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Okeson. Tratamento Das Desordens Temporomandibulares e Oclusão, 6ª Edição (2), Notas de estudo de Odontologia

oclusão Atm desordem tempromandibulares

Tipologia: Notas de estudo

2017
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Compartilhado em 24/03/2017

renata-guerra-8
renata-guerra-8 🇧🇷

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Baixe Okeson. Tratamento Das Desordens Temporomandibulares e Oclusão, 6ª Edição (2) e outras Notas de estudo em PDF para Odontologia, somente na Docsity! TRATAMENTO DAS DESORDENS TEMPOROMANDIBULARES E OCLUSÃO TRATAMENTO DAS DESORDENS TEMPOROMANDIBULARES E OCLUS‹O 6a EDIÇ‹O Do original: Management of Temporomandibular Disorders and Occlusion, 6th edition © 2008, 2003, 1998, 1993, 1989, 1985 por Mosby, Inc., um selo da Elsevier, Inc. ISBN: 978-0-323-04614-5 Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Mosby – um selo editorial Elsevier © 2008 Elsevier Editora Ltda. ISBN: 978-85-352-2880-9 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Capa Folio Design Editoração Eletrônica Futura Elsevier Editora Ltda. Rua Sete de Setembro, 111 – 16º andar 20050-006 - Centro - Rio de Janeiro - RJ - Brasil Telefone: (21) 3970-9300 - Fax: (21) 2507-1991 E-mail: info@elsevier.com.br Escritório São Paulo Rua Quintana, 753 – 8º andar 04569-011 - Brooklin - São Paulo - SP - Brasil Telefone: (11) 5105-8555 NOTA O conhecimento médico está em permanente mudança. Os cuidados normais de segurança devem ser seguidos, mas, como as novas pesquisas e a experiência clínica ampliam nosso conhecimento, alterações no tratamento e terapia à base de drogas podem ser necessárias ou apropriadas. Os leitores são aconselhados a checar informações mais atuais dos produtos, fornecidas pelos fabricantes de cada droga a ser administrada, para verificar a dose recomendada, o método e a duração da administração e as contra-indicações. É responsabilidade do médico, com base na exper- iência e contando com o conhecimento do paciente, determinar as dosagens e o melhor tratamento para cada um individualmente. Nem o editor nem o autor assumem qualquer responsabilidade por eventual dano ou perda a pessoas ou a propriedade originada por esta publicação. O Editor CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ O36t Okeson, Jeffrey P. Tratamento das desordens temporomandibulares e oclusão / Jeffrey P. Okeson ; [tradução Roberta Loyola Del Caro... et al.]. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2008. il. Tradução de: Management of temporomandibular disorders and occlusion, 6th ed. Inclui bibliografia ISBN 978-85-352-2880-9 1. Maloclusão. 2. Articulação temporomandibular - Doenças. 3. Oclusão (Odontologia). I. Título. 08-0638. CDD: 617.643 CDU: 616.314 SUPERVISÃO DA REVISÃO CIENTÍFICA Francisco José Pereira Jr. Doutor e Mestre em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial pela Universidade de Lund, Suécia Especialista em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial Coordenador da Disciplina de Oclusão e Desordens Temporomandibulares da Faculdade de Odontologia da UNIGRANRIO Membro da International Association for the Study of Pain (IASP) Membro da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED) Presidente do Comitê de Dor Orofacial da SBED Membro da Associação para o Estudo da Dor do Rio de Janeiro (ADERJ) Fellow – International College of Dentists REVISÃO CIENTÍFICA Claudia Beatriz Compagnoni Ramos (caps. 11 a 13) Especialista em Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial Especialista em Endodontia Eduardo Esberard Favilla (caps. 7 a 10) Fellow em Dor Orofacial pela University of Maryland, Baltimore, EUA Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial Francisco José Pereira Jr. (caps. 1 a 3, 14, apêndice, índice remissivo) Luiz Eduardo Zacour (caps. 4, 5, 15 e 16) Especialista em Ortopedia Funcional dos Maxilares Especialista em Ortodontia Patricia Pozzi Miranda (caps. 6, 17 a 20) Especialização em Prótese Dentária pela Boston University, EUA Mestre em Prótese Dentária pela Boston University, EUA TRADUÇÃO Débora Rodrigues Fonseca (caps. 7 a 10) Pós-graduação em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mestre em Anatomia (Ciências Morfológicas) pela UFRJ Professora da Disciplina de Cirurgia Bucomaxilofacial da Universidade Iguaçu (UNIG) Hugo César Pinto Marques Caracas (caps. 17 a 20, apêndice) Mestre em Ortodontia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Izabella de Jesus Pasolini (caps. 1 a 6) Mestre em Ortodontia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)/Saúde Pública Roberta Loyola Del Caro (caps. 11 a 16) Especialização em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Tatiana Ferreira Robaina (índice remissivo) Odontóloga pela Universidade Federal de Pelotas, RS (UFPEL) Doutoranda em Ciências pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Sobre o Autor JEFFREY P. OKESON, DMD Dr. Okeson graduou-se pela University of Kentucky College of Dentistry, em 1972. Após a graduação ele ficou dois anos no Public Health Service, em um sistema odontológico de internato rotativo e coorde- nação de uma clínica ambulatorial. Passou a ser do corpo docente da University of Kentucky em 1974. Atualmente, ele é Professor, Chairman of the Department of Oral Health Science, e Diretor do College’s Orofacial Pain Center, fundado por ele em 1977. O Pain Center representa um esforço multidisciplinar no controle dos problemas crônicos de dor orofacial. Dr. Okeson desenvolveu muitos programas de pós-gra- duação neste Centro, incluindo Master of Science Degree in Orofacial Pain. Ele tem mais de 200 publica- ções profissionais nas áreas de oclusão, desordens temporomandibulares (DTM) e dor orofacial em vários periódicos, nacionais e internacionais. Seu livro, Tratamento das Desordens Temporomandibulares e Oclusão, é utilizado na maioria das escolas americanas de odontologia e foi traduzido para nove idiomas. Dr. Okeson é membro ativo de muitas organizações de dor orofacial e DTM, apoiando muitos centros de estudo e pesquisa e participando de vários comitês e conselhos. Ele é ex-presidente e Associado da American Academy of Orofacial Pain (AAOP). É fundador diplomado e ex-presidente do American Board of Orofacial Pain. Tem sido dinâmico participante na AAOP, desenvolvendo diretrizes curriculares e de tratamentos para dor orofacial e DTM. É ainda o editor das diretrizes da AAOP, intitulada Orofacial Pain: Guidelines for Classification, Assessment, and Management, terceira edição, que são utilizadas como padrão de tratamento pelo mundo. Dr. Okeson foi convidado a ministrar mais de 600 palestras sobre o assunto DTM e dor orofacial em 48 estados norte-americanos e em 42 países. Em encontros nacionais e internacionais ele freqüentemente é lembrado como “o embaixador mundial para dor orofacial”. Recebeu muitos prêmios dos seus alunos de Odontologia, e também o prêmio University of Kentucky Great Teacher Award. Ele também é o primeiro ganhador do prêmio Distinguished Alumni Award da College of Dentistry. Este livro é dedicado à minha esposa Bárbara, por seu amor incondicional contínuo, apoio e compreensão por toda a minha vida profissional; à minha mãe, Lois Okeson, e ao meu sogro, Harold Boian, por seus muitos anos de encorajamento constante. Sinto muito a falta deles. Esta obra também é dedicada a todos os meus pacientes. Minha esperança é de que este texto possa, de alguma maneira, ajudar a reduzir o sofrimento deles. PARTE I Anatomia Funcional, 1 1 Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório, 3 2 Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório, 21 3 Posicionamento e Oclusão Dental, 47 4 Mecânica do Movimento Mandibular, 65 5 Critérios para uma Oclusão Funcional Ideal, 77 6 Determinantes da Morfologia Oclusal, 89 PARTE II Etiologia e Identificação dos Distúrbios Funcionais do Sistema Mastigatório, 103 7 Etiologia dos Distúrbios Funcionais do Sistema Mastigatório, 105 8 Sinais e Sintomas das Desordens Temporomandibulares, 133 9 História e Exame das Desordens Temporomandibulares, 173 10 Diagnóstico das Desordens Temporomandibulares, 229 PARTE III Tratamento dos Distúrbios Funcionais do Sistema Mastigatório, 267 11 Considerações Gerais no Tratamento das Desordens Temporomandibulares, 269 12 Tratamento das Desordens dos Músculos Mastigatórios, 303 13 Tratamento das Desordens da Articulação Temporomandibular, 325 14 Tratamento da Hipomobilidade Mandibular Crônica e das Desordens do Crescimento, 365 15 Terapia com Placa Oclusal, 377 16 Seqüência de Tratamento, 401 PARTE IV Terapia Oclusal, 415 17 Considerações Gerais na Terapia Oclusal, 417 18 O Uso de Articuladores na Terapia Oclusal, 427 19 Desgaste Seletivo, 443 20 Considerações Restauradoras na Terapia Oclusal, 459 Apêndice, 477 Índice remissivo, 489 ix ContentsSumário Esta p gina foi intencionalmente deixada em branco I P A R T E Anatomia Funcional O sistema mastigatório é extremamente complexo. Ele é composto, basica- mente, de ossos, músculos, ligamentos e dentes. O movimento é regulado por um intrincado sistema de controle neurológico composto por cérebro, tronco cerebral e sistema nervoso periférico. Cada movimento é coordenado para maxi- mizar a função e, ao mesmo tempo, minimizar danos a qualquer estrutura. São necessários movimentos precisos da mandíbula pela musculatura para movi- mentar os dentes eficientemente sobre si mesmos durante a função. A mecânica e a fisiologia deste movimento são básicas para o estudo da função mastigatória. A Parte I consiste de seis capítulos que discutem a anatomia normal, a função e a mecânica do sistema mastigatório. A função deve ser compreendida antes de se saber o significado da disfunção. 4 Anatomia Funcional molares mandibulares. Os pré-molares também são chama- dos bicúspides porque geralmente possuem duas cúspides. A presença das duas cúspides aumenta muito a superfície de oclusão desses dentes. Os pré-molares maxilares e mandi- bulares ocluem de tal forma que o alimento pode ser apri- sionado e esmagado entre eles. A principal função dos pré- molares é iniciar a quebra das substâncias do alimento em pedaços menores. A última classe de dentes, localizada posterior aos pré- molares, é a dos molares (Fig. 1-4). Existem seis molares maxi- lares e seis molares mandibulares. A coroa de cada molar tem quatro ou cinco cúspides. Isto proporciona uma ampla superfície sobre a qual poderão ocorrer a quebra e a trituração da comida. Os molares atuam primariamente nos estágios finais da mastigação, quando o alimento é transformado em partículas pequenas o suficiente para serem facilmente engo- lidas. Conforme discutido, cada dente é altamente especiali- zado de acordo com a sua função. Os exatos relacionamentos dos dentes entre os arcos (interarco) e dentro dos respectivos arcos (intra-arco) são extremamente importantes e influen- ciam bastante na saúde e na função do sistema mastigatório. Uma discussão detalhada dessas relações é apresentada no Capítulo 3. COMPONENTES ESQUELÉTICOS O sistema mastigatório é constituído por três componentes esqueléticos principais. Dois suportam os dentes: a maxila e a mandíbula (Fig. 1-5). O terceiro, o osso temporal, suporta a mandíbula em sua articulação com o crânio. A B Fig. 1-1 Visão anterior (A) e lateral da dentição (B). Fig. 1-2 O DENTE E AS ESTRUTURAS PERIODONTAIS DE SUPORTE. A largura do ligamento periodontal está extrema- mente exagerada por propósitos ilustrativos. Fig. 1-3 Os dentes maxilares estão posicionados ligeiramente para vestibular em relação aos mandibulares por todo o arco. Fig. 1-4 Vista lateral. Coroa Raiz Tecido gengival Osso alveolar Ligamento periodontal Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório 5 Maxila Em relação ao desenvolvimento, existem dois ossos maxi- lares, que se fundem na sutura palatina mediana (Fig. 1-6). Estes ossos formam a maior parte do esqueleto facial supe- rior. A borda da maxila se estende superiormente para for- mar o assoalho da cavidade nasal, assim como o assoalho de cada órbita. Na parte inferior, os ossos maxilares formam o palato e os rebordos alveolares, que sustentam os dentes. Como os ossos maxilares estão intricadamente fusionados aos componentes ósseos que envolvem o crânio, os dentes maxilares são considerados como uma parte fixa do crânio e, desta forma, constituem o componente fixo do sistema mas- tigatório. Mandíbula A mandíbula é um osso em forma de U que sustenta os dentes inferiores e constitui o esqueleto facial inferior. Ela não tem ligação óssea com o crânio e é sustentada abaixo da maxila pelos músculos, ligamentos e outros tecidos moles, que por sua vez possibilitam a mobilidade necessária para o funcio- namento com a maxila. O aspecto superior da mandíbula arqueada consiste do processo alveolar e dos dentes (Fig. 1-7). O corpo da mandí- bula se estende posterior e inferiormente para formar o ângulo mandibular, e posterior e superiormente para formar o ramo ascendente. O ramo ascendente da mandíbula é formado por uma placa vertical de osso que se estende para cima como dois processos. O anterior deles é o processo coronóide. O posterior é o côndilo. O côndilo é a porção da mandíbula que se articula com o crânio, ao redor do qual o movimento ocorre. De uma vista anterior ele tem projeções medial e lateral, denominadas pólos (Fig. 1-8). O pólo medial geralmente é mais proeminente do que o lateral. Visto de cima, uma linha traçada pelo centro dos pólos do côndilo geralmente vai se estender medial e poste- riormente em direção à borda anterior do forame magno (Fig. 1-9). A extensão mediolateral total do côndilo está entre 18 e 23 mm, e a largura ântero-posterior está entre 8 e 10 mm. A real superfície de articulação do côndilo se estende tanto anterior quanto posteriormente à parte mais superior do côndilo (Fig. 1-10). A superfície articular posterior é maior do que a superfície anterior. A superfície articular do côndilo é bem convexa ântero-posteriormente, e suavemente convexa mediolateralmente. Osso Temporal O côndilo mandibular articula-se na base do crânio com a por- ção escamosa do osso temporal. Esta porção do osso tem- poral é composta pela fossa mandibular côncava, na qual o Fig. 1-5 Componentes esqueléticos que constituem o sistema mas- tigatório: maxila, mandíbula e osso temporal. A Fig. 1-6 A sutura palatina mediana (A) resulta da fusão dos dois ossos maxilares durante o desenvolvimento. A A B B Fig. 1-7 A, O ramo ascendente se estende para cima para formar o processo coronóide (A) e o côndilo (B). B, Vista oclusal. 6 Anatomia Funcional BA Fig. 1-10 CÔNDILO. A, Vista anterior. B, Vista posterior. Uma linha tracejada marca a borda da superfície articular. A superfície articular no aspecto posterior do côndilo é maior do que no aspecto anterior. côndilo se situa (Fig. 1-11) e que também já foi chamada de fossa glenóide ou articular. Posterior à fossa mandibular está a fis- sura timpanoescamosa, que se estende mediolateralmente. Como esta fissura se estende medialmente, ela se divide em fissura petroescamosa, anteriormente, e fissura petro- timpânica, posteriormente. Imediatamente anterior à fossa está uma proeminência óssea convexa denominada eminência articular. O grau de convexidade da eminência articular é alta- mente variável, mas importante, porque a inclinação dessa superfície determina a trajetória do côndilo quando a man- díbula está posicionada anteriormente. O teto posterior da fossa mandibular é bastante fino, indicando que esta área do osso temporal não foi designada para suportar forças exces- sivas. A eminência articular, entretanto, consiste de um osso espesso e denso e pode tolerar melhor tais forças. ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR A área onde a mandíbula se articula com o crânio, a ATM, é uma das articulações mais complexas do corpo. Ela pro- porciona um movimento de dobradiça em um plano e, desta forma, pode ser considerada uma articulação ginglimoidal. No entanto, ao mesmo tempo ela também pode proporcionar movimentos de deslizamento, o que a classifica como uma articulação artrodial. Portanto, ela pode ser tecnicamente considerada uma articulação ginglimoartrodial. A ATM é formada pelo côndilo mandibular posicionado dentro da fossa mandibular do osso temporal. Separando esses dois ossos da articulação direta está o disco articular. A ATM é classificada como uma articulação composta. Por defi- nição, uma articulação composta requer a presença de pelo menos três ossos, apesar de a ATM ser constituída por apenas dois ossos. Funcionalmente, o disco articular age como um osso não calcificado que permite os movimentos complexos da articulação. Como o disco articular funciona como um terceiro osso, a articulação craniomandibular é considerada uma articulação composta. A função do disco articular como um osso não calcificado está posteriormente descrita em detalhes na seção sobre biomecânica da ATM neste capítulo. O disco articular é composto por tecido conjuntivo fibroso denso, na maior parte desprovido de vasos sangüíneos e fibras nervosas. A periferia extrema do disco, entretanto, é ligeira- mente inervada.1,2 No plano sagital, o disco pode ser dividido em três regiões, de acordo com sua espessura (Fig. 1-12). A Fig. 1-8 CÔNDILO (VISTA ANTERIOR). O pólo medial (PM) é mais proeminente do que o pólo lateral (PL). Fig. 1-9 VISTA INFERIOR DA SUPERFÍCIE DO CRÂNIO E DA MANDÍBULA. Os côndilos parecem estar suavemente rota- cionados de maneira que se uma linha imaginária fosse desenhada passando pelos pólos lateral e medial, ela estender-se-ia medial e posteriormente em direção à borda anterior do forame magno. PL PM Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório 9 lares do disco, do côndilo e da fossa são muito lisas, assim, a fricção durante o movimento é minimizada. O líquido sinovial ajuda a minimizar ainda mais a fricção. O líquido sinovial lubrifica as superfícies articulares por meio de dois mecanismos. O primeiro é chamado de lubri- ficação divisória, que ocorre quando a articulação se move e o líquido sinovial é forçado de uma área da cavidade para outra. O líquido sinovial localizado nas regiões da margem ou vão é forçado para a superfície articular, possibilitando assim a lubrificação. A lubrificação divisória evita fricção no movi- mento articular e é o principal mecanismo de lubrificação da articulação. Um segundo mecanismo de lubrificação é chamado de lubrificação exsudativa. Este se refere à capacidade das super- fícies articulares absorverem uma pequena quantidade de líquido sinovial.5 Durante a função de uma articulação são criadas forças entre as superfícies articulares. Estas forças empurram uma pequena quantidade de líquido sinovial para dentro e para fora dos tecidos articulares. Este é o mecanismo pelo qual ocorre alteração metabólica. Sob forças compressi- vas, portanto, uma pequena quantidade de líquido sinovial é liberada. Este líquido sinovial age como um lubrificante entre os tecidos articulares para prevenir aderência. A lubrificação exsudativa ajuda a eliminar a fricção na compressão, mas não no movimento articular. Somente uma pequena quantidade de fricção é eliminada como um resultado da lubrificação exsudativa; portanto, forças compressivas prolongadas sobre superfícies articulares irão esgotar este suprimento. A con- seqüência de carga estática prolongada sobre estruturas da articulação é discutida em capítulos posteriores. Histologia das Superfícies Articulares As superfícies articulares do côndilo mandibular e da fossa são compostas de quatro camadas ou zonas distintas (Fig. 1- 15). A camada mais superficial é chamada zona articular. Ela é encontrada adjacente à cavidade articular e forma a superfície funcional mais externa. Ao contrário da maioria das outras articulações sinoviais, esta camada articular é constituída de tecido conjuntivo fibroso denso, e não por cartilagem hialina. A maioria das fibras colágenas está arranjada em feixes e está orientada paralela à superfície articular.6,7 As fibras estão fir- memente compactas e podem resistir às forças de movimento. Considera-se que este tecido conjuntivo fibroso forneça mui- tas vantagens para a articulação sobre a cartilagem hialina. Como o tecido conjuntivo fibroso geralmente é menos sus- ceptível aos efeitos da idade do que a cartilagem hialina, ele tem menor probabilidade de se deteriorar com o tempo. Este tecido também tem muito mais capacidade de reparo do que a cartilagem hialina.8 A importância desses dois fatores é sig- nificante na função e disfunção da ATM e é discutida de forma mais completa nos capítulos posteriores. A segunda zona, a zona proliferativa, é principalmente celu- lar. É nesta área que o tecido mesenquimal indiferenciado é encontrado. Este tecido é responsável pela proliferação da cartilagem articular em resposta a demandas funcionais loca- lizadas nas superfícies articulares durante a carga. Na terceira zona, na zona fibrocartilaginosa, as fibrilas colá- genas estão arranjadas em feixes em um padrão cruzado, embora alguns colágenos sejam vistos em uma orientação radial. A fibrocartilagem aparece em uma orientação randô- mica, fornecendo uma rede tridimensional que oferece resis- tência contra forças compressivas e forças laterais. A quarta e mais profunda zona é chamada de zona de carti- lagem calcificada. Esta zona é constituída por condrócitos e con- droblastos distribuídos por toda a cartilagem articular. Nesta zona os condrócitos se tornam hipertróficos, morrem e têm seu citoplasma evacuado, formando células ósseas de dentro da cavidade medular. A superfície da matriz extracelular for- nece um local ativo para atividade remodeladora, enquanto o crescimento ósseo endosteal prossegue, como ocorre em toda parte do corpo. A cartilagem articular é composta de condrócitos e matriz intercelular.9 Os condrócitos produzem colágeno, proteo- glicanas, glicoproteínas e enzimas que formam a matriz. As proteoglicanas são moléculas complexas compostas por um núcleo protéico e cadeias de glicosaminoglicanas. As proteo- glicanas estão conectadas a uma cadeia de ácido hialurônico formando agregados de proteoglicanas que constituem uma proteína grande da matriz (Fig. 1-16). Estes agregados são muito hidrofílicos e estão entrelaçados por toda a rede de colá- geno. Como estes conjuntos tendem a reter água, a matriz se expande e a tensão nas fibrilas colágenas neutraliza a pressão proveniente do inchaço dos agregados de proteoglicanas.10 Desta maneira, o fluido intersticial contribui para suportar a carga articular. A pressão externa resultante da carga articular está em equilíbrio com a pressão interna da cartilagem arti- cular. Na medida em que a carga articular aumenta, o fluido tecidual corre para fora até um novo equilíbrio ser alcançado. Na medida em que a carga diminui, o fluido é reabsorvido e o tecido recupera seu volume original. A cartilagem articu- Fig. 1-15 Secção histológica de um côndilo mandibular saudável mostrando as quatro zonas: articular, proliferativa, fibrocartilaginosa e calcificada. (De Cohen B, Kramer IRH, editors: Scientific foundations o dentistry, London, 1976, William Heinemann.) Disco articular Zona articular Zona proliferativa Zona fibrocartilaginosa Zona de cartilagem calcificada Osso subarticular 10 Anatomia Funcional lar é nutrida, predominantemente, pela difusão do líquido sinovial, que depende da ação de bombeamento durante a atividade normal.11 Esta ação de bombeamento é a base para a lubrificação exsudativa, que foi previamente discutida e é considerada importante na manutenção da saúde da cartila- gem articular.12 Inervação da Articulação Temporomandibular Como todas as outras articulações, a ATM é inervada pelo mesmo nervo que fornece inervação motora e sensitiva aos músculos que a controlam (o nervo trigêmeo). Ramos do nervo mandibular fornecem a inervação aferente. A maior parte da inervação é fornecida pelo nervo auriculotemporal assim que ele deixa o nervo mandibular atrás da articulação e ascende lateral e superiormente, contornando a região pos- terior da articulação.13 Inervação adicional é fornecida pelos nervos temporais profundos e massetérico. Vascularização da Articulação Temporomandibular A ATM é ricamente suprida por uma variedade de vasos que a circundam. Os vasos predominantes são a artéria tempo- ral superficial na parte posterior, a artéria meníngea média na parte anterior, e a artéria maxilar interna na parte inferior. Outras artérias importantes são a auricular profunda, a tim- pânica anterior e a faríngea ascendente. O côndilo recebe seu suprimento vascular pelos seus espaços medulares por meio da artéria alveolar inferior, e também recebe suprimento vas- cular por meio de “vasos alimentadores” que entram direta- mente na cabeça do côndilo, tanto anterior quanto posterior- mente, a partir dos vasos mais largos.14 LIGAMENTOS Como em qualquer sistema articular, os ligamentos desempe- nham um importante papel na proteção das estruturas. Os liga- mentos da articulação são compostos de tecido conjuntivo cola- genoso, que tem comprimento particular. Eles não se esticam. No entanto, se forças extensas forem aplicadas ao ligamento, ou inesperadamente ou por um período de tempo prolongado, o ligamento pode ser alongado. Quando isto ocorre, a função do ligamento fica comprometida, alterando, deste modo, a função articular. Esta alteração será abordada em capítulos futuros, que discutem a patologia da articulação. Os ligamentos não atuam ativamente na função da articu- lação, mas, ao invés disso, agem passivamente como agentes restringentes para limitar ou restringir movimentos limítro- fes. Três ligamentos funcionais suportam a ATM: (1) os liga- mentos colaterais, (2) o ligamento capsular e (3) o ligamento temporomandibular (TM). Existem também dois ligamentos acessórios: (4) o esfenomandibular e o (5) estilomandibular. Ligamentos Colaterais (Discais) Os ligamentos colaterais prendem as bordas medial e lateral do disco articular aos pólos do côndilo. Eles geralmente são chamados ligamentos discais e existem dois deles. O ligamento discal medial prende a extremidade medial do disco ao pólo medial do côndilo. O ligamento discal lateral prende a extre- midade lateral do disco ao pólo lateral do côndilo (Figs. 1-14 e 1-17). Estes ligamentos são responsáveis por dividir a articu- lação mediolateralmente em cavidades articulares superior e inferior. Os ligamentos discais são ligamentos verdadeiros, compostos de fibras de tecido conjuntivo colagenoso; por- tanto, eles não se esticam. Eles atuam restringindo o movi- mento do disco para fora do côndilo. Em outras palavras, eles 40 nm Fig. 1-16 Rede de colágeno interagindo com a rede de proteoglicano na matriz extracelular formando um composto reforçado de fibra. (De Mow VC, Ratcliffe A: Cartilage and diarthrodial joints as paradigms for hierarchical materials and structures, Biomaterials 13:67-81, 1992.) Fig. 1-17 ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR (VISTA ANTERIOR). DA, Disco articular; LC, ligamento capsular; CI, cavidade articular inferior, LDL, ligamento discal lateral; LDM, liga- mento discal medial; CS, cavidade articular superior. Ácido hialurônico Monômero Fluido intersticial Fibrila colágena Monômero unido CS DA LDM LC LC LDL CI Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório 11 permitem que o disco se mova passivamente com o côndilo quando ele desliza anterior ou posteriormente. As aderências dos ligamentos discais permitem que o disco seja rotacio- nado anterior e posteriormente sobre a superfície articular do côndilo. Assim, estes ligamentos são responsáveis pelo movimento de dobradiça da ATM, que ocorre entre o côndilo e o disco articular. Os ligamentos discais têm um suprimento vascular e são inervados. Sua inervação proporciona informação sobre a posição e movimentação da articulação. O esforço sobre estes ligamentos causa dor. Ligamento Capsular Como mencionado previamente, a ATM inteira é circundada e envolvida pelo ligamento capsular (Fig. 1-18). As fibras do ligamento capsular estão inseridas superiormente ao osso temporal ao longo das bordas das superfícies articulares da fossa mandibular e eminência articular. Inferiormente, as fibras do ligamento capsular se inserem no colo do côndilo. O ligamento capsular age para resistir a qualquer força medial, lateral ou inferior que tende a separar ou deslocar as superfí- cies articulares. Uma função significativa do ligamento capsu- lar é envolver a articulação, retendo, assim, o líquido sinovial. O ligamento capsular é bem inervado e proporciona estímulo proprioceptivo sobre a posição e movimento da articulação. Ligamento Temporomandibular O aspecto lateral do ligamento capsular é reforçado por fibras fortes e condensadas que compõem o ligamento lateral ou ligamento TM. O ligamento TM é composto por duas partes, uma porção externa oblíqua e uma porção interna horizontal (Fig. 1-19). A porção externa se estende da superfície externa do tubérculo articular e do processo zigomático posterior e inferiormente, até a superfície externa do colo do côndilo. A porção interna horizontal se estende da superfície externa do tubérculo articular e processo zigomático, posterior e hori- zontalmente, até o pólo lateral do côndilo e parte posterior do disco articular. A porção oblíqua do ligamento TM impede a queda exces- siva do côndilo, limitando, portanto, a extensão de abertura da boca. Esta porção do ligamento também influencia o movi- mento de abertura normal da mandíbula. Durante a fase inicial de abertura, o côndilo pode girar ao redor de um ponto fixo até o ligamento se tornar rígido, quando seu ponto de inserção no colo do côndilo é rotacionado posteriormente. Quando o liga- mento está esticado, o colo do côndilo não pode mais girar. Se a boca for aberta ainda mais, o côndilo precisará se movi- mentar para baixo e para frente através da eminência articular (Fig. 1-20). Este efeito pode ser clinicamente demonstrado fechando a boca e aplicando-se ao queixo uma força posterior leve. Com esta força aplicada deve-se pedir ao paciente que abra a boca. A mandíbula irá abrir girando facilmente até que os dentes fiquem separados 20 a 25 mm. Neste momento, se a mandíbula se abrir mais uma resistência será sentida. Se a mandíbula se abrir ainda mais ocorrerá uma mudança distinta no movimento de abertura, representando uma alte- ração de rotação do côndilo ao redor de um ponto fixo para movimento para frente e para baixo pela eminência articular. Esta mudança no movimento de abertura é ocasionada pelo estiramento do ligamento TM. Esta característica única do ligamento TM, que limita a abertura rotacional, é encontrada somente em humanos. Na postura ereta e com a coluna vertebral posicionada vertical- mente, o movimento rotacional contínuo de abertura leva- ria a mandíbula a afetar estruturas vitais submandibulares e retromandibulares do pescoço. A porção externa oblíqua do ligamento TM atua para impedir esta violação. A porção interna horizontal do ligamento TM limita o movimento posterior do côndilo e do disco. Quando uma força aplicada à mandíbula desloca o côndilo posteriormente, esta porção do ligamento torna-se rígida e impede o côndilo de se movimentar para dentro da região posterior da fossa mandibular. Portanto, o ligamento TM protege os tecidos retrodiscais do trauma causado pelo deslocamento posterior do côndilo. A porção interna horizontal também protege o músculo pterigóideo lateral de estiramento ou distensão. A efetividade deste ligamento é demonstrada durante casos de trauma extremo à mandíbula. Nestes casos, o colo do côndilo sofrerá fratura antes que os tecidos retrodiscais sejam rompi- dos ou que o côndilo entre na fossa craniana média. Fig. 1-18 LIGAMENTO CAPSULAR (VISTA LATERAL). Observe que ele se estende anteriormente para incluir a eminência articular e envolver toda a superfície articular da articulação. Fig. 1-19 LIGAMENTO TEMPOROMANDIBULAR (VISTA LATERAL). Duas partes distintas são mostradas: a porção externa oblíqua (PEO) e a porção interna horizontal (PIH). A PEO limita o movimento rotacional de abertura normal; a PIH limita o movimento posterior do côndilo e do disco. (Modificado de Du Brul EL: Sicher’s oral anatomy, ed 7, St Louis, 1980, Mosby.) PIH PEO 14 Anatomia Funcional BA Fig. 1-23 A, Músculo temporal. PA, Porção anterior; PM, porção média; PP, porção posterior. B, Função: ele- vação da mandíbula. O movimento exato é determinado pela localização das fibras ou porção que está sendo ativada. longo da superfície medial do ângulo mandibular (Fig. 1-24). Ele forma, juntamente com o masseter, um suspensório mus- cular que suporta a mandíbula na altura do ângulo mandibu- lar. Quando suas fibras se contraem, a mandíbula é elevada e os dentes entram em contato. Esse músculo também é ativo na protrusão mandibular. A contração unilateral produzirá um movimento mediotrusivo da mandíbula. Pterigóideo Lateral Por muitos anos, o pterigóideo lateral (externo) era descrito como tendo duas porções ou ventres distintos: (1) um inferior e (2) um superior. Como, anatomicamente, o músculo apa- rentava ser único em estrutura e função, esta descrição era aceitável até que estudos provaram ser diferente.17,18 Agora compreende-se que os dois ventres do pterigóideo lateral possuem funções bem diferentes. Desta forma, neste livro o pterigóideo lateral é dividido e identificado como dois múscu- los diferentes e distintos, o que é apropriado porque suas fun- ções são quase opostas. Os músculos serão descritos como pterigóideo lateral inferior e pterigóideo lateral superior. Pterigóideo Lateral Inferior. O pterigóideo lateral inferior se origina na superfície externa da lâmina pterigóidea lateral e se estende para trás, para cima e para fora, até sua inserção primariamente no colo do côndilo (Fig. 1-25). Quando os pte- A B Fig. 1-24 A, Músculo pterigóideo medial. B, Função: elevação da mandíbula. PA PM PP Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório 15 rigóideos laterais inferiores direito e esquerdo se contraem simultaneamente, os côndilos são puxados para baixo, nas eminências articulares, e a mandíbula é protruí da. A con- tração unilateral cria um movimento mediotrusivo daquele côndilo e causa um movimento lateral da mandíbula para o lado oposto. Quando este músculo atua juntamente com os depressores mandibulares, a mandíbula é abaixada e os côndilos deslizam para frente e para baixo nas eminências articulares. Pterigóideo Lateral Superior. O pterigóideo lateral superior é consideravelmente menor do que o inferior e se origina na superfície infratemporal da asa maior do esfenóide, se estendendo quase horizontalmente, para trás e para fora para se inserir na cápsula articular, no disco e no colo do côn- dilo (Figs. 1-14 e 1-25). A inserção exata do pterigóideo late- ral superior ao disco é um tanto discutível. Embora alguns autores19 sugiram não haver inserção, a maioria dos estu- dos revela a presença de uma inserção músculo-disco.14,20-24 A maioria das fibras do pterigóideo lateral superior (60% a 70%) se insere no colo do côndilo, e somente 30% a 40% se inserem no disco. As inserções são mais predominantes no aspecto medial do que no lateral. Aproximando-se das estru- turas articulares por um aspecto lateral revelar-se-ia pouca ou nenhuma inserção muscular. Isto talvez explique os dife- rentes achados nesses estudos. Enquanto o pterigóideo lateral inferior é ativo durante a abertura, o superior permanece inativo, tornando-se ativo somente em conjunto com os músculos elevadores. O pte- rigóideo lateral superior é ativo, especialmente quando há força de resistência e quando os dentes são mantidos juntos. A força de resistência se refere a movimentos que envolvem o fechamento da mandíbula com resistência, como na mastiga- ção ou no apertamento dentário. A significância funcional do pterigóideo lateral superior será discutida com mais detalhes na próxima seção, que envolve a biomecânica da ATM. O clínico deveria notar que a tração do pterigóideo lateral no disco e no côndilo ocorre numa direção predominante- mente anterior; entretanto, ele também tem um componente medial significativo (Fig. 1-26). À medida que o côndilo se move mais para frente, a angulação medial de tração desses músculos torna-se cada vez maior. Na posição de máxima abertura de boca a direção de tração do músculo é mais medial do que anterior. Interessantemente, cerca de 80% das fibras que compõem ambos os músculos pterigóideos laterais são fibras muscula- res lentas (tipo I).25,26 Isto sugere que esses músculos sejam relativamente resistentes à fadiga e possam servir para supor- tar o côndilo por longos períodos de tempo sem dificuldade. Digástrico Embora o digástrico geralmente não seja considerado um músculo da mastigação, ele exerce uma importante influên- cia na função da mandíbula. É dividido em duas porções ou ventres (Fig. 1-27): 1. O ventre posterior se origina na incisura mastóidea, justa- mente medial ao processo mastóide; suas fibras correm para frente, para baixo e para dentro, até o tendão inter- mediário inserido no osso hióide. 2. O ventre anterior se origina em uma fossa na superfície lin- gual da mandíbula, justamente acima da borda inferior e próximo à linha média; suas fibras se estendem para baixo e para trás para se inserirem no mesmo tendão intermediário, como faz o ventre posterior. Quando os digástricos direito e esquerdo se contraem e o osso hióide é fixado pelos músculos supra-hióideos e infra- hióideos, a mandíbula é abaixada e puxada para trás e os den- tes são desocluídos. Quando a mandíbula é estabilizada, os músculos digástricos, juntamente com os músculos supra- hióideos e infra-hióideos, elevam o osso hióide, que é um procedimento necessário para deglutição. Os digástricos são um dos muitos músculos que abaixam a mandíbula e elevam o osso hióide (Fig. 1-28). Geralmente os músculos que se inserem da mandíbula ao osso hióide BA Fig. 1-25 A, Músculos pterigóideo lateral superior e inferior. B, Função do pterigóideo lateral inferior: pro- trusão da mandíbula. Músculo pterigóideo lateral superior Músculo pterigóideo lateral inferior 16 Anatomia Funcional BA Fig. 1-26 A, Quando o côndilo está numa relação normal na fossa, as inserções dos músculos pterigóideo late- ral superior e inferior criam uma tração medial e anterior no côndilo e no disco (setas). B, Assim que o côndilo se move anteriormente a partir da fossa, a tração assume uma direção mais medial (setas). são chamados supra-hióideo, e aqueles que se inserem do osso hióide à clavícula e ao esterno são chamados infra-hióideo. Os músculos supra e infra-hióideos desempenham um impor- tante papel na coordenação da função mandibular, assim como muitos dos outros numerosos músculos da cabeça e do pescoço. Pode-se logo notar que um estudo da função man- dibular não se limita aos músculos da mastigação. Outros músculos importantes, tais como esternocleidomastóideo e músculos cervicais posteriores, desempenham importante papel na estabilização do crânio e permitem que movimen- tos controlados da mandíbula sejam executados. Existe um balanceamento dinâmico finamente coordenado de todos os músculos da cabeça e do pescoço e isto deve ser considerado para um entendimento de como ocorre a fisiologia do movi- mento mandibular. Quando uma pessoa boceja, a cabeça é levada para trás pela contração dos músculos cervicais poste- riores, que elevam os dentes maxilares. Este simples exemplo demonstra que mesmo o funcionamento normal do sistema mastigatório utiliza muito mais músculos do que somente os da mastigação. Com o entendimento deste relacionamento pode-se perceber que qualquer efeito na função dos múscu- los da mastigação também tem efeito em outros músculos da cabeça e do pescoço. Uma revisão mais detalhada da fisiolo- gia do sistema mastigatório como um todo é apresentada no Capítulo 2. BIOMECÂNICA DA ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR A ATM é um sistema articular extremamente complexo. O fato de que duas ATMs estão conectadas ao mesmo osso (a mandíbula) complica ainda mais o funcionamento de todo o sistema mastigatório. Cada articulação pode agir separada- A B Fig. 1-27 A, Músculo digástrico. B, Função: abaixamento da mandíbula. Músculo digástrico posterior Osso hióide Tendão intermediário Músculo digástrico anterior Anatomia Funcional e a Biomecânica do Sistema Mastigatório 19 uma substância dura de um lado (p. ex., uma carne dura), as ATMs não recebem igualmente a mesma carga. Isto ocorre porque a força de fechamento não é aplicada sobre a articu- lação, mas sim sobre o alimento. A mandíbula é apoiada ao redor do alimento duro causando um aumento da pressão interarticular na articulação contralateral e uma diminuição repentina da pressão interarticular na articulação ipsilateral (do mesmo lado).30,31 Isto pode levar à separação das super- fícies articulares, resultando num deslocamento da articu- lação ipsilateral. Para evitar este deslocamento, o músculo pterigóideo lateral superior se torna ativo quando há força de resistência, rotacionando o disco para frente sobre o côndilo, de maneira que a borda posterior mais espessa do disco mantenha o contato articular. Dessa forma, a estabilidade articular é mantida durante o golpe de força da mastigação. À medida que os dentes atravessam o ali- mento e se aproximam da intercuspidação, a pressão inte- rarticular é aumentada. Quando a pressão interarticular é aumentada na articulação, o espaço do disco é diminuído e o disco é mecanicamente rotacionado posteriormente, de modo que a zona intermediária mais fina ocupe o espaço. Quando a força de fechamento é interrompida, a posição fechada de repouso articular é reassumida (Fig. 1-30). O entendimento desses conceitos básicos do funciona- mento da ATM é essencial para a compreensão da disfunção articular. O funcionamento biomecânico normal da ATM deve seguir os princípios ortopédicos apresentados. Os clínicos deveriam lembrar o seguinte: 1. Os ligamentos não participam ativamente no funciona- mento normal da ATM. Eles atuam como conectores-guia, restringindo certos movimentos articulares, enquanto permitem outros. Eles restringem os movimentos arti- culares tanto mecanicamente quanto pela atividade de reflexo neuromuscular (Capítulo 2). 1 2 3 4 5 6 7 8 Fig. 1-30 Movimento funcional normal do côndilo e do disco durante toda a fase de abertura e fechamento. O disco é rotacionado posteriormente no côndilo quando este faz translação para fora da fossa. O movimento de fechamento é o exato oposto da abertura. O disco é sempre mantido entre o côndilo e a fossa. 20 Anatomia Funcional 12. Stegenga B, de Bont LG, Boering G, van Willigen JD: Tissue responses to degenerative changes in the temporomandibular joint: a review, J Oral Maxillofac Surg 49:1079-1088, 1991. 13. Fernandes PR, de Vasconsellos HA, Okeson JP, Bastos RL, Maia ML: The anatomical relationship between the position of the auriculo- temporal nerve and mandibular condyle, Cranio 21:165-171, 2003. 14. Tanaka TT: TMJ microanatomy: an approach to current controversies, Chula Vista, Calif, 1992, Clinical Research Foundation. 15. Guyton AC: Textbook of medical physiology, ed 8, Philadelphia, 1991, Saunders, p 1013. 16. Du Brul EL: Sicher’s oral anatomy, ed 7, St Louis, 1980, Mosby. 17. McNamara JA: The independent functions of the two heads of the lateral pterygoid muscle in the human temporomandibular joint, Am J Anat 138:197-205, 1973. 18. Mahan PE, Wilkinson TM, Gibbs CH, Mauderli A, Brannon LS: Superior and inferior bellies of the lateral pterygoid muscle EMG activity at basic jaw positions, J Prosthet Dent 50:710-718, 1983. 19. Wilkinson TM: The relationship between the disk and the lateral pterygoid muscle in the human temporomandibular joint, J Prosthet Dent 60:715-724, 1988. 20. Dusek TO, Kiely JP: Quantification of the superior lateral pterygoid insertion on TMJ components, J Dent Res 70:421-427, 1991. 21. Carpentier P, Yung JP, Marguelles-Bonnet R, Meunissier M: Insertion of the lateral pterygoid: an anatomic study of the human temporo- mandibular joint, J Oral Maxillofac Surg 46:477-782, 1988. 22. Marguelles-Bonnet R, Yung JP, Carpentier P, Meunissier M: Temporomandibular joint serial sections made with mandible in intercuspal position, J Craniomandib Pract 7:97-106, 1989. 23. Tanaka TT: Advanced dissection of the temporomandibular joint, Chula Vista, Calif, 1989, Clinical Research Foundation. 24. Heylings DJ, Nielsen IL, McNeill C: Lateral pterygoid muscle and the temporomandibular disc, J Orofac Pain 9:9-16, 1995. 25. Ericksson PO: Special histochemical muscle-fiber characteristics of the human lateral pterygoid muscle, Arch Oral Biol 26:495-501, 1981. 26. Mao J, Stein RB, Osborn JW: The size and distribution of fiber types in jaw muscles: a review, J Craniomandib Disord 6:192-201, 1992. 27. Boyd RL, Gibbs CH, Mahan PE, Richmond AF, Laskin JL: Temporomandibular joint forces measured at the condyle of Macaca arctoides, Am J Orthod Dentofacial Orthop 97: 472-479, 1990. 28. Mansour RM, Reynik RJ: In vivo occlusal forces and moments: I. 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Este contato é produzido pelos músculos que puxam através das articulações (os eleva- dores: temporal, masseter e pterigóideo medial). Um sólido entendimento desses princípios é necessário para a avaliação e tratamento das várias desordens que serão abordadas por todo este livro. Referências 1. Wink CS, St Onge M, Zimny ML: Neural elements in the human tem- poromandibular articular disc, J Oral Maxillofac Surg 50:334-337, 1992. 2. Ichikawa H, Wakisaka S, Matsuo S, Akai M: Peptidergic innervation of the temporomandibular disk in the rat, Experientia 45:303-304, 1989. 3. Westesson PL, Kurita K, Eriksson L, Katzberg RH: Cryosectional obser- vations of functional anatomy of the temporomandibular joint, Oral Surg Oral Med Oral Pathol 68:247-255, 1989. 4. Sahler LG, Morris TW, Katzberg RW, Tallents RH: Microangiography of the rabbit temporomandibular joint in the open and closed jaw positions, J Oral Maxillofac Surg 48:831-834, 1990. 5. Shengyi T, Yinghua X: Biomechanical properties and collagen fiber orientation of TMJ discs in dogs: part 1. Gross anatomy and collagen fibers orientation of the disc, J Craniomandib Disord 5:28-34, 1991. 6. De Bont L, Liem R, Boering G: Ultrastructure of the articular cartilage of the mandibular condyle: aging and degeneration, Oral Surg Oral Med Oral Pathol 60:631-641, 1985. 7. De Bont L, Boering G, Havinga P, Leim RSB: Spatial arrangement of colla- gen fibrils in the articular cartilage of the mandibular condyle: a light microscopic and scanning electron microscopic study, J Oral Maxillofac Surg 42:306-313, 1984. 8. Robinson PD: Articular cartilage of the temporomandibular joint: can it regenerate? Ann R Coll Surg Engl 75:231-236, 1993. 9. Mow VC, Ratcliffe A, Poole AR: Cartilage and diarthrodial joints as paradigms for hierarchical materials and structures, Biomaterials 13:67-97, 1992. 10. 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Um entendimento básico da anatomia e função do sistema neuromuscular é essencial para compreender a infl uência que os contatos dos dentes e outras condições têm sobre o movimento mandibular. Este capítulo está dividido em três seções. A primei- ra seção revisa, em detalhes, a neuroanatomia básica e a função do sistema neuromuscular. A segunda descreve as atividades fi siológicas básicas da mastigação, deglutição e fala. A terceira seção revisa importantes conceitos e meca- nismos que são necessários para entender a dor orofacial. A compreensão dos conceitos nestas três seções irá melhorar muito a capacidade do clínico tanto de entender a queixa do paciente quanto a de prover a terapia efi caz. ANATOMIA E FUNÇÃO DO SISTEMA NEUROMUSCULAR Com fi nalidade de discussão, o sistema neuromuscular é dividido em dois componentes principais: (1) as estrutu- ras neurológicas e (2) os músculos. A anatomia e a função de cada um desses componentes estão revisadas separa- damente, apesar de, em alguns casos, ser difícil separar a função. Com o entendimento destes componentes, a função neuromuscular básica pode ser revisada. MÚSCULOS Unidade Motora O componente básico do sistema neuromuscular é a uni- dade motora, que é composta por um número de fi bras musculares que são inervadas por um neurônio motor. Cada neurônio liga-se à fi bra muscular através da placa motora. Quando um neurônio é ativado, a placa motora é estimulada a liberar pequenas quantidades de acetilcolina, que inicia a despolarização das fi bras musculares. A despolarização cau- sa o encurtamento ou contração das fi bras musculares. O número de fi bras musculares inervadas por um único neurônio varia muito de acordo com a função da unidade motora. Quanto menos fi bras musculares por neurônio mo- tor, mais preciso o movimento. Um único neurônio motor pode inervar somente duas ou três fi bras musculares, como nos músculos ciliares (que controlam precisamente o crista- lino dos olhos). Ou por outro lado, um neurônio motor pode inervar centenas de fi bras musculares, como em alguns mús- culos grandes (p. ex., o reto femoral da coxa). Nos músculos da mastigação existe uma variação similar no número de fi - bras musculares por neurônio motor. O músculo pterigóideo lateral inferior tem uma proporção fi bra muscular/neurônio motor relativamente baixa, e dessa forma é capaz de ajustes fi nos na extensão, necessários para se adaptar a alterações horizontais da posição mandibular. Ao contrário, o masseter possui um grande número de fi bras por neurônio motor, o que corresponde à sua função mais grosseira de fornecer a força necessária durante a mastigação. Músculo Centenas de milhares de unidades motoras, juntamente com vasos sangüíneos e nervos, são revestidas por tecido conjuntivo e fáscia para compor um músculo. Os principais músculos que controlam o movimento do sistema masti- gatório foram descritos no Capítulo 1. Para compreender o efeito que estes músculos têm uns sobre os outros e em suas inserções ósseas, deve-se observar as relações esquelé- ticas básicas da cabeça e do pescoço. O crânio é mantido em posição pela espinha cervical. No entanto, o crânio não está localizado centralmente ou equilibrado sobre a coluna cer- vical. Na verdade, se um crânio seco fosse colocado na sua posição correta sobre a coluna cervical, ele seria desequili- brado para anterior e rapidamente cairia para frente. Qual- quer equilíbrio torna-se mais remoto quando a posição da mandíbula pendurada abaixo da porção anterior do crânio é considerada. Pode-se ver claramente que o equilíbrio dos componentes esqueléticos da cabeça e do pescoço não exis- te. Os músculos são necessários para compensar este peso e desequilíbrio de massa. Se a cabeça tiver que ser mantida em uma posição ereta de maneira que se possa olhar para 24 Anatomia Funcional sni sno snc GG Fig. 2-3 REPRESENTAÇÃO DO NERVO TRIGÊMEO ENTRANDO NO TRONCO ENCEFÁ- LICO PRÓXIMO À PONTE. O neurônio aferente primário (1o N) entra no tronco encefálico para fazer sinapse com o neurônio de segunda ordem (2o N) no núcleo do trato espinhal trigeminal (NTE do V). O núcleo do trato espinhal é dividido em três regiões: subnúcleo oral (sno), subnúcleo interpolar (sni) e subnúcleo caudal (snc). O complexo do núcleo do tronco encefálico também é constituído de um núcleo motor do V (NM do V) e do núcleo sensorial principal do V (NS do V). Os corpos celulares do nervo trigêmeo estão localizados no gânglio de Gasser (GG). Uma vez que o neurônio de segunda ordem recebe o estímulo, ele é conduzido até o tálamo (T) para interpretação. (Modifi cado de Okeson JP: Bell’s orofacial pains, ed 6, Chicago, 2005, Quintessence.) enviam os impulsos para baixo, ao longo da espinha dorsal, e de volta à periferia para o órgão eferente para a ação dese- jada. O neurônio aferente primário (neurônio de primeira or- dem) recebe estímulo do receptor sensorial. Este impulso é transportado pelo neurônio aferente primário para dentro do SNC por meio da raiz dorsal a fi m de fazer sinapse no corno dorsal da espinha dorsal com um neurônio secundário (de segunda ordem) (Fig. 2-2). Os corpos celulares de todos os neurônios aferentes primários estão localizados no gânglio da raiz dorsal. O impulso é, então, conduzido pelo neurônio de segunda ordem através da espinha dorsal para o trajeto espinotalâmico ântero-lateral, que ascende para os centros superiores. Múltiplos interneurônios (p. ex., terceira ordem, quarta ordem) podem estar envolvidos na transferência des- te impulso para o tálamo e para o córtex. Os interneurônios localizados no corno dorsal podem se tornar envolvidos com o impulso uma vez que ele faz sinapse com o neurônio de se- gunda ordem. Alguns desses neurônios podem fazer sinapse diretamente com um neurônio eferente que está direcionado para fora do SNC por meio da raiz ventral para estimular um órgão eferente (p. ex., um músculo). Tronco Encefálico e Cérebro Uma vez que os impulsos tenham sido transmitidos para os neurônios de segunda-ordem, estes neurônios os transpor- tam até os centros superiores para interpretação e avaliação. Numerosos centros no tronco encefálico e cérebro ajudam a dar signifi cado aos impulsos. O clínico deveria lembrar que numerosos interneurônios podem estar envolvidos na trans- missão dos impulsos para os centros superiores. Na verda- de, tentar acompanhar um impulso pelo tronco encefálico até o córtex não é uma tarefa simples. Com o objetivo de discutir de maneira inteligente a função muscular e a dor neste livro, certas regiões do tronco encefálico e cérebro de- vem ser descritas. O clínico deveria manter em mente que as seguintes descrições proporcionam uma visão geral de muitos componentes funcionais importantes do SNC; ou- tros textos podem fornecer uma discussão mais completa sobre o assunto.1,2 A Figura 2-3 retrata as áreas funcionais do tronco ence- fálico e do cérebro que serão revisadas nesta seção. A com- preensão destas áreas e de suas respectivas funções ajudará o clínico a entender a dor orofacial. As áreas importantes a serem revisadas são o núcleo do trato espinhal, a formação reticular, o tálamo, o hipotálamo, as estruturas límbicas e o córtex. Eles serão discutidos na ordem pela qual o impulso neural passa na direção dos centros superiores. Núcleo do Trato Espinhal. Por todo o corpo, os neurô- nios aferentes primários fazem sinapse com os neurônios de segunda ordem no corno dorsal da coluna vertebral. A 1º N 2º N Córtex T NM do V NS do V NTE do V Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 25 informação aferente das estruturas orais e da face, entretan- to, não chega à medula espinhal por meio dos nervos da espinha dorsal. Ao invés disso, a informação sensorial da face e da boca é transportada pelo quinto nervo craniano, o nervo trigêmeo. Os corpos celulares dos neurônios afe- rentes do trigêmeo estão localizados no grande gânglio “de Gasser”. Os impulsos transportados pelo nervo trigêmeo en- tram diretamente no tronco encefálico, na região da ponte, para fazer sinapse no núcleo espinhal trigeminal (Fig. 2-3). Esta região do tronco encefálico é estruturalmente similar ao corno dorsal da medula espinhal. Na verdade, ela pode ser considerada uma extensão do corno dorsal e é, algumas vezes, referida como o corno dorsal medular. O complexo do núcleo trigeminal do tronco encefálico consiste de duas partes principais: (1) o núcleo trigeminal sensorial principal, que está rostralmente localizado e rece- be impulsos aferentes periodontais e alguns impulsos afe- rentes pulpares; e (2) o núcleo trigeminal do trato espinhal, que está localizado mais caudalmente. O trato espinhal está dividido em três partes: (1) o subnúcleo oral; (2) o subnú- cleo interpolar; e (3) o subnúcleo caudal, que corresponde ao corno dorsal medular. As aferências pulpares dos dentes vão para todos os três subnúcleos.3 O subnúcleo caudal tem sido especialmente envolvido nos mecanismos nociceptivos do trigêmeo com base nas observações eletrofi siológicas de neurônios nociceptivos.4,5 O subnúcleo oral parece ser uma área signifi cante do complexo trigeminal do tronco encefáli- co para os mecanismos de dor oral.5-7 Outro componente do complexo trigeminal do tronco en- cefálico é o núcleo motor do quinto nervo craniano. Esta área do complexo está envolvida com a interpretação dos impul- sos que demandam respostas motoras. As atividades refl exas motoras da face são iniciadas a partir desta área de maneira similar às atividades refl exas espinhais no resto do corpo.8 Formação Reticular. Após os neurônios aferentes faze- rem sinapses no núcleo do trato espinhal, os interneurônios transmitem os impulsos para cima, para os centros superio- res. Os interneurônios ascendem por meio de muitos tratos, passando através da área do tronco encefálico chamada de formação reticular. Dentro da formação reticular estão concen- trações de células ou núcleos que representam “centros” para várias funções. A formação reticular desempenha um papel extremamente importante na monitoração dos impulsos que entram no tronco encefálico. A formação reticular con- trola toda a atividade do cérebro, tanto aumentando quanto inibindo os impulsos para o cérebro. Esta porção do tronco encefálico tem uma infl uência extremamente importante so- bre a dor e outros estímulos de entradas sensoriais. Tálamo. O tálamo está localizado no centro do cérebro, sendo envolvido por cima e pelos lados pelo telencéfalo, e abaixo pelo mesencéfalo (Fig. 2-3). Ele é composto de nu- merosos núcleos que funcionam juntos para interromper os impulsos. Quase todos os impulsos das regiões inferiores do cérebro, assim como da medula espinhal, são retransmi- tidos através de sinapses no tálamo antes de prosseguirem para o córtex cerebral. O tálamo atua como uma estação de retransmissão para a maioria da comunicação entre o tron- co encefálico, o cerebelo e o cérebro. Enquanto os impulsos chegam ao tálamo, este faz a avaliação e direciona os impul- sos para as regiões apropriadas nos centros superiores para interpretação e resposta. Se alguém fosse comparar o cérebro humano com um computador, o tálamo representaria o teclado que controla as funções e direciona os sinais. O tálamo induz à atividade do córtex e o capacita a se comunicar com outras regiões do SNC. Sem o tálamo, o córtex é inútil. Hipotálamo. O hipotálamo é uma estrutura pequena no meio da base do cérebro. Apesar de ser pequeno, sua função é grande. O hipotálamo é o maior centro do cérebro para controlar as funções corporais internas, tais como tempera- tura corporal, fome e sede. A estimulação do hipotálamo ex- cita o sistema nervoso simpático por todo o corpo, aumen- tando o nível total de atividade de várias partes internas do corpo, aumentando, especialmente, o batimento cardíaco, e causando vasoconstrição. Pode ser visto claramente que esta pequena área do cérebro possui alguns efeitos poten- tes no funcionamento de um indivíduo. Como será discutido posteriormente, aumentando-se o nível de estresse emo- cional, pode-se estimular o hipotálamo a supersensibilizar o sistema nervoso simpático e infl uenciar intensamente a entrada dos impulsos nociceptivos no cérebro. Esta afi rma- ção simples teria um signifi cado extremo para o clínico que controla a dor. Estruturas Límbicas. A palavra límbico signifi ca “mar- gem”. O sistema límbico compreende as estruturas da mar- gem do telencéfalo e do diencéfalo. As estruturas límbicas agem controlando nossas atividades emocionais e compor- tamentais. Dentro das estruturas límbicas estão centros ou núcleos que são responsáveis por comportamentos es- pecífi cos, tais como raiva, fúria e docilidade. As estruturas límbicas também controlam as emoções, tais como depres- são, ansiedade, medo ou paranóia. Um centro de dor-prazer aparentemente existe; em um nível instintivo, o indivíduo é induzido a comportamentos que estimulam o lado de prazer do centro. Estas induções geralmente não são percebidas de forma consciente, mas sim como um instinto básico. O ins- tinto, no entanto, trará certos comportamentos a um deter- minado nível de consciência. Por exemplo, quando um indi- víduo enfrenta uma dor crônica, o seu comportamento será orientado no sentido de retirar qualquer estímulo que possa aumentar a dor. Muitas vezes a pessoa que está sofrendo irá tirar a própria vida, e alterações no humor, como depressão, ocorrerão. Acredita-se que partes das estruturas límbicas interagem e desenvolvem associações com o córtex, coor- denando então as funções comportamentais cerebrais cons- cientes com as funções comportamentais subconscientes do sistema límbico mais profundo. Os impulsos do sistema límbico que são levados para dentro do hipotálamo podem modifi car qualquer uma ou to- das das muitas funções internas do corpo controladas pelo hipotálamo. Impulsos do sistema límbico introduzidos no mesencéfalo e na medula podem controlar comportamen- tos como vigilância, sono, excitação e atenção. Com este entendimento básico da função límbica, pode-se entender, rapidamente, o impacto que ele tem sobre as funções do indivíduo. O sistema límbico certamente desempenha um papel principal nos problemas de dor, como será discutido nos capítulos posteriores. Córtex. O córtex cerebral representa a região externa do telencéfalo e é constituído, predominantemente, de subs- tância cinzenta. O córtex cerebral é a porção do cérebro mais freqüentemente associada ao processo de pensar, mesmo que ele não possa fornecer pensamento sem ação simultâ- nea de estruturas profundas do cérebro. O córtex cerebral é a porção do cérebro na qual, essencialmente, todas de nos- sas memórias estão armazenadas, e é também a área res- ponsável pela capacidade do indivíduo de adquirir diversas habilidades musculares. Pesquisadores ainda não sabem os mecanismos fi siológicos básicos pelos quais o córtex cere- bral armazena ou as memórias ou o conhecimento das habi- lidades musculares. O córtex cerebral possui, aproximadamente, 6 mm de espessura na sua maior parte, e todo ele contém, aproxi- madamente, 50 a 80 bilhões de corpos celulares dos nervos. Talvez um bilhão de fi bras nervosas sejam levadas do córtex, assim como um número comparável são levadas para ele, passando para outras áreas do córtex, para e a partir de es- truturas mais profundas do cérebro, e algumas, diretamen- te, para a medula espinhal. Diferentes regiões do córtex cerebral são identifi cadas como tendo diferentes funções. A área motora está princi- palmente envolvida com a função de coordenação motora. A área sensorial recebe entrada somatossensorial para ava- liação. Áreas para sentidos especiais, tais como visão e au- dição, também são encontradas. Se alguém fosse, novamente, comparar o cérebro huma- no com um computador, o córtex cerebral representaria o disco rígido que armazena toda informação de memória e da função motora. Mais uma vez, deve-se lembrar que o tálamo (o teclado) é a unidade necessária que chama o córtex para a função. Receptores Sensoriais Os receptores sensoriais são estruturas neurológicas ou ór- gãos localizados em todos os tecidos corporais, que forne- cem informação para o SNC por meio de neurônios aferen- tes, sobre o estado destes tecidos. Assim como em outras áreas do corpo, vários tipos de receptores sensoriais estão localizados por todos os tecidos que constituem o siste- ma mastigatório. Receptores sensoriais especializados for- necem informações específi cas aos neurônios aferentes e, então, retornam ao SNC. Alguns receptores são específi cos para o desconforto e dor. Estes são chamados nociceptores. Outros receptores fornecem informação sobre a posição e o movimento da mandíbula e das estruturas orais associa- das. Estes são chamados proprioceptores. Os receptores que carregam informação sobre o estado dos órgãos internos são referidos como interoceptores. A informação constante re- cebida de todos estes receptores permite que o córtex e o tronco encefálico coordenem ações de músculos individuais ou grupos de músculos para criar uma resposta apropriada no indivíduo. Assim como os outros sistemas, o sistema mastigatório utiliza quatro tipos principais de receptores sensoriais para monitorar o estado de suas estruturas: (1) os fusos muscu- lares, que são órgãos receptores especializados encontrados nos tecidos musculares; (2) os órgãos tendinosos de Golgi, localizados nos tendões; (3) os corpúsculos de Pacini, loca- lizados nos tendões, articulações, periósteo, fáscia e tecidos subcutâneos; e (4) os nociceptores, encontrados, geralmen- te, em todos os tecidos do sistema mastigatório. Fusos Musculares. Os músculos esqueléticos consis- tem de dois tipos de fi bras musculares. O primeiro são as fi bras extrafusais, que são contráteis e constituem a massa do músculo; o outro são as fi bras intrafusais, que se contra- em muito pouco. Um feixe de fi bras musculares intrafusais unidas por um invólucro de tecido conjuntivo é chamado fuso muscular (Fig. 2-4). Os fusos musculares, basicamente, monitoram a tensão dentro dos músculos esqueléticos. Eles estão entremeados no músculo e alinhados paralela- mente às fi bras extrafusais. Dentro de cada fuso os núcleos de fi bras intrafusais estão dispostos de duas maneiras dis- tintas: em cadeia (tipo cadeia nuclear) e em feixe (tipo saco nuclear). Dois tipos de nervos aferentes suprem as fi bras intrafu- sais. Eles são classifi cados de acordo com seus diâmetros. As fi bras mais largas conduzem impulsos numa velocidade maior e possuem limiares mais baixos. Aqueles que ter- minam na região central das fi bras intrafusais são o grupo maior (Ia, A alpha) (discutido mais adiante neste capítulo) e são chamados de terminações primárias (também chama- das terminações ânulo-espirais). Aqueles que terminam nos pólos do fuso (fora da região central) são o grupo menor (II, A beta) e são as terminações secundárias (também chama- das de terminações rociadas ou espargidas). Como as fi bras intrafusais do fuso muscular estão para- lelamente alinhadas às fi bras extrafusais dos músculos, uma vez que o músculo é estirado, as fi bras intrafusais também se estiram. Este estiramento é monitorado nas regiões de cadeia nuclear e saco nuclear. As terminações ânulo-espi- rais e rociadas são ativadas pelo estiramento, e os neurô- nios aferentes transportam estes impulsos para o SNC. Os neurônios aferentes que se originam nos fusos musculares dos músculos da mastigação têm seus corpos celulares no núcleo mesencefálico do nervo trigêmeo. As fi bras intrafusais recebem inervação eferente por meio de fi bras nervosas fusimotoras. Estas fi bras são cha- madas, pela classifi cação alfabética, de fi bras gama ou efe- rentes gama para diferenciá-las das fi bras nervosas alfa, que suprem as fi bras extrafusais. Como outras fi bras eferentes, as eferentes gama se originam no SNC e, quando estimula- das, provocam contração das fi bras intrafusais. Quando as fi bras intrafusais se contraem, as áreas da cadeia nuclear e o do saco nuclear são estiradas, o que é interpretado como um estiramento do músculo inteiro e a atividade aferente é iniciada. Portanto, existem duas maneiras pelas quais as fi bras aferentes dos fusos musculares podem ser estimu- ladas: estiramento generalizado do músculo inteiro (fi bras extrafusais) e, contração das fi bras intrafusais por meio de eferentes gama. Os fusos musculares registram somente o estiramento, eles não conseguem diferenciar estas duas ati- vidades. Assim sendo, as atividades são registradas como uma só atividade pelo SNC. As fi bras musculares extrafusais recebem inervação pe- los neurônios motores eferentes alfa. A maioria delas tem seu corpo celular no núcleo motor do trigêmeo. A estimula- 26 Anatomia Funcional Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 29 rente gama aumenta a sensibilidade do refl exo miotático (estiramento), enquanto uma diminuição na atividade efe- rente gama diminui a sensibilidade deste refl exo. A manei- ra específi ca pela qual os centros superiores infl uenciam a atividade eferente gama está resumida mais adiante neste capítulo. Quando um músculo se contrai, os fusos musculares são encurtados, o que faz com que o desempenho da atividade aferente dos fusos cesse. Se o potencial elétrico da ativida- de nervosa aferente for monitorado, um período de silêncio (sem atividade elétrica) será notado durante este estágio de contração. A atividade eferente gama pode infl uenciar a du- ração do período de silêncio. Uma intensa atividade eferente gama leva à contração das fi bras intrafusais, o que diminui o tempo em que o fuso é bloqueado durante a contração mus- cular. Uma diminuição na atividade eferente gama aumenta este período de silêncio. Refl exo Nociceptivo (Flexor). O refl exo fl exor ou nociceptivo é um refl exo polissináptico a estímulos nocivos e, desta for- ma, é considerado um refl exo protetor. Os exemplos estão nos grandes membros (p. ex., quando se retira a mão ao to- car um objeto quente). No sistema mastigatório este refl e- xo torna-se ativo quando um objeto duro é repentinamente encontrado durante a mastigação (Fig. 2-6). À medida que o dente é forçado contra o objeto duro, um estímulo nocivo repentino é gerado pela sobrecarga das estruturas periodon- tais. As fi bras nervosas aferentes primárias levam a informa- ção para o núcleo do trato espinhal trigeminal, onde eles fazem sinapse com interneurônios. Estes interneurônios vão até o núcleo motor trigeminal. A resposta motora leva- A B Fig. 2-5 A, O refl exo miotático é ativado pela aplicação repentina de força para baixo, no queixo, com um pequeno martelo de borracha. Isto resulta em contração dos músculos elevadores (masseter), evita estiramento adicional e, geralmente, provoca uma elevação da mandíbula em direção à oclusão. B, O trajeto é o seguinte: o estiramento repentino do fuso muscular aumenta o estímulo aferente do fuso. Os impulsos aferentes são encaminhados ao tronco encefálico por meio do núcleo mesencefálico trigeminal. As fi bras aferentes fazem sinapse no núcleo motor do trigêmeo com os neurônios motores eferentes alfa que os conduzem de volta às fi bras extrafusais do músculo elevador que foi estirado. A informação refl exa enviada às fi bras extrafusais é para contrair. A presença de fi bras eferentes gama é notada. A estimulação destas fi bras pode causar contração das fi bras intrafusais do fuso e, então, sensibilizar o fuso para um estiramento repentino. (De Sessle BJ: Mastication, swallowing, and related activities. In Roth GI, Calmes R, editors: Oral biology, St Louis, 1981, Mosby.) Núcleo mesencefálico trigeminal Fibra aferente do fuso Núcleo sensorial principal trigeminal Fibra eferente γ Fibra eferente α Núcleo motor trigeminal Fuso muscular Músculo de fechamento mandibular 30 Anatomia Funcional da durante este refl exo é mais complicada do que o refl exo miotático no qual a atividade de diversos grupos muscula- res deve ser coordenada para produzir a resposta motora desejada.9,10 Não somente é fundamental inibir os músculos elevadores para evitar que a mandíbula se feche mais sobre o objeto duro, como também é de suma importância que os músculos que abrem a mandíbula sejam ativados a fi m de separar os dentes e evitar um dano potencial.11,12 Quando a informação aferente dos receptores sensoriais alcança os interneurônios, duas ações distintas ocorrem: 1. Interneurônios excitatórios dirigindo-se aos neurônios eferentes no núcleo motor trigeminal dos músculos que abrem a mandíbula são estimulados. Esta ação leva es- tes músculos a se contraírem. 2. Ao mesmo tempo, as fi bras aferentes estimulam os in- terneurônios inibitórios, que atuam nos músculos eleva- dores da mandíbula, fazendo-os relaxar. O resultado fi nal é que a mandíbula desce rapidamente e os dentes são afastados do objeto que causou o estímulo nocivo. Este processo é chamado inibição antagonista e ocorre em várias ações de refl exos nociceptivos do corpo. O refl exo miotático protege o sistema mastigatório do estiramento repentino de um músculo. O refl exo nocicep- tivo protege os dentes e as estruturas de suporte de danos criados por forças funcionais pesadas repentinas e não usu- ais. Os órgãos tendinosos de Golgi protegem o músculo da contração excessiva através de estímulos inibidores diretos aos músculos que eles monitoram. Outros numerosos tipos de ações refl exas são encontrados nos músculos da masti- gação. Muitos são complexos e controlados nos centros su- periores do SNC. As ações refl exas desempenham um papel importante na função (p. ex., mastigação, deglutição, refl exo do vômito, tosse, fala).3 Inervação Recíproca O controle dos músculos antagonistas é de vital impor- tância na atividade refl exa. É de igual importância para o funcionamento diário do corpo. Como em outros sistemas musculares, cada músculo que sustenta a cabeça e controla parcialmente a função, tem um antagonista que contraba- lança sua atividade. Esta é a base do equilíbrio muscular descrito previamente. Certos grupos de músculos basica- mente elevam a mandíbula, outros grupos basicamente a forçam para baixo. Para que a mandíbula possa ser elevada pelos músculos temporal, pterigóideo medial ou masseter, os músculos supra-hióideos devem relaxar e se distender. Da mesma forma, para abaixar a mandíbula os supra-hiói- deos devem se contrair enquanto os elevadores relaxam e se distendem. O mecanismo de controle neurológico para estes grupos antagonistas é conhecido como inervação recíproca. Este fenô- meno permite um controle exato e suave para que o movi- mento mandibular seja alcançado. Para se manter a relação esquelética do crânio, mandíbula e pescoço, cada grupo de músculo antagonista deve permanecer num estado constan- te de contração suave. Isto compensará o desequilíbrio es- Fig. 2-6 O refl exo nociceptivo é ativado pela mordida repentina de um objeto duro. O estímulo nocivo é iniciado a partir do dente e pelo ligamento periodontal que sofrem o esforço. As fi bras nervosas aferentes levam o impulso ao núcleo do trato espinhal trigeminal. Os neurônios aferentes estimulam tanto os inter- neurônios excitatórios como os inibitórios. Os interneurônios fazem sinapse com os neurônios eferentes no núcleo motor trigeminal. Os interneurônios inibitórios fazem sinapse com as fi bras eferentes que se dirigem aos músculos elevadores. A mensagem levada é para interromper a contração. Os interneurônios excitatórios fazem sinapse com os neurônios eferentes que inervam os músculos depressores da mandíbula. A mensagem enviada é para contrair, o que faz com que os dentes se afastem do estímulo nocivo. Neurônio eferente (motor) Núcleo motor trigeminal Interneurônios Núcleo do trato espinhal trigeminal Neurônio aferente (sensorial) − = Efeito inibitório + = Efeito excitatório Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 31 quelético da gravidade e irá manter a cabeça no que denomi- namos posição postural. Como discutido previamente, o tônus muscular desempenha um importante papel na posição de repouso mandibular, assim como na resistência a qualquer deslocamento passivo da mandíbula. Músculos que estão totalmente contraídos ativam a maioria das fi bras muscula- res, o que pode comprometer o fl uxo sangüíneo, resultando em fadiga e dor. Em contrapartida, o tônus muscular requer a contração de um número mínimo de fi bras musculares, e as fi bras contraídas estão sendo constantemente revezadas. Este tipo de atividade permite o fl uxo sangüíneo correto e não produz fadiga. Regulação da Atividade Muscular Para criar um movimento mandibular preciso, estímulos de vários receptores sensoriais devem ser recebidos pelo SNC através de fi bras aferentes. O tronco encefálico e o córtex de- vem assimilar e organizar este estímulo e iniciar atividades motoras apropriadas através das fi bras nervosas eferentes. Estas atividades motoras envolvem a contração de alguns grupos musculares e a inibição de outros. De maneira geral, acredita-se que o sistema eferente gama seja ativado per- manentemente, apesar de ele nem sempre iniciar o movi- mento. A descarga gama mantém os neurônios motores alfa preparados de forma refl exa para receber os impulsos vindos do córtex ou diretamente dos impulsos aferentes dos fusos. A maioria dos movimentos mandibulares é, provavelmente, controlada por uma ligação entre os eferentes gama, os afe- rentes do fuso e os neurônios motores alfa. Este estímulo combinado produz a contração ou a inibição necessária dos músculos e permite que o sistema neuromuscular mante- nha um autocontrole. Várias condições do sistema mastigatório infl uenciam muito o movimento e a função mandibular. Os receptores sensoriais no ligamento periodontal, periósteo, ATMs, lín- gua e outros tecidos moles da boca continuamente enviam informações que são processadas e usadas para direcionar a atividade muscular. Estímulos nocivos são evitados por via refl exa de maneira que o movimento e a função possam pro- vocar uma lesão mínima aos tecidos e estruturas do sistema mastigatório. Influência dos Centros Superiores Como mencionado anteriormente, o tronco encefálico e o córtex funcionam juntos para calcular e avaliar os impulsos que chegam. Embora o córtex seja o principal determinan- te da ação, o tronco encefálico está encarregado de manter o equilíbrio e controlar as funções corporais subconsciente normais. Dentro do tronco encefálico há um feixe de neurô- nios que controlam as atividades musculares rítmicas como a respiração, o andar e a mastigação. Este feixe de neurô- nios é conhecido, coletivamente, como gerador de padrão cen- tral (GPC).13-17 O GPC é responsável pelo momento preciso da atividade entre os músculos antagonistas de maneira que funções específi cas possam ser cumpridas. Durante o processo de mastigação, por exemplo, o GPC inicia a contra- ção dos músculos supra e infra-hióideos no momento pre- ciso que os músculos elevadores relaxam. Isto permite que a boca abra e aceite o alimento. Em seguida, o GPC começa a contração dos músculos elevadores enquanto relaxa os músculos supra e infra-hióideos, produzindo o fechamen- to da boca sobre o alimento. Este processo é repetido até que o tamanho da partícula do alimento seja pequeno o su- fi ciente para ser facilmente engolido. Para o GPC ser mais efi ciente, ele deve receber estímulos sensoriais constantes das estruturas mastigatórias. Portanto, a língua, os lábios, os dentes e o ligamento periodontal estão constantemen- te levando informações que permitem ao GPC determinar a força de mastigação mais apropriada e efi ciente. Uma vez que o padrão de mastigação efi ciente que minimiza os danos a qualquer estrutura seja encontrado, ele é aprendido e repetido. Este padrão de aprendizado é chamado traço de memória muscular. Portanto, a mastigação pode ser compreendida como uma atividade refl exa extre- mamente complexa que é controlada, principalmente, pelo GPC com o estímulo de numerosos receptores sensoriais. Como muitas outras atividades refl exas, a mastigação é uma atividade subconsciente, todavia pode ser trazida para o controle consciente a qualquer momento. A respiração e o andar são outras atividades refl exas do GPC que ge- ralmente ocorrem de forma subconsciente, mas também podem ser trazidas para o controle voluntário. O processo de mastigação é discutido com maiores detalhes posterior- mente neste capítulo. Infl uência dos Centros Superiores na Função Mus- cular. Geralmente quando um estímulo é enviado ao SNC, uma interação complexa ocorre para determinar a resposta apropriada. O córtex, infl uenciado pelo tálamo, GPC, estru- turas límbicas, formação reticular e hipotálamo determina a ação a ser tomada em termos de direção e intensidade. Esta ação geralmente é quase automática, como a masti- gação. Apesar de o paciente estar consciente disso, não há participação ativa nesta execução. Na ausência de qualquer estado emocional signifi cante, a ação geralmente é previsí- vel e a tarefa, então, realizada de maneira efi ciente. No en- tanto, quando o indivíduo está passando por momentos de forte emoção, como medo, ansiedade, frustração ou raiva, as seguintes modifi cações principais da atividade muscular podem ocorrer: 1. Um aumento no estresse emocional excita as estruturas límbicas e o eixo adrenal-pituitária-hipotalâmico (APH), ativando o sistema eferente gama.18,19 Com esta ativida- de eferente gama aumentada, vem a contração das fi bras intrafusais, resultando em estiramento parcial das re- giões sensoriais dos fusos musculares. Quando os fusos estão parcialmente estirados, é necessário menos estira- mento do músculo como um todo para que se inicie uma ação refl exa. Isto afeta o refl exo miotático e, por último, resulta num aumento do tônus muscular. Os músculos também se tornam mais sensíveis aos estímulos exter- nos, o que freqüentemente leva ao aumento adicional na tonicidade muscular. Estas condições levam a um au- mento da pressão interarticular da ATM. 2. A atividade eferente gama aumentada também pode au- mentar a quantidade de atividade muscular irrelevante. A formação reticular, infl uenciada pelo sistema límbico e pelo eixo APH, pode criar uma atividade muscular adi- cional não relacionada com a realização de uma tarefa 34 Anatomia Funcional 8 1 2 3 4 5 6 7 8 1 1 2 2 3 3 4 4 5 5 6 6 7 7 8 Fig. 2-9 MOVIMENTO MASTI- GA TÓ RIO NO PLANO SA GI - TAL DO LADO DE NÃO TRA BA LHO.* Observe que o primeiro molar, inicialmente, desce da posição de intercuspidação (PI) quase que verticalmente, com pouco ou nenhum movimento anterior ou posterior. O estágio fi nal do movi- mento de fechamento é, também, quase completamente vertical. O côndilo no lado de não trabalho se move anteriormente durante a abertura e segue quase a mesma trajetória no seu retorno. O côndilo do lado de não trabalho nunca está situado posteriormente à posição de intercuspidação. (De Lundeen HC, Gibbs CH: Advances in occlusion, Boston, 1982, John Wright PSG.) 1 cm A B C Fig. 2-10 MOVIMENTO MASTIGATÓRIO (VISTA FRONTAL). Mastigando uma cenoura (B, ali- mento duro) parece provocar um movimento de mastigação mais amplo do que mastigar um queijo (A, alimento mole). Mascar chiclete (C, chiclete) leva a um movimento de mastigação ainda mais amplo e abran- gente. (De Lundeen HC, Gibbs CH: Advances in occlusion, Boston, 1982, John Wright PSG.) Escala *Nota da Revisão Científi ca: Um outro termo freqüentemente utilizado na língua portuguesa em substituição a “lado de não trabalho” é “lado de balanceio”. No entanto, este último termo deve ser evitado por representar um erro de tradução que perdurou por vários anos na literatura odon- tológica. PI PI Nome: AW Masculino, 31 anos Boa oclusão Mastigação no lado esquerdo AWT1S4 ALIMENTO MOLE (queijo) AWT7S2 ALIMENTO DURO (cenoura) AWT6S2 CHICLETE Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 35 GPC é menos infl uenciado pelos impulsos sensoriais e mais pelos traços de memória musculares. Apesar de a mastigação poder ocorrer bilateralmente, cer- ca de 78% das pessoas observadas têm um lado preferencial onde a maioria da mastigação ocorre.29 Este é normalmente o lado com o maior número de contatos dentários durante o deslize lateral.30,31 Pessoas que não têm preferência por lado simplesmente alternam sua mastigação de um lado para o outro. Conforme mencionado no Capítulo 1, a mastigação unilateral produz uma carga desigual nas ATMs.32-34 Sob con- dições normais isto não gera qualquer problema por causa do efeito estabilizador dos pterigóideos laterais superiores sobre os discos. Contatos Dentários durante a Mastigação Estudos anteriores35 sugeriram que, na verdade, os dentes não se contatam durante a mastigação. Especulou-se que o alimento entre os dentes, juntamente com a resposta rápida do sistema neuromuscular, impedem os contatos dentários. Outros estudos,36,37 no entanto, revelaram que ocorrem con- tatos dentários durante a mastigação. Quando o alimento inicialmente é introduzido na boca, poucos contatos ocor- rem. À medida que o bolo é diminuído, a freqüência dos con- tatos dentários aumenta. Nos estágios fi nais da mastigação, um pouco antes da deglutição, o contato ocorre durante cada mordida.38 Dois tipos de contatos foram identifi cados: (1) deslizamento, que ocorre quando as vertentes das cúspides se cruzam durante a fase de abertura e de trituração da mastiga- ção, e (2) único, que ocorre na posição de máxima intercuspi- dação.39 Aparentemente, todas as pessoas têm um certo grau de contato deslizante. A porcentagem média de contato des- lizante que ocorre durante a mastigação é estimada em 60% durante a fase de trituração, e 56% durante a fase de abertu- ra.40 O tempo médio40 de contato dentário durante a mastiga- ção é de 194 ms. Estes contatos aparentemente infl uenciam, ou até mesmo determinam a abertura inicial e a fase fi nal de trituração do movimento mastigatório.32 Tem sido demons- trado, inclusive, que a condição oclusal pode infl uenciar todo o movimento mastigatório. Durante a mastigação, a quali- dade e a quantidade de contatos dentários constantemente retransmitem informação sensorial de volta ao SNC sobre o tipo de movimento da mastigação. Este mecanismo de re- troalimentação permite a alteração no movimento mastiga- tório de acordo com o alimento que está sendo mastigado. De um modo geral, as cúspides altas e as fossas profundas promovem um movimento mastigatório predominantemente vertical, ao passo que dentes planos ou desgastados levam a um movimento mastigatório mais amplo. Quando os dentes posteriores entram em contato em um movimento lateral in- desejável, a má oclusão produz um movimento mastigatório irregular e menos repetitivo (Fig. 2-11).40 Quando os movimentos mastigatórios de pessoas nor- mais são comparados àqueles de pessoas que têm dores na ATM, diferenças marcantes podem ser observadas.41 Pessoas normais mastigam com movimentos mastigatórios que são bem defi nidos, mais repetitivos e com limites defi nidos. Quando os movimentos mastigatórios de pessoas com dor na ATM são observados, um padrão menos freqüente de re- 1 cm A B C Fig. 2-11 MOVIMENTOS MASTIGATÓRIOS LIMÍTROFES (VISTA FRONTAL) DO LADO DE TRABALHO ESQUERDO. Observe que a condição oclusal tem um efeito marcante no movi- mento de mastigação. A, Boa oclusão. B, Oclusão desgastada (bruxismo). C, Má oclusão. (De Lundeen HC, Gibbs CH: Advances in occlusion, Boston, 1982, John Wright PSG.) Escala AWT4S1 Queijo Masculino, , 31 anos AWT3S2 & AWT3S1 Limítrofe frontal Boa oclusão GST1S6 Queijo Masculino, 67 anos GST3S3 Limítrofe frontal Bruxismo/oclusão desgastada BGT1S6 Queijo Feminino, 35 anos BST2S1 Limítrofe frontal Má oclusão 36 Anatomia Funcional petição é percebido. Os movimentos são muito mais curtos e lentos e com um trajeto irregular. Esses trajetos mais len- tos, irregulares, porém repetitivos, parecem estar relaciona- dos ao movimento funcional alterado do côndilo em torno do qual a dor está localizada. Forças da Mastigação A força máxima de mordida que pode ser aplicada aos den- tes varia de indivíduo para indivíduo. Geralmente observa- se que os homens podem morder com mais força do que as mulheres. Em um estudo42 foi relatado que as mulheres têm a força máxima de mordida variando de 35,8 a 44,9 kg, enquanto a força de mordida dos homens varia de 53,6 a 64,4 kg. A força de mordida máxima que foi registrada é de 443 kg.43 Também tem sido notado que a quantidade máxima de força aplicada a um molar geralmente é muitas vezes maior do que aquela que pode ser aplicada a um incisivo. Em ou- tro estudo,44 a variação da força máxima aplicada ao primei- ro molar foi de 41,3 a 89,8 kg, enquanto a força máxima apli- cada ao incisivo central foi de 13,2 a 23,1 kg. A força máxima de mordida parece aumentar com a idade até a adolescência.45,46 Também tem sido demonstra- do42,46-49 que pessoas podem aumentar sua força de mordida máxima com a prática e com exercícios. Dessa forma, uma pessoa cuja dieta contém uma alta porcentagem de alimen- tos duros desenvolverá uma força de mordida mais forte. Este conceito pode explicar o motivo pelo qual alguns estu- dos49 revelam uma força maior de mastigação na população esquimó. A força de mastigação aumentada também pode ser atribuída às relações esqueléticas faciais. Pessoas com divergências marcantes entre a maxila e a mandíbula geral- mente não conseguem aplicar tanta força aos dentes como as pessoas com arcos maxilar e mandibular relativamente paralelos. A quantidade de força colocada nos dentes durante a mastigação varia muito de indivíduo para indivíduo. Um estudo de Gibbs et al.50 relata que a fase de trituração do movimento de fechamento tem uma força média de 26,6 kg nos dentes posteriores. Isso representa 36,2% da força má- xima de mordida de uma pessoa. Um estudo anterior que examinou diferentes consistências alimentares51 sugeriu muito menos força. Anderson relatou que a mastigação de cenouras produziu, aproximadamente, 14 kg de força nos dentes, enquanto a mastigação de carne produziu somente 7 kg. Também foi demonstrado que dor dentária52 ou dor muscular53 reduzem a quantidade de força utilizada durante a mastigação. A maior quantidade de força durante a mastigação está localizada na região do primeiro molar.54 Com alimentos mais duros, a mastigação ocorre predominantemente nas áreas de primeiro molar e segundo pré-molar.55-57 A força de mordida de indivíduos com prótese total é somente 1/4 da- quela dos indivíduos com dentes naturais.57 Função dos Tecidos Moles na Mastigação A mastigação não poderia acontecer sem a ajuda das estru- turas de tecido mole adjacentes. À medida que o alimento é introduzido na boca, os lábios guiam e controlam a ingestão, assim como selam a cavidade oral. Os lábios são especial- mente necessários quando se está introduzindo o líquido. A língua desempenha um papel preponderante não somente no paladar, mas também na distribuição do alimento dentro da cavidade oral para uma mastigação adequada. Quando o alimento é introduzido, a língua geralmente inicia o pro- cesso de divisão apertando o alimento contra o palato duro. A língua, então, empurra o alimento sobre as superfícies oclusais dos dentes, onde ele pode ser esmagado durante o movimento mastigatório. Durante a fase de abertura do próximo movimento de mastigação, a língua reposiciona o alimento parcialmente esmagado sobre os dentes para ou- tras divisões. Enquanto o alimento está sendo reposiciona- do a partir do lado lingual, o músculo bucinador (na boche- cha) está desempenhando a mesma tarefa do lado bucal. O alimento é desta, assim, continuamente recolocado nas superfícies oclusais dos dentes até que as partículas fi quem pequenas o sufi ciente para serem engolidas de forma efi - ciente. A língua também é efi ciente na divisão do alimento em porções que necessitam de mastigação adicional e em porções prontas para serem deglutidas. Depois de comer, a língua varre os dentes a fi m de remover qualquer resíduo alimentar que tenha fi cado aprisionado na cavidade oral. ATO DE ENGOLIR (DEGLUTIÇÃO) A deglutição é uma série de contrações musculares coorde- nadas que move um bolo alimentar da cavidade oral através do esôfago até o estômago. Ela consiste de atividade mus- cular refl exa, voluntária e involuntária. A decisão de engolir depende de uma série de fatores: o grau de diluição da comi- da, a intensidade do sabor e o grau de lubrifi cação do bolo alimentar. Durante a deglutição os lábios estão fechados, se- lando a cavidade oral. Os dentes são levados até sua posição de máxima intercuspidação, estabilizando a mandíbula. A estabilização da mandíbula é uma importante parte da deglutição. A mandíbula tem que estar fi xa de forma que a contração dos músculos supra e infra-hióideos possa con- trolar o movimento correto do osso hióide necessário para a deglutição. A deglutição adulta normal que usa os dentes para estabilizar a mandíbula tem sido chamada de deglutição somática. Quando os dentes não estão presentes, como na criança, nos primeiros anos de vida, a mandíbula tem que ser mantida em posição por outros meios. Na deglutição infantil, ou deglutição visceral,58 a mandíbula é estabilizada através da colocação da língua para frente, entre os arcos dentais ou coxins gengivais. Este tipo de deglutição ocorre até que os dentes posteriores erupcionem. Conforme os dentes posteriores erupcionam em oclusão, os dentes em oclusão estabilizam a mandíbula e a degluti- ção adulta é iniciada. Ocasionalmente, a transição normal da deglutição infantil para a deglutição adulta não ocorre. Isto pode ser ocasionado pela falta de suporte dos dentes por causa da posição incorreta dos dentes ou má posição do arco. A deglutição infantil também pode ser mantida quan- do ocorre desconforto durante o contato dentário em virtude de cáries ou sensibilidade dentária. A retenção prolongada da deglutição infantil pode resultar em deslocamento labial Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 39 À medida que estudamos a dor, torna-se cada vez mais evi- dente que o grau de sofrimento não tem relação direta com a quantidade de dano ao tecido. Ao invés disso, o grau de sofrimento relaciona-se mais de perto com a consciência de ameaça que o paciente tem da lesão e com a quantidade de atenção dada à mesma.66,67 Quando este fenômeno foi percebido pela primeira vez, as teorias contemporâneas sobre dor foram desafi adas. Em 1965, a teoria do portão de modulação da dor68 foi desen- volvida para explicar o fenômeno e, em 1978, esta teoria foi modifi cada.69 Modulação da dor signifi ca que impulsos ori- ginados a partir de um estímulo nocivo, que são conduzidos pelos neurônios aferentes a partir dos nociceptores, podem ser alterados antes de chegar ao córtex para reconhecimen- to. Esta alteração ou modulação do impulso sensorial pode ocorrer quando o neurônio primário faz sinapse com o inter- neurônio no momento que ele entra no SNC ou quando o estímulo ascende ao tronco encefálico e córtex. Esta altera- ção pode ter um efeito excitatório, que aumenta o estímulo nocivo, ou um efeito inibitório, que diminui o estímulo. As condições que infl uenciam a modulação do estímulo nocivo podem ser tanto psicológicas quanto físicas. Os fato- res psicológicos estão relacionados com o estado emocio- nal da pessoa (p. ex., alegre, triste, controlado, deprimido, ansioso). Além disso, o condicionamento prévio infl uencia a resposta da pessoa ao estímulo nocivo. Fatores físicos (p. ex., descansado ou estressado) também afetam a modulação da dor. A infl amação tecidual e a hiperemia tendem a aumentar a sensação de dor. Da mesma forma, a duração do estímulo tende a afetar a dor de uma maneira excitatória. Em outras palavras, quanto mais demorado for o estímulo, maior será a dor. Neste ponto é importante distinguir a diferença entre quatro termos: nocicepção, dor, sofrimento e comportamen- to doloroso. 1. Nocicepção refere-se ao estímulo nocivo originário do re- ceptor sensorial. Esta informação é levada ao SNC pelo neurônio primário. 2. Dor é uma sensação desagradável percebida no córtex, geralmente como resultado de um estímulo nociceptivo de entrada. A presença ou ausência do estímulo nocicep- tivo, no entanto, nem sempre tem relação próxima com a dor. Como mencionado, o SNC pode alterar ou modular o estímulo nociceptivo antes que ele chegue ao córtex para reconhecimento. Portanto, o estímulo nociceptivo entrando no SNC pode ser modifi cado de maneira que o córtex nunca perceba isso como dor. Esta capacidade do SNC em modular estimulação nociva é uma função ex- K, G M P, B F, V N T, D S NG TH Fig. 2-13 Articulação do som criada pelo posicionamento específi co dos lábios, língua e dentes. (De Jenkins GN: The physiology of the mouth, ed 4, Oxford, England, 1978, Blackwell Scientifi c.) 40 Anatomia Funcional tremamente importante. A modulação do estímulo noci- ceptivo pode tanto aumentar como diminuir a percepção da dor. 3. Sofrimento se refere, ainda, a outro fenômeno: como o ser humano reage à percepção da dor. Quando a dor é percebida pelo córtex, começa uma interação complexa de vários fatores. Fatores como experiências passadas, expectativas, consciência de ameaça da lesão e atenção dada à mesma determinam qual será o grau de sofri- mento do indivíduo. O sofrimento, portanto, pode não ser proporcionalmente relacionado com a nocicepção ou dor. Pacientes com pouca dor podem sofrer muito, enquanto outros com dores signifi cativas podem sofrer menos. 4. Comportamento doloroso é outro termo com signifi cado di- ferente. Comportamento doloroso se refere às ações audíveis e visíveis do indivíduo que comunicam o sofrimento aos outros. O comportamento doloroso é a única informa- ção que o clínico recebe sobre a experiência da dor. Este comportamento é tão único quanto as pessoas o são. O clínico deve reconhecer que a informação relatada ao terapeuta pelo paciente não é nem nocicepção, nem dor, nem mesmo sofrimento. O paciente só relata seu comportamento doloroso. Todavia, é a partir desta infor- mação que o clínico deve obter dados para tentar com- preender o problema do paciente; isto geralmente é uma tarefa difícil. O corpo tem pelo menos três mecanismos pelo qual a dor pode ser modulada:70 (1) o sistema de estimulação cutâ- neo não doloroso; (2) o sistema de estimulação doloroso intermitente; e (3) o sistema de modulação psicológica. Sistema de Estimulação Cutânea Não Doloroso As fi bras nervosas que levam informação ao SNC (fi bras aferentes) têm espessuras variadas. Conforme mencionado anteriormente, quanto maior o diâmetro de uma fi bra, mais rápido será a transmissão do impulso. As fi bras aferentes são divididas em quatro grupos principais de acordo com o tamanho: I (a e b), II, III e IV. Outro sistema utiliza letras mai- úsculas com subdivisões em letras Gregas: A alfa, equivalen- te ao grupo I; A beta, ao grupo II, A delta, ao grupo III, e C ao grupo IV. As divisões A delta e C são as principais conduto- ras da dor. As fi bras A (grupo I), mais espessas, transmitem as sensações de tato, movimento e posição (propriocepção). Tem sido especulado que se as fi bras mais espessas forem estimuladas ao mesmo tempo em que as mais fi nas, as fi - bras mais espessas irão mascarar a entrada dos estímulos das fi bras mais fi nas no SNC.69 De acordo com esta teoria, para que o efeito seja forte, a estimulação das fi bras mais espessas tem de ser constante e abaixo do nível da dor. O efeito é imediato e geralmente desaparece depois que o es- tímulo das fi bras mais espessas é interrompido. Os impulsos nocivos que chegam à medula espinhal também podem ser alterados em praticamente cada sinap- se no trajeto ascendente para o córtex. Esta modulação da dor é atribuída a várias estruturas chamadas, coletivamen- te, sistema inibitório descendente. O sistema inibitório descen- dente mantém uma função extremamente importante no SNC. O SNC recebe uma barragem constante de impulsos sensoriais de todas as estruturas do corpo. Este estímulo sensorial é gerado nos gânglios da raiz dorsal e pode ser percebido como doloroso.71 Um papel do sistema inibitório descendente é modular este estímulo de modo que ele não seja percebido pelo córtex como dor. Este sistema pode ser considerado como um mecanismo analgésico intrínseco. O sistema inibitório descendente, aparentemente, usa uma sé- rie de neurotransmissores, sendo a serotonina um dos mais importantes.72-74 Este sistema provavelmente desempenha também um importante papel em outras funções do tronco encefálico que foram previamente discutidas. O sistema inibitório descendente auxilia o tronco ence- fálico a suprimir ativamente os impulsos para o córtex. A importância desta função torna-se óbvia quando se obser- va o processo do sono. Para um indivíduo dormir, o tron- co encefálico e o sistema inibitório descendente têm que inibir completamente os estímulos sensoriais (p. ex., som, visão, tato) para o córtex. Sem o funcionamento correto do sistema inibitório descendente, o sono seria impossível. É também provável que um mau funcionamento do sistema inibitório descendente permita que estímulos sensoriais indesejáveis ascendam ao córtex e sejam percebidos como dor. Nesta condição, a dor é percebida na ausência de estí- mulo nocivo. Isto é exatamente o que é visto, de forma ro- tineira, nos centros de controle da dor crônica. Em outras palavras, os pacientes relatam dor signifi cante na ausência de causa aparente. A estimulação neural elétrica transcutânea (TENS) é um exemplo de sistema de estimulação cutânea não dolorosa que mascara uma sensação dolorosa. Impulsos constantes abaixo do limiar nos nervos mais espessos próximos ao lo- cal da lesão ou outra lesão bloqueiam os estímulos dos ner- vos menores, evitando que estímulos dolorosos cheguem ao cérebro. No entanto, quando o TENS é interrompido, a dor geralmente retorna. (O uso do TENS no tratamento de cer- tas condições dolorosas é discutido no Capítulo 11). Sistema de Estimulação Dolorosa Intermitente Outro tipo de sistema de modulação da dor pode ser evoca- do pela estimulação de áreas do corpo que possuem altas concentrações de nociceptores e baixa impedância elétrica. A estimulação destas áreas pode reduzir a dor sentida num local distante. Esta redução é provocada pela liberação de opiáceos endógenos chamados endorfi nas. Endorfi nas são polipeptídeos produzidos no corpo que parecem ter um efeito tão poderoso quanto (ou possivelmente mais podero- so que) o da morfi na na redução da dor. Foram identifi cados dois tipos básicos de endorfi nas: (1) as encefalinas e (2) as beta-endorfi nas. As encefalinas parecem ser liberadas no líquido cefalorraquidiano e, des- sa forma, atuam rápida e localmente na redução da dor. As beta-endorfi nas são liberadas como hormônios pela hipófi - se cerebral diretamente na corrente sangüínea. Elas agem mais lentamente do que as encefalinas, porém seu efeito é mais duradouro. Para que as endorfi nas sejam liberadas, parece que cer- tas áreas do corpo devem ser intermitentemente estimula- das até um nível de dor. Esta é a base da acupuntura: uma agulha colocada num local específi co do corpo contendo Neuroanatomia Funcional e Fisiologia do Sistema Mastigatório 41 uma alta concentração de nociceptores e baixa impedância elétrica é estimulada, aproximadamente, duas vezes por se- gundo para criar baixos níveis intermitentes de dor. A es- timulação causa a liberação de certas encefalinas no líqui- do cefalorraquidiano e isto reduz a dor sentida nos tecidos inervados por aquela área. As beta-endorfi nas são liberadas na corrente sangüínea através de exercícios físicos, especial- mente exercícios prolongados, o que ajuda a explicar porque corredores de longa distância geralmente experimentam uma sensação de euforia após uma corrida. Como elas são liberadas dentro da corrente sangüínea, as beta-endorfi nas criam um efeito que é mais generalizado através do corpo e que dura mais do que as encefalinas. Sistema de Modulação Psicológica Atualmente, a maneira pela qual o sistema de modulação psicológica funciona não é bem entendida. No entanto, acredita-se que exerça uma grande infl uência no sofrimento que a pessoa sente. Por exemplo, certos estados psicológi- cos afetam a dor, alguns de forma positiva, outros negativa- mente. Níveis intensos de estresse emocional podem estar fortemente correlacionados a níveis de dor aumentados.75 Outras condições que parecem intensifi car a sensação de dor são ansiedade, medo, depressão e desespero. Certa- mente, a quantidade de atenção dada à lesão, assim como a conseqüência da mesma, podem infl uenciar bastante o sofrimento. Pacientes que dão muita atenção à sua dor são, provavelmente, os que mais sofrem. Ao contrário, pacien- tes que são capazes de direcionar a atenção para longe da sua dor são em geral são os que sofrem menos. Distrações, como atividades psicológicas ou físicas, freqüentemente po- dem ser úteis para reduzir a dor. Estados psicológicos como confi ança, segurança, tranqüilidade e serenidade deveriam ser encorajados. O condicionamento e a experiência ante- rior também afetam o grau de dor sentida. (O sistema de modulação psicológica será discutido em capítulos poste- riores.) Fundamento Lógico Depois de se entender o conceito de modulação da dor, fi ca mais fácil de compreender que a dor é muito mais do que uma mera sensação ou refl exo. Ela é o resultado fi nal de um processo que foi alterado em suas origens (os nociceptores) e no seu destino (o córtex) por fatores físicos e psicológicos. Pode ser mais bem descrita como uma experiência, mais que apenas uma sensação, especialmente quando a dura- ção é prolongada. A experiência da dor e, eventualmente, o sofrimento, podem ser as considerações mais importantes no cuidado dos pacientes. TIPOS DE DOR Para melhor entender e tratar a dor, o clínico deve ser capaz de diferenciar sua origem de seu local. Apesar de estas pala- vras parecerem ter o mesmo sentido, isto não é verdade. O local da dor é a localização onde o paciente diz que a sente. A origem da dor é a localização onde ela realmente se origina. Clínicos podem ser induzidos a acreditar que as duas são iguais, mas nem sempre são. A dor cuja origem e o local estão no mesmo lugar é chamada dor primária. A dor primária é facilmente compreendida porque ela é, pro- vavelmente, a mais comum. Um bom exemplo seria a dor de dente. O paciente sente dor num dente específi co, e o exame dentário revela que o dente tem uma lesão cariosa grande, que de fato está causando a dor. (O local e a origem são os mesmos.) Entretanto, nem todas as dores são primárias e isto pode tornar o tratamento das desordens mastigatórias problemá- tico. Algumas dores têm seu local e sua origem em diferen- tes localizações. Em outras palavras, onde o paciente sente a dor não é onde a dor é originada. Estas são chamadas dores heterotópicas. Existem, geralmente, três tipos de dores hete- rotópicas: 1. Dor central. Quando um tumor ou outro distúrbio está presente no SNC, a dor geralmente sentida não é no SNC, mas nas estruturas periféricas. Por exemplo, alguns tumores cerebrais podem produzir dor na face, pescoço e mesmo nos ombros; e freqüentemente acompanhando essa dor estão sintomas sistêmicos de náuseas, fraqueza muscular, dormência e desordens de equilíbrio. 2. Dor projetada. Neste tipo, distúrbios neurológicos causam sensações dolorosas nas partes periféricas da mesma raiz nervosa que está com problema. Um exemplo de dor projetada seria o pinçamento de um nervo na região cer- vical, que produz uma dor irradiada para os braços, mãos e dedos. 3. Dor referida. Nesta categoria de dor, as sensações são sen- tidas não no nervo envolvido, mas em outros ramos da- quele nervo, ou mesmo num nervo totalmente diferente. Um exemplo de dor referida é a dor cardíaca. Quando um paciente sofre um infarto do miocárdio (ataque cardía- co), a dor geralmente é sentida no pescoço, na mandí- bula, radiando pelo braço esquerdo, ao invés da área do coração.76 A dor referida não acontece por acaso, mas parece seguir determinadas regras clínicas: 1. A dor referida ocorre com mais freqüência em uma única raiz nervosa, passando de um ramo para outro (p. ex., molar inferior referindo a dor para o molar superior). Neste caso, o ramo mandibular do quinto nervo crania- no (trigêmeo) está referindo a dor para o ramo maxilar do mesmo ramo. Esta é uma ocorrência bastante co- mum em relação à dor de dente. Geralmente, se a dor for referida para uma outra distribuição do mesmo ner- vo, ela ocorrerá de maneira “laminada”.77 Isto signifi ca que os incisivos referem para incisivos, pré-molares para pré-molares, e molares para molares do mesmo lado da boca. Em outras palavras, molares não referem dor para incisivos ou incisivos para molares. 2. Algumas vezes a dor referida pode ser sentida fora do nervo responsável por ela. Quando isto ocorre, ela geral- mente se move em direção à cabeça (para cima, para a cabeça) e não para baixo. 3. Na área trigeminal, a dor referida nunca atravessa a linha média a menos que ela se origine na linha média. Por exemplo, a dor na ATM direita não cruzará para o lado es- querdo da face. No entanto, isto não é verdade na região cervical ou abaixo dela; dor cérvico-espinhal pode ser algum tempo (12 a 24 horas) após o bloqueio anestésico ser administrado. Este aspecto clínico pode causar alguma confusão durante o diagnóstico. Até agora somente o efeito excitatório central foi consi- derado como um produtor de sintomas da dor. Isto é verda- deiro quando interneurônios aferentes estão envolvidos. Se o efeito excitatório central envolve interneurônios eferentes, no entanto, respostas motoras podem ser sentidas. Um tipo de efeito eferente é o desenvolvimento de uma área locali- zada de hipersensibilidade dentro dos tecidos musculares. Estas áreas são chamadas de pontos-gatilho e serão discutidas com mais detalhes em capítulos posteriores. Outro efeito eferente comum secundário à dor profunda constante é uma excitação refl exa do músculo que modifi ca ligeiramente sua atividade funcional.86 Conforme discutido anteriormente, o GPC regula as atividades rítmicas da mandíbula. Portan- to, quando a boca é aberta, os músculos depressores são ativados enquanto os músculos elevadores são relaxados. Na presença de dor, no entanto, o SNC parece responder de forma diferente. Stohler87 demonstrou que quando a dor facial é introduzida de forma experimental em indivíduos normais, o músculo masseter revela um aumento na ativi- dade eletromiográfi ca durante a abertura da boca. Esta ação muscular antagonista causa uma diminuição na velocidade e no grau de abertura da boca. Especialistas acreditam que o SNC produz esses efeitos como que para proteger a parte ameaçada.8 Este fenômeno é chamado co-contração protetora por causa da contração simultânea dos grupos musculares antagonis- tas. Bell88 reconheceu esta resposta do SNC como contratura muscular protetora. Embora esta condição seja uma respos- ta normal do SNC à dor profunda, ela pode levar à dor mus- cular se for prolongada. Co-contração protetora (contratura muscular) ocorre, normalmente, no local do estímulo de dor profunda ou em direção à cabeça (obedecendo as mesmas regras da dor referida). Sendo assim, a dor sentida na espi- nha cervical pode produzir uma resposta muscular refl exa na área do trigêmeo, como os músculos da mastigação.89 Esta condição não é rara e, infelizmente, confunde muitos dentistas que acabam tratando os músculos da mastigação como a causa primária da dor. No entanto, este tratamento isolado não resolve o problema, pois a origem da co-contra- ção protetora está na coluna cervical. A dor cérvico-espinhal deve ser tratada para eliminar de maneira efetiva o proble- ma da dor dos músculos mastigatórios. Compreender o efeito da dor profunda nos músculos mastigatórios é extremamente importante para o controle do paciente. Este tópico será discutido com maiores deta- lhes em capítulos posteriores. Um aspecto desta dor, no en- tanto, deve ser tratado neste momento porque ele é de vital importância na compreensão da dor muscular. Como já foi falado, o estímulo da dor profunda pode induzir a co-con- tração protetora. Se a co-contração é prolongada, o resulta- do será a dor muscular. Uma vez que a dor muscular esteja presente, ela representa uma origem de dor profunda, que pode continuar a produzir mais co-contração. O resultado clínico é uma condição dolorosa que é autoperpetuada. Esta condição torna-se, então, totalmente independente da fon- te original da dor. Antigamente, esta condição era chamada de espasmos musculares cíclicos. Estudos recentes, no entanto, não apóiam o conceito de que os músculos realmente so- frem espasmos.8 Portanto, esta condição é mais apropriada- mente chamada de dor muscular cíclica. Esta condição pode se tornar um problema de diagnóstico para o clínico porque o paciente continua a relatar sofrimento bem depois da fonte original da dor ter sido resolvida. Como a dor muscular cíclica é um problema clínico que precisa ser compreendido, será dado o exemplo a seguir para ilustrar algumas considerações a respeito do seu con- trole. Um terceiro molar é extraído e durante a semana seguinte ocorre uma osteíte localizada (alvéolo seco). Isto se torna uma fonte de dor profunda constante, que por meio do efeito excitatório cen- tral produz uma co-contração protetora (contratura muscular) dos músculos masseter e pterigóideo medial. O paciente retorna em cinco dias reclamando da condição dolorosa. O exame revela uma abertura mandibular limitada, causada não pela infecção, mas pela resposta muscular secundária. Se a origem da dor profunda for re- solvida rapidamente (i.e., a osteíte local for eliminada), a co-contra- ção protetora será resolvida e a abertura mandibular retornará ao normal. Se a origem não for rapidamente resolvida, a co-contração protetora poderá, por ela mesma, produzir dor, que então perpetu- ará a co-contração protetora e estabelecerá uma condição de dor muscular cíclica. Neste caso, eliminando-se a fonte original da dor (a osteíte) não se eliminará a dor muscular. O tratamento agora deve ser direcionado, especifi camente, para a desordem de dor dos músculos da mastigação, que se tornaram totalmente independente da fonte original da dor. Se efeitos excitatórios centrais envolverem os neurônios autonômicos, manifestações características serão vistas. Uma vez que o sistema autonômico controla a dilatação e a contração dos vasos sangüíneos, a variação do fl uxo san- güíneo aparecerá como um avermelhamento ou empalideci- mento dos tecidos envolvidos. Os pacientes podem se quei- xar de pálpebras inchadas ou olhos secos. Algumas vezes a conjuntiva do olho vai avermelhar. Até mesmo sintomas típicos de alergia poderão ser relatados (p. ex., um nariz en- tupido ou escorrendo). Alguns pacientes podem relatar um inchaço na face do mesmo lado da dor. Raramente é visto um inchaço clinicamente signifi cante nas desordens tempo- romandibulares, ainda que esta reclamação seja comumen- te relatada por muitos pacientes e possa representar um li- geiro edema, secundário aos efeitos autonômicos. O segredo para determinar se esses sintomas são resul- tantes do efeito excitatório central é a unilateralidade. Os clínicos deveriam se lembrar de que os efeitos excitatórios centrais não ultrapassam a linha média na área do trigêmeo. Portanto, as manifestações clínicas serão vistas somente no mesmo lado da dor profunda constante. Em outras palavras, um olho estará vermelho e o outro normal, uma narina po- derá estar congestionada e a outra não. Se a causa do pro- blema autonômico fosse sistêmica (p. ex., alergia), ambos os olhos estariam vermelhos e ambas as narinas congestio- nadas. Compreender este efeito excitatório central é fundamen- tal para o controle dos problemas de dor facial. O papel que 44 Anatomia Funcional Relato de Caso tais condições desempenham no diagnóstico e tratamento das desordens temporomandibulares será detalhadamente discutido em capítulos posteriores. Leituras Sugeridas Bell WE: Temporomandibular disorders: classification, diagnosis, manage- ment, ed 3, Chicago, 1990, Year Book Medical. Okeson JP: Bell’s orofacial pains, ed 6, Chicago, 2005, Quintessence. Referências 1. Okeson JP: Bell’s orofacial pains, ed 6, Chicago, 2005, Quintessence. 2. 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Os den- tes anteriores geralmente estão inclinados mesialmen- te, com os molares mais posteriores estando distalmente inclinados. Se sob uma vista lateral traçarmos uma linha imaginária através das pontas de cúspides vestibulares dos dentes posteriores (molares e pré-molares), uma linha curva que acompanha o plano oclusal será estabelecida (Fig. 3-4, A), que é convexa para o arco superior e côncava para o arco inferior. Estas linhas convexa e côncava se encaixam per- feitamente quando os arcos se ocluem. Esta curvatura dos arcos dentários foi primeiramente descrita por von Spee2 e por isso é chamada de curva de Spee. Quando observamos os arcos dentários por meio de uma visão frontal, é possível ver o relacionamento axial buco-lin- gual. Geralmente os dentes posteriores do arco superior têm uma inclinação ligeiramente vestibular (Fig. 3-7). Na arcada inferior os dentes posteriores têm uma inclinação levemen- te lingual (Fig. 3-8). Se uma linha é traçada através das pon- tas das cúspides vestibulares e linguais de ambos os lados dos dentes posteriores, um plano oclusal curvado será ob- servado (Fig. 3-4, B). A curvatura é convexa no arco superior e côncava no arco inferior. Novamente, se levarmos as arca- das a se ocluírem, as curvaturas dos dentes encaixar-se-ão A B C D Fig. 3-2 A, Mordida aberta anterior em um adulto associada a uma língua grande e ativa. B, Durante a deglutição a língua é vista preenchendo o espaço anterior de maneira que a boca pode ser selada para a deglutição. C, Um indivíduo jovem que desenvolveu uma mordida aberta anterior secundariamente a uma língua ativa. D, Durante a deglutição, a língua é vista preenchendo o espaço anterior, permitindo que o indi- víduo degluta. (Cortesia do Dr. Preston E. Hicks, University of Kentucky College of Dentistry, Lexington.) Fig. 3-3 A perda de um único dente pode ter efeitos signifi cantes na estabilidade de ambos os arcos. Observe que com a perda do primeiro molar inferior, o segundo e terceiro molares inferiores se inclinam mesialmente, o segundo pré-molar move-se para a distal e o primeiro molar superior antagônico é deslocado para baixo (supererupcionado). 50 Anatomia Funcional Fig. 3-5 ANGULAÇÃO DOS DENTES INFERIORES. Observe que tanto os den- tes anteriores como os posteriores estão inclinados para a mesial. (De Dempster WT, Adams WJ, Duddles RA: Arrangement in the jaws of the roots of the teeth, J Am Dent Assoc 67: 779-797, 1963). perfeitamente. Esta curvatura no plano oclusal observada frontalmente é chamada de curva de Wilson. Desde o princípio na Odontologia, observadores procu- raram desenvolver fórmulas padronizadas que pudessem descrever o relacionamento entre arcadas. Bonwill,3 um dos primeiros a descrever os arcos dentários, notou que havia um triângulo eqüilátero entre o centro dos côndilos e a área mesial de contato dos incisivos centrais inferiores. Ele o descreveu como tendo lados de 10 cm. Em outras palavras, a distância da área mesial de contato do incisivo central in- ferior até o centro de quaisquer dos côndilos era de 10 cm, e a distância entre os centros dos côndilos era de 10 cm. Em 1932, Monson4 utilizou o triângulo de Bonwill e propôs uma teoria na qual existia uma esfera com um raio de 10 cm, cujo centro estava a uma distância igual das superfícies oclusais dos dentes posteriores e dos centros dos côndilos. Apesar de esses conceitos estarem relativamente corretos, foram ultra-simplifi cados e não seriam aplicáveis a todas as situações. Reagindo a estas teorias simplistas, pesquisado- res começaram tanto a defender como a atacar essas idéias. Dessa controvérsia surgiram as teorias de oclusão que são aplicadas à Odontologia até hoje. As superfícies oclusais dos dentes são compostas por numerosas cúspides, reentrâncias e sulcos. Durante a fun- ção esses elementos oclusais permitem a quebra efi ciente do alimento e a mistura com a saliva para formar um bolo que é facilmente deglutido. Objetivando o estudo, as super- fícies oclusais dos dentes posteriores podem ser divididas em diversas áreas. A área do dente entre as pontas de cúspi- des vestibular e lingual dos dentes posteriores é chamada de mesa oclusal (Fig. 3-9). É nessa área que a maioria das forças de mastigação é aplicada. A mesa oclusal representa aproxi- madamente 50% a 60% da dimensão buco-lingual total dos dentes posteriores e está posicionada sobre o longo eixo da A B Fig. 3-4 PLANO DE OCLUSÃO. A, Curva de Spee. B, Curva de Wilson. DENTES UNIRRADICULARES Incisivos Caninos Pré-molares MOLARES INFERIORES Raízes mesiais Raízes distais Posicionamento e Oclusão Dental 51 Fig. 3-6 ANGULAÇÃO DOS DENTES SUPERIORES. Os dentes anteriores estão incli- nados mesialmente, enquanto os dentes mais pos- teriores tornam-se mais inclinados para a distal em relação ao osso alveolar. (De Dempster WT, Adams WJ, Duddles RA: Arrangement in the jaws of the roots of the teeth, J Am Dent Assoc 67:779-797, 1963.) DENTES UNIRRADICULARES estrutura radicular. É considerada como o aspecto interno do dente porque ela se situa entre as pontas de cúspides. De modo parecido, a área oclusal fora das pontas das cúspides é chamada de aspecto externo. Os aspectos internos e externos do dente são compostos de vertentes que se estendem des- de a ponta da cúspide até a fossa central (FC), ou até a altura do contorno das superfícies vestibular e lingual dos dentes. Dessa forma essas vertentes são chamadas vertentes internas ou externas (Fig. 3-10). As vertentes interna ou externa são mais bem identifi cadas pela descrição da cúspide em que ela está. Por exemplo, a vertente interna da cúspide vesti- bular do primeiro pré-molar superior direito identifi ca uma Fig. 3-7 ANGULAÇÃO DOS DENTES SUPERIORES. Observe que todos os dentes posteriores estão ligeiramente inclinados para vestibular. (De Dempster WT, Adams WJ, Duddles RA: Arrangement in the jaws of the roots of the teeth, J Am Dent Assoc 67:779-797, 1963). DENTES UNIRRADICULARES Incisivos Caninos Pré-molares PRIMEIRO PRÉ-MOLAR Raízes vestibulares Raízes palatinas MOLARES SUPERIORES Raízes mesiovestibulares Raízes distovestibulares Raízes palatinas Incisivos Caninos Pré-molares PRIMEIRO PRÉ-MOLAR Raízes vestibulares Raízes palatinas MOLARES SUPERIORES Raízes mesio-vestibulares Raízes distovestibulares Raízes palatinas 54 Anatomia Funcional pecto externo tem algum signifi cado funcional. Esta área foi assim chamada de aspecto funcional externo. Um pequeno aspecto externo em cada cúspide cêntrica pode funcionar contra a vertente interna da cúspide não cêntrica (Fig. 3- 15). Como essa área ajuda na divisão do alimento durante a mastigação, as cúspides não cêntricas também têm sido chamadas de cúspides de cisalhamento. A função principal das cúspides não cêntricas é minimi- zar o impacto tecidual, como já foi mencionado, e manter o bolo alimentar na mesa oclusal para mastigação. As cúspides não cêntricas também dão estabilidade mandibular, de ma- neira que quando os dentes estão totalmente ocluí dos haja uma relação oclusal exata e defi nida. Este relacionamento dos dentes na sua máxima intercuspidação é chamado de posição de máxima intercuspidação habitual (MIH). Se a mandíbula se mover lateralmente em relação a esta posição, o contato não cêntrico irá contatar e guiar a mandíbula. Da mesma forma, se a boca for aberta e depois fechada, as cúspides não cêntricas ajudarão a guiar a mandíbula de volta à MIH. Além disso, durante a mastigação estas cúspides terminam os contatos de guia que enviam informações ao sistema neuromuscular, que controla o movimento da mastigação. Assim sendo, é apropriado que as cúspides não cêntricas sejam também chamadas de cúspides-guia. RELAÇÃO DE CONTATO OCLUSAL BUCO-LINGUAL Quando os arcos dentários são vistos pela oclusal, alguns aspectos característicos podem ser visualizados, tornando- os úteis para compreender o relacionamento interoclusal dos dentes. 1. Se uma linha imaginária for estendida sobre todas as pontas das cúspides vestibulares dos dentes inferiores posteriores, a linha buco-oclusal (BO) é estabelecida. Num arco normal esta linha fl ui suave e continuamente, revelando a forma geral do arco. Ela também representa a demarcação entre os aspectos internos e externos das cúspides vestibulares (Fig. 3-16). 2. Da mesma maneira, se uma linha imaginária for esten- dida através das cúspides linguais dos dentes superio- res posteriores, a linha linguo-oclusal (LO) é observada. Esta linha revela a forma geral do arco e representa a demarcação entre os aspectos externos e internos destas cúspides cêntricas (Fig. 3-17). 3. Se uma terceira linha imaginária for estendida através dos sulcos centrais de desenvolvimento dos dentes pos- teriores, superiores e inferiores, a linha da FC será esta- belecida. Num arco normal bem alinhado, esta linha é contínua e revela a forma do arco (Fig. 3-18). Uma vez que a linha FC é estabelecida, é necessário ob- servar uma relação importante das áreas de contato proxi- mal. Estas áreas geralmente estão ligeiramente localizadas para vestibular em relação à linha FC (Fig. 3-19), o que pro- porciona um nicho lingual maior e um nicho vestibular me- nor. Durante a função, o nicho lingual maior atuará como principal área de escape para o alimento que está sendo mastigado. Quando ocluímos os dentes, a maior parte do alimento é levada para a língua, que é mais efi ciente em re- tomar a comida até a mesa oclusal do que o bucinador e a musculatura perioral. Para visualizar as relações buco-linguais dos dentes pos- teriores em oclusão, deve-se simplesmente combinar as li- nhas imaginárias apropriadas. Como é demonstrado na Fig. 3-20, a linha BO dos dentes inferiores oclui com a linha FC dos dentes superiores. Simultaneamente, a linha LO dos dentes superiores oclui com a linha FC dos dentes inferiores. 1/6 1/3 Fig. 3-14 PRIMEIRO MOLAR INFERIOR. A posição das pon- tas de cúspides cêntricas e não-cêntricas é demonstrada em relação à largura total buco-lingual do dente. Fig. 3-15 O aspecto funcional externo (AFE) da cúspide cêntrica é a única área da vertente externa com signifi cado funcional. AFE Fig. 3-16 Linha buco-oclusal (BO) do arco mandibular esquerdo. Linha BO AFE Posicionamento e Oclusão Dental 55 RELAÇÃO DE CONTATO OCLUSAL MESIODISTAL Como foi mencionado, os contatos oclusais ocorrem quan- do as cúspides cêntricas contatam a linha FC oposta. Visto pela vestibular, estas cúspides contatam, geralmente, em uma das duas áreas: (1) áreas da FC, e (2) áreas da crista marginal e do nicho. O contato entre as pontas de cúspide e as áreas da fossa central tem sido comparado à trituração do pistilo no gral. Quando duas superfícies curvas desiguais se encontram so- mente algumas partes se contatam em determinado tempo, deixando outras partes livres de contato para atuarem como áreas de escape para a substância que está sendo esma- gada. À medida que a mandíbula se movimenta durante a mastigação, áreas diferentes se contatam criando diferentes áreas de escape. Este movimento aumenta a efi ciência da mastigação. O segundo tipo de contato oclusal ocorre entre as pontas de cúspides e as cristas marginais. As cristas marginais são áreas ligeiramente elevadas e convexas nas bordas mesiais e distais das superfícies oclusais, onde se ligam à superfí- cie interproximal dos dentes. A parte mais elevada da crista marginal é somente um pouco convexa. Assim sendo, este tipo de contato é mais bem descrito como a ponta da cús- pide contatando uma superfície plana. Nesta relação a pon- ta da cúspide pode penetrar facilmente no alimento, sendo formadas áreas de escape em todas as direções. Conforme a mandíbula se move lateralmente, a área verdadeira de con- tato muda, aumentando a efi ciência da mastigação. Deve-se observar que a ponta de cúspide não é a única responsável pelo contato oclusal. Há uma área circular ao redor da ver- dadeira ponta da cúspide com um raio de aproximadamente 0,5 mm que proporciona área de contato com a superfície do dente antagonista. Quando o relacionamento dentário interarcos normal é visto pela lateral, pode-se observar que cada dente oclui com dois dentes antagonistas. No entanto, existem duas exceções à regra: os incisivos centrais inferiores e os ter- ceiros molares superiores. Nestes casos os dentes ocluem somente com um dente antagônico. Assim sendo, na ar- cada inteira cada dente oclui com seu correspondente na arcada oposta mais um dente adjacente. Esta relação de um dente para dois dentes ajuda a distribuir as forças oclu- sais a muitos dentes e, de forma geral, à toda a arcada. Isso também ajuda a manter alguma integridade do arco, mes- mo quando se perde um dente, uma vez que os contatos oclusais de estabilização ainda são mantidos pelos dentes remanescentes. Numa relação normal os dentes inferiores estão ligeira- mente posicionados para lingual e mesial em relação aos seus opostos. Isto ocorre tanto com os dentes posteriores Fig. 3-17 Linha linguo-oclusal (LO) do arco maxilar direito. Linha LO Fig. 3-18 Linha da fossa central (FC) dos arcos dentários esquerdos. Linha FC Linha FC 56 Anatomia Funcional como com os anteriores (Fig. 3-21). Ao examinar o padrão comum de contato dos arcos dentários é importante estudar os dentes posteriores e anteriores separadamente. RELAÇÃO OCLUSAL COMUM DOS DENTES POSTERIORES Ao se examinar a relação oclusal dos dentes posteriores, grande parte da atenção é direcionada para o primeiro mo- lar. O primeiro molar inferior geralmente está situado ligeira- mente para mesial em relação ao primeiro molar superior. Classe I As seguintes características identifi cam a relação molar mais comum encontrada na dentição natural, descrita origi- nalmente por Angle6 como uma relação de Classe I: 1. A cúspide mesio-vestibular do primeiro molar inferior oclui na área do nicho entre o segundo pré-molar supe- rior e o primeiro molar. 2. A cúspide mesio-vestibular do primeiro molar superior alinha-se diretamente sobre o sulco vestibular do pri- meiro molar inferior. 3. A cúspide mesio-lingual do primeiro molar superior está situada na área da FC do primeiro molar inferior. Fig. 3-19 As áreas de contato proximal entre os dentes posteriores geralmente estão localizadas vestibulares à linha da fossa central. Área de nicho vestibular A B Fig. 3-20 RELAÇÃO OCLUSAL NORMAL DOS ARCOS DENTÁRIOS. A, As cúspides vestibu- lares (cêntricas) dos dentes inferiores ocluem na fossa central (FC) dos dentes superiores. B, As cúspides palatinas (cêntricas) dos dentes superiores ocluem na fossa central dos dentes inferiores. BO, Buco-oclusal; LO, linguo-oclusal. Linha FC Área de nicho lingual Linha BO Linha LO Linha FC Posicionamento e Oclusão Dental 59 aproximadamente 9 mm de comprimento, um pouco mais da metade da coroa é ainda visível pelo lado vestibular. A inclinação vestibular dos dentes anteriores é indicati- va de uma função diferente daquela dos dentes posteriores. Conforme mencionado, a principal função dos dentes poste- riores é auxiliar efetivamente na quebra do alimento duran- te a mastigação, enquanto mantém a dimensão vertical de oclusão. Os dentes posteriores estão alinhados de tal forma que as forças verticais intensas de fechamento possam ser suportadas por eles sem efeito adverso aos dentes ou às es- truturas de suporte. A inclinação vestibular dos dentes ante- riores superiores e a maneira pela qual os dentes inferiores ocluem com eles não favorecem a resistência às forças oclu- sais intensas. Se durante o fechamento mandibular forças intensas ocorrerem sobre os dentes anteriores, a tendência é deslocar os dentes superiores vestibularmente. Assim sen- do, numa oclusão normal, os contatos dos dentes anteriores em MIH são muito mais leves do que os dos dentes poste- riores. Não é raro encontrar ausência de contato dos dentes anteriores na MIH. A fi nalidade dos dentes anteriores não é manter a dimensão vertical de oclusão, mas guiar a man- díbula durante os vários movimentos laterais. Os contatos dentários anteriores que fornecem guia para a mandíbula são chamados de guia anterior. A guia anterior tem um papel importante na função do sistema mastigatório. Suas características são ditadas pela exata posição e relação dos dentes anteriores, o que pode ser examinado tanto horizontal como verticalmente. A dis- tância horizontal pela qual os dentes anteriores superiores sobrepõem os anteriores inferiores, conhecida como a sobre- posição horizontal (algumas vezes chamada traspasse horizontal) (Fig. 3-27), é a distância entre a borda incisal vestibular dos incisivos superiores e a superfície vestibular dos incisivos inferiores na MIH. A guia anterior também pode ser exami- nada no plano vertical, conhecida como sobreposição verti- cal (algumas vezes chamada traspasse vertical). A sobreposição vertical é a distância entre as bordas incisais dos dentes anteriores opostos. Como já mencionado, a oclusão normal tem aproximadamente 3 a 5 mm de sobreposição vertical. Uma característica importante da guia anterior é determina- da pela inter-relação intrincada de ambos os fatores. Outra função importante dos dentes anteriores é iniciar o ato da mastigação. Os dentes anteriores incisam o alimen- to assim que ele é introduzido na cavidade oral. Uma vez incisado, ele é rapidamente levado aos dentes posteriores para uma divisão mais completa. Os dentes anteriores tam- bém desempenham um importante papel na fala, no supor- te labial e na estética. Em algumas pessoas esta relação normal dos dentes an- teriores não existe. As variações podem resultar de diferen- tes padrões de desenvolvimento e de crescimento. Algumas dessas relações têm sido identifi cadas através da utilização de termos específi cos (Fig. 3-28). Quando a pessoa tem uma mandíbula subdesenvolvida (relação molar de Classe II) os dentes anteriores inferiores geralmente contatam o terço gen- gival da superfície palatina dos dentes superiores. Esta rela- ção anterior é chamada de mordida profunda (traspasse vertical profundo). Se numa relação anterior de Classe II os incisivos centrais e laterais superiores estão com uma inclinação labial normal, então é considerada como uma divisão 1. Quando os incisivos superiores estão inclinados para a lingual, a relação anterior é classifi cada como Classe II, Divisão 2. Uma mordida extremamente profunda pode resultar em contato dos incisi- vos superiores com o tecido gengival do palato. Em outros indivíduos nos quais pode haver um cresci- mento mandibular acentuado, os dentes anteriores inferio- res geralmente estão posicionados para frente e contatam com as bordas incisais dos dentes anteriores superiores (re- lação molar de Classe III). Isto é chamado de relação topo a topo. Em casos extremos os dentes anteriores inferiores po- dem estar posicionados tão para frente que não há contato na posição de MIH (Classe III). Outra relação dos dentes anteriores é aquela que tem um traspasse vertical negativo. Em outras palavras, com os dentes posteriores em máxima intercuspidação, os den- tes anteriores opostos não se sobrepõem ou mesmo não se contatam. Esta relação anterior é chamada mordida aber- ta anterior. Numa pessoa com mordida aberta anterior não haverão contatos dentais anteriores durante o movimento mandibular. CONTATOS OCLUSAIS DURANTE O MOVIMENTO MANDIBULAR Até agora foram discutidas somente as relações estáticas dos dentes anteriores e posteriores. Deve-se lembrar, no en- Fig. 3-27 Relação interarco normal dos dentes anteriores mos- trando dois tipos de traspasse. TO, horizontal; TV, vertical. TV TO 60 Anatomia Funcional Movimento Mandibular Protrusivo Um movimento mandibular protrusivo ocorre quando a mandíbu- la se move para frente a partir da posição de MIH. Qualquer área de um dente que contate um dente oposto durante o movimento protrusivo é considerada como um contato pro- trusivo. Numa relação normal de oclusão os contatos protru- sivos predominantes ocorrem nos dentes anteriores entre as bordas incisais e vestibulares dos incisivos inferiores contra as áreas da fossa palatina e bordas incisais dos incisivos su- periores. Estes últimos são considerados as vertentes-guia dos dentes anteriores (Fig. 3-29). Nos dentes posteriores o movimento protrusivo leva as cúspides cêntricas inferiores tanto, que o sistema mastigatório é extremamente dinâmi- co. As articulações temporomandibulares e a musculatura associada permitem que a mandíbula se movimente em to- dos os três planos (sagitaI, horizontal e frontal). Juntamente com esses movimentos aparecem os contatos dentais em potencial. É importante compreender os tipos e locais dos contatos que ocorrem durante os movimentos mandibula- res básicos. O termo excêntrico tem sido usado para descrever qualquer movimento da mandíbula partindo da posição de MIH que resulte em contato dentário. Três movimentos ex- cêntricos básicos são discutidos: (1) protrusivo, (2) latero- trusivo e (3) retrusivo. A Fig. 3-28 A, Seis variações de relação dos dentes anteriores. Classe I (normal) Classe II, divisão 1 (mordida profunda) Classe II, divisão 2 Classe III (topo a topo) Classe III Mordida aberta anterior Posicionamento e Oclusão Dental 61 (vestibulares) a cruzar anteriormente as superfícies oclusais dos dentes superiores (Fig. 3-30). Os contatos protrusivos posteriores ocorrem entre as vertentes distais das cúspides palatinas superiores com as vertentes mesiais das fossas e cristas marginais opostas. O contato protrusivo posterior também pode ocorrer entre as vertentes mesiais das cúspi- des vestibulares inferiores e as vertentes distais das fossas e cristas marginais opostas. Movimento Mandibular Lateroprotrusivo Durante um movimento mandibular lateral os dentes posteriores inferiores direito e esquerdo cruzam com seus antagonistas em diferentes direções. Se, por exemplo, a mandíbula se move lateralmente para a esquerda (Fig. 3-31), os dentes posteriores inferiores es- querdos irão se movimentar lateralmente sob seus dentes opostos. No entanto, os dentes posteriores inferiores direi- tos irão se movimentar medialmente em relação aos seus dentes opostos. As áreas potenciais de contato desses den- tes estão em diferentes locais e assim sendo são designados por nomes diferentes. Olhando mais atentamente os dentes posteriores no lado esquerdo durante um movimento late- ral esquerdo, observa-se que os contatos podem ocorrer em duas áreas de vertente. Uma é entre a vertente interna das cúspides vestibulares superiores e a vertente externa das cúspides vestibulares inferiores. A outra é entre as vertentes externas das cúspides palatinas e as vertentes internas das cúspides linguais inferiores. Ambos os contatos são chama- dos de laterotrusivos. Para diferenciar aqueles que ocorrem entre cúspides linguais opostas daqueles que ocorrem entre cúspides vestibulares opostas, o termo contato laterotrusivo lingual para lingual é usado para descrever o primeiro. O ter- mo contato de trabalho também é comumente usado para am- bos os contatos laterotrusivos. Como a maioria das funções F E CB D G Fig. 3-28, continuação. B, Classe I normal. C, Classe lI, divisão 1, mordida profunda. D, Classe lI, divisão 2. E, Classe III, topo a topo. F, Classe IlI. G, Mordida aberta anterior. 64 Anatomia Funcional contato durante qualquer movimento mandibular excêntrico estará numa área previsível da superfície oclusal do dente. Cada vertente da cúspide cêntrica tem potencial para forne- cer contato excêntrico com o dente oposto. A vertente inter- na da cúspide não cêntrica também pode contatar um dente oposto durante um movimento excêntrico específi co. A Fig. 3-33 mostra os contatos oclusais que poderiam ocorrer nos primeiros molares superiores e inferiores. Devemos lembrar que estas áreas são somente áreas potenciais de contato porque todos os dentes posteriores não contatam durante todos os movimentos mandibulares. Algumas vezes alguns dentes se contatam durante um movimento mandibular es- pecífi co, o que desarticula os dentes remanescentes. Se, no entanto, um dente contatar um dente oposto durante um movimento mandibular específi co, este diagrama mostrará a área de contato. Quando os dentes anteriores ocluem de maneira usual, os locais potenciais de contato durante os vários movimen- tos mandibulares também são previsíveis e são mostrados na Fig. 3-34. Leituras Sugeridas Ash MM, Nelson SJ: Wheeler’s dental anatomy, physiology, and occlusion, ed 8, St Louis, 2003, Saunders. Kraus BS, Jordan RE, Abrams L: Dental anatomy and occlusion, Baltimore, 1973, Waverly. Moyer RE: Handbook of orthodontics for the student and general practi- tioner, ed 3, Chicago, 1973, Year Book Medical. Referências 1. Sarver DM, Proffit WR: Special considerations in diagnosis and treatment planning. In Graber T, Vanarsdall R, Vig K, editors: Orthodontics: current principles and techniques, ed 4, St Louis, 2005, Mosby, pp 3-70. 2. Von Spee FG: Prosthetic dentistry, Chicago, 1928, Medico-Dental Publishing, pp 49-54. 3. Bonwill WGA: Geometrical and mechanical laws of articulation, Trans Odontol Soc Pa 119-133, 1885. 4. Monson GS: Applied mechanics to the theory of mandibular move- ments, Dent Cosmos 74:1039-1053, 1932. 5. Ash MM, Nelson SJ: Wheeler’s dental anatomy, physiology, and occlu- sion, ed 8, St Louis, 2003, Saunders, pp 29-64. 6. Angle EH: Classification of malocclusion, Dent Cosmos 41:248-264, 1899. 7. Kraus BS, Jordon RE, Abrahams L: Dental anatomy and occlusion, Baltimore, 1973, Waverly, pp 226-230. B LL B B L M D B L M D LT LT LT LT R MT LT P R LT MT P R LT MT P R MT LT P D DM M A B Fig. 3-33 A, Locais potenciais de contato durante os movimentos excêntricos (vista lateral e proximal). B, Locais potenciais de contato em volta das cúspides dos primeiros molares superior e inferior (vista oclusal). Os contatos são demonstrados. LT, laterotrusivo; MT, mediotrusivo; P, protrusivo; R, retrusivo. Laterotrusivo LT LT PPP P P P Fig. 3-34 Locais usuais de contatos excêntricos dos dentes ante- riores superiores. LT, laterotrusivos; P, protrusivo. Retrusivo Mediotrusivo Protrusivo 4 C A P Í T U L O 65 Mecânica do Movimento Mandibular “A natureza nos abençoou com um sistema mastigatório maravilho- so e dinâmico, permitindo-nos funcionar e, por causa disto, existir.” – JPO Omovimento mandibular ocorre como uma série complexa de atividades tridimensionais de rota-ção e translação inter-relacionadas. É determi- nado pela atividade combinada e simultânea de ambas as articulações temporomandibulares (ATMs). Apesar de as ATMs não poderem funcionar inteiramente indepen- dente uma da outra, elas raramente funcionam com movi- mentos idênticos e conjuntos. Para melhor entender a complexidade do movimento mandibular, é interessante primeiro isolar os movimentos que ocorrem em apenas uma única ATM. Os tipos de movimento que ocorrem são discutidos inicialmente, e então os movimentos tridi- mensionais da articulação são divididos em movimentos dentro do mesmo plano. TIPOS DE MOVIMENTO Dois tipos de movimentos ocorrem na ATM: rotação e trans- lação. MOVIMENTO DE ROTAÇÃO O Dorland's Illustrated Medical Dictionary defi ne rotação como "o processo de girar em torno de um eixo; movimento de um corpo em torno do seu eixo, chamado eixo de rotação."1 No sistema mastigatório, a rotação ocorre quando a boca abre e fecha em torno de um ponto fi xo ou eixo dentro dos côn- dilos. Em outras palavras, os dentes podem ser separados e novamente ocluídos sem uma mudança de posição dos côndilos (Fig. 4-1). Na ATM, a rotação ocorre como movimento dentro da cavidade inferior da articulação. Então, ela é o movimento entre a superfície superior do côndilo e a superfície inferior do disco articular. O movimento de rotação da mandíbula pode ocorrer em todos os três planos de referência: horizon- tal, frontal (vertical) e sagital. Em cada plano ele ocorre em torno de um ponto, chamado eixo. O eixo de rotação de cada plano será descrito e ilustrado. Eixo Horizontal de Rotação O movimento mandibular em torno do eixo horizontal é um movimento de abrir e fechar. Ele é chamado de movimento de dobradiça, e o eixo horizontal em torno do qual ele ocorre é chamado de eixo de dobradiça (Fig. 4-2). O movimento de do- bradiça é provavelmente o único exemplo de atividade man- dibular na qual um movimento de rotação "puro" ocorre. Em todos os outros movimentos, a rotação ao redor do eixo é acompanhada pela translação do eixo. Quando os côndilos estão em sua posição mais superior na fossa articular e a boca é aberta exclusivamente por rota- ção, o eixo ao redor do qual o movimento ocorre é chamado de eixo terminal de dobradiça. O movimento rotacional em torno do eixo terminal pode ser facilmente demonstrado, mas ra- ramente ocorre durante a função normal. Eixo Frontal (Vertical) de Rotação O movimento mandibular em torno do eixo frontal ocorre quando um côndilo se move anteriormente para fora da po- sição terminal de rotação enquanto o eixo vertical do côn- dilo oposto permanece na posição terminal de rotação (Fig. 4-3). Devido à inclinação da eminência articular, que deter- mina que o eixo frontal se incline enquanto o côndilo em movimento ou orbitante se move para frente, esse tipo de movimento isolado não ocorre naturalmente. Eixo Sagital de Rotação O movimento mandibular em torno do eixo sagital ocorre quando um côndilo se move inferiormente enquanto o outro permanece na posição terminal de rotação (Fig. 4-4). Como os ligamentos e musculatura da ATM evitam um desloca- mento inferior do côndilo (luxação), este tipo de movimento isolado não ocorre naturalmente. No entanto, ele ocorre em conjunto com outros movimentos, quando os côndilos or- bitantes movimentam-se para baixo e para frente através da eminência articular. MOVIMENTOS DE TRANSLAÇÃO A translação pode ser defi nida como um movimento no qual cada ponto do objeto que se move tem, simultaneamente, a mesma velocidade e direção. No sistema mastigatório ela ocorre quando a mandíbula se move para frente, como na protrusão. Os dentes, côndilos e ramos se movem todos na mesma direção e na mesma extensão (Fig. 4-5). 66 Anatomia Funcional Fig. 4-1 Movimento de rotação sobre um ponto fi xo do côndilo. Fig. 4-2 Movimento de rotação em torno do eixo horizontal. Fig. 4-3 Movimento de rotação em torno do eixo frontal (vertical). Fig. 4-4 Movimento de rotação em torno do eixo sagital. A translação ocorre dentro da cavidade superior da ar- ticulação entre a superfície superior do disco articular e a superfície inferior da fossa articular (i.e., entre o complexo côndilo-disco e a fossa articular). Durante a maioria dos movimentos normais da mandí- bula, tanto a rotação como a translação ocorrem simultane- amente2 (i.e., enquanto a mandíbula está rotacionando em torno de um ou mais eixos, cada um dos eixos está transla- dando ou mudando sua orientação no espaço). Isto resulta em movimentos complexos que são extremamente difíceis de visualizar. Neste capítulo, para simplifi car a tarefa de en- tendê-los, nós consideramos que a mandíbula se movimen- ta isoladamente em cada um dos três planos de referência. MOVIMENTOS BORDEJANTES NUM MESMO PLANO O movimento mandibular é limitado pelos ligamentos e pe- las superfícies articulares das ATMs, assim como pela mor- fologia e alinhamento dos dentes. Quando a mandíbula se move através dos limites externos do movimento, limites reprodutíveis e descritíveis resultam nos chamados movi- mentos bordejantes. O movimento bordejante e os movimentos funcionais típicos da mandíbula serão descritos para cada plano de referência. dentes anteriores superiores resulta num movimento ânte- ro-inferior da mandíbula (Fig. 4-12). Isso continua até que os dentes anteriores superiores e inferiores estejam numa relação de topo a topo, durante a qual uma trajetória hori- zontal é seguida. O movimento horizontal continua até que as bordas incisais dos dentes inferiores ultrapassem as bor- das incisais dos dentes superiores (Fig. 4-13). Neste ponto, a mandíbula move-se numa direção superior até os dentes posteriores contatarem (Fig. 4-14). As superfícies oclusais dos dentes posteriores determinam, então, o trajeto restan- te até o movimento de protrusão máxima, o qual se une com a posição mais superior do movimento bordejante de aber- tura anterior (Fig. 4-15). Quando uma pessoa não tem diferença entre a RC e a máxima intercuspidação, a descrição inicial do movimento bordejante de contato superior é modifi cada. De RC não há deslizamento superior para MIH. O movimento de protrusão inicial engrena imediatamente os dentes anteriores e a man- díbula move-se inferiormente, como detectado pela anato- mia lingual dos dentes anteriores superiores (Fig. 4-16). Movimentos Funcionais Os movimentos funcionais ocorrem durante a atividade fun- cional da mandíbula. Eles geralmente acontecem dentro dos movimentos bordejantes e por isso são considerados movimentos livres. A maioria das atividades funcionais re- quer intercuspidação máxima e, por isso, geralmente come- ça na MIH ou abaixo dela. Quando a mandíbula está em re- pouso, encontra-se localizada a aproximadamente 2 a 4 mm abaixo da MIH (Fig. 4-17).4,5 Esta posição tem sido chamada de posição clínica de repouso. Alguns estudos sugerem que ela é bastante variável.6,7 Também tem sido determinado que a chamada posição clínica de repouso não é a posição na qual os músculos têm sua menor quantidade de atividade ele- tromiográfi ca.7 Os músculos da mastigação estão aparente- mente em seu menor nível de atividade quando a mandíbula está posicionada a aproximadamente 8 mm inferior e 3 mm anterior a MIH.7 Nesta posição, a força da gravidade puxando a mandí- bula para baixo está em equilíbrio com a elasticidade e re- sistência ao estiramento dos músculos elevadores e outros tecidos moles que sustentam a mandíbula. Assim sendo, esta posição é melhor descrita como a posição de repouso Fig. 4-10 Relacionamento típico dos dentes quando os côndilos estão na posição de relação cêntrica (RC). Mecânica do Movimento Mandibular 69 RC Fig. 4-11 A força aplicada aos dentes quando os côndilos estão em relação cêntrica (RC) criará um movimento súpero-anterior da mandíbula até a posição de máxima intercuspidação (MIH). RC Fig. 4-12 À medida que a mandíbula se movimenta para frente, o contato das bordas incisais dos dentes anteriores inferiores com as superfícies palatinas dos dentes anteriores superiores cria um movimento inferior. Fig. 4-13 Movimento horizontal da mandíbula à medida que as bor- das incisais dos dentes superiores e inferiores se cruzam. Fig. 4-14 O movimento contínuo da mandíbula para frente resulta em um movimento superior quando os dentes anteriores ultrapas- sam a posição de topo a topo, resultando em contato dos dentes posteriores. MIH Fig. 4-16 O movimento bordejante de contato superior quando os côndilos estão em posição de relação cêntrica (RC) é o mesmo da posição de máxima intercuspidação (MIH) dos dentes. Fig. 4-17 A mandíbula na posição postural (PP) está localizada de 2 a 4 mm abaixo da posição de máxima intercuspidação (MIH). Fig. 4-18 Movimento de mastigação com movimentos bordejantes no plano sagital. RC, relação cêntrica; MIH, posição de máxima in- tercuspidação. Fig. 4-15 O movimento contínuo para frente é determinado pelas superfícies dos dentes posteriores até que o movimento de pro- trusão máxima, estabelecido pelos ligamentos, seja alcançado. Esta posição de protrusão máxima une-se ao ponto mais superior do movimento bordejante de abertura anterior. 70 Anatomia Funcional clínico. Nela, a pressão intra-articular da articulação é re- duzida e se aproxima do deslocamento. Como a função não pode ocorrer prontamente a partir desta posição, o refl exo miotático, que contrabalança as forças da gravidade e man- tém a mandíbula na posição mais disponível ao funciona- mento, 2 a 4 mm abaixo de MIH, é ativado. Nesta posição, os dentes podem ser rápida e efetivamente levados a ocluir para função imediata. Os níveis aumentados de atividade muscular eletromiográfi ca nesta posição são indicativos de refl exo miotático. Como esta não é uma posição de repouso verdadeira, a posição na qual a mandíbula é mantida é mais apropriadamente chamada de posição postural. Se o movimento de mastigação for examinado no plano sagital, o movimento será visto começando em MIH, ocor- rendo para baixo e ligeiramente para frente até a posição desejada de abertura (Fig. 4-18). Ele então retorna em um trajeto mais regular ligeiramente posterior ao movimento de abertura (como descrito no Capítulo 2). Efeitos da Postura no Movimento Funcional. Quando a cabeça está numa posição ereta e alinhada, a posição pos- tural da mandíbula está localizada de 2 a 4 mm abaixo da MIH. Se os músculos elevadores se contraem, a mandíbula será elevada diretamente à MIH. No entanto, se a face for direcionada a aproximadamente 45 graus para cima, a posi- ção postural da mandíbula será alterada para uma posição ligeiramente retruída. Esta alteração está relacionada com o estiramento e alongamento dos vários tecidos que estão inseridos e que sustentam a mandíbula.8 Se os músculos elevadores se contraem com a cabeça nesta posição, o trajeto de fechamento será ligeiramen- te posterior ao trajeto de fechamento na posição ereta. O contato dental, conseqüentemente, ocorrerá posterior à MIH (Fig. 4-19). Como esta posição dos dentes é geralmente instável, ocorre um deslize, levando a mandíbula à máxima intercuspidação. Vem sendo afi rmado que a posição normal da cabeça durante a alimentação é com a face direcionada para baixo uns 30 graus.9 Esta posição é referida como a posição alerta de alimentação. Nela, a mandíbula move-se anteriormente ligei- ramente até a posição postural ereta. Se os músculos eleva- dores se contraem com a cabeça nesta posição, o trajeto de fechamento será ligeiramente anterior ao trajeto da posição ereta. Por isso, o contato dentário irá ocorrer antes da MIH. Tal alteração no fechamento leva a contatos mais fortes dos dentes anteriores. A posição alerta de alimentação pode ser importante ao se considerar a relação funcional dos dentes. Uma extensão da cabeça em 45 graus também é uma po- sição importante porque esta é geralmente a postura que a RC = MIH MIH RC PP MIH cabeça assume quando bebemos. Nesta postura, a mandí- bula é mantida mais posterior à máxima intercuspidação, e por esta razão o fechamento com a cabeça para trás freqüen- temente resulta em contatos dentários posteriores à MIH. PLANO BORDEJANTE HORIZONTAL E MOVIMENTOS FUNCIONAIS Tradicionalmente, um aparelho conhecido como traçador de arco Gótico tem sido utilizado para registrar os movimentos mandibulares no plano horizontal. Ele consiste em uma placa de registro presa aos dentes superiores e um estilete de registro preso aos dentes inferiores (Fig. 4-20). Quando a mandíbula se movimenta, o estilete traça uma linha na placa de registro que coincide com este movimento. Os movimen- tos bordejantes da mandíbula no plano horizontal podem, desta forma, ser facilmente registrados e examinados. Quando os movimentos mandibulares são visualizados num plano horizontal, pode ser visto um traçado de forma romboidal que tem quatro componentes de movimentos distintos (Fig. 4-21), além de um componente funcional: 1. Bordejante lateral esquerdo 2. Bordejante lateral esquerdo continuado com protrusão Mecânica do Movimento Mandibular 71 A B C Fig. 4-19 FINAL DO MOVIMENTO DE FECHAMENTO RELACIONADO COM A POSIÇÃO DA CABEÇA. A, Com a cabeça ereta, os dentes são elevados diretamente à máxima intercuspidação a partir da posição postural. B, Com a cabeça elevada a 45 graus, a posição postural da mandíbula torna-se mais posterior. Quando os dentes ocluem, o contato dentário ocorre posteriormente à posição de intercus- pidação (MIH). C, Com a cabeça angulada a 30 graus para frente (posição alerta de alimentação), a posição postural da mandíbula torna-se mais anterior. Quando os dentes ocluem, o contato dos dentes ocorre anteriormente à máxima intercuspidação. RC, Relação cêntrica. RC Fig. 4-20 Um traçador de arco Gótico é usado para registrar os movimentos mandibulares bordejantes no plano horizontal. À me- dida que a mandíbula se movimenta, o estilete preso aos dentes inferiores traça uma trajetória na placa de registro presa nos dentes superiores. MIH Cabeça na posição ereta Cabeça estendida (45 graus para cima) RC MIH MIH RC Cabeça na posição alerta de alimentação (30 graus para baixo) 74 Anatomia Funcional Movimentos Bordejantes de Abertura Laterais Esquerdos Da posição bordejante superior lateral esquerda máxima, um movimento de abertura da mandíbula produz um traça- do convexo lateral. Ao se aproximar da abertura máxima, os ligamentos se retesam e produzem um movimento direcio- nado medialmente, que causa um retorno da linha média mandibular para coincidir com a linha média da face (Fig. 4-30). Movimentos Bordejantes Superiores Laterais Direitos Uma vez que os movimentos bordejantes frontais esquerdos são registrados, a mandíbula retorna à máxima intercuspi- dação. A partir desta posição, um movimento lateral é feito para a direita (Fig. 4-31), que é semelhante ao movimento bordejante superior lateral esquerdo. Pequenas diferenças podem ocorrer devido aos contatos dentários envolvidos. Movimentos Bordejantes de Abertura Laterais Direitos Da posição bordejante lateral direita máxima, um movimen- to de abertura da mandíbula produz um trajeto convexo lateral similar ao movimento de abertura esquerdo. Ao se aproximar da abertura máxima, os ligamentos se retesam e produzem um movimento direcionado medialmente, que leva a um retorno da linha média mandibular a coincidir com a linha média da face, para encerrar este movimento de abertura esquerdo (Fig.4-32). Movimentos Funcionais Como nos outros planos, os movimentos funcionais no pla- no frontal começam e terminam na MIH. Durante a mastiga- ção, a mandíbula desce diretamente para inferior até que se alcance a abertura desejada. Ela então se movimenta para o lado o qual o bolo alimentar se encontra e eleva-se. Ao se aproximar da máxima intercuspidação, o bolo alimentar Fig. 4-27 Amplitude funcional dentro dos movimentos bordejantes horizontais. RC, Relação cêntrica; EC, área utilizada nos primeiros es- tágios da mastigação; PTT, posição topo a topo dos dentes anterio- res; MIH, posição de intercuspidação; LC, área utilizada nos últimos estágios da mastigação um pouco antes de a deglutição ocorrer. 1 2 3 4 Fig. 4-28 Movimentos bordejantes mandibulares no plano frontal. 1, Superior lateral esquerdo; 2, abertura lateral esquerda; 3, superior lateral direito; 4, abertura lateral direita; MIH, posição de intercuspi- dação; PP, posição postural. MIH MIH Fig. 4-29 Movimento bordejante superior lateral esquerdo regis- trado no plano frontal. Fig. 4-30 Movimento bordejante de abertura lateral esquerdo re- gistrado no plano frontal. RC LC EC PTT PP é quebrado entre os dentes antagônicos. Nos milímetros fi nais do fechamento, a mandíbula rapidamente retorna à MIH (Fig. 4-33). ENVELOPE DE MOVIMENTO A combinação dos movimentos mandibulares bordejantes nos três planos (sagital, horizontal e frontal) produz um envelope de movimento tridimensional (Fig. 4-34), que re- presenta a amplitude de movimento máxima da mandíbu- la. Apesar de o envelope ter esta forma característica, serão encontradas diferenças de pessoa para pessoa. A superfície superior do envelope é determinada pelos contatos dentá- rios, enquanto as outras bordas são determinadas primaria- mente pelos ligamentos e pela anatomia da articulação, que restringem ou limitam os movimentos. MOVIMENTO TRIDIMENSIONAL Para demonstrar a complexidade do movimento mandibu- lar, uma excursão lateral direita aparentemente simples será usada. Quando a musculatura começa a se contrair e a mo- ver a mandíbula para a direita, o côndilo esquerdo é empur- Mecânica do Movimento Mandibular 75 Fig. 4-32 Movimento bordejante de abertura lateral direito regis- trado no plano frontal. Fig. 4-31 Movimento bordejante superior lateral direito registrado no plano frontal. Fig. 4-33 Movimento funcional dentro do movimento bordejante mandibular registrado no plano frontal. MIH, Posição de intercus- pidação. Fig. 4-34 Modelo de envelope de movimento. MIH 76 Anatomia Funcional rado para fora de sua posição de RC. Enquanto o côndilo es- querdo está orbitando anteriormente ao redor do eixo fron- tal do côndilo direito, ele encontra a vertente posterior da eminência articular, o que causa um movimento inferior do côndilo em volta do eixo sagital, resultando em uma incli- nação do eixo frontal. Além disso, o contato dos dentes an- teriores produz um movimento inferior ligeiramente maior na parte anterior da mandíbula do que na parte posterior, o que resulta num movimento de abertura em torno do eixo horizontal. Como o côndilo esquerdo está se deslocando an- terior e inferiormente, o eixo horizontal está se deslocando anterior e inferiormente. Este exemplo ilustra que, durante um simples movimento lateral, ocorre um movimento ao redor de cada eixo (sagital, horizontal e vertical) e simultaneamente cada eixo se inclina para acomodar o movimento que está ocorrendo em torno dos outros eixos. Tudo isso ocorre dentro do envelope de movi- mento e é controlado de forma complexa pelo sistema neuro- muscular, para evitar dano a qualquer das estruturas orais. Leituras Sugeridas Pietro AJ: Concepts of occlusion. A system based on rotational centers of the mandible, Dent Clin North Am 607-620, 1963. Posselt U: The physiology of occlusion and rehabilitation, ed 2, Philadelphia, 1968, FA Davis. Referências 1. Dorland’s illustrated medical dictionary, ed 30, Philadelphia, 2003, Saunders, p 1643. 2. Lindauer SJ, Sabol G, Isaacaso RJ, Davidovitch M: Condylar move- ment and mandibular rotation during jaw opening, Am J Orthod Dentofacial Orthop 107:573-577, 1995. 3. 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Os masseteres e pterigóideos mediais posicionam os côndilos anterior e superiormente. O tônus muscular do pterigóideo lateral inferior posiciona os côndilos anterior- mente contra a vertente posterior da eminência articular. No intuito de resumir, vamos dizer que a posição arti- cular ortopedicamente mais estável, de acordo com os mús- culos, é aquela na qual os côndilos estão posicionados na sua posição mais superior e anterior na fossa articular, com- pletamente apoiados na vertente posterior da eminência articular. No entanto, esta descrição não está completa até que a posição do disco articular seja considerada. A relação articular ideal só é alcançada quando os discos articulares estão corretamente interpostos entre os côndilos e as fossas articulares. A posição dos discos na articulação em repouso é infl uenciada pela pressão interarticular, pela morfologia própria dos discos e pelo tônus dos músculos pterigóideos laterais superiores. Estes últimos levam o disco a rotacionar nos côndilos tão para frente quanto os espaços reservados a eles (determinados pela pressão interarticular) e a espessu- ra da borda posterior dos discos permitirem. A defi nição completa de posição articular ortopedicamen- te mais estável, portanto, é quando os côndilos estão em suas posições mais súpero-anteriores na fossa articular, apoiados nas vertentes posteriores das eminências articulares com os discos articulares interpostos corretamente. Os côndilos as- sumem esta posição quando os músculos elevadores são ati- vados sem interferência oclusal. Por esta razão, esta posição é considerada a posição ME ideal da mandíbula. Nesta posição ME, as superfícies articulares e os tecidos da articulação estão alinhados de tal maneira que as forças exercidas pela musculatura não criam dano algum. Quando um crânio seco é examinado, a cobertura anterior e superior da fossa mandibular pode ser vista como bem espessa e fi - siologicamente capaz de suportar forças pesadas.19,20 Assim sendo, durante a função e o repouso, esta posição é tanto anatômica como fi siologicamente saudável. A posição ME é agora descrita no Glossary of Prosthodontic Terms como RC.21 Apesar de defi nições anteriores de RC9-11 enfatizarem a posição mais retruída dos côndilos, a maioria dos clínicos têm percebido que o côndilo assentado na po- sição súpero-anterior é muito mais aceitável sob o ponto de vista ortopédico. A controvérsia surge sobre se existe uma variação ântero- posterior na posição mais superior do côndilo. Dawson6 su- geriu que isso não existe, o que implica que se os côndilos se movimentam para a frente ou para trás a partir de sua posição mais superior, eles também se movimentarão para baixo. Isto pode estar correto para uma articulação jovem e sadia, mas deve-se entender que nem todas as articulações são iguais. A força posterior aplicada na mandíbula é contra- balanceada na articulação pelas fi bras horizontais internas do ligamento temporomandibular (TM). Portanto, a posição mais súpero-posterior dos côndilos é, por defi nição, uma posição ligamentosa. Se este ligamento estiver fi rme, poderá haver pouca diferença entre a posição mais superior retruí- da, a posição mais superior (i.e., posição de Dawson) e a po- sição súpero-anterior (ME). No entanto, se o ligamento TM estiver frouxo ou alongado, uma variação ântero-posterior de movimento pode ocorrer enquanto o côndilo permanece na sua posição mais superior (Fig. 5-3). Quanto mais poste- rior estiver localizada a força na mandíbula, mais alongado estará o ligamento e mais posterior será a posição condilar. O grau de liberdade ântero-posterior varia de acordo com a saúde das estruturas articulares. Uma articulação saudável parece permitir pouco movimento condilar posterior a partir da posição ME.22 Infelizmente, a saúde da articulação pode ser difícil de avaliar clinicamente. Estudos sobre o ciclo da mastigação mandibular de- monstraram que em indivíduos saudáveis o côndilo de ro- tação (de trabalho) se movimenta posteriormente para a posição de intercuspidação (MIH) durante a etapa de fecha- mento do ciclo (Capítulo 2). Por esta razão, algum grau de movimento posterior condilar para a MIH é normal durante a função. Na maioria das articulações, este movimento é pequeno (1 mm ou menos). No entanto, se ocorrerem al- terações nas estruturas articulares (p. ex., estiramento dos ligamentos temporomandibulares, desordens articulares), a extensão ântero-posterior do movimento pode ser aumenta- da. O clínico deveria reconhecer que a posição mais superior e posterior (ou retruída) para o côndilo não é uma posição fi siológica ou anatomicamente saudável (Fig. 5-4). Nesta posição, a força pode ser aplicada à porção posterior do disco, lâmina retrodiscal inferior e aos tecidos retrodiscais. Como os tecidos retrodiscais são altamente vascularizados e bem supridos por fi bras nervosas sensoriais,23 eles não es- tão estruturados anatomicamente para receber força. Dessa forma, quando a força é aplicada nessa área, há um grande potencial para provocar dor e/ou causar danos.24-28 Quando um crânio seco é examinado sob ponto de vista anatômico, a porção posterior da fossa mandibular parece Fig. 5-2 A força direcional dos músculos elevadores primários (temporal, masseter e pterigóideo medial) coloca os côndilos na fossa numa posição súpero-anterior. Critérios para uma Oclusão Funcional Ideal 79 Força direcional bem fi na e aparentemente não confi gurada para suportar carga. Esta característica enfatiza ainda mais o fato de que a posição condilar superior e posterior não parece ser a posi- ção funcional ideal da articulação. Curiosamente, como exposto no Capítulo 1, os ligamen- tos não participam ativamente na função articular. Eles exis- tem para atuar como estruturas limitantes de alguns mo- vimentos articulares de extensão ou bordejantes. Mesmo assim, durante anos foi discutida na Odontologia a idéia do uso da posição bordejante ligamentosa como uma posição funcional ideal para os côndilos. Tal relação bordejante não seria considerada ideal para nenhuma outra articulação. Por que tal princípio ortopédico seria diferente para a ATM? Como algumas vezes é difícil determinar clinicamente as condições extra e intracapsular da articulação, é conve- niente não colocar força posterior na mandíbula na tentativa de se localizar a posição ME da articulação. A maior ênfase deveria ser dada na orientação e direcionamento dos côn- dilos até sua posição mais súpero-anterior nas fossas. Isto é conseguido tanto com técnicas de orientação mandibular bilateral como através da própria musculatura (como é dis- cutido em capítulos posteriores). Até o fi nal deste texto, a RC será defi nida como a posição mais súpero-anterior dos côndilos nas fossas articulares com os discos interpostos corretamente. Pode-se dizer, então, que RC e a posição ME são a mesmas. Esta defi nição de RC está se tornando am- plamente aceita.21 Um outro conceito de estabilidade mandibular18 sugere que uma posição diferente é a ideal para os côndilos. Nela, os côndilos são descritos como estando na sua posição ideal quando eles transladam para baixo até certo ponto nas vertentes posteriores das eminências articulares (Fig. 5- 5). Como os côndilos estão posicionados para baixo e para a frente, o complexo do disco o acompanha; dessa forma, forças exercidas no osso são dissipadas de maneira efi caz. O exame do crânio seco revela que esta área da eminên- cia articular é bastante espessa e fi siologicamente capaz de suportar força. Por esta razão, esta posição, assim como a posição mais súpero-anterior, parece ser anatomicamente capaz de suportar forças. Na verdade, este é um movimento protrusivo normal da mandíbula. A principal diferença entre essa posição e a posição ME reside na função muscular e na estabilidade mandibular. Para posicionar os côndilos para baixo e para frente nas vertentes posteriores da eminência articular, os músculos pterigóideos laterais inferiores devem se contrair. Isto é com- patível com um movimento protrusivo. Entretanto, assim que os músculos elevadores são contraídos, a força aplicada aos côndilos por esses músculos está numa direção superior e ligeiramente anterior. Esta força direcional tenderá a levar os côndilos para a posição súpero-anterior como já descrito (i.e., posição ME). Se a posição de máxima intercuspidação Fig. 5-3 A posição mais súpero-anterior do côndilo (linha contínua) é músculo-esqueleticamente a posição mais estável da articulação. No entanto, se as fi bras horizontais internas do ligamento tempo- romandibular permitirem algum movimento posterior do côndilo, a força posterior irá deslocar a mandíbula desta posição para uma posição mais posterior e menos estável (linha pontilhada). As duas posições estão no mesmo nível superior. 80 Anatomia Funcional Fig. 5-4 Uma força posterior aplicada na mandíbula pode deslocar o côndilo da posição músculo-esqueleticamente estável. Fig. 5-5 O movimento para a frente da mandíbula traz os côndilos para baixo na eminência articular. Um aumento na atividade mus- cular é provável. (MIH) fosse estabelecida nesta posição mais avançada, exis- tia uma discrepância entre a posição oclusal mais estável e a posição articular mais estável. Portanto, para que o paciente abra e feche a boca em MIH (o que claro é, necessário para a função), o músculo pterigóideo lateral inferior deve manter um estado de contração para impedir que os côndilos se elevem para posições mais súpero-anteriores. Por isso, esta posição representa uma posição “estabilizada por músculo”, não uma posição ME. Supor que esta posição irá requerer mais atividade muscular para manter a estabilidade man- dibular é lógico. Como a dor muscular é a reclamação mais comum de pacientes com desordens mastigatórias, não pareceria vantajoso estabelecer uma condição oclusal que possa, na realidade, aumentar a atividade muscular. Por esta razão, não parece que esta posição seja compatível com re- pouso muscular,29 e ela não pode ser considerada a posição mais funcional ou mais fi siológica. Outro conceito que tem sido proposto para ajudar o den- tista a localizar a posição condilar ideal é mediante uso de estimulação elétrica e relaxamento subseqüente dos mús- culos elevadores. Neste conceito, os músculos elevadores são expostos a pulsos elétricos ou eletricamente estimula- dos em intervalos regulares na tentativa de produzir relaxa- mento. Esta técnica tem sido usada por fi sioterapeutas há anos com sucesso na redução da tensão muscular e da dor. Portanto, pode ser que existam boas razões para o uso da estimulação elétrica para reduzir dor muscular, apesar de os dados serem escassos (Capítulo 11). Os seguidores desse conceito acreditam que se esta pulsação é feita com a ca- beça posicionada de forma ereta, os músculos elevadores continuarão a relaxar até que suas atividades EMG alcan- cem o nível mais baixo possível, que eles descrevem como repouso. Este repouso representa o ponto no qual as forças da gravidade que puxam a mandíbula para baixo se igualam à elasticidade dos músculos e ligamentos que sustentam a mandíbula (tônus viscoelástico). Na maioria dos casos sig- nifi ca que a mandíbula está posicionada para baixo e para a frente assentada na posição súpero-anterior. O fato de esta posição ter a menor atividade EMG não signifi ca que esta seja uma posição razoável a partir da qual a mandíbu- la deveria funcionar. Como discutido neste texto, a posição de repouso (menor atividade EMG) pode ser encontrada quando a boca está aberta de 8 a 9 mm, ao passo que a posi- ção postural está localizada de 2 a 4 mm abaixo da MIH pre- parada para função.30,31 Presumir que a posição mandibular ideal está no ponto de menor atividade EMG é um pensa- mento ingênuo e certamente não embasado com dados. No entanto, seguidores desta fi losofi a acreditam que esta é a posição na qual a oclusão deveria ser estabelecida. Pelo menos três considerações importantes questionam a probabilidade de esta posição ser uma posição mandibu- lar ideal. A primeira está relacionada ao fato de que esta po- sição é quase sempre encontrada para baixo e para a frente da posição condilar assentada. Se os dentes forem restaura- dos nesta posição e os músculos elevadores se contraírem, os côndilos estarão assentados superiormente, deixando apenas os dentes posteriores sem oclusão. A única maneira pela qual a posição oclusal pode ser mantida é conservando o músculo pterigóideo lateral inferior em um estado par- cial de contração, apoiando os côndilos contra a vertente posterior da eminência articular. Isto, claro, representa uma posição “músculo-suportada” e não uma posição ME, como previamente discutido. Outra consideração em encontrar uma posição mandibu- lar desejável pela pulsação dos músculos elevadores é que esta posição é quase sempre encontrada em uma dimensão vertical aumentada. A maior força que pode ser gerada pelos músculos elevadores ocorre quando os dentes estão separa- dos de 4 a 6 mm.32 É nesta distância que os músculos eleva- dores são mais efi cientes para partir os alimentos. Reconsti- tuir os dentes em máxima intercuspidação nesta dimensão vertical provavelmente geraria um grande aumento de forças sobre os dentes e as estruturas periodontais, aumentando o potencial de destruição. Uma terceira consideração na utilização desta técnica é que, uma vez relaxados os músculos, a posição mandibu- lar fi ca mais suscetível a ação da gravidade. Por este moti- vo, a posição da cabeça do paciente pode mudar a relação maxilar/ mandibular adquirida. Se o paciente move sua cabe- ça para frente ou para trás, ou mesmo a inclina para direita ou esquerda, a posição mandibular provavelmente mudará. Não parece que este tipo de variação seja confi ável quando se restaura os dentes. Outra preocupação com esta técnica é que basicamen- te cada indivíduo, saudável ou com desordem mandibular, assumirá uma posição da mandíbula aberta e para a frente seguindo a pulsação muscular. Portanto, esta técnica não é útil para distinguir pacientes dos controles saudáveis nor- mais. Quando isto ocorre, indivíduos saudáveis correm o risco de ser candidatos a terapia desnecessária, que pode inclusive ser bastante extensa. Em resumo, de um ponto de vista anatômico, pode-se concluir que a posição mais superior e anterior dos côndilos repousando nos discos contra as vertentes posteriores das eminências articulares é a posição mais saudável ortopedi- camente. De um ponto de vista muscular também parece que esta posição ME dos côndilos é ideal. Um valor adicio- nal desta posição é que ela tem a vantagem protética de ser reproduzível. Como os côndilos estão numa posição supe- rior bordejante, um movimento terminal de dobradiça pode ser executado repetidamente (Capítulo 9). CONTATOS FUNCIONAIS IDEAIS DOS DENTES A posição ME que acabou de ser descrita foi considerada so- mente em relação aos fatores que infl uenciam a articulação e os músculos. Conforme discutido previamente, o padrão de contato oclusal infl uencia fortemente o controle muscular da posição mandibular. Quando o fechamento da mandíbula na posição ME cria uma condição oclusal instável, o sistema neuromuscular rapidamente inicia uma ação muscular apro- priada para localizar a posição mandibular que irá resultar numa condição oclusal mais estável. Por esta razão, a po- sição ME das articulações pode ser mantida apenas quan- do está em harmonia com uma condição oclusal estável. A condição oclusal estável deveria permitir o funcionamento efetivo enquanto minimiza o dano a qualquer componente Critérios para uma Oclusão Funcional Ideal 81 84 Anatomia Funcional Ambos os métodos eliminam as forças fora do eixo, per- mitindo dessa forma que o ligamento periodontal absorva efetivamente as forças potencialmente nocivas ao osso e possa, essencialmente, reduzi-Ias. Quantidade de Força Aplicada aos Dentes Os critérios para a oclusão ideal estão assim estabelecidos: pri- meiro, contato homogêneo e simultâneo de todos os dentes possíveis deve ocorrer quando os côndilos mandibulares esti- verem em sua posição mais súpero-anterior, apoiados nas ver- tentes posteriores da eminência articular com os discos apro- priadamente interpostos. Segundo, cada dente deve contatar de tal forma que as forças do fechamento sejam direcionadas através do longo eixo do dente. Um aspecto importante que deixou de ser discutido está relacionado à complexidade da ATM. A ATM é capaz de ex- cursões laterais e protrusivas que permitem o contato den- tário durante os diferentes tipos de movimentos excêntricos. Estas excursões laterais permitem que forças horizontais se- jam aplicadas aos dentes. Conforme mencionado, forças ho- rizontais não são bem aceitas pelas estruturas de suporte e pelo sistema neuromuscular, ainda que a complexidade das articulações requeira que alguns dentes suportem a carga dessas forças inaceitáveis. Dessa forma, vários fatores de- vem ser considerados quando se identifi ca qual(is) dente(s) pode(m) melhor aceitar essas forças horizontais. O sistema de alavanca da mandíbula pode ser compa- rado com um quebra-nozes. Quando uma noz está sendo quebrada, ela é colocada entre as alavancas do quebra-no- zes e a força é aplicada. Se ela for extremamente dura, será posicionada mais perto do fulcro para aumentar a probabi- lidade de ser quebrada. Isto demonstra que forças maiores podem ser aplicadas a um objeto quando ele está localizado próximo ao fulcro. Isto também pode ser afi rmado sobre o sistema mastigatório (Fig. 5-13). Se uma noz dura precisa ser quebrada entre os dentes, a posição mais desejável não é entre os dentes anteriores, mas entre os dentes posteriores, porque, conforme a noz é posicionada mais próxima do ful- cro (ATM) e da área das forças vetoriais (músculos masseter e pterigóideo medial), maiores serão as forças aplicadas aos dentes posteriores do que aos dentes anteriores.46-48 A mandíbula, no entanto, é mais complexa. Enquanto o fulcro do quebra-nozes é fi xo, o do sistema mastigatório é livre para se mover. Como resultado, quando forças pesadas são aplicadas a um objeto nos dentes posteriores, a man- díbula é capaz de se deslocar para baixo e para frente para obter a relação oclusal que melhor complete a tarefa deseja- da. Este deslocamento dos côndilos cria uma posição man- dibular instável. Grupos musculares adicionais, tais como pterigóideos laterais superiores e inferiores e os temporais são acionados para estabilizar a mandíbula, resultando num sistema mais complexo do que um simples quebra-nozes. Entender este conceito e compreender que forças pesadas aplicadas aos dentes podem criar alterações patológicas nos leva a uma conclusão óbvia: as forças horizontais da- nosas do movimento excêntrico devem ser direcionadas aos dentes anteriores, que estão posicionados mais longe do fulcro e das forças vetoriais. Como a quantidade de força que pode ser aplicada aos dentes anteriores é menor do que as que podem ser aplicadas aos dentes posteriores, a proba- bilidade de dano é minimizada.48-50 Quando todos os dentes anteriores são examinados, tor- na-se claro que os caninos são os mais adequados para rece- ber as forças horizontais que ocorrem durante os movimen- tos excêntricos.37,49,51,52 Eles possuem as raízes mais longas e mais largas e, portanto, a melhor proporção coroa/ raiz.53 Eles também são envolvidos por osso compacto denso, o A A B B Fig. 5-11 Quando dentes antagônicos se contatam nas vertentes, a direção da força não é através do longo eixo dos dentes. Em vez disso, são estabelecidas forças de inclinação (setas) que tendem a causar compressão (A) de certas áreas do ligamento periodontal e distensão (B) de outras áreas. A B Fig. 5-12 Carga axial pode ser conseguida por (A) contatos ponta de cúspide-superfície plana ou (B) contatos recíprocos das vertentes (chamados de tripodização). qual tolera melhor as forças do que o faz o osso medular encontrado ao redor dos dentes posteriores.54 Outra vanta- gem dos caninos reside no impulso sensorial e no efeito re- sultante sobre os músculos da mastigação. Aparentemente, menos músculos são ativados quando os caninos contatam durante os movimentos excêntricos do que quando os den- tes posteriores contatam.55,56 Níveis menores da atividade muscular diminuiriam as forças das estruturas dentárias e articulares, minimizando a patologia. Assim sendo, quan- do a mandíbula se movimenta numa excursão laterotrusi- va direita ou esquerda, os caninos superiores e inferiores são os dentes apropriados para contatar e dissipar as forças horizontais enquanto desocluem ou desarticulam os den- tes posteriores. Quando existe esta condição, o paciente é considerado como tendo guia canina ou desoclusão pelos caninos (Fig. 5-14). Muitos pacientes, no entanto, não possuem os caninos numa posição apropriada para receber forças horizontais; outros dentes devem contatar durante os movimentos ex- cêntricos. A alternativa mais favorável à guia canina é cha- mada de função em grupo. Na função em grupo, vários dentes no lado de trabalho contatam durante o movimento latero- trusivo. A função em grupo mais desejável consiste no cani- no, nos pré-molares e algumas vezes na cúspide mesioves- tibular do primeiro molar (Fig. 5-15). Qualquer contato late- rotrusivo mais posterior do que a porção mesial do primeiro molar não é desejável por causa da quantidade aumentada de força que pode ser criada quando os contatos se aproxi- mam do fulcro (ATM). O clínico deveria se lembrar de que os contatos cúspide vestibular-cúspide vestibular são mais desejáveis durante os movimentos laterotrusivos do que os contatos cúspide lin- gual-cúspide lingual (trabalho lingual a lingual) (Fig. 5-16, A). Os contatos laterotrusivos (tanto na guia canina quanto na função em grupo) precisam fornecer guia adequada para desocluir os dentes do lado oposto do arco (mediotrusivo ou lado de não-trabalho) imediatamente (Fig. 5-16, B). Os contatos mediotrusivos podem ser destrutivos ao sistema mastigatório devido à quantidade e à direção das forças que podem ser aplicadas na articulação e estruturas dentárias.* Alguns estudos sugeriram que contatos mediotrusivos são percebidos pelo sistema neuromuscular de forma diferen- te de outros tipos de contato oclusal. Estudos EMG59,60 de- monstram que todos os contatos dentários são, por nature- za, inibitórios. Em outras palavras, a presença dos contatos dentários tende a interromper ou inibir a atividade mus- cular. Isto é resultado dos proprioceptores e nociceptores no LPD, que, quando estimulados, criam respostas inibitórias. Outros estudos61 EMG sugerem ainda que a presença de contatos mediotrusivos nos dentes posteriores aumenta a atividade muscular. Apesar de o aumento na atividade mus- cular poder ser demonstrado, a razão da sua presença não é clara. (Estes conceitos são discutidos com mais detalhes no Capítulo 7.) O que é claro, no entanto, é que contatos mediotrusivos deveriam ser evitados quando uma oclusão funcional ideal é estabelecida. Quando a mandíbula se movimenta para frente no contato protrusivo, forças horizontais danosas podem ser aplicadas aos dentes. Como ocorre com os movimentos laterais, os dentes anteriores podem receber e dissipar melhor essas forças.48,49 Portanto, durante a protrusão, os dentes anteriores, e não os posteriores, deveriam contatar (Fig. 5-17). Os dentes anteriores deveriam fornecer contato ou guia adequada para desocluir os dentes posteriores. Os contatos posteriores na protrusão pa- recem fornecer forças desfavoráveis ao sistema mastigatório devido a quantidade e direção da força que é aplicada.** Durante esta discussão, tornou-se evidente que os den- tes anteriores e posteriores funcionam de maneira bastan- te diferente. Os dentes posteriores se comportam de forma Critérios para uma Oclusão Funcional Ideal 85 A B Fig. 5-13 A quantidade de força que pode ser gerada entre os dentes depende da distância da articulação temporomandibular e dos vetores das forças musculares. Uma força muito maior pode ser gerada nos dentes posteriores (A) do que nos dentes anteriores (B). *Referências 12, 13, 47, 52, 57, 58. **Referências 12, 13, 47, 52, 57, 58. 86 Anatomia Funcional bastante efetiva ao receber forças aplicadas durante o fecha- mento da boca. Eles recebem bem estas forças basicamen- te porque a posição deles no arco é tal que a força pode ser direcionada através de seus longos eixos e então mais efi cientemente dissipada. Os dentes anteriores, no entanto, não estão tão bem posicionados no arco para receber forças pesadas. Eles estão normalmente posicionados num ângulo labial em relação à direção de fechamento, de forma que a carga axial é quase impossível.53,55 Se os dentes anteriores superiores receberem contatos oclusais pesados durante o fechamento, existe uma grande probabilidade de suas es- truturas de suporte não serem capazes de tolerar as forças e eles serem deslocados labialmente. Isto é um achado co- mum em pacientes que perderam suporte dentário posterior (colapso posterior da mordida) (Fig. 5-18). Os dentes anteriores, ao contrário dos dentes poste- riores, estão em posição apropriada para receber as forças dos movimentos mandibulares excêntricos. Geralmente, portanto, pode-se afi rmar que os dentes posteriores fun- cionam mais efetivamente em parar a mandíbula durante o fechamento, enquanto os dentes anteriores funcionam mais efetivamente em guiar a mandíbula durante os movimentos excêntricos. Observando estas funções, torna-se claro que os dentes posteriores deveriam contatar ligeiramente com mais força do que os dentes anteriores, quando os dentes estão ocluídos em MIH. Esta condição é descrita como oclu- são mutuamente protegida.51,52 Considerações Posturais e Contatos Dentários Funcionais Como discutido no Capítulo 4, a posição postural da mandí- bula é aquela mantida durante períodos de inatividade. Essa se encontra geralmente de 2 a 4 mm abaixo da MIH e pode ser infl uenciada em certo grau pela posição da cabeça. O A B Fig. 5-14 GUIA CANINA. A, Movimento laterotrusivo. B, Apa- rência clínica. A B Fig. 5-15 GUIA POR FUNÇÃO EM GRUPO. A, Movimento laterotrusivo. B, Aparência clínica. L LA B Fig. 5-16 A, Dentes posteriores durante um movimento latero- trusivo. Podem ocorrer contatos entre as cúspides antagonistas vestibulares (V) e linguais (L). Quando a guia por função em grupo é desejável, os contatos vestibulares são utilizados. Os contatos lin- guais não são desejáveis durante movimento excêntrico. B, Den- tes posteriores durante um movimento mediotrusivo. Os contatos ocorrem entre as cúspides linguais dos dentes superiores e as cús- pides vestibulares dos dentes inferiores. Fig. 5-17 Movimento protrusivo com guia anterior. V V
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