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Realismo Ofensivo e Realismo Defensivo (2010), Notas de estudo de Relações Internacionais

Aumento dos gastos militares da Venezuela - Realismo Ofensivo e Realismo Defensivo

Tipologia: Notas de estudo

2013
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Baixe Realismo Ofensivo e Realismo Defensivo (2010) e outras Notas de estudo em PDF para Relações Internacionais, somente na Docsity! INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br O AUMENTO DOS GASTOS MILITARES DA VENEZUELA: REALISMO OFENSIVO E DEFENSIVO Bia Albernaz, Eduardo Carneiro Luz, Felipe Betim, Luiza Torzatto, Matias Jimenez e Rafael Medina” Resumo O artigo tem como objetivo revelar as pressões sistêmicas responsáveis pelo recente aumento dos gastos militares da Venezuela, que não estão recebendo a devida atenção, nem no meio acadêmico, nem na mídia. Para isso, analisaremos as causas desse comportamento venezuelano por meio de dois marcos teóricos de fundamental importância na teoria das Relações Internacionais, ambos derivados do neo-realismo de Kenneth Waltz: o realismo ofensivo e o realismo defensivo. O medo e a incerteza resultantes da grande assimetria regional e internacional aparecem nessas duas análises como fatores essenciais para a explicação. No fim, compararemos as análises ressaltando as semelhanças e as diferenças entre elas, buscando a que tem maior capacidade de explicar a realidade venezuelana. Palavras-chave: Venezuela, Aumento dos Gastos Militares, Neo-realismo. Abstract This article's main objective is to highlight the systemic factors responsible to the recent increase in Venezuela's military spending that are not receiving the needful attention of the scholars and the media. Therefore, we analyse the causes of that behaviour by two distinguished theoretical frames, both with the same origins, the neo-realism of Kenneth Waltz: offensive realism and defensive realism. Insecure and fear resultant from the giant regional and international asymmetry comes in those two analyses as essentials factors to the explication. In the end, we compare both analyses emphasising the similitude and the differences between them, looking for that which is more capable of explaining the Venezuelan reality. Key Words: Venezuela, Increase in Military Spending, Neo-realism. * Alunos do curso de Graduação em Relações Internacionais da PUC/RJ. Trabalho recebido em 01/07/2010. Aprovado para publicação em 15/07/2010. INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br Introdução a atualidade, a Venezuela é uma nação portadora de uma vanguarda política e ideológica, sendo certa exceção no panorama da América do Sul. Percebemos que a compreensão das problemáticas de poder nessa nação contribuirá ainda no entendimento do avanço da aquisição de material bélico em outras nações do subcontinente. Na última década, a Venezuela investiu milhões de dólares na compra de avançadíssimos caças de ataque russos Sukhoi, submarinos, milhares de fuzis Kalashnikov, helicópteros de combate, radares, entre outros materiais avançadíssimos para aumentar suas capacidades militares (Villa, 2008, p. 7). Esta postura é incomum na América Latina, tida como uma área pacífica, sendo, por exemplo, uma das únicas regiões do mundo a se declarar oficialmente livre de armas nucleares! (Goldblat, 1997, p. 18). Nos últimos anos tivemos alguns exemplos de um aumento das tensões na América do Sul. Em março de 2008, uma ação do exército colombiano foi acusada de entrar em território equatoriano, o que causou uma crise generalizada entre os dois países, com inquietação demonstrada também pela Venezuela (O Globo, 2008). Já em 2009, o contrato entre Colômbia e EUA para o estabelecimento de bases americanas em território colombiano foi alvo de uma ofensiva diplomática engendrada por Hugo Chávez sob a alegação de que tal acordo ameaçaria a soberania de outras nações (Bandeira, 2009). Tais exemplos são importantes uma vez que permitem compreender até que ponto as tensões no continente têm possibilidade de escalonar para uma corrida armamentista devido ao sentimento generalizado de conflito iminente. Especialistas da área têm levantado a possibilidade de uma corrida armamentista na região, o que ameaça o equilíbrio de poder, podendo até mesmo levar a deflagração de conflitos armados como este continente nunca presenciou (Villa, 2008, p.4). Tendo em vista que a maior parte dos trabalhos acerca deste tema tem caráter predominantemente descritivo, viemos surgir a necessidade de uma abordagem mais teórica, “A partir da assinatura do Tratado de Tlatelolco em 1967 por diversos países latino-americanos, ficou proibida qualquer atividade nuclear não-pacífica na região. » INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br compartilhamento de cultura política, especialmente neste artigo salientado em relação aos EUA e os demais países da região, o que se mostrou nada mais que um fator adicional de complicação para a instauração de CBM eficientes (Bromley & Perdomo, 2005). Segundo os autores, o armamento venezuelano adquire feições mais latentes na primeira metade de 2005 e consiste ademais em um aspecto angular que deve ser ressaltado, já que pode ser observado como um importante entrave para as CBM, pois com essa nova doutrina militar venezuelana moldada no conceito de “guerra assimétrica”, vê-se uma falta de transparência no que concerne a questão de informações para se chegar a uma cooperação ótima, mesmo com as demonstrações venezuelanas de compartir arquivos, sobretudo com os EUA, Portanto, mediante a revisão deste texto acadêmico, observamos que o incremento venezuelano na esfera militar corrobora a dita capacidade limitadora das CBM. Porém, mostrando também que a Venezuela e os demais países da região protagonizam um cenário em que os atores interagem até certo ponto, pois a partir daí a anarquia não permite que os Estados entrem numa cooperação mais profunda, estável e transparente, pois emerge então a figura do medo proporcionado pela anarquia internacional de que um aliado ganhe mais que outro, mesmo com os dois fazendo parte de uma mesma aliança (Grieco, 1990,p.219). No artigo de Bartolomé (2008) sobre a defesa venezuelana, temos como ponto relevante sua exposição das cinco visões alternativas sobre a Venezuela e sua posição para adoção da guerra assimétrica. Dentre as visões abordadas, Bartolomé argumenta que a apropriada oficialmente pelo governo venezuelano é a que utiliza a guerra assimétrica numa lógica defensiva, com o fim de proteger a revolução bolivariana de uma hipotética agressão norte-americana (Bartolomé, 2008, p.51). Esta posição é oposta àquela apresentada anteriormente, uma vez que a Venezuela, ao mudar sua doutrina militar e utilizar a noção de guerra assimétrica opta por uma política de cunho ofensivo, como colocada por Manwaring (Manwaring apud Bartolomé, 2008, p.50), na medida em que cria uma “ferramenta-chave” para explorar as vulnerabilidades políticas e econômicas do oponente, tentando pender a situação para seu próprio beneficio. Em suas considerações, Bartolomé explica as afirmações de Max Manwaring, de que o armamento venezuelano pode ser entendido como um respaldo técnico para um objetivo INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br maior, que seria a expansão do bolivarianismo, com objetivo de estabelecer regimes similares em outros países da América Latina. No entanto, essa visão apresenta um argumento ideológico que na realidade não tem capacidade de influenciar o comportamento dos Estados. Um suposto aprofundamento de uma revolução bolivariana constitui uma operação psicológica cujo verdadeiro objetivo é ampliar o controle sobre a sociedade (Bartolomé, 2008, p.53). De acordo com o realismo estrutural, as pressões sistêmicas são os fatores explicativos para as variações comportamentais do Estado, que sempre almeja maximizar seus interesses, e discursos ideológicos são utilizados apenas para encobrir essas razões de Estado. Portanto, divergimos categoricamente dessa visão apresentada quanto às verdadeiras pretensões venezuelanas. O realismo estrutural nas Relações Internacionais O realismo estrutural, ou neo-realismo, surgiu em 1979 com o livro Theory of International Politics de Kenneth Waltz. Essa publicação revigorou o pensamento realista nas relações internacionais, que vinha sendo muito criticado por teóricos que ressaltavam o papel de atores não-estatais no panorama internacional. Waltz argumenta que o realismo tinha a capacidade de explicar os principais fenômenos que ocorriam dentro da disciplina, mas carecia de solidez e cientificidade. Ele então mantém os princípios básicos do realismo clássico, revestindo-os de um forte rigor científico (Nogueira & Messari, 2005, p.42). Sua teoria é estrutural porque afirma que o problema perene das relações internacionais, a guerra, só pode ser explicado no nível do sistema internacional, caracterizado por ser anárquico. Como já foi citado anteriormente, examinaremos a questão venezuelana à luz de duas teorias diferentes, que derivam da teoria estrutural como apresentada por Waltz, de maneira que a utilização dos instrumentos teóricos de ambas permitirá uma visão mais ampla e completa dos pontos a serem explorados. A primeira teoria com a qual exploraremos a problemática apresentada é o realismo ofensivo de John Mearsheimer (2003). Este autor se insere na abordagem neo-realista da disciplina de relações internacionais, também chamada de realismo estrutural. Esta é uma abordagem INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br analítica sistêmica, que apresenta uma definição de estrutura independente das características específicas das unidades (Waltz, 1979, p. 79-101). Ateoria de John Mearsheimer considera cinco suposições sobre o sistema internacional. Todas elas derivam de certo modo do realismo clássico: o conceito de anarquia; as incertezas que caracterizam o dilema de segurança; a sobrevivência como objetivo primário do estado; e a racionalidade estatal (Mearsheimer, 2003, p. 30-32). Se tomadas em conjunto, compõem os constrangimentos estruturais que levam os estados a agir agressivamente em relação aos outros estados. Tais constrangimentos derivam em particular de três comportamentos: medo, auto-ajuda e maximização de poder (Mearsheimer, 2003, p. 32). Existe um aspecto diferente na teoria do autor da teoria realista de relações internacionais (Nogueira & Messari, 2005, p.53). Mearsheimer argumenta que a busca por poder só cessa quando o estado atingir a hegemonia no sistema, sendo esse estado não somente o mais forte, mas a única potência do sistema. Ele desconsidera a existência de estados seguros de sua posição no sistema por dois motivos: é difícil medir o quanto de poder relativo é necessário para que um estado tenha segurança em relação a seus rivais; o papel da sorte e de estratégias eficientes pode mudar o curso de uma guerra favorecendo o lado mais fraco; e medir o poder ainda se torna mais difícil, quando o estado contempla a distribuição de poder no longo prazo, um bom exemplo disso é a queda inesperada da União Soviética (Mearsheimer, 2003, p. 34-35). Devido a essas dificuldades, os estados reconhecem que a melhor maneira de garantir sua sobrevivência é conquistar a hegemonia agora. Mesmo que um estado não tenha capacidade de se tornar uma hegemonia agora, ele vai continuar a agir ofensivamente buscando o quanto de poder ele tiver capacidade de conquistar. Além de buscar mais poder, um estado ainda trabalha para assegurar que outros não tirem vantagem dele (Mearsheimer, 2003, p. 35). Já a segunda teoria que utilizaremos para analisar a questão dos investimentos venezuelanos na área de segurança será o realismo defensivo baseado em Joseph Grieco. Segundo esta teoria, os Estados têm como objetivo a manutenção do seu status quo em relação ao equilíbrio de poder no cenário internacional (Grieco, 1990, p.39). Podemos dizer que Grieco tem uma abordagem “posicionalista”, ou seja, os Estados empregam suas capacidades relativas visando a manutenção de sua posição no sistema. INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br causas latente da Venezuela, acaba por diferenciar significativamente os atores no sistema internacional. Exagerando nas diferenças, a abordagem perde na capacidade de generalização sobre os fenômenos em questão (Singer, 1961, p. 6-7), comprometendo a capacidade explicativa dessa causa. Em relação à segunda motivação latente exposta por Villa: a melhoria da posição regional da Venezuela, ela se enquadra dentro da nossa abordagem teórica como uma causa, mas temos ressalvas. Essa motivação não é somente da Venezuela, mas de todos os estados no sistema internacional, não dependendo de aspirações de um determinado estado. A melhoria na posição regional, que culmina na hegemonia, é condição necessária para a garantia de segurança estatal no mundo. Isso se dá por dois motivos: é difícil medir o quanto de poder relativo é necessário para que um estado tenha segurança em relação a seus rivais, o papel da sorte e de estratégias eficientes pode mudar o curso de uma guerra favorecendo o lado mais fraco; e medir o poder ainda se torna mais difícil, quando o estado contempla a distribuição de poder no longo prazo, um bom exemplo disso é a queda inesperada da União Soviética (Mearsheimer, 2003, p. 34-35). Mas como Mearsheimer afirma, a hegemonia global é muito difícil de ser alcançada, tendendo os estados a se tornarem, no máximo, hegemonias regionais, adquirindo prevalência militar na região (principalmente de forças terrestres), como os Estados Unidos na América do Norte (no texto do autor, ele cita os EUA como hegemonia regional nas Américas, mas vamos refinar o argumento do autor, separando uma região grande em duas menores, assim como ele faz com a Ásia) (Mearsheimer, 2003, p. 40-42). Vamos argumentar aqui que a Venezuela tenta galgar sua posição como hegemonia regional sob efeito de dois constrangimentos sistêmicos: o Brasil como uma hegemonia regional em potencial e a Colômbia, como ponte para o balanceamento externo (off-shore balancing) dos Estados Unidos. E como são grandes as diferenças de capacidades destes atores em relação à Venezuela, esta busca maximizar seu poder de maneira agressiva, aumentando seus gastos com exportadores de material bélico, como a Rússia, e implementando políticas externas muitas vezes agressivas, que aumentam sua influência política e militar. 10 INTELLECTOR Ano VI Volume VII Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri.org.br Ao analisarmos a distribuição de capacidades na América do Sul, podemos observar uma multipolaridade desbalanceada. O Brasil, tanto em termos militares como econômicos, é o estado mais poderoso da região (ver gráfico 1 e gráfico 2 abaixo). É o único estado da América do Sul capaz de projetar poder aeronaval no alto mar, possui a maior força aérea do continente e um gigantesco exército em termos de pessoal, rivalizável apenas pelo colombiano, que é empregado há décadas contra forças revoltosas no ambiente doméstico (Alves & Haye, 2008, p. 6-9). Gráfico 1 Produto Interno Bruto (PIB) entre 2003 e 2007 Contas Nacionais Anuais fem milhões de dólares a preços constantes raferentes ao ano de 2000) Argentina Bolívia Brasil chile Colômbia Equador Paraguai Peru Uruguai venezuela América do sul 1.274. 263.599,84, 3.988,76 677.856,94 82.872,76 103.009,55 18.122,31 7.516,11 53.396,91 17.640,30 101.835,91 287.402,00 313.783,30 9.363,89 3.777,91 716.494,78 731.273,13 87.879,18 92.764,78 107.813,66 113.981,65 19.572,22 20.747,17 7.826,92 8.050,66 61.281,75 65.521,84 19.725,39 21.031,93 120.453,24 132.887,02 935.746,00 1.364.186.766,00 1.433.960.498,00 Fonte: Comissão Económica para América Latina e o Caribe (CEPAL) u O wwwemilitanypower com br 340.347,87 10.246,95 764.552,24 96.792,57 121.918,15 21.555,46 8.400,10 70.473,23 22.504,08 146.637,21 369.819,40 10.714,66 805.838,10 101,724,70 131.898,50 22.137,46 8.975,21 76.732,35 24.174,06 158.955,20 Gráfico 2 INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br Como já afirmamos na exposição do marco teórico, um estado nunca sabe o que esperar das intenções alheias, portanto para garantir seu interesse fundamental, a sobrevivência, deve obter meios para se defender contra uma possível ameaça (Mearsheimer, 2003, p. 33-34). À Venezuela teme as possíveis aplicações das capacidades brasileiras, fazendo com que ela procure meios para garantir sua própria segurança. O segundo constrangimento sistêmico é os Estados Unidos alterando a balança de poder da América do Sul como um “balanceador externo”, O interesse desse estado em agir dessa maneira seria, segundo a teoria de Mearsheimer, natural das hegemonias regionais, que tentariam minar a possibilidade do surgimento de outra hegemonia regional, que poderia por meio deste mesmo tipo de balanceamento, acabar com a hegemonia regional do estado rival, eliminando as garantias de sua sobrevivência (Mearsheimer, 2003, p. 140-143). A Colômbia é um dos principais receptores de ajuda militar dos Estados Unidos no mundo. A maior parte do investimento em armamentos da Colômbia deriva dessa ajuda. Programas de assistência militar como o Plano Colômbia, que desde 2000 já assistiu com aproximadamente US$ 900 milhões de dólares destinados à assistência militar e policial, e a Estratégia Andina Antidrogas transformaram esse estado, em inícios do milênio, num dos principais ajudados militarmente pelos EU A no mundo. Em 2007 a ajuda militar na Colômbia pelos Estados Unidos correspondeu a 8,94% da ajuda total para o resto do mundo com exceção do Iraque, ficando atrás apenas de Israel com 45,30% e Egito com 25,22% (Villa, 2008, p.14-15). Por se situar na fronteira com a Venezuela, o aumento da capacidade militar colombiana é utilizado pelos EUA como uma forma de conter a influência política e militar venezuelana na região. Ao equilibrar a balança de poder regional, os Estados Unidos procuram diminuir a instabilidade desse sistema, que poderia culminar com o surgimento de uma potência regional, capaz de ameaçá-lo, já que inexistiriam rivais aspirantes a esse posto, principalmente o Brasil, mas também a Venezuela. Uma possível crítica pode ser feita em relação às motivações dos Estados Unidos e dos tipos de armamentos adquiridos pela Colômbia. Tanto o Plano Colômbia quanto a Estratégia Andina Antidrogas citadas acima fazem parte de um programa americano contra o narcotráfico, ou mais especificamente no caso do primeiro, contra as FARC e o ELN devido ao incremento do INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br p.28). Mesmo que os Estados sul-americanos sejam guiados pela cobiça e ambição, é a sensibilidade a qualquer erosão de suas capacidades relativas que molda o comportamento efetivo de cada nação. Nesse sentido, estes países estão constantemente investindo em defesa para manter o seu status quo em relação ao poder dentro do sistema regional (Horning, 2008, p.3) Tendo em vista que a Venezuela percebe um desequilíbrio nas capacidades relativas no subcontinente, e sua segurança e independência no contexto de auto-ajuda da anarquia internacional são postas em xeque, ela sente a necessidade de potencializar seu aparato militar para garantir a sua segurança (Grieco, 1990, p.39). Em última instância, a Venezuela não está interessada em obter o máximo ganho possível, mas, de acordo com o objetivo fundamental dos Estados, deseja prevenir que outros não possam obter avanços nas capacidades relativas (Grieco, 1990, p.39). Desta forma, podemos associar esse pensamento com a falta de uma cooperação estável e franca no continente sul-americano, através do que nos mostra Mark Bromley e Catalina Perdomo acerca das frágeis Confidence-Building Measures (CBM) (Bromley & Perdomo, 2005). A aquisição de armas por parte do Estado venezuelano, segundo Bromley e Perdomo, explicitou a capacidade limitada das CBM, remarcando o pensamento de Grieco quanto à anarquia internacional como sendo a que inibe a vontade dos Estados em trabalhar juntos mesmo quando eles tem interesses em comum, e que as instituições internacionais são amplamente incapazes em mitigar os efeitos de constrangimento da anarquia na cooperação inter-estatal (Grieco, 1990, p.27). Em 2001 circularam rumores de que a Venezuela estaria interessada em adquirir Migs-29 russos. Com a visita de Chávez ao país em 2004, isto ficou mais latente. No entanto, a operação não se concretizou, já que emergiram informações em 2005 de que a Venezuela teria voltado seu interesse para aviões SU-27 e SU-35, também russos (Bromley & Perdomo, 2005, p.12). No entanto, ainda na primeira metade do ano de 2005, a Venezuela assinou quatro contratos para a importação de armas - um com o Brasil, um com a Espanha e dois com a Rússia - para a compra de aviões ligeiros super-tucanos, helicópteros, aeronaves C-295 de transporte e vigilância, além de buques patrulheiros, corvetas e cargueiros, sendo o total dessa operação se INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br aproximando de 1,7 bilhão de dólares. Fora isso, fez um acordo com a Rússia para a compra de 100 mil fuzis AK-103/AK-194 (Bromley & Perdomo, 2005, p.11 e 12). Essas compras denotam a insegurança e o temor quanto à traição, pois como os Estados em um ambiente anárquico são atomizados, ou seja, “egoístas racionais”, eles buscam seus objetivos primordiais, sobrevivência e independência (Grieco, 1990, p.28-29), sem se pautar por políticas de outros países. Por isso, mesmo localizando-se em uma região tida por muitos como pacífica, o país vem investindo maciçamente em defesa. Essa mobilização venezuelana pode, segundo Bromley e Perdomo, ser relacionada basicamente a três fatores: a mudança da doutrina militar; o mau estado em que se encontram as Forças Armadas da Venezuela, com a deterioração da segurança da fronteira com a Colômbia; e, por fim, a tentativa do país de diversificar suas fontes de equipamentos militares, com o fim de desprender-se dos EUA, fornecedor majoritário por excelência da Venezuela historicamente (Bromley & Perdomo, 2005, p.12). Cabe ressaltar a nova doutrina militar adotada pelo Estado venezuelano, centrada em uma “guerra assimétrica” - uso de táticas de guerrilha e a participação da população em geral -, a qual se traduz no fortalecimento do aparato militar nacional, aumento do tamanho de suas unidades militares em todo o país e melhora do estado de preparação tanto das unidades regulares como das de reserva, além de toda uma atualização de material militar, com a criação de unidades de milícia, as chamadas Unidades de Defesa Popular (UDP) (Bromley & Perdomo, 2005, p.13). Essa nova política foi adotada pela concepção de fraqueza da Venezuela em face de um eventual ataque norte-americano (Márquez, 2005). O aumento do armamento venezuelano tem como um dos fatores explicativos a preocupação com as áreas fronteiriças com a Colômbia, país com o qual a Venezuela tem relações sinuosas historicamente devido às disputas pelas áreas marinhas e submarinhas do Golfo da Venezuela. Este conflito tem uma natureza estrutural, territorial; é uma disputa por recursos, pelo domínio de uma grande bacia petrolífera e pelo controle da saída e entrada ao lago de Maracaibo, empório de recursos de hidrocarbonetos da Venezuela. A tensão que permeia a interação entre esses dois Estados é então por uma área que se estende ao longo de 500 milhas quadradas em face da península de La Guajira, limite de comunicação entre o Golfo da Venezuela e o Mar do Caribe (Jarrin, 1989, p.118). Isso mostra que há Estados que, mesmo INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br interessados em seus ganhos individuais, estão mais preocupados em fazer com que o outro não fique em vantagem, avaliando sua própria situação em comparação a dos outros, uma vez que isso incidiria para um desequilíbrio de poder na área (Grieco, 1990,p.219). Como os Estados não podem ter certeza das intenções dos outros, os investimentos venezuelanos são percebidos como ameaças constantes pela Colômbia, principalmente em relação ao equilíbrio de poder na região (Grieco, 1990, p.28-29). Esta questão toma ainda maior relevância quando se trata da suposta compra de aviões de combates da Rússia, pois a aquisição de helicópteros seria compreensível, denotando uma intensificação no controle de fronteiras. Porém, os caças Mig-29 mostram uma tendência maior para um desequilíbrio nas relações de poder (Webb-Vidal apud Bromley & Perdomo, 2005, p.14), bem como as fragatas adquiridas da Espanha, que possibilitarão uma presença mais efetiva nas águas disputadas no Golfo da Venezuela (Cala & de Cordoba apud Bromley & Perdomo, 2005, p.14). Com essas novas aquisições, os demais países da região são atingidos pela erosão de suas capacidades relativas, que constituem a base da segurança de cada Estado (Grieco, 1990, p.39). Por fim, a visão de os Estados Unidos como ameaça é um dos fatores explicativos mais importantes para a posição defensiva da Venezuela. Estados que detém maior poder são tentados a colocar estas capacidades em prática e, consegientemente, os países com poderio militar mais limitado temem esta eventual demonstração de força. (Waltz, 2000, p.13) Para exemplificar esta caracterização dos EUA como um elemento hostil, podemos citar as diversas acusações por parte do presidente Chávez de que o governo norte-americano tentou golpe para derrubar seu governo. Um dos motivos para esta suspeita seria o suposto apoio americano ao golpe de 2002, que colocou outro governo em Caracas durante alguns dias (ISS, 2005). Dessa maneira, podemos perceber que ao adquirir material bélico, o governo venezuelano tem como objetivo enfrentar eventuais ameaças à sua soberania, de maneira que os principais elementos a serem neutralizados seriam os países da América do Sul, que temem o poderio da Venezuela, e os Estados Unidos. Portanto, há tanto uma carência de estabilidade e previsibilidade como um grau ínfimo de capacidade e vontade dos governos para criar Confidence-building Measures que sejam INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br Mearsheimer (2003, p. 139-167) do que na de Grieco (1990) ou mesmo na de Waltz (1979), que se limitam à construção de alianças, ao balanceamento interno e à guerra. Na análise do realismo ofensivo, somente nos referimos aos meios quando eles não partiram da Venezuela, mas sim dos Estados Unidos agindo como um “balanceador externo”, influenciando assim a compra de armamentos venezuelana. A aplicação desse conceito, exclusivo da teoria de Mearsheimer, é uma das diferenças entre a análise ofensiva e a defensiva. Nessa última, apesar de citarmos os EUA como um dos fatores sistêmicos, não estabelecemos o porquê, e por isso a intensidade de influência desse fator no comportamento da Venezuela ficou distorcida e, principalmente, necessitava de um caráter ideológico (antiimperialista) atribuído no caso ao Chávez. A aplicação desse conceito deixa a perspectiva ofensiva mais adequada à abordagem estrutural desse artigo e consegientemente, como nós argumentamos, à realidade venezuelana. Finalizando, vale ressaltar a diferença quanto as pretensões Venezuelanas nas duas teorias, mesmo que na busca pelas causas do comportamento venezuelano isso não tenha feito diferença. Nas duas teorias realistas os Estados buscam segurança no sistema internacional. No realismo ofensivo, o Estado só se sente seguro quando atinge a hegemonia regional (mesmo a regional é imperfeita, mas se aplicando ao caso ela faz mais sentido do que uma hegemonia global, onde a segurança é perfeita). Por outro lado, no realismo defensivo, atingir a hegemonia regional ou global não é necessário para se atingir um nível significativo de segurança. Quando as capacidades relativas de um Estado ainda são limitadas, as diferenças nessas pretensões não alteram seu comportamento. No caso, a Venezuela ainda se encontra nesse estágio, tendo em vista a já comentada gigantesca assimetria de poder regional e global. Na medida em que um Estado vai ganhando poder, suas capacidades de exercê-lo aumentam e as suas pretensões alteram de forma significativa seu comportamento, seja buscando uma hegemonia ou não. Conclusão A partir de uma ótica ofensiva e outra defensiva, tendo como base as obras de John Mearsheimer, Joseph Grieco e Kenneth Waltz, fizemos uma análise mais profunda sobre as 20 INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br reais intenções da Venezuela com os seus investimentos em armamentos. Analisamos a possibilidade de a Venezuela estar se armando com o objetivo de aumentar o seu poder e sua influencia política e militar na região, bem como a possibilidade do país desejar manter a balança de poder na região, evitando um eventual ataque contra o seu território, e mantendo o status quo. Nossa intenção era a de desvendar os fatores sistêmicos que influenciam o comportamento da Venezuela, principalmente em relação ao seu incremento em gastos com armamentos militares na última década. Acreditamos que isso é importante pela originalidade da análise, que não relaciona Chávez à expansão dos gastos militares venezuelanos. Dessa maneira, fizemos uma contraposição à abordagem predominante, principalmente na mídia, que coloca como principal responsável pelos acontecimentos na Venezuela os fatores que derivam do nível de análise nacional e ideológico como, por exemplo, o presidente venezuelano Hugo Chávez (VEJA, 2008, edição 2051). Os pontos de vista de apresentados nesse trabalho não constituem em verdades absolutas. Não tivemos pretensão, nem poderíamos abarcar, a realidade como um todo relacionando de maneira dinâmica os fatores sistêmicos, as especificidades do governo local e a trajetória do país como um todo. Na verdade, essas análises configurariam uma contribuição gigantesca para essa discussão que é de extrema importância para a América Latina, mas que ainda está no início. Novas análises, vistas sob óticas diferentes serão muito bem vindas, e aumentarão o leque de compreensão da questão. Finalmente, devemos esperar os próximos acontecimentos na região para tirar as devidas conclusões, principalmente a respeito da proeminência dos fatores estruturais no comportamento venezuelano. Bibliografia ALVES, V.; HEYE, T. Tamanho é documento? O Brasil e o equilíbrio de poder na América do Sul. Análise de Conjuntura, n.8, agosto 2008. INTELLECTOR Ano VI Volume VIL Nº13 Julho/Dezembro 2010 Rio de Janeiro ISSN 1807-1260 www.revistaintellector.cenegri org.br BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Com presença na Colômbia, EUA visam rotas do petróleo. Revista Espaço Acadêmico, v.9,n. 100,p. 109-110, set. 2009. BARROS, Pedro Silva. Chávez e Petróleo: Uma Análise da Nova Política Econômica Venezuelana. Cadernos PROLAM /USE, ano 5, v.2, p. 209-237, 2006. BARTOLOMÉ, Mariano Cesar. 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