoável para dar continuidade a essa pesquisa?”, a resposta poderá ser um excelente objetivo de pesquisa. Muitas vezes as questões de pesquisa já estão colocadas no trabalho pelos autores na esperança de que outros grupos deem continuidade à pesquisa. A quinta pergunta, “que ideias de áreas próximas poderiam ser aproveitadas neste trabalho?”, traz ao pensamento do pesquisador possíveis melhoramentos ao trabalho sendo estudado em função de conceitos correlatos de outras áreas de pesquisa, que possivelmente não eram conhecidos dos autores do trabalho. Dessa forma, o sucesso da aplicação de algum desses conceitos correlatos no trabalho em questão poderá dar origem a uma interessante hipótese de pesquisa, que, se tiver uma justificativa plausível, poderá ser um excelente objetivo de pesquisa. 3.2.5 Exposição À Pesquisa Além da leitura, o pesquisador, na fase de geração de ideias, deverá estar constantemente exposto a um ambiente científico. No caso de alunos de mestrado e doutorado, na fase de elaboração do objetivo de pesquisa, é fundamental que se tente, pelo menos uma vez por semana, gerar uma ideia de pesquisa para ser discutida com o orientador. Regularmente, o pesquisador deverá ler pelo menos os resumos dos artigos publicados nos principais periódicos e eventos na sua área de pesquisa. Além dos resumos, deve-se procurar ler pelo menos um ou dois artigos de maior relevância para a área de pesquisa. Além disso, sempre que possível, o pesquisador deverá participar de palestras e seminários nos quais poderá trocar ideias com outros pesquisadores, além de observar a forma de trabalho de outros grupos de pesquisa. No caso de alunos de mestrado e doutorado, isso implica também participar, como ouvinte, do maior número possível de defesas de teses e dissertações, mesmo que não sejam referentes à sua área de pesquisa específica. 3.2.6 A Ideia De Pesquisa A ideia de pesquisa, ou problema, surge a partir da leitura e observação. Pode-se comparar a ideia de pesquisa a uma semente que germina no solo da revisão bibliográfica. Com uma revisão bibliográfica superficial ou inexistente até se pode ter ideias, mas possivelmente serão ideias fracas, que dificilmente se desenvolverão de forma saudável. Já com uma boa revisão bibliográfica, tem-se um solo forte para germinação de ideias consistentes. Portanto, antes de tentar ter ideias, o aluno deve ter experimentado uma boa carga de leitura relacionada ao tema. 3.2.7 Como Sistematizar A Pesquisa Bibliográfica Um dos problemas que os alunos eventualmente encontram, conforme já mencionado, é justificar que não encontraram nada efetivamente ligado ao assunto que desejam pesquisar. Buscas desorganizadas dificilmente levarão a bons resultados e dificilmente darão segurança ao aluno quando lhe for perguntado “mas será que alguém já não fez isso?”. Fica aqui então uma sugestão sobre como proceder à pesquisa bibliográfica de maneira sistemática. Cada aluno poderá mudar essas sugestões de acordo com suas necessidades ou disponibilidade. Sugere-se seguir estes passos: a) Listar os títulos de periódicos e eventos relevantes para o tema de pesquisa e os títulos de periódicos gerais em computação que eventualmente possam ter algum artigo na área do tema de pesquisa. b) Obter a lista de todos os artigos publicados nos últimos cinco (ou mais) anos nesses veículos. c) Selecionar dessa lista aqueles títulos que tenham relação com o tema de pesquisa. d) Ler o abstract desses artigos e, em função da leitura, classificálos como relevância “alta”, “média” ou “baixa”. e) Ler os artigos de alta relevância e fazer fichas de leitura anotando os principais conceitos e ideias aprendidos. Anotar também títulos de outros artigos possivelmente mencionados na bibliografia de cada artigo (mesmo que com mais de cinco anos) e que pareçam relevantes para o trabalho de pesquisa. Incluir esses artigos na lista dos que devem ser lidos (inicialmente o abstract e, se for relevante, o artigo todo). f) Dependendo do caso, ler também os artigos de relevância média e baixa, mas iniciando sempre pelos de alta relevância. O conjunto de referências mencionadas no terceiro passo deve ser efetivamente produzido na forma de uma listagem que possa ser posteriormente consultada ou até indicada na bibliografia do trabalho como fonte de pesquisa. Portanto, essa fase do processo deve ser bem documentada. Depois do último passo, o aluno poderá decidir se: a) Já tem material suficiente para elaborar uma ideia de pesquisa consistente. b) Precisa expandir a pesquisa examinando artigos mais antigos (expandindo o passo “b”) ou periódicos menos relevantes (expandindo o passo “a”). A decisão sobre se já há material suficiente para finalizar a revisão bibliográfica usualmente será tomada em conjunto com o orientador. Uma última técnica ainda para expandir a revisão bibliográfica, quando necessário, é consultar as referências bibliográficas citadas nos trabalhos mais importantes consultados. 3.2.8 Como Terminar A Revisão Bibliográfica Em geral, existe sempre conhecimento novo sendo produzido em todas as áreas da ciência. A revisão bibliográfica, portanto, praticamente não termina nunca. Mas o trabalho de pesquisa deve ter um término claro. E é necessário saber que, durante o seu desenvolvimento, apenas a revisão bibliográfica não produz nenhum conhecimento novo. É necessário, portanto, passar gradualmente da fase de revisão bibliográfica para a fase de realização propriamente dita do trabalho de pesquisa, ou seja, a construção de teorias e realização de experimentos para testar hipóteses. 3.3 O Objetivo O objetivo da pesquisa deve ser diretamente verificável ao final do trabalho. Um bom objetivo de pesquisa possivelmente irá demonstrar que alguma hipótese sendo testada é ou não verdadeira. Portanto, o objetivo geral e os objetivos específicos do trabalho devem ser expressos na forma de uma condição não trivial cujo sucesso possa vir a ser verificado ao final do trabalho. Um objetivo bem expresso em geral terá verbos como “demonstrar”, “provar”, “melhorar” (de acordo com alguma métrica definida) etc. Deve-se tomar cuidado com certos verbos que determinam objetivos cuja verificação é trivial e, portanto, inadequada. Entre eles pode-se citar “propor”, “estudar”, “apresentar” etc. Se o objetivo do trabalho é propor algo, basta que a Os trabalhos científicos, que devem obrigatoriamente ser desenvolvidos no mestrado e no doutorado, devem, além de usar o conhecimento já disponível, criar novos conhecimentos, associandoos dentro de uma estrutura coerente àqueles que já são conhecidos. Sendo assim, o desenvolvimento de sistemas ou protótipos servirá apenas como apoio para demonstrar a aplicabilidade desses novos conhecimentos, se assim for necessário. 3.3.3 Os Objetivos Específicos Os objetivos específicos devem ser escolhidos da mesma forma que o objetivo geral, ou seja, devem ser não triviais e verificáveis ao final do trabalho. Normalmente, os objetivos específicos não são etapas do trabalho, mas subprodutos. Deve-se tomar cuidado para não confundir os objetivos específicos com os passos do método de pesquisa. A implementação de um protótipo ou a coleta de dados empíricos possivelmente serão etapas dentro de um trabalho e, portanto, parte do método de trabalho. Esses passos não são, assim, objetivos específicos. Deve-se entender, portanto, que os objetivos específicos são detalhamentos ou subprodutos do objetivo geral. Se o objetivo geral consiste em provar uma determinada hipótese, os objetivos específicos podem estabelecer a prova de uma série de condições associadas a tal hipótese. 3.4 O Método de Pesquisa Em geral as monografias têm um capítulo ou seção designados como “metodologia”. Entretanto, metodologia seria o estudo dos métodos. Apesar do uso corrente, linguisticamente seria mais correto afirmar que um trabalho científico individualmente tem um método de pesquisa e não uma metodologia. Segundo a Wikipédia (2009a), “A Metodologia é o estudo dos métodos. (…) Tem como finalidade captar e analisar as características dos vários métodos disponíveis, avaliar suas capacidades, potencialidades, limitações ou distorções e criticar os pressupostos ou as implicações de sua utilização.” Dificilmente um aluno escrevendo uma monografia apresenta uma metodologia com essas características. O usual é que, dependendo do tipo de problema, se escolha um método de trabalho e siga utilizando-o até comprovar ou refutar as hipóteses. Assim, os termos método e metodologia serão aqui claramente diferenciados. Ainda segundo a Wikipédia (2009b), “O método científico é um conjunto de regras básicas para desenvolver uma experiência a fim de produzir novo conhecimento, bem como corrigir e integrar conhecimentos preexistentes. Na maioria das disciplinas científicas consiste em juntar evidências observáveis, empíricas (ou seja, baseadas apenas na experiência) e mensuráveis e as analisar com o uso da lógica.” Este livro trata de metodologia porque apresenta um estudo de métodos. Mas o livro em si teve um método para ser concebido e escrito, o qual não é aqui descrito. Porém, uma monografia deverá sempre descrever o método usado para chegar às conclusões. O método propriamente dito de um trabalho científico só pode ser estabelecido depois que o objetivo tiver sido definido. Por esse motivo, no caso da Computação, normalmente a revisão bibliográfica não deveria nem fazer parte do método. A revisão bibliográfica consiste em um passo do trabalho no qual o aluno vai iniciar ou aprofundar seus conhecimentos em um campo do saber para que possa então propor um objetivo que seja coerente com o grau que deseja obter. Ou seja, a etapa de revisão bibliográfica não seria parte do método, mas um prerrequisito para realização do trabalho de pesquisa, pois quem não estudou o assunto não tem como propor um objetivo válido. O método consiste na sequência de passos necessários para demonstrar que o objetivo proposto foi atingido, ou seja, se os passos definidos no método forem executados, os resultados obtidos deverão ser convincentes. O método deve então indicar se protótipos serão desenvolvidos, se modelos teóricos serão construídos, quais experimentos eventualmente serão realizados, como os dados serão organizados e comparados, e assim por diante, dependendo do tipo de trabalho. A definição do método de pesquisa é um passo fundamental a ser executado logo após a definição do objetivo. Dado o objetivo, o método descreve o caminho para atingi-lo. Assim, deverá ser suficiente trilhar o caminho descrito pelo método para se alcançar o objetivo. Se o objetivo e o método foram coerentes, então grande parte do trabalho de pesquisa já terá sido executada, restando apenas a execução dos passos descritos no método. Porém, descrever um conjunto de passos que constitua um método de trabalho científico aceitável exige alguns conhecimentos sobre o método científico que serão detalhados nesta seção. A não observância do método científico pode levar a conclusões erradas ou forçadas. Propostas metodologicamente ingênuas não são totalmente incomuns em computação. Coisas como “trabalhar com dois grupos, um com a ferramenta e outro sem a ferramenta”, até poderia ser parte de um método, mas não é suficiente. Se a diferença entre as médias dos dois grupos for de 0,5 ponto percentual, pode-se concluir que um grupo foi melhor que o outro? Ou pode ter sido obra do acaso? E se a diferença for de cinco pontos percentuais? Como saber? Existem algumas informações trazidas pela estatística que devem ser do conhecimento de qualquer pessoa que se aventure a desenvolver pesquisa científica. Além disso, existe ainda a possibilidade do mau uso da lógica. Os antigos sofistas eram bastante requisitados entre os gregos para argumentação. Entretanto, nem sempre a lógica usada por eles era exatamente a que poderia ser aceita cientificamente. Um exemplo hilário de uso tortuoso da lógica aparece no filme Monty Python em Busca do Cálice Sagrado, quando Bedevere propõe um método infalível para determinar a identidade de uma bruxa. Ao final de uma série de argumentações pseudológicas, ele conclui que, se a mulher pesar tanto quanto um pato, será uma bruxa. Basicamente, segundo Bedevere, bruxas queimam e madeira também queima. Madeira flutua na água assim como os patos. Logo, se a mulher pesar tanto quanto um pato é feita de madeira e, portanto, é uma bruxa. 3.4.1 Dados Versus Conceitos O método de pesquisa não consiste apenas em coletar dados para suportar a hipótese de trabalho. É necessário elaborar um discurso ponderado e esclarecedor a partir desses dados. O aspecto mais importante de uma monografia é o pensamento crítico e não apenas a coleta de informações. Trabalhos acadêmicos que se restringem à realização de pesquisas de opinião através de questionários com a consequente tabulação dos dados e apresentação de gráficos não terão validade se não trouxeram consigo alguma informação nova. Lakatos e Marconi (2006) identificam o questionário como um instrumento de pesquisa que dispensa a presença do pesquisador. Porém, deve-se evitar a distribuição de questionários para serem respondidos se não se sabe com antecedência qual a informação que se está buscando, ou seja, qual a hipótese que se está tentando comprovar. Além disso, em geral respostas diretas e interpretações simplistas não são as mais interessantes. Por exemplo, há algum tempo pesquisadores realizaram uma pesquisa na Inglaterra, onde entrevistaram homens e mulheres perguntando quantos parceiros sexuais haviam tido ao longo da vida. O resultado médio para as mulheres foi três e o resultado médio para os homens foi 10. Uma interpretação ingênua e simplista desse fato diria que o homem em média tem mais parceiros do que as mulheres. Porém, considerando-se que existe aproximadamente o mesmo número de homens e mulheres na sociedade, isso é impossível, visto que cada vez que um homem tem uma nova parceira, uma mulher (a parceira) também tem automaticamente um novo parceiro. Portanto, as duas médias deveriam ser praticamente iguais. A conclusão da pesquisa foi, portanto, que ou os homens mentem para mais, ou as mulheres mentem para menos, ou ambos mentem quando se trata de quantificar o número de parceiros. 3.4.2 Pesquisa Experimental E Não-Experimental Uma das caracterizações clássicas das formas de pesquisa consiste na classificação da pesquisa experimental e não-experimental. Basicamente, a pesquisa não-experimental consiste no estudo de fenômenos sem a intervenção sistemática do pesquisador. Por exemplo, um pesquisador que estude o dia a dia de uma empresa de desenvolvimento de software para detectar ali determinadas práticas previamente catalogadas está fazendo uma pesquisa mestres. É preciso verificar objetivamente se o fenômeno descrito realmente é verdadeiro. Antes foi mencionado o fato de que o interesse pela Internet vem crescendo muito nos últimos anos. Será verdade? Quem disse? E de onde observou esse fato? É um sentimento comum e intuitivo. Possivelmente vários livros e artigos sobre Internet têm falado isso ao longo dos anos. Mas será essa afirmação realmente verdadeira hoje? Não estará o interesse pela Internet estável ou diminuindo? O leitor provavelmente responderá “claro que não” a essa última pergunta. Mas como pode ter tanta certeza? Fez alguma observação empírica? Tem dados? Afinal o que é interesse? Como se mede? Essas dúvidas são importantes para o cientista que quer realmente entender os fenômenos e descobrir novos conhecimentos. Se os médicos atualmente continuassem acreditando que o coração bate porque aquece o sangue, baseados na afirmação de Descartes, pouquíssimos avanços da Medicina teriam sido conseguidos. Duvidar das conclusões de outros cientistas e duvidar do próprio senso comum, muitas vezes, é a chave para grandes descobertas. 3.4.5 Variáveis Foi mencionada anteriormente a existência de fenômenos para os quais interessa ao cientista realizar medições objetivas. Em geral, tais fenômenos que podem ser medidos objetivamente são identificados como variáveis. Uma variável é um nome que se dá a um fenômeno que pode ser medido e que varia conforme a medição. Se não variasse seria uma constante e não teria maior interesse para a pesquisa. Variáveis em experimentos, assim como as variáveis em programas computacionais possuem um domínio, ou seja, um conjunto de valores dentro do qual a variável se altera. Por exemplo, uma temperatura em geral será um número racional limitado inferiormente pelo zero absoluto (o valor literal dependerá da escala que se use). Uma variável relacionada à temperatura não poderá assumir o valor “Z” ou “falso”, já que esses não pertencem ao seu domínio. O domínio de uma variável pode ser discreto ou contínuo. Variáveis contínuas assumem valores reais, a ideia de contínuo vem do fato de que entre dois valores sempre existe um terceiro. Já as variáveis discretas assumem seus valores em conjuntos cujos elementos podem ser ordenados ou em conjuntos finitos. O número de participantes de uma videoconferência é um fenômeno representado em uma variável cujo domínio é discreto e corresponde ao conjunto dos números naturais. Os valores desse conjunto podem ser ordenados, e entre o n-ésimo valor e o (n+1)-ésimo valor não existe uma terceira possibilidade para qualquer n que seja um número natural. Algumas variáveis discretas assumem seus valores em conjuntos finitos. Tais variáveis são denominadas categóricas. Por exemplo, as notas que um estudante de mestrado na UFSC pode obter em uma disciplina variam no conjunto {A, B, C, E}. Em ciência, muitas vezes fenômenos observados são classificados com variáveis categóricas, pois estas são em geral mais fáceis de compreender do que valores contínuos. Caso se avaliasse alunos com valores contínuos, seria razoável concluir que um aluno com nota 6,7812 é melhor do que um aluno com nota 6,7811? Em alguns casos é possível estabelecer regras de transformação de valores contínuos para discretos. Esse processo, chamado discretização, consiste em atribuir um valor discreto diferente para variados intervalos de valores contínuos. Por exemplo, considerando-se notas arredondadas para uma casa decimal após a vírgula, pode-se estabelecer uma correspondência entre o domínio contínuo e a variável categórica da seguinte maneira: notas de 0,0 a 4,9 poderiam ser consideradas como o conceito E, notas de 5,0 a 6,9, como conceito C, notas de 7,0 a 8,9, como conceito B, e notas de 9,0 a 10,0, como conceito A. Note-se, porém, que quando se aplica o conceito de arredondamento para uma casa decimal depois da vírgula o domínio da variável já foi transformado de contínuo em discreto, pois, dessa forma, as notas possíveis limitam-se a 101 valores: {0,0, 0,1, 0,2, …, 9,8, 9,9, 10,0}. Na pesquisa científica é importante classificar ainda as variáveis como medidas ou manipuladas. Uma variável medida é aquela cujo fenômeno será observado pelo pesquisador. Por exemplo, quantas vezes um usuário de uma ferramenta vai olhar no manual para obter informações para desempenhar a tarefa que lhe foi proposta. Essa variável tem como domínio o conjunto dos números naturais, e seus valores não são determinados pelo observador, mas simplesmente medidos. Já a variável manipulada é aquela que o experimentador vai deliberadamente modificar para realizar seu experimento. Por esse motivo, tal variável também é chamado de variável experimental. Um exemplo de variável manipulada poderia ser o número de passos da tarefa repassada aos usuários. O pesquisador poderia passar a alguns usuários, por exemplo, tarefas com cinco passos, a outros com 10 passos, a outros com 15 passos etc. Assim, ao fazer a experimentação, o pesquisador manipula a variável referente ao número de passos da tarefa e observa o comportamento da variável medida que consiste em contar quantas vezes o usuário vai olhar o manual da ferramenta. Mas por que pesquisadores manipulam uma ou mais variáveis enquanto observam outras? É porque eles querem encontrar dependências entre essas variáveis. No exemplo anterior, possivelmente o pesquisador estaria tentando descobrir se tarefas mais longas implicam ou não o usuário consultar o manual do sistema mais vezes. A princípio pode-se testar a dependência entre quaisquer variáveis manipuladas e observadas. Mas nem sempre esse teste fará sentido. Antes de analisar uma dependência experimentalmente, o pesquisador em geral desenvolve uma teoria ou hipótese. No caso anterior, a hipótese poderia ser que quanto maior a tarefa, maior a consulta ao manual feita pelo usuário. Outra hipótese possível seria que não importa o tamanho da tarefa, isso não influenciará no número de vezes que o usuário consulta o manual. É uma dependência que tanto em um caso quanto no outro parecem valer a pena testar. Mas nem sempre dependências que podem ser testadas fazem sentido enquanto hipótese ou teoria. Por exemplo, manipular a variável “número de botões na tela do aplicativo” e medir a variável “número de vezes que o usuário espirra enquanto está usando a ferramenta”, pode até ser divertido, mas dificilmente haverá uma conexão entre os dois fenômenos. Outro exemplo seria observar o dia da semana e tentar verificar se programas rodam mais rapidamente na sexta-feira. O pesquisador até poderia criar experimentos controlados para mensurar isso. Mas dificilmente encontraria uma conexão entre o dia da semana e a velocidade dos programas. Até porque a teoria corrente sobre programas não estabelece nenhuma conexão entre sua velocidade e o dia da semana. Tal hipótese então se revelaria falha. Daí vem a importância de se trabalhar com uma boa teoria em pesquisa. Não basta realizar experimentos e encontrar relações entre variáveis. É preciso ter uma teoria que procure explicar o porquê dessas relações. Há aqui também a caracterização, bastante comum em pesquisa, dos termos variável dependente e variável independente. A variável independente é aquela que, se supõe, influencia outra. A variável dependente é a influenciada. Uma hipótese de pesquisa científica, então, em geral terá uma associação de implicação, ou seja, antecedente/consequente, entre uma ou mais variáveis independentes e uma ou mais variáveis dependentes. Por exemplo, o número de passos em uma tarefa implica o aumento do número de vezes que o usuário consulta o manual? Essa seria uma hipótese de pesquisa em que a variável dependente é o número de consultas ao manual, e a variável independente é o número de passos da tarefa. Em geral, o pesquisador manipula a variável independente e mede a dependente. Nesse caso, ainda, como ambas as variáveis são numéricas, pode-se afirmar que se busca encontrar uma dependência direta, ou seja, quanto maior o número de passos, maior o número de consultas. Em outros casos, se poderia pesquisar dependências inversas, em que o aumento no valor da variável independente causa uma diminuição na variável dependente. Ainda existe a dependência linear e não-linear. A linear pode ser aproximada por um polinômio de primeiro grau. Por exemplo, poderia ser observado que, para cada passo na tarefa, o usuário faz mais duas consultas ao manual. Nesse caso, a relação entre o número de passos x e o número de consultas y poderia ser expressa pela função y = 2x. Dependências não-lineares usualmente são representadas por polinômios de grau superior a um ou ainda por equações com exponenciais, raízes ou logaritmos. Este livro apresentará apenas os conceitos relacionados à dependência linear. Para o leitor que queira se aprofundar em outras formas de dependência recomenda-se a leitura de um bom livro de estatística, como o de Barbetta, Reis e Bornia (2008). 14,75/3 = 4,9166… 382,75/3 = 127,5833… 0,75/3 = 0,25 O que se pode concluir aqui é que o segundo conjunto é o que mais varia, ou seja, seus elementos mais se afastam da média, enquanto o terceiro conjunto é o que menos varia, ou seja, ele é o que tem os elementos relativamente mais próximos da média. A fórmula da variância pode ser então assim definida: Onde é o símbolo comumente usado para representar a variância de X, n é o número de elementos do conjunto, representa a média aritmética do conjunto e xi representa cada um dos elementos do conjunto no somatório. O desvio-padrão é uma medida também bastante utilizada para analisar conjuntos e é definido simplesmente como a raiz quadrada da variância, ou seja: onde SX é o símbolo comumente usado para representar o desviopadrão. No exemplo anterior, os valores de desvio-padrão dos três conjuntos são respectiva e aproximadamente: 3.4.7 Covariância A variância é uma medida muito importante para a pesquisa científica. Basicamente pode-se dizer que não haveria muito o que fazer se os fenômenos não variassem. Se cada variável estudada tivesse variância zero, então os valores seriam previsíveis e pouco se poderia aprender sobre a natureza das coisas. Entretanto, os fenômenos variam, e quanto maior a variância, mais interessante pode ser o fenômeno. A pesquisa em engenharia de software, por exemplo, tenta descobrir formas de estimar quanto tempo um programa levaria para ser desenvolvido. É uma medida difícil porque mesmo que se tenha uma descrição detalhada de cada função ou caso de uso a ser desenvolvido, o tempo que o desenvolvedor levaria para programar cada um desses elementos poderia variar de alguns minutos a várias semanas. Saber o tempo esperado (ou o tempo médio) ao criar os programas necessários para realizar um caso de uso2 pode até ser útil ao fazer previsões para conjuntos de casos de uso, mas médias aritméticas de um conjunto de valores só costumam ser boas estimativas quando uma quantidade significativa de valores está em jogo. Saber o tempo médio que se gasta para programar um caso de uso não permite prever quanto tempo vai-se levar para programar um dado caso de uso, tomado individualmente. Similarmente, mesmo sabendo que em 1.000 jogadas de uma moeda, aproximadamente 500 serão cara e aproximadamente 500 serão coroa, não há meios de saber qual resultado será obtido em uma jogada específica. No caso de conjuntos que variam muito, como do tempo que se leva para programar casos de uso, será que não se trataria de considerar que não se tem um único conjunto mas sim um certo número de subconjuntos, cada um dos quais com características distintas? Cada um com sua própria média e variância? Voltando ao conjunto de maior variância do exemplo anterior, {1, 20, 2, 22}. Observando-se esse conjunto, não seria possível concluir que talvez se trate de dois subconjuntos distintos? Ou seja, {1, 2} e {20, 22}. Nesse caso, o que se tem são dois subconjuntos com médias distintas, e cada um dos quais com variância bem menor do que a do conjunto original. Seria necessário, então, construir uma teoria para determinar quais as causas de certos elementos apresentarem medidas associadas ao primeiro subconjunto ou ao segundo subconjunto, ou seja, qual a causa da existência desses dois subconjuntos. Voltando ao exemplo dos casos de uso. Não seria mais útil imaginar que seria possível classificar esses casos de uso em, por exemplo, simples, médios e complexos, para obter conjuntos de medidas com variância menor e, portanto, mais previsíveis? E se, por exemplo, os casos de uso simples pudessem ser programados em menos de um dia, os médios entre um dia e uma semana e os complexos em mais de uma semana? Seria mais fácil fazer previsões sobre o tempo que se levaria para desenvolver um sistema. Bastaria contar a quantidade de casos de uso simples, médios e complexos e multiplicar cada quantidade pela média de tempo associada a cada subconjunto. A informação seria mais relevante, possivelmente, do que uma única média aplicada ao conjunto inteiro dos casos de uso, pois com essa abordagem seriam usadas características dos elementos do conjunto para reduzir a incerteza sobre eles. Porém, essa subclassificação introduz outro fator de incerteza: não se sabe, a priori, se a forma de determinar que um caso de uso é simples, médio ou complexo realmente classifica os casos de uso em subconjuntos nos quais os valores de tempo de desenvolvimento tenham variância mais baixa. Nesse ponto poderia ser aplicada a experimentação científica para validar a hipótese de que uma determinada técnica de classificação dos casos de uso efetivamente classifica a complexidade destes adequadamente, ou seja, que esse sistema de classificação colocará no conjunto “simples” os casos de uso que efetivamente sejam mais rápidos de programar, e no conjunto “complexos” os casos de uso mais difíceis, ficando os demais no conjunto “médios”. Para testar essa hipótese é necessário comparar dois conjuntos de valores: o valor dado a um caso de uso pelo método de classificação e o valor do tempo que efetivamente se leva para programar o caso de uso. Para efetuar essa comparação é necessário usar o conceito de covariância, ou seja, determinar em que grau os dois conjuntos variam conjuntamente. Espera-se, então, que ao se ter as medidas dos tempos, os maiores tempos estejam no conjunto “complexos”, os menores tempos no conjunto “simples” e os demais tempos no conjunto “médios”. Para dar um tratamento totalmente numérico aos conjuntos é possível denotar os conjuntos simples, médios e complexos por números. Alguns trabalhos de referência na área de pontos de caso de uso sugere aplicar valores numéricos 1, 2 e 3 para casos de uso simples, médios e complexos, respectivamente. Nesse caso, o que se busca é uma covariância entre esses valores de pontos de casos de uso e os valores das medidas de tempo obtidas. Pode ser questionado se a escala é correta. Por exemplo, não seria mais adequado ter valores como 1, 2 e 5 em vez de 1, 2 e 3? É uma dúvida válida, mas como a literatura propõe os valores 1, 2 e 3 e não é objetivo deste exemplo questionar esse aspecto da teoria, então trabalha-se com esses valores mesmo e não com outros (se esse exemplo fosse um projeto de pesquisa, o fato de que não será considerada a hipótese de a proporção ser diferente poderia ser uma limitação do trabalho). Supondo que o pesquisador queira saber se um determinado método de estimativa realmente classifica os casos de uso adequadamente, ele poderia fazer experimentos da seguinte forma: (1) tomar um conjunto de casos de uso aleatoriamente escolhidos cujo tempo de programação já seja conhecido (neste caso, trata-se de um benchmark; se o tempo não for conhecido, o pesquisador terá de efetuar ele mesmo os cálculos, possivelmente solicitando a um ou mais programadores que desenvolvam os casos de uso para verificar quanto tempo levam); (2) aplicar o método para classificar cada caso de uso com os valores 1, 2 ou 3 e verificar se existe covariância entre os dois conjuntos de valores obtidos. Supondo que os valores obtidos pelo método de classificação para um conjunto de 10 casos de uso sejam os que estão apresentados na Tabela 3.1, pode-se verificar intuitivamente que para os valores mais altos de tempo tem-se a classificação com 3 pontos e os valores mais baixos de tempo estão classificados com 1 ponto, portanto, intuitivamente parece haver covariância. será positivo. Se um se desvia para cima e outro para baixo, o resultado será negativo. Quanto mais os dois elementos se desviam da média, maior o valor absoluto do produto. A covariância pode então ser calculada simplesmente como o somatório desses produtos, dividido pelo número de elementos do conjunto de valores menos um, ou seja: Onde SXY é o símbolo usual para representar a covariância entre os conjuntos X e Y. Agora, conhecendo a definição matemática da covariância pode-se aplicar esse conceito para identificar entre os dois métodos qual é mais adequado para fazer estimativas de tempo de desenvolvimento de casos de uso. A Tabela 3.3 apresenta o cálculo da covariância para o primeiro método. A média dos tempos conhecidos, , é 20,6 e a média dos valores de classificação, , é 1,8. Então, o valor da covariância entre os dois conjuntos consiste na somatória da última coluna da Tabela 3.3 dividido por n-1, ou seja: 149,2/9 = 16,57777…. Mas o que significa esse número? A partir dele é possível concluir que os valores de um conjunto são afetados pelos valores do outro conjunto? A covariância não produz um número normalizado, como será explicado em seguida. Então, o valor da covariância serve basicamente para comparar um par de conjuntos com outro par de conjuntos, desde que as unidades de medida dos dois pares sejam idênticas. Seguindo esse raciocínio, é de se esperar que o método arbitrário, apresentado na Tabela 3.2, designado agora como Y’ apresente um valor de covariância bem mais baixo do que o primeiro método, designado na Tabela 3.3 como Y. A Tabela 3.4 apresenta o cálculo da covariância para o método arbitrário, levando em conta que a média dos valores obtidos pelo método arbitrário é 1,9. Tabela 3.3 Covariância para o primeiro método Caso de] Tempo conhecido [Pontos de caso «-0 [gy -9| (6 -5y =) uso (horas): X de uso: Y ' ' ' ' uci 1 1 -19,6 | -0,8 15,68 UC2 18 2 -2,6 0,2 -0,52 UC3 4 1 -16,6 | -0,8 13,28 UC4 67 3 46,4 lie 55,68 UCs 22 2 1,4 0,2 0,28 UC6 12 2 -8,6 0,2 -1,72 UC7 2 1 -18,6 | -0,8 14,88 ucs E 1 -13,6 | -0,8 10,88 UC9 18 2 -2,6 0,2 -0,52 Ucio 55 3 34,4 1,2 41,28 Tabela 3.4 Covariância para o método arbitrário Assim, a covariância entre esses dois conjuntos é a somatória da última coluna da Tabela 3.4 dividido por 9, ou seja, –70,4/9 = –7,822222…. O sinal negativo indica que se existe eventualmente alguma covariância, esta é negativa, mas o valor absoluto obtido para o método arbitrário é menos do que a metade do valor obtido para o primeiro método. Ou seja, a covariância do primeiro método em relação aos valores de tempo é maior do que a covariância do método arbitrário. 3.4.8 Correlação Como mencionado anteriormente, o valor absoluto da covariância não diz muita coisa sobre um conjunto estar influenciando o outro ou não. Por esse motivo usa-se mais frequentemente a correlação. Esta tem basicamente o mesmo significado intuitivo da covariância, mas o resultado numérico varia entre –1 e 1, em que perto de –1 significa correlação negativa muito forte, perto de 1 significa correlação positiva muito forte e perto de 0 significa ausência de correlação. Existem vários tipos de cálculo de correlação possíveis. O mais conhecido é o coeficiente de correlação de Pearson, obtido dividindo-se o resultado de , que (dividido por n-1) é usado para obter a covariância, pelo produto do desvio-padrão de cada um dos dois conjuntos de valores, ou seja: Tabela 3.5 Valores mínimos de correlação para ser considerada significativa com 95% de certeza 3.4.9 A Hipótese De Pesquisa Um aspecto que diferencia o trabalho científico do trabalho técnico é a existência de uma hipótese de pesquisa. A hipótese é uma afirmação da qual não se sabe a princípio se é verdadeira ou falsa. O trabalho de pesquisa consiste justamente em tentar provar a veracidade ou falsidade da hipótese. Um objetivo sem uma boa hipótese pode ser muito arriscado. Anteriormente foi dito que o objetivo consiste em tentar produzir algum conhecimento que ainda não existe. Mas se não houver uma boa hipótese para justificar esse objetivo, corre-se o risco de realizar a pesquisa sem obter resultados. Por exemplo, ter como objetivo de pesquisa provar que P = NP é perfeitamente válido, pois esse problema é relevante à sociedade e o conhecimento necessário para resolver o problema ainda não existe. Porém, com que hipótese o pesquisador vai trabalhar? Se o problema de pesquisa for colocado simplesmente como “provar que P=NP”, o pesquisador poderá ficar tateando a esmo, e o risco de fracasso será muito grande. É necessário, portanto, ter uma hipótese. Segundo Comer (2008), uma tese é uma hipótese ou conjectura. O texto da tese ou monografia é um documento em que o aluno apresenta argumentos a favor de sua tese. Daí a confusão que muitas vezes se faz com o termo “tese”, que pode representar tanto o documento escrito, quanto a hipótese de pesquisa. O método, como discutido anteriormente, deverá indicar como os testes deverão ser feitos. Ao final dos experimentos haverá evidências a favor ou contra a hipótese inicial. Nesse caso, alguém poderá perguntar, “e se não se conseguir provar que a hipótese era válida?”. A resposta para essa pergunta dependerá de quão relevante era a hipótese original. Uma hipótese qualquer escolhida a esmo, sem nenhum tipo de justificativa, se não for confirmada, não traz nenhuma informação nova para a área de pesquisa. Mas uma hipótese sólida e bem justificada, com evidências de validade, que ao final é invalidada, pode produzir a informação interessante. No pior dos casos provará que aquilo que eventualmente se poderia aceitar intuitivamente como verdadeiro não resistiu à prova. É dessa forma que muitos mitos podem ser derrubados. Sendo assim, além do objetivo, hipótese e metodologia, é fundamental que o trabalho de pesquisa tenha como base uma boa justificativa para a escolha da hipótese. Uma hipótese bem justificada no início do trabalho aumenta as chances de sucesso. Em primeiro lugar, é mais provável que ela seja verdadeira do que uma hipótese sem justificativa. Em segundo lugar, se ela for falsa, o trabalho terá o mérito de ter derrubado algum mito. O trabalho científico na área de Computação consiste então em formular uma hipótese e coletar evidências para comprovar a sua validade. Essas evidências podem ser obtidas basicamente de três formas: a) Construindo uma teoria, que a partir de fatos aceitos e deduções válidas prove que a hipótese é verdadeira. b) Realizando certo número de experimentos controlados, que estatisticamente comprovem a validade da hipótese. Porém, devese ter em mente que esse tipo de comprovação é sempre sujeito a erros. Normalmente se aceita que hipóteses sejam comprovadas com 95% de certeza. c) Realizar estudos de caso, comparativos, argumentações, colher opiniões através de questionários e outras formas que dificilmente constituem uma prova, mas que podem ser evidências da validade da hipótese. É possível também realizar um trabalho estruturado sobre combinações de duas ou três formas anteriores. De qualquer maneira, o importante é que a partir da formulação da hipótese, o pesquisador esteja engajado no processo de busca de evidências, e que essas evidências sejam estruturadas em um discurso coerente, em que ele apresenta a sua argumentação para a comunidade científica. Um problema de pesquisa, então, em geral vai perguntar como duas ou mais variáveis se relacionam, e se existe correlação positiva ou negativa entre os valores das variáveis. A existência dessas correlações, porém, ainda não prova causas. Uma teoria consistente que explique causa e efeito precisa também ser elaborada, além da validação empírica. Isso acontece porque algumas vezes duas variáveis até se correlacionam com alto índice, mas as causas envolvidas podem não ser tão diretas. Cita-se como exemplo o caso de uma empresa que decidiu verificar se funcionários bem alimentados trabalhavam melhor. A empresa passou a servir um café da manhã saudável para seus funcionários em todas as filiais e, em praticamente todas, a produtividade aumentou. Mas será realmente verdade? Qual a explicação? Será que foi mesmo a alimentação que fez os funcionários trabalharem mais? Na sequência a empresa testou retirar o café da manhã saudável para verificar se os trabalhadores retornavam ao ritmo anterior. Para surpresa de todos, a produtividade cresceu ainda mais. Como um cientista lidaria com esses dados aparentemente contraditórios? O caso aqui é que se trata de verificar o real motivo do aumento de produtividade. Este não ocorreu por conta de uma alimentação melhor, mas pelo fato de que houve uma significativa modificação no dia a dia da empresa. Funcionários estão acostumados a perceber que modificações na empresa em geral implicam demissões. Por isso, cada vez que se observa uma modificação no ambiente (introdução ou retirada do café da manhã), os funcionários tendem a trabalhar mais para serem notados e garantirem seus empregos. 3.5 Justificativa Foi comentado anteriormente que uma hipótese de trabalho é muito arriscada se não estiver solidamente apoiada em uma boa justificativa que apresente evidências de que vale a pena investir tempo e recursos na tentativa de comprovar a hipótese. Quem em sã consciência se proporia a trabalhar dois anos para provar que o método arbitrário definido anteriormente faz boas previsões em estimativa de esforço? Uma boa hipótese precisa ser justificável. Em uma monografia, pode-se justificar o tema de pesquisa, mas mais importante ainda é justificar a escolha do objetivo e da hipótese. Por exemplo, se o tema de pesquisa é “compactação de texto”, o objetivo de pesquisa é obter um algoritmo com maior grau de compactação do que os algoritmos comerciais, e a hipótese de pesquisa pode consistir em utilizar um determinado modelo de rede neural para realizar essa compactação, então a justificativa do tema deverá se concentrar em mostrar que é necessário obter algoritmos de compactação melhores. Adicionalmente, a justificativa da hipótese deverá se concentrar em apresentar evidências de que o modelo de rede neural escolhido poderá produzir resultados melhores do que os algoritmos comerciais. Em geral, a justificativa do tema aparece na contextualização do trabalho, em que se tenta justificar ao leitor que o problema escolhido realmente é relevante (no exemplo anterior, compactação de textos). Mas na maior parte das vezes esse convencimento é pacífico. Mais difícil é justificar uma hipótese de trabalho, pois para isso será necessário apresentar alguma evidência de que uma determinada linha de pesquisa pode levar a bons resultados quando ainda não se efetuou essa pesquisa (no exemplo anterior, justificar o uso do modelo específico de redes neurais para compactar textos). Essas evidências podem ser referências a outros trabalhos que eventualmente mostraram algum tipo de resultado que aponte para a viabilidade da hipótese escolhida, ou ainda em dados colhidos preliminarmente pelo próprio autor do trabalho ou em um estudo de caso. 2O conceito de caso de uso é descrito de forma compreensível por Wazlawick (2004). CAPÍ T ULO 4 Análise Crítica de Propostas de Monografia No curso da disciplina de Metodologia da Pesquisa no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação da UFSC, dezenas de alunos ingressantes foram convidados a apresentar um seminário com uma proposta de pesquisa. As apresentações foram utilizadas para ajudar os alunos a perceberem problemas em suas propostas e melhorá-las. Neste capítulo analisaremos alguns textos contidos nessas propostas antes de sua melhoria, ou seja, os textos apresentados são material não revisado pelos alunos. Dessa forma considerou-se apropriado não mencionar os nomes dos autores deste material, sendo colocado entre aspas o texto que é de produção dos alunos e os comentários logo em seguida. 4.1. Análise da Contextualização e Colocação do Problema Nesta seção são analisados textos referentes à contextualização do problema. A avaliação verifica se o problema é, de fato, um problema de pesquisa e se está bem claro. Os resultados são apresentados a seguir. “Uma das grandes dificuldades que o acadêmico encontra ao ingressar em uma universidade é confrontar-se com a disciplina Metodologia da Pesquisa. Desconhece a ABNT e suas normas bem como as propostas de formatação e estruturação de um relatório de pesquisa. Para amenizar o problema, pretendese elaborar um sistema multimídia, utilizando-se de técnicas referentes ao desenvolvimento de sistemas deste tipo como: ergonomia de software, um método de apoio para aprimorar a interação usuáriomáquina e a distribuição dos recursos no sistema.” Em relação a esse texto, cabem os seguintes comentários: de onde vem a informação sobre “isto ser uma grande dificuldade”? Observação do autor (experimentos)? Ou pesquisa bibliográfica? Quem demonstrou que essa informação é verdadeira? Mesmo supondo que se trate de um problema real, caberia ainda perguntar por que o aluno considera que um sistema multimídia será uma solução. Não existem outras possibilidades? Aqui parece que já se escolheu a ferramenta sem analisar o problema em si detalhadamente. Deve-se considerar em casos como esse que a observação do problema pode estar localizada, como no caso do aluno que observou que o rio que cruzava a cidade onde ele morava não podia ser atravessado. O problema referido pode então ser consequência das técnicas de ensino de um professor em particular, que o aluno tenha observado e não se tratar de problema generalizado que afeta todas as instituições de ensino. “No Departamento de Tecnologia da Informação da *** não há um método específico para gerenciar projetos de desenvolvimento de software terceirizado. Projetos terceirizados de desenvolvimento de software têm sido entregues com atrasos e com os requisitos não sendo plenamente atendidos.” O problema refere-se a uma empresa específica. Se essa empresa não usa um método para gerenciar projetos, então a solução é implantar um método existente que já tenha sido testado, ou seja, trata-se de um trabalho técnico. Esse problema, da forma como está colocado, não justifica uma proposta de pesquisa, como, por exemplo, neste caso, em que será proposto o desenvolvimento de um método para gerenciamento de terceirizados. “O sistema *** está constituído por 14 instituições (…) de ensino superior. Não houve um aumento no número destas instituições, mas as instituições estão se expandindo. O número de alunos matriculados vem aumentando ano a ano. As informações serão retiradas do questionário socioeconômico e da secretaria acadêmica que formam uma grande base de dados, possibilitando a utilização de data mining nesta base de dados.” Aqui existe uma oportunidade, não um problema. A oportunidade é a existência de dados em abundância, portanto, propõe-se fazer data mining nesses dados. Mas falta informar o que se pretende descobrir ao analisar os dados ou pelo menos que pista se está seguindo. Como dizem, “se você não sabe para onde quer ir, qualquer estrada serve”. “Octrees são usadas para representação espacial de cenários e objetos. São empregadas por possibilitar a rápida determinação de partes não visíveis. Necessitam de precisão infinita para representar curvas (distorcem a realidade).” Aqui temos um bom exemplo de contextualização. A mensagem é rápida, mas coloca um problema de forma clara. Mesmo que o leitor não saiba o que são octrees, o autor informa que elas são usadas para representação espacial de cenários e objetos. Além disso, o autor informa que elas sofrem de um problema sério: necessitam de precisão infinita. “Serviços distribuídos têm sido usados para obter transparência, desempenho e confiabilidade em sistemas. Dentre os problemas encontrados, está a dificuldade em se um melhor aproveitamento da banda de conexão e uma economia no consumo das baterias, que possuem capacidade limitada. O Grid é uma versão segura de Web Services para o compartilhamento de dados e recursos (Foster, 2001). Entidades como a OGSI e WSRF definem as especificações para os tools kit em que temos controle de usuário, segurança e interface aberta para garantir a compatibilidade. Dessa forma podemos propor uma malha de servidores de vídeo em que um aplicativo cliente pode copiar fragmentos de vídeo de diversos pontos fornecendo uma alta disponibilidade dos recursos e diminuir a sobrecarga existente num sistema centralizado.” Existe um problema claramente caracterizado. Porém, não fica claro se a solução proposta ainda não foi tentada. Se foi, quais os problemas atuais com as soluções existentes para que uma nova tecnologia seja proposta? “Alguns processos de integração de fontes de dados XML heterogêneas definem um esquema conceitual único (esquema global) representativo do esquema de todas essas fontes. Através desse esquema global é possível realizar consultas de forma transparente, uma vez que ele abstrai as complexidades inerentes às fontes de dados, como diferenças estruturais e semânticas. Trabalhos como [***] tratam esse problema.” Embora o texto assim mencione, ele não apresenta um problema, mas uma solução. O texto referenciado aparentemente apresenta soluções para a combinação de bases XML heterogêneas. Então, resta ao autor da proposta de pesquisa identificar um problema, possivelmente no trabalho referenciado, que merecesse atenção para ser resolvido. Pela simples leitura do texto anterior não é possível saber qual é o problema que será resolvido na monografia. “Em supermercados, por exemplo, existe a necessidade de prever a quantidade de produtos que serão vendidos em uma faixa de tempo, para a otimização da quantidade comprada, enxugando custos e necessidades logísticas. Por isso foi estudada a previsão de séries temporais, a qual possui modelos estatísticos que vêm sendo utilizados no mercado. Estes, porém, ora não contemplam perfeitamente os objetivos, ora exigem muitos recursos para tal, portanto há a necessidade de se encontrar um modelo que atenda mais apropriadamente este caso. Alguns estudos em redes neurais sugerem que há a possibilidade de que seja encontrado este modelo neste campo de pesquisa.” O texto coloca um problema real, menciona que as soluções existentes têm limitações e se propõe a pesquisar uma forma de suplantá-las usando uma ferramenta que, segundo o autor, a literatura apresenta como uma tendência. Porém, se redes neurais já têm sido usadas para esse fim, será absolutamente necessário um trabalho de comparação entre os resultados de modelos existentes e o modelo definido pelo autor. “A garantia de QoS é uma preocupação para algumas aplicações distribuídas, as quais necessitam desta para poder funcionar corretamente. Assim, torna-se necessário adotar uma técnica que melhor se encaixe na aplicação de forma a prover os requisitos necessários podendo com isso superar os problemas que poderão surgir, como, por exemplo, atraso (delay), extravio de pacotes, entrega desordenada e prioridades, ou seja, requisitos temporais de qualidade e de segurança [***].” O problema é fundamentado corretamente em uma citação bibliográfica. Esta aponta no sentido da melhoria de vários aspectos relacionados ao tema. “WebServices têm sido amplamente utilizados com intuito de prover interoperabilidade entre aplicações. Algumas aplicações necessitam que os serviços acessados estejam altamente disponíveis, ou seja, ativos e em funcionamento o máximo de tempo possível.” Trata-se aqui da descrição de uma necessidade. Para que se torne um problema de pesquisa é necessário indicar ainda como essa necessidade tem sido suprida e quais as limitações das técnicas correntes. “Há um crescente número de máquinas conectadas à internet. Máquinas de capacidade cada vez maior. Estudos comprovaram que 93% da capacidade de processamento dos computadores permanece ociosa. Essa capacidade pode ser utilizada para processamento de projetos que requerem alto desempenho computacional a um baixo custo operacional. O Ambiente *** é uma alternativa para isto.” Aqui, a informação apresentada, ociosidade de máquinas na Internet, é quantificada e embasada em um estudo bibliográfico (embora não seja explicitamente citado aqui). Porém, esse texto não apresenta um problema de pesquisa, mas uma oportunidade. Máquinas ociosas são uma oportunidade para aproveitar seu potencial de processamento, mas falta estabelecer qual o novo conhecimento que se busca gerar no trabalho. “Jurisprudência (do Latim: juris prudentia) é um termo jurídico com diversos significados. O mais comum refere-se à aplicação de estudo de casos jurídicos na tomada de decisões judiciais. Assim, ‘jurisprudência’ pode referir-se a ‘lei baseada em casos’, ou as decisões legais que se desenvolveram e que acompanham estatutos na aplicação de leis em situações de fato. Grande parte do conhecimento jurídico está formatado em documentos que contêm decisões proferidas em sentenças ou acórdãos. A pesquisa visa contribuir para definir um modelo de arquitetura de pesquisa em documentos com significado semântico incorporado. Criando uma conexão entre a linguagem técnica jurídica e sua representação utilizando ontologias aptas para seu processamento em ferramentas que auxiliem no refinamento do conhecimento.” Essa contextualização apresenta um tema bem delimitado, mas falha ao não caracterizar o problema de pesquisa. A proposta é definir um modelo de arquitetura de pesquisa, mas não estabelece quais são os problemas com as eventuais arquiteturas de pesquisa existentes. Mesmo a menção de uma aplicação direta no domínio jurídico não permite concluir pelo ineditismo desse trabalho, pois esse tipo de aplicação possivelmente já existia no momento da elaboração dessa proposta. Mesmo que não existisse, deveria ser deixado claro o que esse domínio tem de diferente em relação a outros, e por que não funcionariam outros sistemas anteriores a este que será proposto. “A atividade de exploração de poços de petróleo envolve um grau de incerteza muito grande, e essa incerteza gera riscos elevados em termos de custos. Para fazer essa Análise de Risco, a técnica de Simulação vem sendo utilizada, necessitando-se conhecer as distribuições dos valores de tempo das operações. Para a descoberta dessas distribuições, existem vários métodos que avaliam a aderência a algum modelo de probabilidade. Mas para isso é necessário que exista uma série histórica dos tempos de operações semelhantes. Quando não há esse histórico, como realizar a descoberta dos modelos de probabilidade?” Aqui a contextualização apresenta um problema de fato: para realizar uma simulação é necessário ter uma série histórica. É colocado o problema de como fazer essa simulação quando uma série não está disponível, o que de fato pode acontecer. 4.2. Análise de Objetivo Geral Nesta seção procura-se avaliar se um objetivo geral está bem escrito, se é um objetivo de pesquisa e se deixa claro que pode ser verificado ao final do trabalho. Atenção especial é dada ao verbo que apresenta o objetivo. Analisa-se também se o objetivo apresentado define claramente uma pesquisa científica ou um objetivo tecnológico, como, por exemplo, a implementação de um sistema. Os resultados estão apresentados a seguir. “Elaborar um sistema Hipermídia observando critérios ergonômicos e princípios de design como apoio ao ensino da Metodologia Científica.” O verbo inicial não aponta para um objetivo de pesquisa, mas um objetivo técnico: elaborar um sistema. Critérios ergonômicos e princípios de design também são requisitos que qualquer projeto técnico deveria observar. “Obter confiabilidade através de replicação com 5 servidores, obtendo perda máxima de 20% de desempenho comparado a um sistema sem replicação.” Um algoritmo baseado em relaxamento das variáveis Lagrangeanas parece uma boa solução para otimizar alguma coisa como, por exemplo, a manutenção de um sistema elétrico. Mas, por que não outras técnicas? Existe alguma técnica sendo usada correntemente? Que resultados ela produz? Quanto se pretende melhorar e em que dimensão? “Gerar aproximação de superfície em nodos externos da Octree.” Um objetivo sucinto. Talvez por isso seja difícil determinar se está adequado como objetivo de pesquisa. A princípio, “gerar” uma aproximação de superfície não traz novo conhecimento à tona. É uma atividade, não um objetivo de pesquisa. Poderia ser reescrito talvez como, “demonstrar que é possível gerar aproximação de superfície...”. Isso se até o momento da pesquisa nunca tivesse sido feito. Caso contrário, seria reinventar a roda. “Desenvolver um sistema de gerenciamento hospitalar que, com base na tecnologia de workflow, permita a modelagem e execução de processos médicos, interagindo com servidores de dados no padrão ***.” Desenvolver um sistema, por melhor que seja, nunca será um objetivo de pesquisa. O sistema pode ser usado para demonstrar algo, mas ele em si é um objetivo técnico. “Oferecer solução para o planejamento de rotas de navegação para um ambiente semiconhecido. Aplicar essa solução a um sistema de planejamento neurocirúrgico. Demonstrar que essa solução está correta através da comparação com outros métodos atualmente utilizados.(manual!)” “Oferecer solução” está bom como resultado esperado, mas existem muitas formas de fazer isso. Pode-se comprar um sistema, pode-se implementar um algoritmo, pode-se mesmo criar toda uma nova teoria e prática nessa área, com vistas a fornecer uma solução. Então, isso teria de ser mais bem definido. A aplicação dessa solução numa determinada área pode ser interessante, especialmente se os métodos correntes utilizados são manuais. Deve haver uma referência bibliográfica ou a apresentação de uma pesquisa que demonstre que de fato a técnica corrente é manual. Uma rápida observação no hospital local não seria suficiente como justificativa. “Propor um modelo para identificação de características para um plano amostral estratificado.” “Propor” é um verbo que é usado em muitas monografias como objetivo, mas é um verbo perigoso se não vier acompanhado de um objeto direto relevante. No caso anterior, o que está sendo proposto é um modelo para identificação de características. Ok, o modelo pode ser proposto. Mas é necessário indicar claramente o que sucede com outros modelos que possivelmente devem existir. Se não existirem, deve-se avaliar por que não existem e referenciar os modelos mais parecidos com o que se pretende propor. Em suma, não se pode chegar e simplesmente propor alguma coisa. É preciso apresentar uma boa justificativa para tal proposta. “Portar o Sistema *** para a arquitetura de RSSF da UC Berkeley.” A não ser que o processo de “portar” apresente desafios que impliquem construção de novos conhecimentos em computação, o trabalho, como proposto, é apenas um objetivo técnico que poderia ser executado por um profissional da área, sem que ele fosse receber ao final disso o título de mestre. “O objetivo deste trabalho é apresentar um mecanismo sistemático que, através dos contratos definidos em notação OCL, gere diagramas de colaboração, aplicando design patterns.” Seria necessário conhecer bem a área para saber que o mecanismo proposto não existe, portanto, o aluno deveria ter dito isso claramente na contextualização. 4.3. Análise de Objetivos Específicos Os objetivos específicos devem refletir subprodutos ou um detalhamento do objetivo principal. Não se deve, a princípio, mencionar como objetivo específico passos que são meramente intermediários para atingir o objetivo geral. Vários outros cuidados também devem ser tomados, conforme os comentários nos exemplos a seguir. “a) Utilizar critérios de ergonomia de software; b) Aplicar princípios de design no desenvolvimento de sistemas multimídia; c) Elaborar uma interface amigável em sistema multimídia, ou seja, fácil de usar, aplicar e comunicar; d) Adequar o sistema a um método de apoio para sistemas de autoria.” Todo objetivo deve ter um verbo, mas ele deve indicar a produção de algum conhecimento novo. Isso vale para os objetivos específicos também. O objetivo (a) é apresentado com o verbo “utiliza”, que não se presta bem a um objetivo de pesquisa, pois o fato de o autor estar utilizando algo não quer dizer que esteja produzindo algum tipo de conhecimento novo. O mesmo vale para o objetivo (b). O objetivo (c) realmente implica algo sendo feito, possivelmente algo novo. Porém, é difícil mensurar o que significa ser amigável e fácil de usar. Algum critério de medição dessas características deveria ser mencionado. O objetivo (d) não parece ser de pesquisa, mas tecnológico: existe um sistema que será adaptado. “a) Técnicas para identificar padrões em característica; b) Técnicas de agrupamento; c) Categorização de variáveis contínuas; d) Discretização.” Para que esses itens correspondam a objetivos específicos deveria inicialmente haver um verbo em cada item. “a) Desenvolver método de replicação de dados entre servidores; b) Mostrar limitações dos métodos existentes para replicação de servidores com balanceamento de carga.” Considerando que o objetivo geral desse trabalho era “obter confiabilidade”, os objetivos específicos podem ser considerados satisfatórios. Mas ainda assim podem ser questionados. O segundo objetivo específico consiste em mostrar limitações dos métodos existentes. Mas pressupõe-se que tais limitações já sejam conhecidas pelo aluno, pois, caso contrário, por que ele estaria propondo um novo método (primeiro objetivo específico)? Aqui, o que aparece é um estágio ainda pouco maduro da pesquisa. O aluno deseja encontrar limitações nos métodos existentes para que isso justifique a proposição de um novo método. “a) Analisar métodos de gerência de projetos de software terceirizados; b) Desenvolver um método customizado para gerenciar os aspectos custo, prazo, qualidade e risco de projetos; c) Adaptar ou desenvolver uma ferramenta de software (caso não exista nenhuma adequada) para dar suporte à aplicação do método; d) Implantar o método; e) Coletar e analisar dados empíricos, resultantes da aplicação do método nos projetos; f) Propor melhorias no método desenvolvido.” Aqui aparece claramente a confusão que muitas vezes se estabelece entre objetivos específicos, metodologia e cronograma de atividades. Os objetivos específicos deveriam ser resultados finais mensuráveis, em geral um detalhamento ou subproduto do objetivo geral. Mas o aluno apresenta praticamente uma sequência de passos que levam ao objetivo geral. Não chega a ser um método, pois faltaria complementar com outras informações, mas o que foi apresentado é uma lista de atividades sobre a qual possivelmente o cronograma de trabalho será construído. Pode-se até falar em objetivos intermediários de cada etapa do processo de pesquisa, mas vários deles não são objetivos de pesquisa, mas atividades técnicas. “a) Implementar o sistema de inicialização e abstrações de hardware para *** no ***; b) Definir, implementar, testar e avaliar uma família de protocolos de comunicação de ***; c) Definir, implementar, testar e avaliar um sistema de controle de recursos de energia para ***; d) Definir e implementar aplicações que permitam avaliar os sistemas definido quando já se sabe qual o objetivo da pesquisa. Como o objetivo só é consistentemente definido quando a revisão bibliográfica já está suficientemente madura, não se considera, para efeito de metodologia em computação, que a revisão bibliográfica seja parte do método. A revisão pode ser parte do cronograma do trabalho, mas não do método. O método deve mostrar como o proponente vai fazer para que sua hipótese de trabalho seja testada e que ao final se possa concluir se ela é ou não verdadeira. “a) Levantamento bibliográfico sobre os tópicos abordados neste trabalho como: Critérios Ergonômicos, Interatividade, Método de Apoio à autoria e outros; b) Pesquisa sobre o Método de Apoio a ser utilizado; c) Definição de recursos audiovisuais a serem utilizados no trabalho; d) Modelagem do sistema conforme o método de apoio à autoria escolhido; e) Elaboração da ferramenta multimídia; f) Testes do sistema”. O método inicia com a revisão bibliográfica (itens a e b), quando fica claro que o aluno ainda não domina suficientemente o tema de pesquisa. Os passos (c) e (d) ficam atrelados ao que o aluno vier a descobrir na revisão bibliográfica e, por isso, ainda não podem ser mais específicos. Já os passos (e) e (f) são tão genéricos que serviriam para uma gama muito grande de propostas de monografia. A questão é: como a hipótese de pesquisa será testada. Isso o método não deixa claro. “a) Desenvolvimento de um mecanismo que não utiliza design patterns (sem conhecimento); b) Adição de conhecimento ao mecanismo; c) Experimentos + pesquisa bibliográfica = monografia.” Aqui o aluno parece propor um estilo de projeto no qual vai avaliar uma determinada hipótese (uso de conhecimento ou design patterns) contra a opção que não utiliza essa hipótese. Trata-se de um trabalho em que o aluno desenvolve um sistema presumivelmente compatível com o estado da arte e depois insere nele alguma nova característica para avaliar se melhorou. Embora não seja a forma mais madura de pesquisa, pois carece de um benchmark mais universal, é uma forma válida, exceto pelo item (c) que não informa nada específico sobre o trabalho. Porém, para que o método fosse mais claro, seria necessário especificar o que significa adição de conhecimento (a hipótese) e mostrar quais testes seriam feitos para testar a validade ou não dessa hipótese, além, claro, de uma métrica bem definida para comparar as duas abordagens. “a) Utilizar técnicas existentes de replicação e medir desempenho da rede e do serviço; b) Implementar técnica proposta para replicação em serviços sem paralelismo e medir desempenho da rede e serviço.” A pesquisa proposta aqui é bastante semelhante à imediatamente anterior. Implementa-se o que seria o estado da arte e compara-se com uma versão que tenha alguma característica nova. “a) Levantamento Bibliográfico; b) Criação do método; c) Adaptação ou desenvolvimento da ferramenta de software; d) Planejamento da aplicação do método; e) Aplicação do método; f) Avaliação; g) Conclusão.” Essa apresentação é particularmente interessante porque ela serve para quase qualquer monografia de tão genérica que é. Ela consiste praticamente de um template, a partir do qual o cronograma de trabalho poderia ser descrito. Para isso seria necessário instanciar cada um desses passos em atividades concretas e relacionadas com os objetivos do trabalho. “a) Desenvolvimento de um protótipo das quatro ferramentas englobando os conceitos de modelagem e gerenciamento de workflow em conformidade com a padronização ***; b) Aplicação dessas ferramentas em dois hospitais conveniados ao projeto com a finalidade de coleta de dados estatísticos para validação.” Essa proposta tem a vantagem, em relação às anteriores, de mencionar explicitamente a aplicação da técnica sendo estudada em casos reais (hospitais). Menciona-se, porém, coleta de dados, sem deixar muito claro que tipo de dados serão coletados e que tipo de análise será feita. Dependendo do tipo de dados a ser levantado, deve-se tomar cuidado, porque estes podem não ter representatividade estatística, como se quer. Um exemplo extremo seria considerar que se trata de dois hospitais especializados em cirurgia cardíaca. Se a maioria dos pacientes que ali se interna tem como objetivo um tratamento cardíaco, essa não é uma informação que possa ser generalizada para outros hospitais. Trata-se de um fato verdadeiro apenas naquela realidade, já que existe uma relação entre causa (o hospital ser especializado em cirurgia cardíaca) e efeito (um maior número de tratamentos cardíacos naquele hospital). Outras relações bem mais sutis podem ocorrer. Então o termo “estatístico” deve ser usado com muito cuidado. Um último exemplo: “a) Design a. Application Oriented System Design b) Testes de Corretude a. Técnicas de Depuração para Software Embutido c) Testes de Performance a. Executado via Testes Comparativos b. Métricas i. Tamanho de Código ii. Tempo de Execução de Tarefas iii. Energia gasta na Execução 1. Tempo de Operação de Componentes de Hardware iv. Throughput de Rede 1. Simulação 2. Testes de Campo.” A descrição do método em si deixa muita coisa subentendida, mas tem o mérito de mencionar explicitamente quais são as métricas buscadas nos testes comparativos. dele? No nível de mestrado e doutorado, sim. Por exemplo, considere-se uma monografia sobre XML que apresente como referências 12 trabalhos, sendo três livros técnicos de XML e nove páginas na Internet que consistem em manuais técnicos de XML. Nesse caso, não há evidência de trabalho científico, mas apenas de trabalho técnico. O aluno pode até ter feito uma implementação muito bonita de alguma coisa com XML, mas possivelmente não terá valor científico se não estiver fundamentado em trabalhos relatados em eventos ou periódicos. Estando as referências adequadas, o avaliador observará o capítulo de introdução com atenção. Neste capítulo ele entenderá com mais detalhes o problema sendo resolvido, a técnica usada para resolução e a forma como os resultados foram validados. O avaliador estará especialmente atento aos objetivos do trabalho, incluindo os objetivos específicos, que ele procurará identificar claramente nas conclusões. Ao ler as conclusões, um bom avaliador esquadrinhará o texto buscando um comentário conclusivo sobre cada um dos objetivos do trabalho. A falta dessa ligação direta entre objetivos e conclusões certamente dará margem a críticas. Após verificar as conclusões, o avaliador desviará sua atenção ao capítulo de desenvolvimento, a fim de verificar como o aluno chegou àquelas conclusões. As conclusões terão de ser todas consequências de avaliações feitas no capítulo de desenvolvimento. Não se admite, por exemplo, que um aluno conclua que seu sistema é fácil de usar, se no desenvolvimento testou apenas a eficiência do sistema, sem checar a usabilidade. Concluir algo que não foi testado ao longo do trabalho é denominado “conclusão forte”, sendo inaceitável em trabalhos científicos. Tendo compreendido a real contribuição do aluno, o avaliador finalmente dará uma vista de olhos no capítulo da revisão bibliográfica para ver se os principais conceitos foram bem apresentados e se os trabalhos correlatos estão adequadamente descritos. A forma de leitura descrita parece ir das pontas para o centro da monografia. O especialista concentra-se primeiro nos pontos críticos do trabalho, para depois ler as partes menos sujeitas a problemas. 5.3 Como uma Monografia poderia ser Escrita Já a ordem sugerida para escrever os diferentes capítulos de uma monografia difere das duas anteriores. Pode-se escrever a monografia exatamente na ordem em que os capítulos se apresentam. Mas essa abordagem tem alguns inconvenientes, como, por exemplo, produzir uma revisão bibliográfica desnecessariamente longa (por não saber quais conceitos realmente serão usados no texto, colocase tudo sobre o que se leu), e, por vezes, deixa o aluno cansado na hora de escrever o mais importante: as conclusões. Quantas pessoas já não entregaram seu trabalho ao orientador dizendo “Está pronto! Só faltam as conclusões”. Porém, o mais importante num trabalho científico são as conclusões. O resto é apenas um meio convincente para se chegar a elas. Comer (2008) diz “the easiest way to build a dissertation is inside-out. Begin by writing the chapters that describe your research (…). Collect terms as they arise and keep a definition for each. Define each technical term, even if you use it in a conventional manner.”1 Recomenda-se que só se inicie a escrita do texto final depois de ter concluído pelo menos a maior parte dos experimentos. Nada impede a escrita de rascunhos, mas esses textos não precisam ainda ter a preocupação de formatação de um texto finalizado. Então, quando o aluno terminar os experimentos e já tiver uma ideia muito clara do que fez e quais resultados obteve, ele vai transformar seus rascunhos em um texto acabado. Mas em que ordem ele deveria escrever esse texto? Segue uma sugestão: a) Introdução. b) Desenvolvimento. c) Conclusões. d) Revisão Bibliográfica. e) Referências. f) Resumo. Recomenda-se iniciar pela introdução porque possivelmente é o rascunho que estará mais próximo da forma final neste momento. O capítulo de introdução frequentemente é uma reescrita da proposta de monografia. Troca-se o tempo futuro pelo tempo presente e a monografia passa a ter objetivo, justificativa, hipóteses etc., que eram os mesmos, muitas vezes, da proposta de pesquisa. Em seguida, o desenvolvimento deve ser escrito porque os experimentos ainda estarão fresquinhos para serem relatados. Esse é um capítulo importante, por isso deve ser escrito com muita atenção. As conclusões deveriam ser escritas logo depois. Após terminar o relato do desenvolvimento e já tendo o capítulo de introdução sido revisado com seus objetivos claramente colocados, a conclusão deverá ser uma consequência daquilo que foi relatado no desenvolvimento, bem como ter ligação com cada um dos objetivos, conforme já observado. Na sequência escreve-se então a revisão bibliográfica e listam-se as referências. Deve-se evitar colocar na revisão bibliográfica a totalidade das fichas de leitura, pois isso não serve a um objetivo claro. Deve-se colocar, isso sim, as comparações com trabalhos correlacionados e os conceitos principais usados no capítulo de desenvolvimento. Um conceito que não é usado no capítulo de desenvolvimento, por mais interessante que seja, não precisa estar na revisão bibliográfica. As referências vão mencionar apenas os trabalhos efetivamente citados. Por isso é importante que essas duas sessões sejam verificadas em conjunto. Finalmente, escreve-se o resumo, que, como o nome diz, resume o trabalho. Mais adiante será discutido o que deveria ser dito nesta seção do trabalho. 5.4 O Título O título do trabalho é o primeiro meio para chamar a atenção de um potencial leitor. Um título deve descrever a principal contribuição do trabalho de forma sintética. Alguns títulos, por serem muito genéricos, não motivam a leitura. Por exemplo, “um estudo sobre redes semânticas”. Para que fosse um bom título, seria melhor dizer que tipo de resultado esse estudo produziu. Outro exemplo de um título não motivador é “XYZ: uma nova técnica de modelagem de dados”. Novamente, seria mais interessante se o título pudesse esclarecer que tipo de vantagem essa nova técnica teria em relação a outras. Apenas o fato de ser nova não garante que seja interessante. Seguem alguns exemplos de bons títulos obtidos na Biblioteca Digital da Sociedade Brasileira de Computação, SBC (http://bibliotecadigital.sbc.org.br/? subject=144): a) Formal Approaches to Ensuring the Safety of Space Software.2 b) Automação de Métodos e Técnicas para Teste Funcional de Componentes. c) Electric Wheelchair Simulator for Rehabilitation of Persons with Motor Disability.3 d) Análise Comparativa dos Dicionários LBG e SOA sob o Ponto de Vista da Complexidade Computacional Envolvida na Fase de Codificação da Quantização Vetorial. O título deve apresentar, então, claramente, a ideia ou contribuição central do trabalho. Porém, o título não pode ser muito longo. A apresentação mais detalhada da ideia ou contribuição central será feita então no resumo do trabalho, que normalmente aparece logo após o título. 5.5 O Resumo O resumo de uma monografia não é, como alguns parecem pensar, um trailer de um filme, em que se começa a contar uma história, mas não se conta o final. O resumo de um trabalho científico deve contar o final da história, ou seja, o leitor vai querer saber, em primeiro lugar, qual foi o resultado científico a que esse trabalho chegou. Se ele achar o resultado interessante no resumo, vai querer ler o resto para ver como o aluno chegou a tal resultado. Centenas de monografias em Computação são defendidas a cada ano apenas no Brasil. Se contarmos outros países, ainda teremos uma infinidade de material científico disponível cujo índice de produção aumenta cada vez mais. Esperar que alguém leia uma monografia cujo resumo diz “Este trabalho apresenta um estudo sobre bancos de dados” é esperar demais. Afinal, essa frase diz muito pouco. O que efetivamente esse “estudo” poderia ter gerado em termos de informação nova que poderia interessar a alguém que trabalhe com bancos de dados? em questão, os quais podem ser comparados com os resultados de outros trabalhos correlatos. Tratase, portanto, nesse caso, de uma comparação bem mais objetiva. Um ponto a ser sempre mencionado é a questão do plágio. Em hipótese alguma pode-se utilizar textos escritos por outra pessoa, mesmo em um trabalho de cunho eminentemente escolar, sem colocar o texto citado entre aspas e, quando possível, mencionar a fonte de consulta. Utilizar o trabalho de outro como se fosse seu é considerado crime de plágio pela legislação brasileira. Mesmo traduções devem ser evitadas. Se for o caso de mencionar algum texto em outra língua, recomenda-se que seja mantido no original entre aspas e com a fonte citada. Opcionalmente pode-se colocar em nota de rodapé uma tradução. Se a fonte de consulta for a obra traduzida, então pode-se citar conforme a língua em que foi traduzida (no caso Português), mas se a tradução for feita pelo próprio autor do trabalho, recomenda-se manter o original e utilizar a nota de rodapé para a tradução, visto que não se trata de uma tradução oficial e, portanto, o sentido da tradução não pode ser atribuído ao autor do texto original. Rugaber (1995) afirma que a seção de revisão bibliográfica em geral é maçante e mal usada. Isso acontece porque o aluno, ao escrever, perde a oportunidade de usar o trabalho de outros autores para motivar o seu próprio estudo. Em vez disso, muitas vezes perdese tempo e espaço fazendo um estafante e desnecessário inventário de tudo o que foi lido ou ainda uma sequência de citações de outros autores que não levam a lugar nenhum. Ainda segundo Rugaber, uma boa seção de revisão bibliográfica inclui uma ontologia e uma ontogenia. A ontologia vai apresentar os principais conceitos utilizados no trabalho. Já a ontogenia mostra como as diferentes ideias evoluíram com o passar do tempo até chegar ao estado da arte. O final da ontogenia naturalmente vai incluir o trabalho sendo desenvolvido, mostrando como ele se encaixa na evolução da área. 5.8 O Capítulo de Desenvolvimento O capítulo de desenvolvimento marca o início da contribuição pessoal do autor do trabalho. Portanto, não se deve fazer do capítulo de desenvolvimento uma nova revisão bibliográfica. De preferência, todos os conceitos que serão necessários nesse capítulo já devem ter sido citados no capítulo de revisão bibliográfica. Se alguma comparação for feita com trabalhos correlatos nesse capítulo, então apenas a comparação objetiva deve ser feita aqui, sendo que a apresentação pura e simples dos trabalhos correlatos já terá ocorrido no capítulo anterior. O capítulo de desenvolvimento deve apresentar a construção da teoria, modelo ou proposta, seja de que natureza for. Conceitos criados pelo autor da monografia devem ser descritos aqui e não na revisão bibliográfica. Na sequência, o autor deve trabalhar as evidências de que sua hipótese é verdadeira. Serão então apresentados dados, gráficos, testes, provas formais, estudos de casos, transcrição de entrevistas ou quaisquer outros meios julgados adequados para provar o seu ponto, ou seja, para mostrar que a hipótese é verdadeira. Deve-se evitar sempre transformar o capítulo de desenvolvimento em uma apresentação de um sistema computacional. Se um sistema foi desenvolvido, foi para servir a algum propósito de descobrir novo conhecimento. A monografia deve ser sobre o conhecimento gerado, não sobre o sistema em si. Apresentações detalhadas sobre telas de software, incluindo telas de login, menu principal etc., são enfadonhas e desnecessárias em um trabalho científico. O seguinte texto, do Prof. John W. Chinneck (1988), resume tudo: “The purpose of your thesis is to clearly document an original contribution to knowledge. You may develop computer programs, prototypes, or other tools as a means of proving your points, but remember, the thesis is not about the tool, it is about the contribution to knowledge. Tools such as computer programs are fine and useful products, but you can’t get an advanced degree just for the tool. You must use the tool to demonstrate that you have made an original contribution to knowledge; e.g., through its use, or ideas it embodies.”4 5.8.1 Definições Constitutivas E Operacionais No capítulo de desenvolvimento frequentemente o pesquisador precisará definir termos que esteja usando. Existem duas formas clássicas de criar definições: as definições constitutivas e as operacionais. Dependendo do tipo de variável, será necessário usar uma ou outra. Trabalhos eminentemente formais tendem a usar mais as definições constitutivas. Segundo Kerlinger (1980), “definições constitutivas são definições de dicionário”. As definições constitutivas procuram definir um termo em função de seus constituintes. Uma gramática formal, por exemplo, pode ser definida como um conjunto de regras de produção; uma regra de produção pode ser definida como duas sequências de símbolos e assim por diante. Porém, pesquisas que utilizem termos não formais como “facilidade”, “adequação”, “flexibilidade” etc. dificilmente poderão utilizar apenas definições constitutivas para esses termos, até porque em geral tais definições sequer existem. É necessário, nesses casos, utilizar uma definição operacional que, segundo Kerlinger (1980): “atribui significado a um constructo ou variável especificando as atividades ou ‘operações’ necessárias para medi-lo ou manipulá-lo”. A definição operacional é, então, uma definição pragmática. Ela não define a natureza de um fenômeno, mas os meios para obter uma medição e caracteriza o resultado dessa medição como sendo o próprio fenômeno. Por exemplo, o termo “facilidade” pode ser definido como o número de toques no teclado ou mouse para realizar uma determinada tarefa. O termo “adequação” pode ser definido como a nota obtida em um teste padrão aplicado por especialistas. O termo “flexibilidade” pode ser definido como o tempo médio que um programador leva para introduzir um conjunto predefinido de características. Mas esses são apenas exemplos do que poderia ser feito. Não se pretende aqui fornecer definições operacionais para esses termos. Cada trabalho usará as definições que forem mais adequadas ao objetivo da pesquisa. O importante aqui é enfatizar que no caso de variáveis que representem características não formais é necessário utilizar definições operacionais para que o fenômeno associado à variável possa efetivamente ser medido. Sem isso o trabalho seria apenas especulativo. 5.9 O Capítulo de Conclusões O capítulo das conclusões é, em geral, a pedra no sapato do estudante. Aparentemente tudo já foi dito sobre o trabalho no capítulo de desenvolvimento; então o que escrever nesse capítulo final? A primeira dica é observar os objetivos geral e específicos do trabalho no capítulo de introdução e colocar no capítulo das conclusões um comentário sobre como o desenvolvimento apresentado ajudou a chegar a cada um desses objetivos, ou seja, como o trabalho de pesquisa permite concluir que cada um dos objetivos foi atingido. Outro ponto importante é apresentar não apenas os pontos positivos do trabalho, mas também os negativos. Não se espera de nenhum trabalho científico que ele resolva todos os problemas do mundo. Pelo contrário, espera-se que o pesquisador seja suficientemente honesto para descrever de forma clara as fraquezas e limitações de seu próprio trabalho. A seguinte máxima segue implacavelmente das leis da lógica: “Se você não for o maior crítico de seu próprio trabalho, outra pessoa será”. Outro tópico a ser abordado no capítulo de conclusões são as lições aprendidas. O aluno passou dois anos ou mais estudando um tema e realizando experimentos com ele. Além dos objetivos do trabalho, claramente colocados e atingidos, ele deve ter aprendido muita coisa no processo. Talvez essa informação possa ser útil a outras pessoas. Então se deve descrever no capítulo de conclusões quais foram essas lições aprendidas ao longo do trabalho. Pode-se descrever também outras situações nas quais se imagina que essas lições possam ser aplicadas. Por exemplo, ao comparar o resultado de questionários aplicados em uma empresa com a situação real observada in locu, um aluno percebeu que, por conta do medo de retaliações por parte da chefia, a maioria dos funcionários procurava apresentar nos questionários uma situação mais bonita do que realmente era. Dessa forma, o aluno aprendeu que questionários não são fontes confiáveis de informação se não houver uma validação das respostas no ambiente de estudo. Essa lição aprendida teria de ser colocada no capítulo de conclusões. (1988), o capítulo final de uma monografia deve ter pelo menos três partes: a conclusão, as contribuições e os trabalhos futuros. que se julga boa. Em vez de dizer que algo é ruim, deve-se apresentar uma explicação baseada em fatos verificáveis sobre os defeitos que se julga serem um problema. Nunca se deve dizer que alguma coisa é “perfeita”, porque na natureza nada é. Expressões como “hoje em dia” e “atualmente” também devem ser evitadas no texto científico, porque a monografia é um trabalho atemporal. Então não se deveria evitar dizer que “atualmente a Internet é bastante usada”. Pode-se dizer, em vez disso, que em 2009, tantos milhões de pessoas usam a Internet. Dessa forma, a frase ficará mais precisa e dará melhor embasamento científico a qualquer outra informação que se for apresentar em seguida. Não se deve usar expressões do tipo “ficamos surpresos ao perceber que...”. Não é da conta de ninguém se o aluno ficou surpreso. Deve-se apenas dizer o que foi percebido e, de preferência, mostrar como isso foi percebido de forma que também possa ser percebido por outras pessoas. Afirmações como “uma nova abordagem”, “uma técnica diferente” etc. devem ser evitadas a todo o custo. Qualquer abordagem que estiver sendo proposta será nova e diferente das outras, caso contrário, não seria tema de uma monografia. Não faria sentido propor algo que seja velho ou igual ao que já existe, não? Então, devese evitar qualificar o trabalho como novo e diferente, pois isso já é o que todos esperam. É melhor apenas dizer, afinal de contas, qual é o trabalho e em que ele é diferente ou melhor que os anteriores. Usar palavras como “obviamente” ou “claramente” pode insultar o leitor, pois o autor diz estar falando algo que é óbvio. Se for óbvio, não precisa ser dito, se não é óbvio então não se deve dizer que é. Então, obviamente, deve-se evitar usar esse termo.5 Sempre que o texto usar a expressão “na verdade” pode dar a impressão de que aquilo que foi escrito antes era mentira. Então, na verdade, essa não é uma boa escolha.6 Deve-se evitar sempre o uso da primeira pessoa, mesmo o plural majestático, reservado apenas ao Papa e aos reis, bem como a segunda pessoa no texto científico. A monografia é impessoal. Ela não é narrativa, para que se pudesse usar primeira ou segunda pessoa. Então o impessoal sempre deve prevalecer. Quando for usado um dos pronomes “todos”, “muitos”, “alguns” ou “nenhum”, deve-se ter certeza de que se tem uma evidência ou prova de que a afirmação efetivamente possa ser assim qualificada. Não se pode dizer, por exemplo, que “muitos estudantes têm problemas com a monografia”, em um texto científico, sem ter havido um estudo, observação ou medição sobre isso. Outra possibilidade é usar uma citação. Dizer “segundo Fulano (200x), muitos alunos têm problemas com a monografia” está correto, porque passa o problema de provar a afirmação para o autor do texto citado. No entanto, nesse caso, é preciso verificar se a referência é um trabalho confiável publicado em um bom veículo. Outras recomendações são: usar a voz ativa ao invés da passiva, escrever sempre no tempo presente e colocar negações no início da frase. Essas recomendações de estilo ajudam a facilitar a compreensão do texto. Seria difícil ler uma frase longa na qual se vai afirmando uma série de coisas e no final se usa uma expressão para indicar que tudo o que estava sendo dito é falso. Se o objetivo é negar algo, então é preferível iniciar negando. Assim ficará mais fácil compreender o texto. Em todo o caso, sempre é preferível usar frases afirmativas quando possível. Por exemplo, em vez de dizer “nenhum programa rodou em menos de dez segundos” é preferível dizer “todos os programas rodaram em dez segundos ou mais. Chinneck (1988) apresenta algumas dicas interessantes para o texto: a) Ter sempre em mente o background do leitor. Deve-se saber qual a capacidade de compreensão que o leitor-alvo do texto terá. O texto deve ser então suficientemente informativo a esse leitoralvo. Não detalhar demais conceitos que seriam triviais e não deixar de explicar conceitos que não são provavelmente de conhecimento do leitor-alvo. b) Não fazer com que o leitor tenha de dar duro. Sabendo quais são as obrigações do aluno no texto (deixar claro o problema de pesquisa, mostrar que ele ainda não tinha sido resolvido, mostrar que valia a pena resolver o problema e mostrar que o aluno efetivamente resolveu o problema), deve-se deixar o texto o mais acessível possível. Quanto mais dificuldade os avaliadores tiverem para encontrar as respostas às questões fundamentais sobre o trabalho, pior será sua impressão sobre o texto e maior a probabilidade que exijam grandes mudanças no texto final. c) Escrever de forma que seja impossível ser mais claro. Devese escrever cada frase com muito cuidado, verificar se ela faz sentido e se apresenta alguma informação útil de forma clara. Deve-se verificar se cada termo usado em cada sentença já foi devidamente explicado no nível de compreensão do leitor-alvo e se todas as possíveis ambiguidades foram eliminadas. d) Lembrarse de que a monografia não é uma história. Ela não é uma cronologia das coisas que o aluno tentou fazer, mas um documento formal que apresenta resultados de uma pesquisa. e) Evitar declarações fortes como “o software é a parte mais importante de um sistema computacional”, as quais são apenas uma opinião e não uma informação substanciada na literatura corrente. Os examinadores provavelmente pegarão frases como essas e perguntarão “você pode demonstrar que o software é a parte mais importante de um sistema computacional?”. Moro (2009) apresenta os sete pecados capitais do texto científico: a) “Frases longas (repletas de vírgulas ou não!)”. Sempre que forem detectadas frases muito longas com várias orações coordenadas, deve-se procurar dividi-las em frases menores, usando pontos para isso. Mas deve-se cuidar para que cada frase lida individualmente faça sentido, tendo sujeito, verbo e objeto, quando for o caso. b) “Erros ortográficos”. Nada desqualifica mais um autor do que erros ortográficos, ou seja, palavras mal escritas. Um bom conteúdo pode até passar despercebido se o autor cometer erros desse tipo. c) “Tradução literal e imbromation”. Um autor que não domine a língua inglesa deve procurar a ajuda de um tradutor e, na maioria dos casos também, de um revisor profissional dessa língua. Textos em inglês que são traduções literais do português como, por exemplo, “the cow went to the swamp”,7 “between hundred beat”8 e “I am with you and don´t open”9 são motivo de piada. d) “Imagens/tabelas ilegíveis”. Letras muito pequenas ou borradas servem para comunicar alguma coisa? Legendas que coloridas são perfeitas, mas quando impressas em preto e branco ficam indistinguíveis também devem ser revisadas e evitadas. e) “Erros gramaticais (paralelismo, concordância, conjugação, crase)”. Erros de concordância acabam sendo muito comuns devido a revisões malfeitas do texto. Algumas vezes muda-se o sujeito de uma frase do masculino para o feminino ou do singular para o plural e deixa-se o verbo ou complementos como estavam. Por exemplo, a frase original estava assim: “o método foi devidamente demonstrado”. Uma revisão trocou o termo “método” por “passos” e o texto final ficou assim: “os passos foram devidamente demonstrado”. O erro aparece apenas na última palavra. f) “Cópia literal”. Se houver cópia literal de outros textos sem uso de aspas e citação da fonte incorre-se em plágio. g) “Blábláblá (encher linguiça)”. Quantas páginas deve ter uma monografia? Algumas vezes alunos que acham que seu trabalho está curto e resolvem preencher páginas com textos que não informam nada apenas para dar mais sensação de volume. Além disso, Moro (2008) apresenta algumas dicas para a produção de textos de boa qualidade. Entre elas destacam-se: a) Usar revisores automáticos de texto, embora nada substitua uma leitura atenta por parte do autor, seu orientador e eventualmente por terceiros também. b) Dividir os parágrafos cuidadosamente. Cada parágrafo deve apresentar uma ideia central que pode ser introduzida e comentada no mesmo parágrafo. Mas quando se introduz uma nova ideia, usualmente inicia-se um novo parágrafo. Parágrafos longos demais devem ser evitados. c) Uma seção ou capítulo devem ser formados por mais de um parágrafo. Sessões numeradas são formadas por texto. É um erro de estilo criar uma seção (por exemplo, “3.2.1 Exemplos de algoritmos”) e preenchê-la apenas com uma lista de itens. A seção sempre inicia com um texto. Listas de itens podem ser parte da seção, mas nunca sua totalidade. d) Cada frase deve ter um sujeito e um verbo. Apenas os títulos de sessões, figuras e tabelas podem ser compostos por sentenças sem verbo (por exemplo, “Testes Finais”). Mas frases incluídas no texto devem sempre ter pelo menos
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