Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Políticas públicas e criminais, Notas de estudo de Políticas Públicas

A implementação de políticas públicas como precedente necessário a uma efetiva política criminal

Tipologia: Notas de estudo

2013

Compartilhado em 05/03/2013

marcelo-de-souza-23
marcelo-de-souza-23 🇧🇷

1 documento

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Políticas públicas e criminais e outras Notas de estudo em PDF para Políticas Públicas, somente na Docsity! INTRODUÇÃO O processo pelo qual se desenvolveu o fenômeno da criminalidade tem sido palco, há muito tempo, de acaloradas discussões que versam desde o seu surgimento até o atual estágio de periclitância em que hodiernamente se encontra. Não obstante toda essa tímida tentativa de se encontrar uma resposta capaz de minimizar essa violência social, por óbvio que jamais se encontrará uma solução enquanto não houver uma necessária convergência de atitudes entre os vários atores responsáveis pelo estado de bem estar da sociedade. Pretende-se, nesse cariz, demonstrar a necessidade de se aliar os vários conhecimentos e pontos de vistas sobre as causas da violência e da criminalidade, a fim de que se possa entender, de maneira global, o problema sob análise, pois, somente assim é que se poderá diagnosticar esse mal e tratá-lo de forma eficaz. Assim, entende-se como de suma relevância a realização de trabalhos organizados e conjuntos entre o poder público, mídia, igrejas, empresas, organizações, e demais ramos da sociedade, para a elaboração de um plano capaz de reverter o atual nível de criminalidade a índices perfeitamente aceitáveis, vale dizer, o mais próximo possível da média mundial, de acordo com estatísticas aferidas pela Organização das Nações Unidas. Nesse esteio, atualmente a interdisciplinaridade constitui-se na melhor técnica de pesquisa, haja vista que todos deverão compartilhar mutuamente suas informações, evitando-se a formação de conceitos esparsos, o que, via de regra, acaba sempre por emperrar qualquer tentativa de padronização dos sistemas. O objetivo da presente obra não é elucidar o problema apresentado, mas sim traçar, basicamente, algumas linhas consideradas fundamentais para a construção de uma nação livre dos altos índices de delituosidade hoje existentes. Questões político/sociais pouco abordadas, mas de suma importância, serão analisadas e debatidas, como, por exemplo, a influência da família, escola e meios de comunicação na formação do pensamento social; os vícios a serem sanados pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com o intuito de otimizar as relações entre estes e a sociedade. Por derradeiro, e assim não poderia deixar de ser, será realizada uma análise acerca do Sistema Penitenciário e seus institutos, trazendo-se à tona todos os motivos que espelham sua precariedade ou falência, como alguns preferem dizer. Isso, fruto do descaso das autoridades supramencionadas que jamais cumpriram seus papéis de maneira adequada, ignorando a finalidade de seus atos e causando todo o caos que ora se encontra instalado nas esferas da Execução Penal, instituto ignorado por todos que desconhecem sua verdadeira função, que, aliás, é de fundamental importância para o bem estar social, haja vista que possui a incumbência de reintegrar o infrator penal, de maneira que não volte a oferecer riscos à estabilidade e harmonia entre os cidadãos. Estreme de dúvidas, uma árdua e complexa tarefa a redução das estatísticas de violência neste País, mormente agora em que se faz necessário uma mudança radical na forma de pensar e de agir das instituições competentes para esse mister. Porém, absolutamente realizável, bastando apenas iniciativa e motivação para tal. PAGE \* MERGEFORMAT 14 urbano do Rio estabelecia-se, dessa forma, com características francamente segregadoras, respaldadas por grande parte da crítica jornalística.3 Por conta disso, houvera, inevitavelmente, um aumento de delitos, mendicância, prostituição, e demais desagregações sociais. O controle social de então era situado na unidade de produção, isto é, a fazenda, exercido pelo senhor de engenho, auxiliado pelos capatazes e capitães-do-mato. Com a proclamação da República, porém, este controle fora deslocado para o Estado, recém criado. Todavia, suas instituições não foram suficientes ou competentes para dar conta do controle. Corroborando a presente exposição fática, importa destacar os pertinentes comentários de Plácido Soares, ao mencionar que “é possível perceber um aumento considerável dos índices de criminalidade em todas as sociedades que sofrem mudanças abruptas, que interrompem ou alteram um sistema social já consolidado, como a evolução da organização rural familiar para o capitalismo agrário, a acelerada industrialização, o crescimento demográfico desordenado, grandes e prolongadas crises econômicas ou ainda a ocorrência de guerras e revoluções”4. Do Estado Republicano até o aparecimento do capitalismo, também se verifica um contexto de esgotamento das estratégias tradicionais de controle social, expressos em frases muito comuns tais como “bandido é problema de polícia”, o que revela um total descompromisso e alienação da sociedade. Atualmente, em pleno século XXI, o contexto histórico é muito semelhante àquele da virada do século XIX para o século XX. Um absoluto esgotamento das estratégias formais de controle social. Para entender o porquê da derrocada dessas classes sociais, eleitas para responderem por todos os males que afligem a estabilidade social, é necessário que se entenda o significado ideológico do atual sistema punitivo que é reforçado pela veiculação de notícias superficiais e tendenciosas pela mídia, funcionando como verdadeira agência policial, ou seja, com capacidade de desconfiguração ou configuração do fato criminoso, de acordo com seus interesses político-econômicos. Destarte, o sistema penal seleciona pessoas e não ações, voltando seu poder para as classes socialmente desfavoráveis, criando esteriótipos e marginalizando os excluídos do processo de acumulação do capital, representados pelos negros, pobres, desempregados e analfabetos. Essa clientela, ainda é vítima da chamada atitude suspeita, consubstanciada na origem de classe destes, extirpados do convívio social e consumerista. Sobre esse assunto, vale lembrar a impactante frase que dá título à música “Todo camburão tem um pouco de navio negreiro”5, com letra de Marcelo Yuka e PAGE \* MERGEFORMAT 14 3 MAIOLINO. Idem. 4 SOARES, Plácido. Alerta Geral. Violência , criminalidade e segurança pública no Brasil. Curitiba: Livraria do Chain, 2003. p. 21. 5 O RAPPA. Todo Camburão tem um pouco de navio negreiro. Warner Music Brasil. 1994. música da banda O Rappa, a qual retrata de maneira clara e sucinta a herança de 388 anos de escravidão e discriminação racial contra o negro no Brasil. Diante da barbárie latente, faz-se necessário o estudo do presente tema, haja vista que o Estado, como resposta, acaba por inserir-se nos movimentos de lei e ordem, na tentativa ilusória de acautelar a população. A despeito deste dispiciendo controle legitimado pelo Estado, que só faz aumentar a distância entre as diferentes classes sociais que compõe toda a nação deste país, impende salientar a fundamental importância da participação de instituições como família, escola e igreja, como forma de se tentar abrandar tais diferenças, ainda que não seja possível se vislumbrar resultados positivos a curto prazo. Assim, no que concerne à estrutura familiar, os pais, que já não dispõe do mínimo de tempo necessário para os seus filhos, deveriam se esforçar ao máximo para a consecução desse objetivo, e desta forma, poder acompanhar o desenvolvimento dos mesmos, e com isto, através de uma boa dose de afeto, aliado à educação, fazer com que não se envolvessem em crimes ou com criminosos. Juntamente com a família, deveriam atuar a igreja e a escola, que seriam responsáveis pela instrução e preparação para a vida útil. Entende-se que, a não distinção entre o que é violência e o que é criminalidade, é mais um elemento complicador para o encaminhamento de eventuais propostas de soluções, pois, percebe-se, claramente, que quando a sociedade fala sobre estes temas, dá mostras de que sabe, mas não conhece, por isso, confunde e mistura. Diante disso, denota-se que o crime possui grande parte de sua origem nos fenômenos sociais, e a criminalidade depende, por via de conseqüência, de como estão se processando tais fenômenos, ou seja, a delituosidade além de ter sua origem direita dos processos de omissão e de seletividade do Estado, também possui uma íntima relação com o estado social vigente. Se a sociedade estiver melhor organizada, decerto que haverá menos crimes, e a contrário senso, se a sociedade se desorganiza, os índices criminais, infalivelmente tendem a crescer. Importa ainda salientar que, apesar do homem ser um animal gregário, sua vida em sociedade não implica em que haja uma unidade de consciência social. Isso seria absolutamente utópico, pois, esta nada mais é que o somatório das consciências individuais que irão compor a maioria da unidade social. De mesmo entendimento, são as asseverações feitas pela respeitável doutrinadora de direito penal, a professora Maria Del Mar Díaz Pita, ao se reportar ao comportamento doloso, como sendo, acima de tudo, um comportamento humano: Como apontado mais acima, a perspectiva normativa não cria ex novo a realidade, mas abandona a investigação dela desde parâmetros de análise próximos aos utilizados pelas ciências naturais, para abordá-la desde um prisma valorativo, mas sem deixar de basear-se PAGE \* MERGEFORMAT 14 em tal realidade. Mais que isso, esta análise valorativa não perde de vista a racionalidade de nossa cultura, concretamente de nossa cultura jurídica. Isto quer dizer que tal perspectiva, antes de afastar-se das valorações cotidianas presentes na sociedade, tenta aproximar-se delas, passando-as pela peneira da interpretação jurí Denota-se que os valores éticos, morais e sociais estão progressivamente sendo esquecidos e se perdendo com o passar do tempo. Sobre a importância desses pressupostos para o equilíbrio nos relacionamentos humanos, merece destaque algumas informações sobre ética e moral, consignadas no site Wikipédia – a enciclopédia livre, segundo o texto abaixo: Define-se Moral como um conjunto de normas, princípios, preceitos, costumes, valores que norteiam o comportamento do indivíduo no seu grupo social. Moral e ética não devem ser confundidos: enquanto a moral é normativa, a ética é teórica e busca explicar e justificar os costumes de uma determinada sociedade, bem como fornecer subsídios para a solução de seus dilemas mais comuns. Porém, deve-se deixar claro que etimologicamente "ética" e "moral" são expressões sinônimas, sendo a primeira de origem grega, enquanto a segunda é sua tradução para o latim. O homem vive em sociedade, convive com outros homens e, portanto, cabe-lhe pensar e responder à seguinte pergunta: “Como devo agir perante os outros?”. Trata-se de uma pergunta fácil de ser formulada, mas difícil de ser respondida. Ora, esta é a questão central da Moral e da Ética . Enfim, a ética é julgamento do caráter moral de uma determinada pessoa. Como Doutrina Filosófica, a Ética é essencialmente especulativa e, a não ser quanto ao seu método analítico, jamais será normativa, característica esta, exclusiva do seu objecto de estudo, a Moral.7 (grifado) O crime é um produto de vários fatores. Cada um desses fatores tem sua participação própria, determinada na ocorrência e mesmo na sucessão da criminalidade, que se vestirá das mais diferentes roupagens na dependência da atuação de cada um deles. Há que se salientar ainda acerca das considerações preliminares sobre o crime, que existiram inúmeras teses sobre como ele ocorre, proposições essas que algumas já se perderam na antiguidade do tempo, como, por exemplo, a de que o crime é resultado da existência do criminoso nato; ou de que existe um tipo criminal, ou de que o delinqüente é sempre um ser anormal, biológica e psicologicamente, ou PAGE \* MERGEFORMAT 14 6 PITA, María Del Mar Díaz. A presumida inexistência do elemento volitivo no dolo e sua impossibilidade de normativização. In: BUSATO, Paulo César (org.). Modernas tendências sobre o dolo em direito penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris: 2008. p. 20-21. 7 WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/ %C3%89tica. Acesso em: 08 de maio de 2009. A crise social vivenciada hoje, em seus mais variados aspectos, da qual a criminalidade e a violência são indissociáveis é, também, a crise do modelo repressivo, que nunca fora abandonado. “O abuso da repressão é antidemocrático, enfraquece a autoridade e alimenta a corrupção”11. A inflação jurídica e o rigor da Lei no âmbito Penal, não resolveram o problema da criminalidade e da violência, pois os delitos continuam acontecendo e, em larga escala. A solução para o problema está na educação, nos programas sociais, no crescimento econômico, na diminuição das desigualdades e, não na aplicação de um Direito penal do Inimigo, que é desumano e fere o princípio basilar da Constituição Federal: a Dignidade da Pessoa Humana. Quem não tem seus direitos respeitados, tende a não respeitar os dos outros. Quem não tem oportunidade, certamente, poderá ter empunhado em sua mão, uma arma. O sistema Penal Brasileiro, pela ótica da falácia da ressocialização – ressocializar a quem nunca foi socializado - nasceu falido, mas se observado pela ótica da política, irá se perceber que é perfeito, pois incide sobre os menos abastados, funcionando como uma forma de controle e perpetuação de uma elite no poder. E o que falar do sistema penitenciário brasileiro? Verdadeiras universidades, para a formação de criminosos que, em seguida especializam-se e, por fim, tornam- se mestres do crime. Falar em Direito Penal do Inimigo, sem dúvidas, nos remete a Idade Média, mais precisamente, ao período da instauração da Santa Inquisição, em que milhares de pessoas foram torturadas e/ou queimadas vivas por defenderem idéias que iam de encontro ao Catolicismo. Combater o crime com o Direito penal é deveras um equívoco. O crime deve ser combatido através da criminologia e da política criminal, em não conseguindo, o Direito Penal deve ser usado, mas como Ultima Ratio. PAGE \* MERGEFORMAT 14 11 Malin, Mauro. Debate busca raízes da violência. – Acessa.com, Março 2007. Disponível em http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=703. Acesso em: 10 de maio de 2009. Quantos “Capitães Nascimento” será preciso para combater o crime? A solução está na formação de grupos de extermínios? Até quando há de se continuar construindo a história pela contramão? São perguntas que pairam no ar. O Direito Penal do Inimigo é o legítimo inimigo da sociedade, pois tenta reduzir o ser humano a um simples ponto de imputação normativa e, flagrantemente, afronta ao texto constitucional. Sua aplicação só pode ser entendida como um lamentável retrocesso na história da humanidade. A intolerância e a incapacidade do Estado, em lidar com os novos fenômenos da criminalidade organizada fazem com que o Direito Penal seja visto como a única solução para resolver o problema. Ledo engano. Um erro, não pode ser consertado com outro; violência, não se combate com violência; criminalidade, não se combate de maneira desorganizada. As soluções e o comprometimento com a Nação precisam aparecer, para que o país possa sair desse caos, que há muito se encontra e, o povo brasileiro possa ser levantado, com a certeza e esperança de que o Brasil, realmente, possa ser o país do futuro. Sob esse prisma, conclui-se pela necessidade uma ampla reforma no que diz respeito às idéias e às ações que constituem o poder punitivo estatal. Entrementes, é certo que jamais se alcançara qualquer progresso nesse sentido, se não se objetivar planos que respondam com maior eficiência aos ajustes essenciais no atual conjunto de métodos preventivos e punitivos, e não, como soe acontecer, apenas para a promoção de falsa sensação de segurança, diante da elaboração de medidas a toque de caixa, que sempre acabam por manter e legitimar a ordem imposta pelo Estado. Mas como realizar um trabalho que se evidencia pela sua imanente complexidade, onde o principal obstáculo se constitui na figura do próprio Estado? Diante disso, a presente obra destaca, a seguir, alguns institutos, que não se pretende denotar como um rol taxativo, que demandam maior atenção, diante da essencialidade e deficiência que atualmente apresentam. Instituições que se configuram na base de qualquer sociedade, seja para erigi-la à posição de nação desenvolvida, seja para transformá-la num conjunto de indivíduos desprovidos das mínimas condições de dignidade humana. PAGE \* MERGEFORMAT 14 2. DAS QUESTÕES SOCIAIS É notório o aumento vertiginoso da criminalidade e da violência, espalhadas pelas grandes capitais brasileiras. O noticiário nacional todos os dias mostra a quantidade de barbaridades que são cometidas e, que acabam por causar uma sensação de temor e insegurança na sociedade. É com tristeza e mãos atadas que se afirma que as condições de hoje são tão propícias, quando da época, para que outros episódios como a chacina da Candelária, Vigário geral e Carandiru aconteçam e continuem a macular “a alma do país”. O pior, em toda essa situação desastrosa é o discurso falacioso de que o problema da criminalidade e da violência reside na “brandura” e “candura” do modelo penal brasileiro e, que é preciso agir com mais rigor, retirando benefícios, que estão previstos no ordenamento jurídico, das pessoas que cometem delitos. É de se ficar boquiaberto ao se constatar que o modelo ideal, na ótica da sociedade, a ser adotado, capaz de resolver tal problema, não seria outro, se não a política da “tolerância zero”, importada dos Estados Unidos da América, só do Norte. Não há dúvidas, o que se prega é o Direito Penal do Inimigo, teoria anunciada por Günter Jakobs, doutrinador alemão, em que se retiram da pessoa, o status de cidadão e as garantias estabelecidas pelo ordenamento jurídico. Jakobs menciona alguns precedentes jusfilosóficos. Primeiramente Rousseau, para quem "qualquer ‘malfeitor’ que ataque o ‘direito social’ deixa de ser ‘membro’ do Estado, posto que (sic) se encontra em guerra com este, como demonstra a pena pronunciada contra o malfeitor"12. Nas palavras de Jakobs, "Direito Penal do cidadão mantém a vigência da norma, o Direito Penal do inimigo (em sentido amplo: incluindo o Direito das medidas de segurança) combate perigos; com toda certeza existem múltiplas formas intermediárias"13. Como se vê, é negada ao inimigo a sua condição como pessoa. Os pilares do Direito Penal do Inimigo estão assentados na antecipação da punição do inimigo, na desproporcionalidade das penas e supressão de garantias PAGE \* MERGEFORMAT 14 12 JAKOBS, Günther, MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo: Noções e Críticas. 2ª ed. Trad. André Luís Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 25. 13 Ibidem, p. 30. O Direito Penal do Inimigo é o legítimo inimigo da sociedade, pois tenta reduzir o ser humano a um simples ponto de imputação normativa e, flagrantemente, afronta ao texto constitucional. A aplicação deste absurdo é um retrocesso na história da humanidade. A intolerância e a incapacidade do Estado em lidar com os novos fenômenos da criminalidade organizada, fazem com que o Direito Penal seja visto como a única solução para resolver o problema. Ledo engano. Um erro, não pode ser consertado com outro. Violência não se combate com violência e criminalidade não se combate de maneira desorganizada. As soluções e o comprometimento com a Nação precisam aparecer, para que o país possa sair desse caos, que há muito se encontra e, o povo brasileiro possa ser levantado, com a certeza e esperança de que o Brasil, realmente, é o país do futuro. 2.1. A importância do vínculo familiar A criminalidade e a violência são assuntos bastante atuais. É certo que o mundo atual apresenta novos desafios. A sociedade atual está marcada por comportamentos preponderantemente egoístas e individualistas. As pessoas se tornaram mais concentradoras de renda e conhecimento. A competição entre elas é muito grande e os vínculos familiares estão a cada dia se desfazendo. O consumo de todos os tipos de drogas está carcomendo a base de nossa sociedade, que é a família18. O atual sistema capitalista e mercantilista integrado pelo processo de globalização, aliado às premissas acima expostas, concorre para o crescimento da onda de violência indiscriminada que grassa por todo mundo afora. Esse é, sem dúvida, um processo de exclusão social. Como bem mostra o Sociólogo Celso Antonio Pinheiro de Castro, em sua Obra Sociologia do Direito,: As relações primárias na família sofrem a concorrência das interações de seus membros em outros grupos – profissional, recreativo e outras associações -, sem contar o adversário doméstico: o televisor. Considerando-se a redução dos membros, tem-se constatado que as separações judiciais e os divórcios, nos países que mantêm essa instutuição, são mais freqüentes em famílias de PAGE \* MERGEFORMAT 14 18 FERNANDES, Newton. Teoria Geral do Crime (Por que o Crime Acontece?). São Paulo: N. Fernandes, 1998. p. 286. menor número de membros. No Brasil, ainda não dispomos de dados substanciais para uma análise, em profundidade, referente à descoberta de melhor forma de constituição familiar.19 A instituição mais antiga da humanidade, certamente, é a família, que hoje passa por profunda crise. É no seio da família que a gente nasce e cresce como pessoa, como filho, como irmão. A cultura moderna parece ter tramado uma espécie de conspiração antifamiliar, que se manifesta de diferentes formas. São as uniões de fato que se autodenominam família, com ausência ora do pai, ora da mãe, ora dos filhos. Uniões do mesmo sexo, uniões sem vínculo jurídico ou religioso, matrimônios de experiências e o chamado casamento aberto, em que é consentido o envolvimento íntimo com outras pessoas, fora do matrimônio. A queda dos valores fez com que o aborto, o divórcio, o adultério e a esterilização se tornassem comportamentos tidos por naturais e até legais. As ambigüidades da sexualidade hoje no casamento são evidentes: sexo sem procriação e procriação sem sexo - proveta, clonagem -, sexo sem amor e sem vínculo matrimonial, sexo seguro e sem pecado. A respeito do que seja um comportamento normal sobre a sexualidade nos dias atuais, ressalta-se o ensinamento do professor Newton Fernandes ao proferir que: Os psicólogos e os psiquiatras, em suas clínicas, procuram, frequentemente, em suas experiências profissionais, estabelecer o que é normal ou não nesse campo. Infelizmente, porém, a carga de problemas paralelos, trazida pela respectiva clientela a esses consultórios, não raro, lhes torna impossível ou mesmo impossibilita-os de chegar a uma idéia clara da amplitude de experiências normais. Fragilizada no amor, a família sofre ainda com o desemprego, droga, alcoolismo, trabalho fora de casa, e os filhos são os mais atingidos. Os pais, por não serem onipotentes, são afetados pela vida dos filhos e precisam de muita ajuda. Nessas alturas, até um pequeno afago resolve muitos problemas. Urge buscar e aceitar ajuda. Nesse sentido, é de sobrelevar importância salientar que “a disseminação das drogas destrói a vida, perverte as relações humanas, explora os indivíduos, principalmente os jovens e as crianças, corrói a vida familiar, inspira ações PAGE \* MERGEFORMAT 14 19 CASTRO, Celso A. Pinheiro de. Sociologia do Direito. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 104-105. criminosas e debilita a fibra moral dos indivíduos e por via de conseqüência de toda comunidade humana”20. Uma concepção perversa da liberdade entra na família, e as pessoas confundem arbítrio pessoal, justificação de atos nocivos, amor livre, tolerância sem limites, domínio dos outros, interesses egocêntricos, com liberdade. Tudo acaba em incomunicabilidade, solidão, orfandade, distância. Crescem muros onde deveria haver as pontes do diálogo, perdão, ternura e oração. A facilidade destrói a fidelidade. A pessoa humana nunca se desliga do refúgio emocional, sentimento que remete à necessidade de carinho, elogio, valorização. O individualismo e a indiferença geram um clima turbulento em sua casa. A pessoa humana não se contenta em ser amada, ela precisa saber que é amada. A tentação do dinheiro, do consumismo, da aparência, da inveja, da competição, arrasta maridos, pais e filhos para negócios, sucessos profissionais, enquanto o lado humano e espiritual é prejudicado. Os filhos assumem o comando e se tornam os ditadores dos pais que cometeram erros de amor, isto é, com a intenção de ajudar acabam por estragar seus filhos. Onde falta presença, colo, aleitamento materno, amor entre marido e mulher, está sendo gestado um futuro toxicômano. A solução não está em culpar-se, lamentar, desanimar, mas em aceitar ajuda, querer aprender e mudar. Assim, a família se torna esperança da sociedade. Muitos sofrimentos estão vinculados à frustração familiar, mas, por outro lado, grandes alegrias são curtidas na família bem-sucedida. Lares não se improvisam. Quem planta nada, colhe nada. Ocorre, então, salvar a família pelo namoro sadio, do noivado, melhor, desde o útero materno. A educação de uma criança começa 20 anos antes de ela nascer. 2.2. A influência da mídia e do meio social PAGE \* MERGEFORMAT 14 20 FERNANDES, Teoria. Op. cit. p. 286. É nesse sentido que se ressalta a não existência da imparcialidade da mídia no momento da transmissão e/ou publicação da notícia sobre o determinado crime ou criminalidade. Essa influência da mídia afeta inclusive um dos aspectos mais usados pela segurança pública para o alcance do bem estar social, que é a segurança subjetiva24. Isto quer dizer que crimes podem estar ocorrendo, mas o seu impacto é tão ínfimo que a sociedade sente-se segura mesmo que na realidade não esteja. Ocorre ainda que, esse vício de superdimensionar a criminalidade, muitas vezes acaba por surtir um efeito contrário, pois, mesmo os índices de criminalidade reduzam-se de forma surpreendente, a sociedade ainda acreditará piamente que o índice é assustadoramente alto e irreversível. Merece destaque nas análises entre produção da alteridade e a criminalidade, as relações entre as classes sociais. As classes menos favorecidas estão mais sujeitas à violência e à criminalidade, e são, freqüentemente, mal vistas pela classe média, que tende a atribuir aos pobres a culpa pela existência da violência. A diferença entre as classes parece tornar-se uma guerra de dois lados opostos. Ao analisar a desqualificação social, verifica-se que a pobreza assume um status social desvalorizado, o que obriga os pobres a viverem numa situação de isolamento, procurando dissimular a inferioridade de seu status. A mídia, frequentemente, parece corroborar essa desqualificação, uma vez que a violência produzida e/ou mantida pela elite não tem a mesma cobertura e ênfase que fenômenos ocorridos nas comunidades pobres, contribuindo ainda mais para a associação entre pobreza e violência. De maneira geral, o que se pode notar, na TV, rádio e jornais, é quase uma campanha de culpabilização coletiva dos pobres pela violência. Através das imagens e das palavras eles são rotulados. não se vêem mais pessoas, tornam-se rótulos. PAGE \* MERGEFORMAT 14 24 A segurança apresenta dois aspectos importantes ou duas formas de apresentar- se, de acordo com Valla, a segurança pode ser entendida como aquela situação, proporcionada ao indivíduo, consciente de que nenhum direito seu, atual ou em expectativa, lhe será negado, pela ausência de risco, isto é, pela segurança objetiva, pela crença do indivíduo na ausência de risco - segurança subjetiva. Entendemos que a ausência total de riscos é utópica, pois a insegurança está implícita à existência humana, sempre cercada de adversidades de toda ordem, sejam conhecidas e determináveis ou totalmente aleatórias e descontroladas, restando somente a segurança subjetiva, a crença na ausência do risco. (VALLA, Wilson Odirley. Doutrina de emprego de Polícia Militar e Bombeiro Militar. 1ª ed. Curitiba: Associação da Vila Militar Publicações Técnicas, 1999. p. 70). Vêm-se carentes, favelados, ladrões, menores infratores, delinqüentes, criminosos, bandidos, viciados, porque parece que a sociedade deve reconhecer que há mortos dignos e outros indignos. Há violências que não contam, é como se fossem ritos necessários à depuração da sociedade. Por isso, os direitos humanos de reivindicações democráticas, acabam sendo vistos como “privilégios de bandidos”, ganhando uma valoração negativa entre a sociedade. As políticas de segurança são influenciadas na medida em que a mídia deixa de ser um meio de comunicação de primordial divulgação e reflexão de novas representações sobre a violência, e não contribui com uma visão menos estigmatizante e estereotipada dos problemas sociais. Ao agir dessa forma, passa a forçar a confecção de normas ineficazes por parte do poder legislativo, usando-se apenas como parâmetro para tal, um caso específico que tenha gerado grande divulgação nacional e/ou internacional. Exemplo disso foi a rápida edição da já inconstitucional, ao menos em alguns aspectos, lei de crimes hediondos. É público e notório que tal lei surgiu de forma rápida e errônea devido ao grande lobby realizado pela mídia nacional, principalmente a televisiva, para que os crimes considerados como “mais repulsivos que os demais”, tivessem agravações nas sanções judiciais e a negação do exercício de alguns privilégios ou direitos, garantidos inclusive pela própria Carta Magna Nacional. Posteriormente, como já previsto por alguns especialistas em criminalidade, verificou-se, estatisticamente, que a referida lei não reduziu em nada o índice de criminalidade, causando efeito contrário ao gerar mais um problema a ser solucionados pelo Estado que é a superpopulação carcerária, consoante informações contidas no relatório final de pesquisa “Lei de Crimes Hediondos como Instrumento de Política Criminal”, realizado pelo Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente – ILANUD/ Brasil.25 PAGE \* MERGEFORMAT 14 25Nações Unidas. ILANUD. Relatório final de pesquisa “Lei de Crimes Hediondos como Instrumento de Política Criminal”. Disp. em: < http://www.prsp.mpf.gov.br/ prdc/area-de-atuacao/torviolpolsist/RelILANUD.pdf>. Acesso em: 16 de maio de 2009. Conforme visto, considera-se a violência uma característica contemporânea, que emana da evolução do homem, da globalização, da exclusão e dos diversos níveis sociais. Ocorre, todavia, que a violência, e por conseqüência a criminalidade, não se encontram restritas apenas a esse ambiente. Quem assim pensa só conhece da violência atual das megalópoles, e já se equivoca porquanto desde os primórdios a violência acompanha a conduta humana, ou melhor, faz parte da natureza do homem independente deste encontrar-se em ambiente urbano ou rural. Naquele sentido, quando se fala de violência, está se deixando à margem aquela violência do campo onde as contendas são resolvidas “na base do facão”, porquanto, não se revestem na degradação lato sensu do homem. Como anteriormente citado, algumas pessoas cometem crimes levados pela influência do meio em que vivem. Nesse passo, “condição social” abarca uma gama de características, como: condição econômica: renda insuficiente ou inexistente, oportunidade de trabalho; formação de caráter: estrutura familiar na qual foi criado e na qual vive atualmente, educação, escola, creche; condições dignas de moradia: habitação com infra-estrutura adequada para um ser humano; entre outras. Não se pode olvidar, como conseqüência da falta de condições mínimas de sobrevivência, a precária alimentação do corpo que influi na má formação física, psíquica e biológica do homem, tornando-o “apto” a delinqüir; e ainda do louco criminoso que da patologia que possui, independente de sua fonte, acarreta o crime.26 E mais, há que levar em consideração todo o espetáculo imposto pela cultura midiática, que através dos tempos tem ditado todas as regras do que seja a “normalidade comportamental social”, ou seja, a maneira mais correta e aceitável de se portar perante as pessoas, uso de roupas, tênis, músicas, livros, bebidas, cigarros e outras “especiarias” que fazem parte do mundo moderno. Os programas televisivos colocados à disposição das classes mais carentes da sociedade em nada contribuem para o crescimento intelectual dessas pessoas, a não ser consumir aquilo que lhes é apresentado, sob pena de se ver sumariamente excluído das relações sociais. PAGE \* MERGEFORMAT 14 26 FERRARI, Eduardo Reale. Medidas de Segurança e Direito Penal no Estado Democrático de Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 154-155. Na sociedade pós-industrial, a passagem para a vida adulta envolve patamares mais difíceis e complexos de serem alcançados. Os jovens têm de se confrontar com aspectos de ordem social, econômica, política e profissional, o que faz desta passagem um processo muito mais penoso. Assim, qualquer que seja o contexto sociocultural, a adolescência será sempre um período de crise e de desequilíbrio. Estas características são devidas tanto às mudanças fisiológicas que se processam quanto às repercussões psicológicas de inserção do jovem na comunidade adulta28. Assim, se a vulnerabilidade psicoemocional é uma característica comum à juventude, o que dizer dos jovens pertencentes aos segmentos pobres dos bairros periféricos e das favelas, que são desprovidos de quase todos os meios de reconhecimento social? Estes jovens, além da privação material, enfrentam ainda a exclusão simbólica, o sentimento de não pertencimento, pelo simples fato de não corresponderem aos padrões estéticos que são valorizados pela sociedade, onde o acesso a determinados serviços e bens de consumo como escolas, clubes, óculos, roupas de marca e carros do ano, são a senha para a inclusão. Destarte, o debate em torno da influência da renda sobre a violência está ainda muito longe de ser concluído. Embora os jovens de baixa renda, moradores de áreas periféricas e favelizadas, sejam mais expostos à violência. As condições socioeconômicas não são suficientes para explicar os motivos pelos quais alguns deles, extremamente pobres, optam pela criminalidade e a grande maioria, apesar de viverem em um contexto de privações sociais similar, continuam trilhando o caminho da legalidade. Por sua vez, a hipótese de que a pobreza e a desigualdade social contribuem para o aumento da violência também não é capaz de responder aos motivos que levam jovens, bem nascidos, moradores dos bairros nobres das grandes cidades, a cometerem crimes hediondos que chocam a opinião pública. Constata-se ainda que a desigualdade social impõe fortes dificuldades de acesso dos jovens de baixa de renda à escola de qualidade e ao trabalho não precário. Este aspecto faz com que estes jovens fiquem mais vulneráveis a serem agentes ou vítimas, muitas vezes fatais, da violência. PAGE \* MERGEFORMAT 14 28 Ibidem, p.26. Os aspectos aqui discutidos trazem algumas pistas para se pensar estratégias para a juventude. A primeira questão extremamente importante refere-se à necessidade da ampliação da escolaridade dos jovens com vistas aumentar suas chances de inclusão. A segunda passa, necessariamente, pela introdução de mecanismos compensatórios que aumentem a renda dos jovens extremamente pobres. Programas de transferência de renda direta que incentivem a freqüência à escola podem colaborar para o alcance da autonomia e da independência, que são os dois principais objetivos perseguidos pela juventude. A terceira questão é a lembrança de que os jovens não se movem apenas pela dimensão material. No tocante à juventude, as mediações simbólicas são tão ou mais importantes do que a renda. Estratégias que permitem ampliar o acesso dos jovens à cultura, à música, ao esporte, ao lazer e à tecnologia digital, por exemplo, podem contribuir de forma significativa para a diminuição da violência. Finalmente, é importante pensar formas e meios que desenvolvam e consolidem valores de paz e de solidariedade entre os jovens. Nesta linha, encontram-se os incentivos para o desenvolvimento de ações comunitárias realizadas de jovens para jovens, bem como a participação da juventude, principalmente universitária, em trabalhos de extensão nas comunidades. 2.3. A estrutura educacional Os dias de hoje têm sido palco de uma crise geral nas instituições responsáveis pelas políticas de prevenção à criminalidade e violência. Fala-se em crise nos órgãos de segurança pública, no sistema penitenciário, no Direito Penal, nas Instituições para menores infratores, e demais órgãos, sempre desconsiderando o fato de que todo esse estado de coisas é um reflexo da crise da sociedade em seus mais amplos espectros. A trajetória de violência que vem se desenvolve nesse país é produto de uma das mais graves crises: a da educação, pedra angular da formação dos indivíduos e do Estado Democrático de Direito. Quando esse segmento da atividade humana PAGE \* MERGEFORMAT 14 fracassa, não há política de segurança pública que possa conter a onda de criminalidade. O renomado criminologista Alessandro Baratta já houvera alertado que “os resultados das pesquisas sobre o sistema escolar nos permitem atribuir ao novo sistema global de controle social, através da socialização institucional, a mesma função de seleção e de marginalização que, até agora, era atribuída ao sistema penal, por quem repercorre a história sem idealizá-la”29. E ainda: A complementaridade das funções exercidas pelo sistema escolar e pelo penal responde à exigência de reproduzir e de assegurar as relações sociais existentes, isto é, de conservar a realidade social existente. Esta realidade se manifesta com uma desigual distribuição dos recursos e dos benefícios, correspondentemente a uma estratificação em cujo fundo a sociedade capitalista desenvolve zonas consistentes de subdesenvolvimento e de marginalização.30 Sem as normas educacionais, morais e religiosas, que atuam na formação e na inibição do indivíduo para a prática de crimes, dificilmente o Estado conseguirá conter a criminalidade. A sociedade desorganizada e deseducada continuará sendo uma “fábrica” de criminosos, e o Estado, na mesma proporção, continuará despendendo dinheiro público para conter tais criminosos. É um grande círculo vicioso que só a educação comprometida poderá romper. No entanto, há anos o Poder Público atua com descaso na formação dos indivíduos. Muitas vezes as escolas construídas são verdadeiras mega-estruturas, mas não contém o que realmente importa: condições para a formação do indivíduo como cidadão, isto é, como indivíduo construtor de sua trajetória individual e social. Assim, o Estado Democrático de Direito, sem cidadãos formadores de opinião, participativos e conscientes, é uma verdadeira falácia. O Poder Público se esquece que a formação do cidadão não se resume à construção escolas e à inserção dos menores nessa estrutura. Até porque a maior parte desses menores advém de ambiente familiar nocivo, onde imperam maus- tratos, drogas e álcool. E para piorar, dessume-se que em grande parte dos casos, os próprios menores já se encontram num quadro de alcoolismo e de dependência química. PAGE \* MERGEFORMAT 14 29 BARATTA. Op. cit. p. 171. 30 Idem. Das muitas coisas de difícil compreensão, uma acaba de despertar atenção especial, após leitura de estudo divulgado sobre a queda no número de homicídios no Brasil e sua relação direta com o programa "escola aberta"32. Embasado em estatísticas, criticas são formuladas para relacionar a manutenção dos jovens nas escolas como medida profilática para a continuidade na redução dos delitos que os mesmos protagonizam quando estão ociosos. A bem da verdade, tal ligação parece ser óbvia. Não há razão para se duvidar que a presença dos mesmos em instituições educacionais, onde suas poucas opções se multiplicarão, face ao espírito inovador e construtivista das mesmas, será mais saudável que sua permanência nas comunidades carentes e caóticas em que vivem. Há muito tempo, todavia, escolas, faculdades e demais instituições optaram pela troca de nobres características e adjetivações como "centros de arte", "espaços educacionais" ou ainda "adubo da criatividade" pela simples e lucrativa denominação de shopping de informações. É difícil saber quem deu início ao que encontramos nestes locais hoje em dia. A própria ciência tem sua cota de participação quando resolveu sistematizar cartesianamente todo o conhecimento, separando-o em infinitos ramos que, no lugar de se unirem, terminaram fazendo o exato oposto para facilitar a especialização que o mercado, por sua vez, cobra. Com o saber fatiado e embrulhado, é a vez das tais instituições entrarem na relação, unindo a técnica “x” com a experimentação “y” para vender a formação “z”. Tal receita, após formulada, não pode ser modificada, pois afetaria toda a cadeia produtiva, tornando inútil qualquer interpretação criativa dos consumidores, pois suas opiniões sobre o que lhes é ensinado não possuem valor. É possível que o neoliberalismo seja corresponsável, já que estabelecendo a doutrina quase religiosa das relações de consumo e livre comércio, exige tacitamente tais resoluções. Entretanto, o Estado não é menos responsável, pois é ele quem resolve adotar tal modelo. Todavia, as reflexões aprofundadas sobre as origens de tal complexo cenário, terminam por se distanciar do foco principal desta reflexão. PAGE \* MERGEFORMAT 14 32 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Escola Aberta. Disp. em: <http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=escola_aberta.html>. Acesso em 19 de maio de 2009. Nos diversos centros universitários espalhados pelo país, uma catraca eletrônica separa o organizado campus do caos instalado do lado de fora, onde grande quantidade de comerciantes disputam acirradamente seu espaço. Tudo pode ser encontrado. Entretanto, é fato que o produto mais consumido é a cerveja. Nos corredores, discussões sobre a obra de Marx, Descartes ou pilar de semelhante importância para aquilo que é apresentado nas aulas são substituídas por especulações sobre os próximos capítulos da novela das oito, a situação dos times de futebol locais e, naturalmente, os planos etílicos para o fim de semana. As salas, climatizadas e organizadas, cedem o espaço de suas vastas paredes a coisa alguma no lugar de exibirem mapas, estudos ou qualquer objeto de interesse relevante e coletivo. Os professores, visivelmente abatidos pela extensa carga horária, chegam pontualmente dez minutos após o horário e sairão outros dez antes do término. A metodologia não é outra se não a usada há três gerações passadas. Maquiadas pela utilização de caros equipamentos como notebooks, datashows e modernos sistemas de som, o mestre nada mais faz do que ditar para que suas palavras sejam copiadas. Como ninguém é de ferro, a oratória é interrompida vez por outra por assunto ou comentário de natureza cotidiana até a chegada do longo intervalo. Neste, as mais diversas fomes e sedes são saciadas tanto do lado de fora quanto de dentro, com a diferença no atendimento exclusivo proporcionado por lanchonetes terceirizadas. Voltando à sala, não é raro a entrada, permanência, interferência e aplausos ao cidadão que resolveu se embriagar em um dos muitos bares em frente da instituição. Verdadeiros heróis, são acolhidos pelos demais que não cansam de agradecer por suas interrupções contínuas na fala tecnicista do orador que repetidamente olha para o relógio, ansioso pelo fim da jornada. Por volta das 22h, com o fim das aulas, uma espécie de festa pré- carnavalesca é ensaiada fora do campus. Carros com as malas abertas tocam os últimos sucessos para que jovens senhoras possam dançar, namorar e estreitar os laços de amizade com seus colegas de curso que, dispensando as fermentadas, exibem com orgulho os caros rótulos de seus destilados doze anos. PAGE \* MERGEFORMAT 14 Subtrai-se de tal cenário todos os recursos, infra-estrutura e pré-formação dos alunos, já que, bem ou mal, passaram por processo seletivo e, por fim, as tão chamadas oportunidades futuras. De outro turno, resta pouco para ilustrar sobre a rotina dos desfavorecidos suburbanos protagonistas do citado estudo. Poderia ser o caso de especular sobre a recorrente alternativa de conduta diversa, diante do obscuro futuro. Desta forma, teríamos uma explicação dedutiva e lógica para a postura dos mesmos. Uma segunda opção parece adequada se tal reação nasce da comparação entre a dura realidade das periferias e as fantasiosas oportunidades agarradas à força em virtude do desespero, insatisfeitos com o que têm e deslumbrados com a expectativa do que poderiam ter. Newton Fernandes, ao falar sobre escola e educação, acentua que: Muitas vezes, no entanto, todo o trabalho dos pais se perde, quando seus filhos vão para a escola e ali passam a receber más influências de outras crianças, principalmente nos dias que correm, onde as escolas são invadidas por usuários e traficantes de drogas, além dos abusos sexuais cometidos dentro da própria unidade de ensino, envolvendo, não só alunos com alunos, mas às vezes até professores (indignos da profissão que exercem) com alunos e até outros professores. Registros policiais, a respeito corroboram a nossa afirmativa. E isso acontece com todos os graus de ensino.33 Entretanto, especulações à parte, parece imperativo que tais estudos passem a incluir as razões que proporcionam tais baixas na violência praticada pelos contemplados da iniciativa "escola aberta" para, quem sabe, delas chegarmos a outros projetos, inclusive aquele que poderá combater a mediocridade e futilidade dos favorecidos, pois não serão outros que mais à frente passarão a constituir o poder governante. PAGE \* MERGEFORMAT 14 33 FERNANDES, op. cit. p. 308. 3.1. O imediatismo como forma de legislar em detrimento das políticas criminais A Política Criminal em nosso país atua de forma diferenciada, em função da possibilidade de consumo das pessoas alvo de tal política. Esta não é discutida de forma democrática, mas influenciada pela mídia que possibilita ser o movimento “Lei e Ordem” vencedor no que se refere ao agravamento de penas. Cuida-se apenas para a criação novos tipos penais, medidas paliativas, sem se importar com medidas que sejam realmente efetivas para a diminuição da criminalidade e o tratamento aos que já se encontram sob a tutela estatal. Impende salientar que apesar da despenalização trazida pela Lei dos Juizados Especiais, não avançamos no sentido da descriminalização de condutas ou ainda, retirada das mesmas do âmbito penal. A política criminal coloca como alvo pessoas vítimas da seletividade e vulnerabilidade do sistema penal, o que só vem a reproduzir um sistema de desigualdade social que já se encontra arraigado na história dessa nação. Uma das maiores contribuições da sociologia criminal foi, sem dúvida, permitir a compreensão de que assim como a criminalização é resultado de um pensamento dominante em determinado momento e local, o criminoso é resultado de seletividade que se impõe sobre um grupo de pessoas vulneráveis e que correspondem a um estereotipo, este é o espelho do ser atávico lombrosiano35. Desse modo, ao se analisar o pensamento que preside a legislação criminal, em especial, a da década de 90, portanto em plena vigência, não só observamos o cumprimento desta lógica, mas esta vai além, sendo permeada por um tratamento diferenciado entre consumidores e não consumidores, excluídos e os outros. Para os consumidores, uma lei que despenaliza, para os indivíduos “redundantes” outra que fere os princípios constitucionais da dignidade humana. Ao tratar do assunto, impende salientar o conceito de Política Criminal e abordar as mais importantes Leis que aplicadas justificam o que se afirma. A política criminal está relacionada com a política social, isto é, seu desenvolvimento conforma-se com o momento histórico - sócio/cultural/econômico - em que se vive numa determinada época. E para implementar tais políticas, foi PAGE \* MERGEFORMAT 14 35 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 284. instalado em junho de 1980 o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que tem por escopo, nas palavras do festejado doutrinador Mirabete, “a implementação, em todo território Nacional, de uma nova política criminal e, principalmente, penitenciária com base em periódicas avaliações do sistema criminal, criminológico e penitenciário, bem como a execução de planos nacionais de desenvolvimento quanto às metas e prioridades da política a ser executada”36. Viver num Estado democrático de direito, à primeira vista, pode dar a impressão de que a política criminal em seu conteúdo mais amplo seja a melhor para a sociedade. Evidentemente, não temos um parâmetro empírico que nos permita avaliar a aceitação popular de tantas medidas repressivas que ferem direitos de cunho constitucional, máxime quando as mais agressivas são divulgadas e exercitadas em momentos de crimes graves, amplamente noticiados. Neste contexto, as propostas de legislações para exacerbamento de penas, acabam sempre por serem vistas como forma de contenção da criminalidade e, aliado a isto, observa-se parecer existir um interesse em desviar a atenção da sociedade de outros problemas como: desemprego, taxas de juros, inflação, pobreza, corrupção, entre outros. A política criminal deve ser orientada por determinadas linhas argumentativas que devem partir da ótica do respeito à dignidade da pessoa humana, cujas definições nem sempre se encontram inseridas em determinadas estruturas culturais e sociais que deveriam respeitar o próximo e ter garantido o direito à vida e a integridade corporal, não se admitindo tratamentos cruéis, humilhantes e nem penas desumanas. A intervenção penal deve ser humana. Pugna-se, na atualidade, por meios de punição mais benignos, embora se verifique grande lentidão para alcançá-los. Deve ser ainda considerado que o Direito Penal é subsidiário e fragmentário e por tal só deve intervir em questões como ultima ratio, o que significa que só pode ser merecedora de pena a infração cujo bem jurídico necessite da proteção do direito penal, excluindo-se se realizado por outros meios protetores. A mídia, cada vez mais tem participação na política criminal e atua de forma eficaz na elaboração de leis que representam contundente retrocesso, conforme se constata com a edição da lei de crimes hediondos e, ainda, pela forma como a PAGE \* MERGEFORMAT 14 36 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei 7.210, de 11-07-1984. 11ª edição. São Paulo: , Atlas, 2004. p. 171. questão penitenciária vem sendo tratada. Não há como convencer de que amontoar pessoas em um espaço onde não cabem todas deitadas não seja tratamento humilhante e indigno. Não há como não se indignar com penas elevadas, aplicadas sem atendimento aos preceitos da política de execução como, possibilidade de trabalho, progressão de regime, entre outros. Nesse diapasão, dessume-se que a Lei de Crimes Hediondos não é só resultado de um momento específico, assentado em determinado tipo de criminalidade. É muito mais. É resultado do método de colonização colocado em prática e da evolução do processo de entronização das desigualdades econômico- financeiras e sociais deste país. Os criminosos alcançados por esta lei são os: ontem escravos, hoje massas marginais urbanas, que só conhecem a cidadania pelo seu avesso, de maneira autodefensiva da opressão dos organismos do sistema penal vigente. A política criminal deveria, primeiramente, fazer parte de um planejamento de atuação que fosse delineado pari passu pela mobilização dos vários segmentos sociais como: agências de controle, juristas e demais instituições. Poder-se-ia começar a partir da elaboração de um diagnóstico que contemplasse o estudo da criminalidade em determinados locais e necessidades, não para enfrentamento à criminalidade, mas de efetiva prevenção, que provavelmente poderá se dar mais pelo envolvimento de outras disciplinas das áreas de saúde e sociais, do que propriamente jurídica. A política criminal, diferentemente de outras políticas não vem comportando discussão democrática. A sociedade civil, ao discutir alguma questão relacionada à criminalidade, não percebe o impacto provocado pela divulgação sensacionalista da mídia, que impede um julgamento imparcial e opiniões isentas de manipulação. É urgente estabelecer mudanças de conduta, no sentido de espargir a discussão sobre política criminal, tais como: colocar a discussão na voz dos conhecedores do assunto, isto é, juristas, criminalistas, operadores do direito e; ampliar a discussão, retirando-a do fórum elitizado e incluindo a participação da sociedade. 3.2. A carência de técnica legislativa PAGE \* MERGEFORMAT 14 Contravenções Penais, por exemplo, considera crime o ato de mendicância40. Esse artigo, inclusive, será avaliado em breve pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara41 para que seja retirado da lei. A lei é de 1941, mas está em vigor e uma pessoa flagrada na prática de mendicância pode ficar até três meses na cadeia, sem direito à fiança. Sua aplicação estrita limparia as esquinas das grandes avenidas de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. A Lei de Contravenções Penais é rica em situações como essa. Em seu artigo 59, classifica como criminoso o sujeito apto ao trabalho que se entrega à ociosidade. Até fazer reunião secreta é crime42. O problema é saber quem é que vai descobrir isso, já que a reunião é secreta. No caso tem-se uma boa desculpa na obsolescência de uma lei antiga, ultrapassada pelo tempo. Mas modernidade não é garantia de bom senso legislativo. Mesmo o melhor dos propósitos não é garantia para que se produza a melhor lei. Na cidade de Bocaiúva do Sul, no interior do Paraná, em 1997, o prefeito baixou decreto proibindo a venda de camisinhas e anticoncepcionais. A justificativa do prefeito era razoável: legislou preocupado com a perda de receita do município diante da diminuição da população e dos repasses federais43. A solução encontrada é que não era adequada. Os excessos e os maus tratos infligidos à lei, servem até para engordar a literatura de humor nacional, mas têm um componente perverso: contribuem também para banalizar as normas de convivência social. Diante disso, importa ressaltar a oportuna filosofia de Habermas ao mencionar que no sistema jurídico, o processo da legislação constitui o lugar propriamente dito da integração social. Por isso, há que supor que os participantes do processo de legislação saem do papel de sujeitos privados do direito e assumem, através de seu papel de cidadãos, a perspectiva de membros de uma comunidade jurídica livremente associada, na qual um acordo sobre os princípios normativos da regulamentação da convivência já está assegurado através da tradição ou pode ser PAGE \* MERGEFORMAT 14 40 Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941. Artigo 60. 41 Projeto de Lei nº 75/05, da Câmara dos Deputados Federais do Brasil, de 15 de agosto de 2005. 42 Decreto-Lei nº 3.688. Art. 39. 43 CARDOSO, Antonio Pessoa. Associação dos Magistrados Brasileiros. As leis ridículas no Brasil. Disp. em: < http://www.amb.com.br/index.asp? secao=artigo_detalhe&art_id=525>. Acesso em: 22 de maio de 2009. conseguido através de um entendimento segundo regras reconhecidas normativamente.44 Lamentavelmente, alguns dos que são eleitos não estão preparados para legislar. A pessoa não precisa, necessariamente, ter conhecimentos de legislação, mas que seja um legítimo representante da comunidade e tenha condições para exercer essa função. 3.3. A fragilidade da lei diante das reformas parciais A primeira e fundamental indagação que todos certamente formulam é a seguinte: mais reformas para quê se os índices de violência continuam aumentando a cada dia? Por quê reformas parciais? Por quê não aprovar Códigos inteiros? Qual é a qualidade técnica das inovações em andamento? O quê se pode delas esperar em termos de redução da violência e da criminalidade? Estaria o legislador aproveitando o ano eleitoral para iludir a população com mais reformas, puramente, demagógicas? Premissa número um: se mudanças na legislação resolvessem o problema da criminalidade, o Brasil hoje já seria um paraíso, país da tranqüilidade e da segurança. Continua, entretanto, ostentando a condição de um “paraíso” penal, país da impunidade. Os anos 90 foram os mais prósperos em produção legislativa penal: mais de 100 leis criminais. As mais rigorosas sempre coincidiram, não por acaso, com o período eleitoral, senão vejamos: 1990, primeira lei dos crimes hediondos, 1994, segunda: tornou o homicídio qualificado crime hediondo, e 1998, lei dos remédios falsificados. E nada disso resolveu o problema da criminalidade. Sobre esse fato, mister se faz o registro das oportunas considerações o eminente doutrinador Aury Lopes Junior, ao afirmar que: “o Brasil já foi contaminado por esse modelo repressivista há mais de 10 anos, quando a famigerada Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90), seguida de outras na mesma linha, marcou a entrada do sistema penal brasileiro na era da escuridão, na ideologia do PAGE \* MERGEFORMAT 14 44 HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia entre facticidade e validade. Vol. I. 2a ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. p. 52-53. repressivismo saneador. A idéia de que a repressão vai sanar o problema é totalmente ideológica e mistificadora”45. O IPEA, Instituto de Pesquisas Econômicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal, no ano de 200546, através de dados estatísticos oficiais, realizou um estudo referente ao considerável aumento no índice de violência no país. Constatou-se que de 1992 a 1999 os homicídios passaram de 18,8 para cada 100 mil habitantes para 25,04, ou seja, mais de 35% de aumento. Considerando-se que a média mundial era de 5 homicídios para cada 100 mil habitantes, pode-se notar a situação caótica em que o país se encontrara já naquela época. Ninguém, razoavelmente informado, pode alimentar a ilusão de que mudanças na lei resolvem da noite para o dia o problema da violência e da criminalidade. Alguns políticos, especialmente em épocas eleitorais, prometem isso. Mas é pura demagogia! Não sabem que o Direito penal é apenas um dos instrumentos do controle social. Aliás, o mais drástico e, por isso mesmo, o mais moroso, porque a pena só pode ser aplicada corretamente quando observadas as garantias do devido processo legal. Conseqüentemente, não se deve depositar nele toda confiança. Mesmo porque, se se quer dele fazer uso adequado, deve-se reservá-lo para os casos mais graves, de ataques mais intoleráveis para os bens jurídicos mais importantes como: vida, integridade física, patrimônio e outros. Nesse viés, as oportunas palavras dos professores Alexandre Morais da Rosa e Sylvio Lourenço da Silveira Filho, a seguir: A regulação de sentimentos de medo, de insegurança e de ameaça constante representada pela exacerbada exibição da criminalidade opera a canalização de reivindicações de (imediato) arrocho dos meios coercitivos, demarcando o simbolismo necessário para edição de mais e mais leis penais severas, incrementando verdadeira legislação de terror. PAGE \* MERGEFORMAT 14 45 LOPES JUNIOR, Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade garantista. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 15. 46 FERREIRA, Helder. Instituto de Pesquisas Econômicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal. O crescimento dos homicídios de crianças e adolescentes no brasil: 1980 a 2003.Disp.em:<http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/ publicacoes/bpsociais/bps_11/ENSAIO2_Helder.pdf>. Acesso em: 24 de maio de 2009. aspectos concretos, com os quais todos os intérpretes do direito têm uma estreita cumplicidade. Em pleno século XXI, tem-se ainda um Poder Judiciário de pensamento medieval, que procura se impor perante a sociedade pela imponência das cortes e pelas vestes talares dos seus magistrados, descuidando-se do cumprimento eficiente de seu papel constitucional de salvaguarda da justiça, como se o respeito viesse da aparência de poder e não do resultado do trabalho. Já se formou um consenso diante de uma realidade incomodante: o judiciário não funciona. Nenhum cidadão se sente estimulado a buscar a justiça, porque nela já ingressa com a certeza de que será sucumbente, ainda que ao final vencedor na demanda. Com o movimento da cidadania, aumentou o acesso do povo à Justiça. Assim o exercício do direito de ação do cidadão aumentou, com o conseqüente e assustador crescimento da quantidade de ações nos Fóruns. Diante disso, neste momento em que o Poder Judiciário se encontra mal aparelhado e com falta de juízes, acabou emperrado, daí a crítica à morosidade da justiça. A falta de estrutura e ausência de vontade política do Governo Federal em dar condições de trabalho e melhor remuneração para seus componentes gerou grave crise no Poder Judiciário. Trouxe-lhe inclusive descrédito. Destarte, torna-se necessário que o Governo Federal entenda que o conceito de Poder Judiciário deve constituir-se em autêntico e real “Poder”. Há que se encontrar mecanismos que conciliem boa qualidade de sentença, com celeridade processual. O povo tem pressa. Com a era do Real em que a dificuldade da boa qualidade de vida, grave crise financeira, falta de desenvolvimento do país, desemprego e grande movimentação reivindicatória por melhoria de vida, despertou grande interesse do cidadão na busca do Judiciário. O que se percebe é uma enorme defasagem de aparelhamento e de estrutura compatível com as necessidades e realidades deste momento, e o que é pior, nada acontece para mudar esta realidade. Diante disso resta uma indagação: porque os juízes não trabalham em sistema de plantão para dar mais celeridade às suas decisões e assim desafogar as vias judiciais? PAGE \* MERGEFORMAT 14 É mister que haja mudança na mentalidade dos governantes e parlamentares no sentido de tornar a justiça forte, bem aparelhada, salários condignos, para que seus membros trabalhem felizes e com prazer. Acredita-se não ser necessário um prazo muito elástico para a pretendida reforma no âmbito Judiciário, pois, o país está mergulhado num contexto de grave crise de várias ordens, as quais só mudarão com uma inexorável mudança de mentalidade. Fato que não pode deixar de ser considerado é trazido por Fernandes, que menciona a idéia de se considerar que “por seu mau funcionamento, pela morosidade, por suas decisões, às vezes tíbias, consagrando, por exemplo, a impunidade na esfera criminal, a justiça também é um dos fatores institucionais de criminalidade”50. De se lamentar que à “justiça” desse país ainda sejam impingidas características como: Atuar como sistema duplamente seletivo , a Justiça Criminal, através das pessoas criminaliza as ações, através das ações, criminaliza as pessoas. O importante é constatar, graças ao progresso das Ciências Sociais e das tecnologias de pesquisa desenvolvidas neste campo do conhecimento, que a serenidade, o equilíbrio, a razoabilidade, a neutralidade do Direito Penal ou do Sistema Penal escolhem eficazmente suas vítimas. Esta constatação, lembra-nos aqueles versos do poeta José HERNANDEZ, na obra “Martin Fierro”: “A lei é teia de aranha,/ eis a verdade suprema:/ quem for rico, não a tema,/ tampouco aquele que mande:/ porque a rompe o bicho grande/ e aos fracos somente algema”.51 Quem sabe a próxima geração pense diferente, pense mais no interesse público, bem estar da sociedade, bem comum, do que em si próprio. No Brasil, o político honesto é tido como um mito, quando na realidade, ser honesto, é dever do cidadão. A grande meta é a construção de um Brasil feliz e com melhor qualidade de vida, e num futuro, não muito distante, deixar de se encontrar nas ruas e nos campos, os sem-terra, os sem-teto, os mendigos e os famintos. PAGE \* MERGEFORMAT 14 50 FERNANDES, Op. cit. p. 337. 51 LIMA, Miguel M. Alves. Reflexões sobre o tema “violência e justiça criminal”. In: SANTOS, Rogério Dultra dos (org). Introdução crítica ao estudo do sistema penal: elementos para a compreensão da atividade repressiva do estado. Florianópolis: Diploma Legal, 1999. p. 73-74. 4.1. Da morosidade processual A morosidade dos processos judiciais é uma praga que condena a todos os cidadãos brasileiros, frustrando-os quando batem às portas do judiciário na esperança de obter uma reparação justa e adequada pelos direitos lesados.. É preciso urgentemente repensar essa estrutura pesada e excessivamente hierarquizada do Poder Judiciário. O processo tem um caminho longo e perverso. Atravessa três ou quatro instâncias decisórias, quase sempre para concluir o óbvio: o devedor tem que pagar ao credor. E aí surgem as contradições internas, frutos dessa cultura medieval que a sociedade brasileira carrega. A importância do juiz, no olhar míope do judiciário, cresce na mesma medida em que se eleva a instância. E essa falsa concepção de importância que se cultua revela-se não apenas nas reverências exigidas, mas principalmente, o que é mais grave, na própria aplicação de recursos, que se reflete, ao final, na estrutura de trabalho oferecida. Ora, o primeiro grau é a grande porta de entrada do judiciário, onde juiz e cidadão se encontram. É lá que as decisões podem ser realmente construídas com razão e sensibilidade, ingredientes essenciais para as melhores soluções. Mas o que se tem? Primeiras instâncias desprestigiadas e tribunais cada vez mais imponentes e equipados. Uma verdadeira inversão de valores, um flagrante contra-senso. Aonde se decide de modo definitivo mais de 70% dos processos judiciais, menos recursos financeiros são alocados e, conseqüentemente, é onde se têm as piores condições de trabalho. Tudo isso contribui para a morosidade do judiciário. Evidentemente que não é só isso. Poder-se-ia ainda falar de tantos outros entraves da celeridade, como o formalismo processual, o excesso de recursos e o número insuficiente de juízes. Mas o que é lamentar é que algumas das questões ora pontuadas dependem apenas de uma vontade política interna, de uma mudança de mentalidade dentro do próprio judiciário em relação às suas prioridades. Com entendimento análogo ao que fora acima exposado, Fernandes, com muita propriedade, relata a seguinte proposição: De se enfatizar o atual congestionamento do judiciário, por falta absoluta de juizes (atualmente, parece existir 1 juiz para cada 24.000 pessoas) e aí, para resolver a questão, chegam os eternos salvadores da pátria e propugnam pela chamada súmula vinculante (as PAGE \* MERGEFORMAT 14 No mundo da vida está presente um saber não problematizado que é visto pelos atores como uma certeza óbvia e imediata. Quando tematizado, ele deixa de ser mundo da vida para entrar em contato com as pretensões de validade, mas é justamente por meio desse processo de problematização que o mundo da vida se reproduz, enquanto pano de fundo, e forma um complexo de ‘tradições entrelaçadas, de ordens legítimas e de identidades pessoais’. Em sociedades pós-industriais, o mundo da vida opõe problemas para a integração social. Em sociedades arcaicas, ele se apresentava suficiente para garantir a integração social, porque era possível estabilizar expectativas de comportamento e criar o complexo cristalizado de convicções, crenças e tradições, por meio da formação de instituições fortes, regidas por uma autoridade inquestionável, que ritualizava os processos de entendimento de forma a limitar a comunicação, protegendo aquele complexo da instabilidade provocada pela problematização dos conteúdos. O direito ainda está ligado e incorporado nos conteúdos éticos e religiosos não questionáveis, os quais dão a unidade e identidade da sociedade. Mas no processo da modernidade, o risco de dissenso é incorporado à própria dimensão da validade. A diferenciação funcional característica desse processo, amplia os papéis sociais, os interesses, as concepções de vida boa, portanto, amplia os espaços de opção.56 O fato de a teoria de Habermas ter como pano de fundo a ética do discurso, ou seja, estar preocupada com questões de ordem moral, faz com que se torne ainda mais complicado conciliar a perspectiva de uma sociedade multicultural e a possibilidade de um consenso universal, especialmente, pelo fato de que não há mais moral universal, nem conceitos universalmente aplicáveis. Nota-se da análise da teoria de Habermas e de suas críticas, que o risco do dissenso está justamente no suposto perigo de não se poder alcançar, jamais, o consenso e, a partir daí, instaurar-se a imposição, o autoritarismo, a instabilidade e a insegurança. A partir daí, ao se transferir tais questionamentos para a seara do Processo Penal, não se pode olvidar a diferença sócio-cultural existente entre os diversos atores que compõem uma demanda judicial, ou seja, distâncias abismais entre mundos absolutamente diversos entre si, estilos de vida que em nada se parecem, mas que dentro do processo se encontram, formando-se assim, uma relação de domínio e dependência. Diante disso, impende questionar até que ponto o Magistrado, Representante do Ministério Público, e ainda o Defensor constituído pelo Réu, possuem, efetivamente, conhecimento a respeito dos fatos trazidos para a análise do Poder Judiciário? PAGE \* MERGEFORMAT 14 56 REPOLÊS, María Fernanda Salcedo. Habermas e a Desobediência Civil. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. p .68. A par dessa deficiência que impossibilita os integrantes dos órgãos jurisdicionais de exercerem sua funções com maior propriedade, o ínclito doutrinador Alessandro Baratta já se manifestara nos seguintes termos: O insuficiente conhecimento e capacidade de penetração no mundo do acusado, por parte do juiz, é desfavorável aos indivíduos provenientes dos estratos inferiores da população. Isto não só pela ação exercida por esteriótipos e por preconceitos, mas também pela exercida por uma série de chamadas “teorias de todos os dias”, que o juiz tende a aplicar na reconstrução da verdade judicial. Pesquisas empíricas têm colocado em relevo as diferenças de atitude emotiva e valorativa dos juízes, em face de indivíduos pertencentes a diversas classes sociais. Isto leva os juizes, inconscientemente, a tendências de juízos diversificados conforme a posição social dos acusados, e relacionados tanto à apreciação do elemento subjetivo do delito (dolo , culpa) quanto ao caráter sintomático do delito em face da personalidade (prognose sobre a conduta futura do acusado) e, pois, à individualização e à mensuração da pena destes pontos de vista.57 Não há nenhuma novidade no fato de que a maioria dos Juízes de Direito são formados por pessoas que sempre tiveram as melhores condições possíveis para a consecução de todos os seus objetivos, bastando apenas boa vontade e perseverança em seus estudos, escorados em todos os recursos colocados à sua disposição, tais como: carro, livros, materiais didáticos e equipamentos de mídias diversos, cursos de atualização e demais comodidades, para um bom desempenho de suas atividades. Tudo isso, sem contar as regalias recebidas dentro de sua casa, a fim de que possa direcionar tempo integral exclusivamente aos seus estudos. De outro lado, o Réu, pessoa, via de regra, carente, sabedora de todo esse aparato que cerca os indivíduos pertencentes à classe média desse país, porque já viu isso nas telenovelas brasileiras que retratam todo o glamour dos endinheirados deste país, mas que, fatalmente, jamais terá a oportunidade de pertencer a tal mundo, pois, vive sob as condições mais desfavoráveis possível: sem casa própria, educação de má qualidade, e muitas vezes alijado dos direitos mais básicos como: água, energia elétrica e até mesmo comida em seus pratos. E para completar esse quadro de miséria, o vício, a violência e a criminalidade entre seus pares. Estreme de dúvidas, diante do exposto, é no mínimo discutível a validade de decisões que não refletem a realidade apresentada nos processos criminais, isso, devido ao desconhecimento do pano de fundo que permeia cada fato levado ao conhecimento do judiciário. PAGE \* MERGEFORMAT 14 57 BARATTA. Op. cit. p. 177-178. Porquanto, impende salientar que é de suma importância que tanto os acusadores, quanto os julgadores das demandas judiciais, estejam devidamente preparados para o exercício desse mister. Seja no sentido da realização de leituras direcionadas às questões referentes às diferenças sociais que separam e diferenciam a realidade de cada indivíduo; visitas acadêmicas nas comunidades mais carentes de sua região; bem como na elaboração de trabalhos voluntários junto à essas pessoas, pois, somente assim é que se poderá adquirir experiência de vida necessária para a resolução dos problemas que serão colocados sob sua responsabilidade e bom senso, qualidades estas indispensáveis para quem pretende manipular a vida e os interesses de outrem. PAGE \* MERGEFORMAT 14 dos bairros pobres é que estão na mira do aparato policial-judiciário repressivo e que, quando colhidos, são virtualmente massacrados pelo sistema.62 Destarte, mostra-se irremediavelmente necessário que os Poderes constituídos e a sociedade civil organizada enfrentem o tema da concretização dos direitos sociais, pois, somente assim, as causas da criminalidade serão adequadamente equacionadas, em benefício de todos os cidadãos, independentemente do estrato social em que estejam inseridos. 5.1. A corrupção policial Denota-se que a literatura que analisa as questões atinentes à violência e criminalidade no Brasil, não aborda os aspectos inerentes à atividade policial: a criminalidade entranhada nas instituições, membros dos órgãos de segurança pública que se corromperam e a questão da desorganização estrutural desses órgãos. Inúmeros fatores concorrem de forma complexa para a generalização e agravamento da insegurança pública no Brasil. Correntemente, se vê a discussão dos aspectos da má distribuição de renda, haja vista que o Brasil é um dos campeões mundiais da falência do sistema penitenciário brasileiro. Fato lamentável é que grande parte do controle e administração do crime organizado acontece de dentro para fora dos presídios, da impunidade, da inépcia das leis penais, da reforma e controle do judiciário, da corrupção e crimes de colarinho branco, das questões sociais do desemprego, pobreza, dentre outros. Ocorre que, considerar todos esses aspectos sem observar a situação dos órgãos responsáveis por executar as políticas de segurança pública, além de descobrir somente parte das causas do aumento da violência num diagnóstico parcial, efetivamente não consegue estabelecer formas de tratamento pelo fato de que os instrumentos existentes atualmente, legalmente instituídos, se encontram com enormes problemas estruturais. Esses instrumentos da sociedade imbuídos de executar as tarefas de segurança pública são, principalmente, a Polícia Federal e Rodoviária Federal no PAGE \* MERGEFORMAT 14 62 FRAGOSO, Heleno Cláudio, apud BATISTA, Nilo. Punidos e mal pagos: violência, justiça, segurança pública e direitos humanos no Brasil de hoje. Rio de Janeiro: Revan, 1990. p. 94. âmbito Federal e as Policias Civil e Militar nos Estados membros. É fácil perceber que existem graves problemas como a corrupção policial e a violência institucionalizada, e que as estruturas dos órgãos não são qualificadas e capazes de dar as respostas necessárias. A respeito dessa crise histórica que vive a instituição policial brasileira, Fernandes lança sua crítica ao fazer o seguinte questionamento: A polícia é uma das causas institucionais de criminalidade? Resposta: Sim, por sua ineficiência, desestímulo (face aos baixos vencimentos), despreparo e ainda porque ela precisa livrar-se de três carcinomas, apontados, pelo ínclito Delegado de Polícia aposentado e escritor, João Milanez da Cunha Lima, que em sua obra “Novos Rumos da Administração policial”, assevera com muita propriedade: “que a polícia seja subtraída dos três grandes carcinomas que soem solapar seus alicerces: a corrupção, a ingerência política e a impopularidade.63 Historicamente no Brasil a questão segurança pública sempre foi conduzida sob um viés elitista, sendo os organismos da segurança pública usados para segurança própria de governos e classes dominantes, de acordo com suas necessidades e desejos particulares. Para tanto, sempre foi útil a desqualificação de seus membros que em última instância resolviam os problemas de segurança pública com violência institucional, amplamente utilizada pelas policias como técnica de investigação contra o contingente populacional menos favorecido da sociedade. Jamais houve interesse em se organizar e qualificar as polícias para prevenir e reprimir crimes, sem distinção de cores partidárias ou classe econômica. As policias eram ignoradas e seus membros deviam ser “ignorantes” no sentido de obedecer às ordens do grupo político no poder e dos donos do dinheiro. No passado não existia o conceito da “Polícia Cidadã”, que deve servir a sociedade e não a governos ou a senhores, já que nem todos devem ser iguais perante a lei. Daí adveio à militarização das forças policiais que tinha o objetivo de ter em mãos uma força capaz de servir aos senhores governantes. Há muito sentido na crença de que os enormes problemas estruturais dos órgãos da segurança pública advêm desta lógica política que nunca apostou na qualificação e capacitação dos que fazem a segurança pública. Particularmente no Departamento de Polícia Federal, essa lógica foi quebrada no ano de 1997 com o primeiro concurso que exigiu nível superior para todos os PAGE \* MERGEFORMAT 14 63 FERNANDES. Op. cit. p. 332. cargos policiais. Além de outros fatores, acredita-se que esse tenha sido primordial para o atual desempenho da Polícia Federal que nos últimos anos vem efetuando prisões de políticos criminosos de diversas matrizes, policiais bandidos ou corruptos das polícias federal, rodoviária federal, civil e militar por todo o país, juízes de direito, grandes empresários, altos funcionários públicos. Atuações estas que conseguiram desarticular inúmeras organizações criminosas espalhadas pelo Brasil, e que estavam em atividade há anos. Durante as investigações realizadas nessas operações policiais, foram apresentadas provas robustas e incontestáveis dos crimes cometidos, fato que possibilitou ao Ministério Público e Judiciário a definição pelas condenações dos envolvidos. Basta a apresentação dos resultados das últimas operações da Polícia Federal para revelar o quanto foi oportuna a medida de se exigir o nível superior para todos os cargos do órgão. As polícias, hoje muito mais do que no passado, são fundamentais para o desenvolvimento da sociedade moderna. Se não se tem polícias eficientes e capazes de prevenir e reprimir o crime, a sociedade acaba por pagar um enorme custo que não se resume na intranqüilidade de viver e na falta de paz social, mas também do ponto de vista econômico, já que toda a sociedade arca com os gastos do tratamento dos efeitos da violência e da perda de investimentos e bens e serviços que deixam de ser produzidos em função da criminalidade. Como disse Ricardo Balestreri no artigo Direitos Humanos: Coisa de Polícia: “... a polícia, como instituição indispensável, para servir e proteger a cidadania, para assegurar a todos o respeito a seus direitos e liberdades ... é o vetor potencialmente mais promissor no processo de redução de violações aos Direitos Humanos ... a polícia pode jogar o papel de principal violadora de direitos civis e políticos mas pode, igualmente, transformar-se na sua maior implementadora ... a polícia é um setor estratégico para a mudança da sociedade e o desenvolvimento do país.”.64 Situação análoga é constatada pelo cientista político Jorge Zaverucha, em sua obra Polícia Civil de Pernambuco; O Desafio da Reforma, de acordo com a transcrição abaixo: PAGE \* MERGEFORMAT 14 64 BALESTRERI, Ricardo. Direitos Humanos: Coisa de polícia. Disp. em: <http:// www.dhnet.org.br/educar/balestreri/php/dh3.html, 19/06/2009>. Aceso em: 19 de junho de 2009. Os agentes de polícia federal, escrivães, papiloscopistas, e os investigadores de polícia civil, ou cargos equivalentes, que dedicam suas vidas à causa da segurança pública, que têm aptidão e vocação, que gostam do que fazem e se sacrificam para o mister policial durante as investigações e operações, não podem ficar sem perspectiva de ascensão funcional nos órgãos de segurança pública, sob pena de todos pararem de trabalhar para estudar para concursos públicos. Juízes, promotores, procuradores e militares das forças armadas têm carreiras únicas. Alguém conseguiria imaginar concurso para major ou coronel do Exército Brasileiro, ou concurso para juiz titular ou de primeira entrância ou para diretor de fórum? As polícias judiciárias têm cargos estanques que negam qualquer possibilidade de ascensão funcional. A carreira única é fundamental para a qualificação, valorização e modernização das polícias judiciárias. 5.2. As divergências sobre a natureza da execução penal O fim da execução penal, de acordo com o artigo 1º da Lei de Execução Penal (LEP), é a correta efetivação dos mandamentos existentes nas sentenças ou outras decisões, destinados a reprimir e a prevenir os delitos, e a oferta de meios pelos quais os apenados e os submetidos às medidas de segurança venham a ter participação construtiva na comunhão social. E para que estes objetivos sejam efetivados são previstos na LEP vários direitos relacionados aos condenados, como também, órgãos responsáveis pela execução da pena e sua fiscalização, o que determina a natureza jurídica da execução penal. Apesar de divergências doutrinárias a respeito, Ada Pellegrini Grinover leciona que “na verdade, não se nega que a execução penal é atividade complexa, que se desenvolve, entrosadamente, nos planos jurisdicional e administrativo. Nem se desconhece que dessa atividade participam dois Poderes estaduais: o Judiciário e o Executivo, por intermédio, respectivamente, dos órgãos jurisdicionais e dos estabelecimentos penais”67. Não se nega que a doutrina ao entender a natureza complexa da execução penal, vislumbra como participantes da mesma somente dois dos Poderes contidos PAGE \* MERGEFORMAT 14 67 GRINOVER, Ada Pellegrini, apud MARCAO, Renato Flávio. Curso de Execução Penal. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 02. na separação de poderes de Montesquieu68: o executivo e o judiciário, que seriam os responsáveis pela aplicação da LEP e, conseqüentemente, na garantia dos direitos reservados aos condenados e internos. Mas, no Título III da LEP, que trata dos órgãos da execução penal, é visto que a participação da pena não se restringe tão somente a esses dois poderes citados na natureza jurídica da execução penal. Reza o artigo 61 da LEP que: “são órgãos da execução penal: I - o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária; II - o Juízo da Execução; III - o Ministério Público; IV - o Conselho Penitenciário; V - os Departamentos Penitenciários; VI - o Patronato; VII - o Conselho da Comunidade”. A intenção do legislador ao colocar como órgãos da execução penal os poderes executivo, judiciário e juntamente a instituição do Ministério Público, foi a de fortalecer o direito penitenciário. Diante das dúvidas sobre a natureza jurídica da execução e do conseqüente hiato de legalidade nesse terreno, o controle jurisdicional, que deveria ser freqüente, tem-se manifestado timidamente para não ferir a suposta autonomia administrativa do processo executivo. O rigor metodológico dessa divisão de poderes tem sido, ao longo dos séculos, uma das causas marcantes do enfraquecimento do direito penitenciário como disciplina abrangente de todo o processo de execução. Como bem acentua Mirabete: Diante desse caráter hibrido e dos limites ainda imprecisos da matéria, afirma-se na exposição de motivos do projeto que se transformou na Lei de Execução Penal: “Vencida a crença histórica de que o direito regulador da execução é de índole predominantemente administrativa, deve-se reconhecer, em nome de sua própria autonomia, a impossibilidade de sua inteira submissão aos domínios do Direito Penal e do Direito Processual Penal”.69 A LEP prevê em vários artigos as incumbências destes órgãos da execução penal, que procuram efetivar a correta aplicação da Lei, como também, o respeito aos direitos fundamentais dos condenados e dos internos. O artigo 64 prevê que compete ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, Poder Executivo: I - propor diretrizes da política criminal, quanto à prevenção do delito, administração da justiça criminal e execução das penas e das medidas de segurança (...); VI - estabelecer regras sobre a arquitetura e construção de estabelecimentos penais e casas de albergados; VIII - inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, bem assim informar-se, mediante relatório do Conselho Penitenciário, requisições, visitas ou outros meios, acerca do desenvolvimento da execução penal nos Estados, Territórios e Distrito Federal, propondo às PAGE \* MERGEFORMAT 14 68 MONTESQUIEU. Do espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2006. p. 184-195. 69 MIREBETE. Op. cit. p. 20. autoridades dela incumbidas as medidas necessárias ao seu aprimoramento; IX - representar ao juiz da execução ou à autoridade administrativa para a instauração de sindicância ou procedimento administrativo, em caso de violação das normas referentes à execução penal; X - representar à autoridade competente para a interdição, no todo ou em parte, de estabelecimento penal. Ao fazer referência ao Poder Judiciário, a LEP em seu artigo 66 prevê que compete ao juiz da execução: (...) “VI - zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de segurança; VII - inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento e promovendo, quando for o caso, a apuração de responsabilidade; VIII - interditar, no todo ou em parte, estabelecimento penal que estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos desta Lei”. Quanto à instituição do Ministério Público, a LEP prevê em seu artigo 67 que “o Ministério Público fiscalizará a execução da pena e da medida de segurança, oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução”. Novamente, fazendo referência ao Poder Executivo, a LEP prevê em seu artigo 72 que são atribuições do Departamento Penitenciário Nacional: “I - acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo o território nacional; II - inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços penais”. Mas a já conhecida falência do sistema prisional, o desrespeito aos direitos fundamentais dos condenados e internos, a superpopulação carcerária, e as violentas rebeliões que frequentemente têm ocorrido, demonstram que há uma falha muito grave no âmbito no sistema penitenciário. Além do que, a essa triste realidade, outras, de igual relevância, foram, cada vez mais intensamente, acrescidas, e das quais cumpre destacar: a insuperável morosidade da Justiça Criminal; a falta de estabelecimentos prisionais, hospitalares e ambulatórios adequados, em numero suficiente ao recolhimento, à internação e ao tratamento dos condenados; as péssimas condições das instalações desses estabelecimentos, afrontosas, inclusive, da dignidade da pessoa humana; a desenfreada corrupção de administradores de estabelecimentos penais e de seus agentes penitenciários; a criminalidade violenta, crescente, inclusive no interior desses próprios estabelecimentos, diuturnamente; bem como a falta de destinação PAGE \* MERGEFORMAT 14 Parafraseando Michel Foucault: “a execução da pena vai-se tornando um setor autônomo, em que um mecanismo administrativo desonera o Estado, que se livra desse secreto mal-estar por um enterramento burocrático da pena”74. PAGE \* MERGEFORMAT 14 74 FOUCALT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 35ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2008. p. 13. 6. A CRISE NO SISTEMA PENITENCIÁRIO No “passado”, eram aplicadas formas cruéis de tortura e agressão para que os presos fossem obrigados a confessar seu crime, pois, na época, este não poderia ser condenado à execução pública antes deste procedimento.75 Com isso, o sistema punitivo que vigorou até o final do Século XVII, baseado em suplícios e castigos corporais, com o tempo passou a ser gradativamente por penas consistentes em privação da liberdade e reclusão do condenado, apresentando-se assim, uma forma de prisão menos desumana. Isso, graças às idéias iluministas, que foram fundamentais par a humanização das pena.76 Atualmente, pode-se afirmar que o sistema penitenciário brasileiro baseia-se no sistema irlandês, onde há proteção, teórica, dos condenados para que não sofram situações degradantes, com promoção de favores graduais.77 As penas aplicadas aos infratores da lei penal são as privativas de liberdade, restritivas de direito e de multas78, que podem variar de acordo com o delito cometido, expressamente aduzido no artigo de aplicação da pena ao crime, tanto no Código Penal Brasileiro, quanto em Leis Especiais. Há que se salientar que a pena privativa de liberdade utilizada pelos romanos como forma de punição pela não prestação de pagamento de dívida, hoje é, no Brasil, em quase todos os casos, aplicada somente com escopo Penal, excetuando- se a prisão por Depositário Infiel79 e pelo não pagamento de Pensão Alimentícia80. Ao se abordar as questões relativas às prisões brasileiras, verdadeiros cativeiros que soem apenas brutalizar seus segregados, o que se nota é um afrontamento direto ao Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, pois, a finalidade do sistema carcerário seria regenerar espiritualmente o preso, para que ele, ao sair, pudesse se reintegrar socialmente como um cidadão livre. Porém, PAGE \* MERGEFORMAT 14 75 BARROS, Carmem Silvia de Moraes. A individualização da pena na execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 44. 76 TASSE, Adel El. Teoria da pena: pena privativa de liberdade e medidas complementares: um estudo crítico à luz do Estado Democrático de Direito. Curitiba: Juruá, 2004. p. 32. 77 Ibidem. p. 110. 78 Código Penal Brasileiro. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, reformado pela Lei 7.209, de 11 de julho de 1984. Art. 32. 79 Código de Processo Civil. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Art. 904. 80 Ibidem. Art. 733. as atrocidades cometidas dentro das prisões, a superlotação dos presídios, os maus tratos sofridos pelos presos e a “lei de sobrevivência”, além da falta de higiene e um regime alimentar deficiente, fazem com que o preso ao sair se torne muitas vezes um criminoso com potencial delituoso bem maior do que antes de ingressar na prisão. Nem sempre o sistema penitenciário reprime o comportamento criminoso. É sabido que as prisões brasileiras se tornaram um ambiente propício para criar pessoas ameaçadoras, violentas e perversas. A problemática é imensa, por isso, diversas alternativas são buscadas, mas enquanto não é encontrada uma solução, aumenta o número de presídios superpopulosos. De acordo com um levantamento penitenciário realizado pelo Ministério da Justiça, no ano de 2003, o Brasil possuía cerca de 308.304 presos, entre o Sistema Penitenciário e a Polícia, para cerca de 179.489 vagas. Ou seja, déficit de 128.815 vagas.81 Ainda mais recente, no ano de 2007, um novo levantamento feito sobre o sistema penitenciário brasileiro, relatara que já existiam 275.194 vagas, para 422.590 presos, ou seja, aumentou-se o número de vagas, porém, o número de presos aumentou em 37% em comparação a 2003. Portanto, o déficit no sistema prisional brasileiro já chegara, naquela época, à cifra astronômica de 147.396 vagas.82 A superlotação nos presídios é evidente e gera um custo muito elevado do encarceramento. Se somar as despesas com custo de folha de pagamento de servidores ativos e inativos, despesas de custeio, despesas de investimento e o gasto com os presos e dividirmos pelo número de encarcerados no Brasil chegaremos à quantia de R$ 5.205.312.70483 bi / 422.590 presos = R$ 12.317,64/ ano, o que gera por mês de despesas aos cofres públicos cerca de R$ 1.026,47 por PAGE \* MERGEFORMAT 14 81Ministério da Justiça. Disp. em: <http://www.mj.gov.br/data/Pages/ MJD574E9CEITEMIDC37B2AE94C6840068B1624D28407509CPTBRIE.htm>. Acesso em: 22 de junho de 2009. 82 Idem. 83Ministério da Justiça. Disp. em: < http://www.mj.gov.br/services/ DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.asp? DocumentID={1F644536-6947-42A4-BC0C-51DCC4D7A369} &ServiceInstUID={4AB01622-7C49-420B-9F76-15A4137F1CCD}>. Acesso em: 22 de junho de 2009. De fato, em seu artigo 1°, a LEP, como é usualmente conhecida, afirma que o objetivo da execução penal é "proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado". Compreende, portanto, a assistência e ajuda na obtenção dos meios capazes de permitir o retorno do apenado e do internado, ao meio social em condições favoráveis para que possa ter uma vida honesta e virtuosa. Esse espírito otimista da LEP é resultado de uma esperança de alcançar a recuperação do condenado que se incorporou aos sistemas normativos, através de proclamações retóricas. Essas, na maioria das vezes, exaurem-se na literalidade dos textos, pois as medidas não se efetivam na prática, ou quando são efetivadas, não produzem os resultados desejados. Assim, infelizmente as normas cuidadosamente traçadas pela LEP na teoria, não são cumpridas na realidade das prisões brasileiras, que além dos problemas já relacionados, existe ainda um indiscriminado consumo de drogas dentro das instituições, carência de atendimentos médicos, corrupção em vários setores públicos, abusos sexuais sofridos pelos mais fracos, e vários outros. Diante do descalabro em que se encontra o Sistema Penitenciário brasileiro, surge a idéia da privatização por parte do Estado, na tentativa de melhoramento desse quadro. Atualmente existem quatro formas para se proceder essa modificação, quais sejam: a) a construção do estabelecimento por instituição privada e o Estado posteriormente a aluga; b) entrega da direção à companhia privada; c) utilização por particulares do trabalho dos penitenciários nas prisões industriais; e d) como tipo de terceirização onde existe uma delegação de determinados serviços ao setor privado. Enfim, não se pode olvidar que em termos políticos, o envolvimento do setor privado na esfera penitenciária tem despertado muitas dúvidas quanto à compatibilidade entre a natureza pública do processo de tomada de decisões, inerente à formulação da política criminal, e a finalidade lucrativa das empresas. Há o receio de que os interesses privados das companhias passem a influir sobremaneira na definição dos termos que conduzem a política criminal. A política de adoção de estabelecimentos penitenciários privados tem significado na prática um reforço da prisão como locus privilegiado das estratégias de controle penal e, mais PAGE \* MERGEFORMAT 14 do que isso, pode abrir caminho para a criação de um poderoso lobby, veladamente interessado no aumento da população penitenciária. Apenas para se pensar, seria paradoxal que empresas que desejam participar da administração penitenciária, que visam obter lucros e que retiram esse lucro da própria existência da criminalidade, iriam lutar justamente contra a criminalidade. 6.1. A falta de políticas penitenciárias No Brasil foram adotados, por enquanto, dois modelos de administração penitenciária: o da co-gestão entre o sistema público e o privado e a terceirização do sistema penitenciário industrial. Mas a privatização é uma ideologia que deve ser fonte de discussão, pois o que pode ocorrer é a diminuição do vínculo estatal para tão somente as atividades de segurança, educação, lazer e saúde, e também, gerar o fortalecimento de grupos econômicos que não tem compromisso com o bem-estar social, visando com isso, exclusivamente o lucro. Tal pensamento encontra-se também espelhado no magistério do Professor Luiz Flávio Gomes, quando menciona que “a presença massiva de miseráveis e marginalizados nas cadeias gera a construção de mais presídios privados, mais renda para seus exploradores, movimenta a economia, dá empregos, estabiliza o índice de desempregados etc.”88. Diante do exposto, pode-se observar o caos em que se encontra o Sistema Penitenciário brasileiro. A falta de investimentos públicos é um dos principais problemas, conforme aduzido anteriormente. Também não se pode deixar de tratar do tema que, sem sombra de dúvida, é o mais importante para uma redução no inchaço do Sistema Penitenciário, a educação. A educação é um dos principais pilares de apoio para o melhoramento do sistema, haja vista que de acordo com dados do Ministério da Justiça, o número de PAGE \* MERGEFORMAT 14 88GOMES, Luiz Flávio. Industria das prisões. Disp. em: < http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=9478>. Acesso em: 25 de junho de 2009. pessoas presas com grau de escolaridade baixa é muito maior que o dos presos com grau de escolaridade mais avançada.89 Segundo o levantamento feito em junho de 2007 pelo Ministério da Justiça, o número de presos analfabetos no Brasil era de 22.827 presos, enquanto os alfabetizados somavam 57.080 presos. Ainda nesta pesquisa, relatou-se que o número de indivíduos sob custódia com o ensino fundamental incompleto era de 147.443 presos, e com ensino fundamental completo totalizava 40.854 presos. No que concerne ao ensino médio, os que não concluíram chegou-se ao número de 31.099 presos, enquanto os conclusos ao quantum de 20.098 presos. Por fim, o número de presos com o ensino superior incompleto que significava 3.168 presos, os que concluíram o ensino superior em número de 1.463 presos, e ainda, os que estão acima do nível superior completo, como mestrado e doutorado, que se constituíram num total de 58 presos. Desta forma, conclui-se claramente que quanto maior o grau de instrução, menor o número de presos. Diante de toda essa escassez na estrutura da máquina estatal, o que não possibilita o exercício de uma gestão razoável no âmbito do sistema prisional brasileiro, uma das soluções que talvez pudesse amenizar essa superlotação que hoje impera no interior dos presídios, seria a organização de mutirões, anualmente ou a cada seis meses, a fim de dar cumprimento à todos os benefícios legais que assistem aos encarcerados. Este se constitui num dos graves problemas que afligem a “massa” carcerária do país, pois, o fato é que muitos dos que se encontram presos, acabam passando mais tempo nesta condição do que o determinado pela Lei e pela Justiça, diante da falta de acompanhamento de advogado. Uma coisa é certa: Não existem interessados em seus direitos. Desta forma, os presos que têm oportunidade de pagar advogados, podem perfeitamente cumprir sua pena de acordo com a legislação penal, já os que não têm este privilégio, acabam, inexoravelmente, por passar mais tempo nas prisões e causando a superlotação das mesmas. PAGE \* MERGEFORMAT 14 89Ministério da Justiça. Disp. em: < http://www.mj.gov.br/services/ DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.asp? DocumentID={1F644536-6947-42A4-BC0C-51DCC4D7A369} &ServiceInstUID={4AB01622-7C49-420B-9F76-15A4137F1CCD}>. Acesso em: 25 de junho de 2009. 6.2. O obsoletismo das estruturas físicas As idéias de "Estado" e de "Direito Penal" surgem a partir da necessidade de que os conflitos entre os seres humanos pudessem ser regrados e tratados impessoalmente em uma esfera pública. Assim, a modernidade se forma também ao se estabelecer uma sanção para aqueles que violam o pacto social e transgridem as normas legais. O fato de alguém transgredir as normas, praticando um ilícito penal, por exemplo, não autoriza a vingança. O Estado, por esse motivo, é chamado para dirimir o conflito. Após o julgamento através dos meios legítimos e legais, e, chegar à conclusão de que certa conduta é ilícita, portanto, contra as regras estabelecidas pela sociedade, é chegada a hora de pagar pelo mal que se fez. O indivíduo, agora apenado, prestará contas à sociedade através de sua reclusão. A partir desse momento, é como se desse adeus ao mundo real para adentrar num novo mundo, numa nova comunidade cheia de regras, de costumes, com um código de ética que indicará como se deve portar. Ao se analisar os dados demonstrados anteriormente, chega-se à conclusão de que os presídios, de forma geral em todo o Brasil, funcionam com lotação de quase 35% acima do limite permitido, e em condições subumanas, de total degradação, o que fundamenta as sucessivas rebeliões em quase todos os Estados brasileiros. Sem se furtar da problemática, Mirabete exprime-se da seguinte maneira: Já se tem afirmado que uma autêntica reforma penitenciária deve começar pela arquitetura das prisões. Entretanto, ainda nos dias de hoje, no recinto das prisões, respira-se um ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela arquitetura dos velhos presídios, em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas, de tetos elevados e escassas luminosidade e ventilação, num ambiente que facilita não só o homossexualismo como o assalto sexual. Não fosse por outras razões, ligadas ao procedimento de reinserção social, o respeito à personalidade e intimidade do preso tem levado os legisladores modernos a dispor sobre as condições de espaço e higiene a que deverá estar submetida a arquitetura dos estabelecimentos penais...94 Trata-se de um problema crônico, de difícil equacionamento, pois exige investimentos financeiros bastantes elevados, além de efetiva vontade política e PAGE \* MERGEFORMAT 14 94 MIRABETE. Op. cit. p. 270. mesmo de respeito ao ser humano, pois, afinal, o primeiro reconhecimento que a sociedade precisa ter é de que seus presos continuam sendo seres humanos. No Brasil, contudo, preso é considerado apenas e tão-somente bandido. E, como tal, é tratado quase como um animal. Todo o sistema prisional brasileiro está falido e funciona à revelia da sociedade e sob a ostensiva e continuada omissão dos governantes. Um jogo de empurra entre o governo federal e os estaduais. Em análise sucinta, Hireche traça um dramático perfil do sistema carcerário vigente, ao emitir a seguinte reflexão: Os críticos ao abolicionismo alegam, principalmente, ser utópica a maneira de pensar. Porém, é igualmente utópica crer-se num molde de sistema penal que já se mostrou falido, impróprio e manifestamente incorreto. Tome-se como exemplo o artigo 88 da Lei de Execuções Penais. Positivou-se que a unidade celular seria individual seria individual e dotada de salubridade, aeração, insolação e disposta em uma área mínima de seis metros quadrados. Isto comparado á realidade que assola os presídios do país, mostra-se surreal. É uma grave dificuldade existente há tempos e justificada com argumentos românticos, insubsistentes.95 Essas instituições nada mais são do que um verdadeiro curso de pós- graduação da criminalidade, gerada muitas vezes pela condição de sobrevivência. A grande maioria vive uma rotina de violência e corrupção a começar pelo espaço físico, pela ausência de ocupação com trabalho e com estudo, até considerações mínimas de higiene como a indisponibilidade de papel higiênico e sabonete, sem qualquer lembrança ao princípio da dignidade da pessoa humana, ou seja, verdadeiras reinvenções do inferno. As atuais condições, particularmente a superlotação e as práticas violentas, fazem dos presídios brasileiros instituições que expressam o mal radical. Por conta disso, os presídios se constituem num dos fatores mais operantes da criminogênese; vale dizer: da formação do crime. Os presos brasileiros são normalmente forçados a permanecer em terríveis condições de vida nos presídios, o que legalmente não se constitui numa das obrigações resultantes da medida constritiva imposta pela Justiça. Devido à superlotação, muitos deles dormem no chão de suas celas, às vezes no banheiro, próximo ao buraco do esgoto. Nos estabelecimentos mais lotados, onde não existe espaço livre nem no chão, presos dormem amarrados às grades das PAGE \* MERGEFORMAT 14 95 HIRECHE. Gamil Föpel El. A função da pena na visão de Claus Roxin. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 131-132. celas ou pendurados em “redes”, pedaços de cobertores amarrados. A maior parte dos estabelecimentos penais conta com uma estrutura física deteriorada, alguns, com sua composição já bastante prejudicada e inadequada para sua finalidade. A Lei de Execução Penal prevê que os presos sejam mantidos em celas individuais de pelo menos seis metros quadrados96. De acordo com essa norma, muitos dos presídios brasileiros possuem celas individuais em toda ou boa parte de suas áreas de reclusão. Mesmo assim, a superlotação superou os planos originais: ao invés de manter um preso por cela, as celas individuais são normalmente usadas para dois ou mais detentos. Além de celas individuais, grande parte dos presídios possui celas grandes ou dormitórios que foram especificamente planejados para convivência em grupo. O Delegado-Chefe da Divisão de Policiamento do Interior da Polícia Civil do Estado do Paraná, Luiz Alberto Cartaxo Moura, em declaração prestada à Assessoria de Imprensa da Procuradoria-Geral do Estado: Admite que as unidades prisionais do estado são antigas e precárias. "A maioria das cadeias do interior foram construídas há décadas e não têm uma base de terraplanagem e muros de concreto sob o piso", diz, lembrando que, antigamente, as delegacias eram construídas como um prédio comum, com uma cadeia anexada. Segundo Cartaxo, as piores situações estão em Foz do Iguaçu, Guarapuava, Umuarama e Apucarana. "Em Foz, temos 850 presos numa cadeia pública construída para 280 vagas. E existem outras cadeias com até cinco presos alojados para cada vaga existente", diz.97 (grifado) Em alguns estabelecimentos, a superlotação atingiu níveis desumanos, com presos amontoados em grupos. Através de reportagens jornalísticas, pode-se facilmente observar cenas de presos amarrados às janelas para aliviar a demanda por espaço, no chão, e presos forçados a dormir sobre buracos que funcionam como sanitário. Essa superlotação gera sujeira, odores fétidos, ratos e insetos, agravando ainda mais as tensões entre os presos. Os detentos são responsáveis por manter as PAGE \* MERGEFORMAT 14 96 Lei de Execução Penal, art. 88, parágrafo único, alínea “b”. 97 Ministério Público do Estado do Paraná. MP na Imprensa: Cadeias lotadas e calor nas celas são convite para fugas / 95 detentos não voltam para a cadeia / Falta de espaço em mini-presídio cria clima de tensão permanente. Disp em: <http:// 200.189.113.39/mppr/noticiamp.nsf/ 9401e882a180c9bc03256d790046d022/7ee57a3f662b6561832573cc0045f116? OpenDocument>. Acesso em: 27 de junho de 2009. O princípio da legalidade garante ao condenado e ao internado que serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei, considerando- se que o sistema é plenamente dotado de segurança jurídica. O juiz da execução não poderá modificá-la em prejuízo do sentenciado.103 Nesse diapasão, é certo que deverão ser possibilitadas condições adequadas para a sua recuperação e reinserção ao meio social, bem como estende-las aos procedimentos administrativos e eventuais sanções disciplinares, que estarão sempre adstritas à prévia cominação legal. O princípio da igualdade estabelece que sejam respeitadas as diferenças e peculiaridades de cada indivíduo condenado, e ainda, de não submete-los a tratamentos tendentes a modificação de sua personalidade. Determina, também, a proibição de tratamentos discriminatórios, sejam de ordem social, econômica, religiosa, racial ou político-ideológica.104 No que diz respeito ao princípio da individualização da pena, imprescindível a análise dos princípios da personalidade e da proporcionalidade. Por causa da personalidade a pena deve ser exclusivamente dirigida ao sujeito individualmente considerado como infringente do ordenamento jurídico, não se admitindo que a mesma passe da pessoa que cometeu o delito. Por conseguinte, a personalidade conterá a classificação dos presos; a separação de acordo com as características individuais; adoção de meios para o seu rápido retorno ao convívio social; oferecimento de trabalho de acordo com as aptidões pessoais, e demais providências.105 Da mesma forma a proporcionalidade na execução da pena, que será configurada de forma que o seu cumprimento esteja de acordo com a realidade vivida pelo condenado. E derradeiramente, o princípio da humanidade, que irá nortear o tratamento penal do preso, através da implementação de ações pautadas em condutas humanamente dignas e com o devido respeito, características que devem ser obrigatoriamente inerentes aos responsáveis pela condução desse trabalho.106 PAGE \* MERGEFORMAT 14 103 BARROS. Op. cit. p. 130-131. 104 Ibidem. p. 132. 105 Ibidem. p. 132-133. 106 Ibidem. p. 133. A adequação da pena, realizada em relação ao agente e a sua personalidade, faz denotar que a lei busca mais a reintegração do indivíduo à sociedade do que a pura punição pela aplicação de sanções ao delinqüente. Todos estão sujeitos a cometer delitos, é inerente ao ser humano, embora a história da humanidade conte que chegou-se a condenar pessoas devido a sua crença religiosa, ao fato de ser negro, entre outros motivos. Entretanto, isso tudo foi ultrapassado, está mais do que provado que o ilícito, fútil ou não, é praticado por todas as camadas sociais, por homens bons e maus, e a sociedade brasileira atual vem se mostrando uma expressiva prova disso. A despeito disso, como se afirmar que a individualização ocorre na execução penal? Sabe-se que por completa desatenção ao art. 5º da LEP, não há uma devida classificação do condenado ou do internado. A LEP inclui orientações detalhadas, conforme visto, determinando que os presos sejam classificados e separados por sexo, antecedentes criminais, status legal, isto é, quando condenados permaneçam aguardando julgamento, reproduzindo os padrões internacionais sobre este assunto, contudo, na prática poucas destas regras são respeitadas. As mulheres presidiárias são separadas dos homens, os menores são, em grande parte, mantidos fora de prisões de adultos, e ex-policiais são mantidos em celas separadas dos outros presos; ainda assim, na maior parte das instituições penais, pouco mais é realizado no sentido de separar as diferentes categorias de presos. Não há um sistema operante de classificação de prisioneiros por níveis de segurança, como por exemplo, máximo, médio e mínimo, tanto em cada prisão, como entre as diferentes prisões. Os prisioneiros são misturados igualmente ao acaso. A atribuição de celas tende a ser ditada por considerações de espaço ou decidida entre os próprios prisioneiros, e até mesmos os internos que aguardam julgamento são livremente misturados com aqueles já condenados. Além do grande número de prisioneiros condenados confinados junto com outros ainda não condenados nas cadeias das delegacias policiais, existe ainda, nas PAGE \* MERGEFORMAT 14 penitenciárias, um grande número de presos ainda não julgados colocados junto aos presos já condenados. Na mesma premissa é a manifestação do Juiz de Direito do Estado da Bahia: Marcos Antonio Santos Bandeira, ao se referir à pena como um “ato de vingança, que submete o preso provisório e o preso definitivo, sem qualquer distinção, ao arbítrio e aos caprichos daquelas autoridades encarregadas de sua execução, transformando a prisão num inferno e numa verdadeira fábrica de bandidos, constatado mediante o elevado índice de reincidência aos egressos de pena privativa de liberdade, situação que perdura até nossos dias”107. É de bom ressaltar que os presos provisórios deveriam ser resguardados, diante do princípio da presunção da inocência, devendo ser preservados do ambiente prisional e de sua “contaminação”108. Portanto, como regra, não há um “programa individualizador” para a execução das penas, restando no vazio o art. 6º da Lei de Execução Penal. A Lei de Execução Penal dispõe que os presos devem ser classificados segundo os seus antecedentes criminais e personalidade, adequando a pena ao condenado e separando os presos reincidentes dos primários. Assim, o exame criminológico, realizado de maneira adequada, possibilitaria uma eventual individualização do tratamento penal. Um dos resultados decorrentes dessa falta de política criminal é mencionado por Nucci, quando revela que: É possível que alguém se torne agressivo, justamente ao ser colocado em uma cela insalubre, tomada pela violência e pela disputa de espaço, de modo que sua personalidade é afetada, para pior, no decorrer do cumprimento da pena, algo que se pode constatar verificando os vários exames de classificação ou criminológicos a que seja submetido. Em outras circunstâncias, o sujeito agressivo, recebendo tratamento adequado por parte do Estado, apoio familiar, assistencial e psicológico, pode transformar-se em pessoa mais calma e equilibrada, o que denota a alteração positiva de sua personalidade. Resta ao juiz fiar-se no importante exame de classificação para determinar as condições em que se dará o cumprimento da pena, mas, sobretudo, o modo pelo qual se avaliará o merecimento do condenado para efeito de progressão de regime e recebimento de outros benefícios. 109 PAGE \* MERGEFORMAT 14 107 BANDEIRA. Marcos Antonio Santos. A Execução Penal e os Direitos Fundamentais do Preso. Disp. em: <http://www.amab.com.br/site/artigos.php? fazer=det&cod=59>. Acesso em: 28 de junho de 2009. 108 FOUCAULT. Op. cit. p. 248-249. 109 NUCCI. Op. cit. p. 956. Pois bem, nesta seqüência de conflitos, o crime é a modalidade de resposta, nas tentativas que o homem faz para solucionar o conflito vital de fazer valer os seus direitos, dentro de uma história em que quase tudo lhe foi negado. O preso não deve ser considerado como um objeto, como alguém a receber ajuda, mas como um sujeito pensante. Um dos maiores desafios da sociedade moderna é assistir ao homem que enfrenta os problemas advindos do encarceramento, quer durante o cumprimento da pena de prisão, quer após esta, quando esse homem é devolvido à liberdade. De nada adianta todo o esforço para melhorar o sistema prisional brasileiro, se ao libertar esse homem, a sociedade o rejeita, o estigmatiza, o repugna e o força a voltar à criminalidade por absoluta falta de opção. O Estado e a sociedade terão de encarar o problema e buscar soluções urgentes quebrando esse total desinteresse pelo egresso. Não é preciso ressaltar a importância do tema, mas indispensável fixar a idéia do que e de quem produz o egresso, estabelecendo de onde ele vem. Profundo conhecedor das questões que versam sobre as discriminações que recaem sobre os excluídos socialmente, o professor Carlos Bacila aduz em sua obra Estigmas: um estudo sobre os preconceitos, que: A polícia, a justiça e a penitenciária encaminham o condenado à rejeição da sociedade pois o sentenciado à pena de prisão é perseguido permanentemente pelas autoridades como suspeito ou, então, é considerado pela sociedade como o sujeito mau, uma casta diferente das pessoas. No plano jurídico, esta estigmatização reflete-se no instituto da reincidência, no registro das condenações e antecedentes etc., e na esfera social, na dificuldade de encontrar emprego ou inserir-se numa normalidade de vida comunitária. Tudo se resume no fracasso do projeto de ressocialização daquele que praticou crime e que é submetido à pena privativa de liberdade, sanção esta que surgiu inicialmente como uma proposta humanitária, mas falhou em seus propósitos principais.114 O Egresso vem de nosso sistema prisional brasileiro que, de acordo com o Censo Penitenciário de 2007, já mencionado no capítulo 6 deste trabalho, conta com aproximadamente 422.590 mil presos, os quais estão acomodados em pouco mais de 275.194 mil vagas, levando à um “déficit” de aproximadamente 147.396 mil vagas, e a sua superlotação inimaginável. É daí que vem o egresso. Vale ainda lembrar a crueza do sistema que impõe as sevícias físicas e sexuais ao encarcerado, onde “estima-se que 20% da população carcerária PAGE \* MERGEFORMAT 14 114 BACILA, Carlos Roberto. Estigmas: um estudo sobre os preconceitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 17-18. brasileira tenha o HIV e aproximadamente a mesma proporção possua o vírus da hepatite B. Pelo menos 10% têm sífilis e hepatite C. Também há entre os presos um número significativo de casos de doenças como tuberculose, pneumonias, dermatoses, distúrbios mentais, hepatites, diarréias infecciosas, hipertensão e diabetes”115. É desse meio que surge o egresso. Diante disso, dessume-se a necessidade premente de ações de promoção de saúde e prevenção de doenças nas Unidades do Sistema Carcerário brasileiro. Diante das informações acima, alguns questionamentos devem ser esclarecidos, tais como: quem é o egresso? Seria todo aquele que um dia fora preso, definitiva ou provisoriamente? Será ele um egresso para o resto de sua vida? Não. É a lei que define quem é egresso, pelo artigo 26 da Lei de Execução Penal, estabelecendo duas, “categorias” de egressos, a primeira compreendendo o condenado libertado definitivamente, que pelo prazo de um ano após sua saída do estabelecimento é assim considerado, como também o desinternado de Medida de Segurança, pelo mesmo prazo. Outra “categoria” é o liberado condicional, mas somente durante o seu período de prova. Diante disso, após esses prazos, um ano para o libertado ou desinternado e o período de prova para o liberado condicional, o homem perde a qualificação jurídica de “egresso”, bem como a assistência daí advinda. Tal assistência justifica-se face o fenômeno enfrentado pelo homem preso, que o desacostuma de viver em liberdade, adaptando-se ao sistema total, fazendo o preso desaprender a viver liberto. Dessa forma, essa pessoa quando libertada sofre um choque tão grande quanto aquele sofrido por ocasião da sua prisão. Assim, com base inclusive no artigo 10, e seu parágrafo único, da LEP, e estribado na orientação da ONU, justifica-se a assistência que, consiste em orientá- lo e apoiá-lo para reintegrá-lo à vida em liberdade. Nesse sentido, compreende-se, também, alojamento e alimentação por um prazo máximo de 2 meses, com possibilidade de renovação por uma única vez, tudo conforme art. 25 do mesmo documento legal. O trabalho talvez seja o apoio mais necessário e desejado, pois, o egresso tem extrema dificuldade em colocar-se nesse mercado, até porque a sociedade PAGE \* MERGEFORMAT 14 115 Informe Saúde do Ministério da Saúde. Saúde no Sistema Penitenciário. Disp. em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/periodicos/informesaude/informe163.pdf>. Acesso em: 29 de junho de 2009. estigmatiza-o. É por essa razão que o legislador dedicou o artigo 27 da LEP, só para prever a colaboração à orientação de trabalho. Sobre esta necessidade, o sociólogo Pedro Bodê enfatizara sua preocupação no sentido de que o trabalho deve ser tratado como política prioritária no âmbito carcerário, ao afirmar que: Cremos, como Castel (1998) sugere, que trabalho é mais que trabalho porque produz e confere identidade, não só relativa ao universo de trabalho, como também em relação ao mundo social em que os indivíduos habitam. Assim, quando nos referimos à identidade que parte do mundo do trabalho entendemos, como muito bem posto por Duarte (1986, p. 11), que ela compõe a identidade social do indivíduo “muito vinculada a ‘identidade pessoal’.116 Resta saber quem terá obrigação legal de assistir ao egresso. É o art. 78 da mesma lei que estabelece o Patronato, o qual pode ser público ou privado. Há que se salientar que a lei não dispõe sobre sua composição, que poderá ser integrada por estudantes de Direito, Sociologia, Psicologia, Medicina, Serviço Social, e outros. A supervisão do patronato é obrigação do Conselho Penitenciário do Estado, de acordo com o art. 70 da LEP. Dessa forma, a esperança de reintegração social é um forte mobilizador da melhora, enquanto a desesperança é fonte de desistência. O criminoso não é só um criminoso, mas antes de tudo um ser humano que não apenas tem seus direitos garantidos na Magna Carta, como tem direito natural de viver em sociedade, produzir e retomar sua posição após ser punido. Diante disso, resta apenas esperar que a sociedade descubra que o egresso desassistido hoje, pode significar o reincidente de amanhã. 6.5. Medidas imprescindíveis para uma reintegração social eficaz A importância da educação para a reintegração do apenado está tão difundida, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, que já se tem aceitado pelos Juízos de Execuções Penais a possibilidade de se obter remição através do estudo, equiparando-o, assim, ao trabalho. De fato, sendo a remição, em sua essência, uma recompensa auferida por quem se utiliza, no meio prisional, de instrumento apto à reintegração, não há porque PAGE \* MERGEFORMAT 14 116 BODÊ DE MORAES, Pedro Rodolfo. Punição, encarceramento e construção de identidade profissional entre agentes penitenciários. São Paulo: IBCCRIM, 2005. p. 214. ONU e das Regras Mínimas para Tratamento de Presos no Brasil, de acordo com as disposições do artigo 43 deste documento legal. As ideologias religiosas, em geral, trazem mensagens de paz, de amor, de boa convivência e de abandono da violência. A religiosidade pode facilitar a ressocialização do indivíduo, na medida em que ele possibilita a interiorização de mensagens baseadas no respeito, na solidariedade, na busca de um comportamento adequado à boa convivência social. Além disso, muitas vezes o condenado se vê abandonado por seus familiares, fazendo com que passe a ter na religiosidade e nos religiosos a única fonte de conforto, de assistência e de contato com o mundo exterior. Por derradeiro, a medida prioritária, que poderia bem ser considerada a “cereja do bolo”, a qual dará todo o suporte necessário para o sucesso dos projetos de iniciativa do poder público, no que se refere à política de reinserção do egresso do sistema prisional, que se constitui na efetiva participação da comunidade em todo esse processo, mormente através da instalação dos Conselhos das Comunidades, para que cumpram, de fato, as disposições prescritas no artigo 81 da Lei de Execução Penal, vale dizer, a devida fiscalização da execução penal e a prestação de assistência aos seus apenados, a fim de que a execução de pena posa produzir todos os efeitos esperados pela sociedade. Numa exposição bastante apropriada sobre o asseverado acima, Nucci repisa ao afirmar que “a integração, através de organismos representativos, no acompanhamento da execução das penas, torna-se maior a probabilidade de recuperação do condenado, até porque, quando findar a pena, possivelmente já terá apoio garantido para a sua reinserção social, mormente no mercado de trabalho (art. 4º, LEP). Para tanto, são previstos como órgãos da execução penal o Patronato (arts. 78 e 79, LEP) e o Conselho da Comunidade (arts. 80 e 81, LEP)”119. PAGE \* MERGEFORMAT 14 119 NUCCI. Op. cit. p. 954. CONCLUSÃO Após a análise de todo o conteúdo exposto no presente trabalho monográfico, resta devidamente evidenciado a amplitude como característica inerente ao texto, ao abordar inúmeros temas imanentes à intemperança no tratamento das questões voltadas à justiça e à segurança pública. Há, todavia, que se salientar, que tal obra se tornaria irrealizável, tivesse que se ater a um único tema, haja vista a complexidade que envolve toda a problemática da violência e da criminalidade, o que requer seja necessário trazer ao lume uma enorme gama de fatores que concorrem para o estado de periclitância que atualmente se encontra estabelecido. Desemprego, falta de educação, drogas, discriminação, segregação, estigmatização, e vários outros elementos, compõem uma vasta relação de causas a serem amplamente combatidas pela sociedade, sob pena de se ter o domínio da “datenização” como modelo de notícia na imprensa brasileira. O que fatalmente seria o fim daquilo que realmente se pretende como projeto de nação desenvolvida. Diuturnamente são veiculadas notícias que já se tornaram pauta obrigatória na imprensa, ou seja: criminosos versus policiais nos morros cariocas, balas perdidas e suas vítimas, superlotação no sistema prisional, reincidência, corrupção no poder público, menores que cometem crimes cada vez mais atrozes, e muito mais. Tudo isso se constitui, estreme de dúvidas, num inevitável reflexo diante da ausência de políticas públicas voltadas para a valorização do ser humano. Resta claro que a tipificação e seletividade do transgressor pelo sistema punitivo como negro, pobre, desempregado e analfabeto é realizada não só porque o Estado necessita de um criminoso ideal, mas pelo fato da sociedade assumir uma posição política totalmente passiva, na medida em que aceita como verdade absoluta tudo que lhe é transmitido pelos meios de comunicação, que incontrolavelmente difundem a idéia do fictício delinqüente. Percebe-se que a solução apresentada pelo Estado para os pobres da nova economia – capitalista e neoliberal – é o sistema penal, que aplica sem cerimônia a receita da exclusão, e como se não bastasse, criminaliza os problemas sociais que vão se incorporando no cotidiano resultando numa enxurrada de legislação penal repressiva. Verifica-se, então, que o maior perigo da criminalidade nas sociedades PAGE \* MERGEFORMAT 14 pós-modernas não é o crime em si mesmo, mas sim o de que a luta contra este acabe por conduzir tais sociedades ao totalitarismo. O transgressor ideal é marcado por um sinal distintivo, estimulando o preconceito e a discriminação, e, conseqüentemente, tornando-o cada vez mais inapto ao convívio social e, em contrapartida mais propenso a prosseguir nos tortuosos caminhos da criminalidade. Há muito que a sociedade virou as costas para esse problema, muito embora se diga preocupada com esse descalabro. O discurso é paradoxal e não reflete os atos cometidos pela parcela social dominante. A título de exemplificação, outro dia rodou pela internet um vídeo intitulado “Profissão Ladrão”, que mostrava o exato momento da apresentação de um indivíduo que acabara de ser detido pela polícia por tentar furtar a quantia de R$ 14,00 (quatorze reais). O fato interessante durante toda a entrevista realizada por um repórter local, é que em nenhum instante o detido tentara esconder sua condição de marginalidade, e mais, em determinado momento passara a ressaltar sua “utilidade pública” no sentido de que o seu papel era fundamental para a manutenção do emprego do policial, do repórter e todos os que dependem da sua condição de “bandido”. Não fosse trágico seria cômico o quadro apresentado pelo criminoso que desafia a sociedade. Este fato é apenas um pequeno exemplo do quão a sociedade se encontra indiferente para essa situação que ameaça, cotidianamente, a harmonia dos valores fundamentais para o equilíbrio das relações humanas, causado por um desajuste coletivo às normas existentes na própria estrutura social. As pessoas andam muito preocupadas com o seu próprio bem estar, a ponto de esquecerem que não estão sozinhas neste mundo, e o mais importante, que desde os primórdios o espírito da coletividade é o que mantém um determinado grupo estável e livre das ameaças que habitualmente se apresentam. Isso inclui grande parcela dos juízes, promotores de justiça, advogados, parlamentares, governantes e vários outros segmentos da sociedade, que, com muita freqüência, costumam apenas a se preocupar com seus próprios interesses e prerrogativas, como: salários e honorários elevados, reserva de mercado, inércia diante da morosidade dos serviços públicos, acúmulo de poder, monopólio do conhecimento, dentre outros. PAGE \* MERGEFORMAT 14 GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES, Luís Flávio. Juizados Especiais Criminais: comentários à Lei 9.099/95. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. HABERMAS, Jurgen. Para a reconstrução do materialismo histórico. São Paulo: Brasiliense, 1983. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia entre facticidade e validade. Vol. I. 2a ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003. HIRECHE. Gamil Föpel El. A função da pena na visão de Claus Roxin. Rio de Janeiro: Forense, 2004. JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo– Noções e Críticas. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. KRELL, Andreas. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2002. KUEHNE. Maurício. Lei de Execução Penal Anotada. 6ª ed. Curitiba: Juruá, 2009. LEVISKY, David Leo (org.). Adolescência: pelos caminhos da violência: a psicanálise na pratica social. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1998. LOPES JUNIOR, Aury. Introdução crítica ao processo penal: fundamentos da instrumentalidade garantista. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. MAIOLINO, Ana Lúcia Gonçalves. Espaço urbano: conflitos e subjetividade. Rio de Janeiro: FAPERJ, 2008. MARCAO, Renato Flávio. Curso de Execução Penal. São Paulo: Saraiva, 2004. MANNION, James. O Livro Completo da Filosofia: entenda os conceitos básicos dos grandes pensadores: de Sócrates a Sartre. Tradução Fernanda Monteiro dos Santos. São Paulo: Madras, 2004. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal: comentários à Lei 7.210, de 11-07-1984. 11ª edição. São Paulo: Atlas, 2004. ____. Manual de direito penal. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 1999. MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. MONTESQUIEU. Do espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2006. NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. PAGE \* MERGEFORMAT 14 REPOLÊS, María Fernanda Salcedo. Habermas e a Desobediência Civil. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003. ROSA, Alexandre Morais da; SILVEIRA FILHO, Sylvio Lourenço da. Para um processo Penal democrático: crítica à metástase do sistema de controle social. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008. SIRVINSKAS, Luís Paulo. Introdução ao estudo do direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2003. SHECAIRA, Sérgio Salomão. CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da pena: finalidades, direito positivo, jurisprudência e outros estudos de ciência criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais. SANTOS, Rogério Dultra dos (org). Introdução crítica ao estudo do sistema penal: elementos para a compreensão da atividade repressiva do estado. Florianópolis: Diploma Legal, 1999. SOARES, Plácido. Alerta Geral. Violência , criminalidade e segurança pública no Brasil. Curitiba: Livraria do Chain, 2003. TASSE, Adel El. Teoria da pena: pena privativa de liberdade e medidas complementares: um estudo crítico à luz do Estado Democrático de Direito. Curitiba: Juruá, 2004. VALLA, Wilson Odirley. Doutrina de emprego de Polícia Militar e Bombeiro Militar. 1ª ed. Curitiba: Associação da Vila Militar Publicações Técnicas, 1999. ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Rio de Janeiro: Revan, 1991. ____; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. 2ª ed., ver. e atual.. São Paulo: RT, 1999. ZALUAR, Alba Maria. Integração perversa: pobreza e tráfico de drogas. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2004. ZAVERUCHA, Jorge. Polícia Civil de Pernambuco: o desafio da reforma. 3ª ed. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2006. SITES Associação dos Magistrados Brasileiros. Corregedoria do TST remete ao CNJ caso do juiz que não aceitou trabalhador de chinelos. Disp. em: <http:// www.amb.com.br/index.asp?secao=mostranoticia&mat_id=13421>. Acesso em: 27 de maio de 2009. PAGE \* MERGEFORMAT 14 Associação dos Magistrados Brasileiros. Cidadania e Justiça Também se Aprendem na Escola. Disp. em: <http://www.amb.com.br/cej/>. BALESTRERI, Ricardo. Direitos Humanos: Coisa de polícia. Disp. em: <http:// www.dhnet.org.br/educar/balestreri/php/dh3.html>. BANDEIRA. Marcos Antonio Santos. A Execução Penal e os Direitos Fundamentais do Preso. Disp. em: <http://www.amab.com.br/site/artigos.php? fazer=det&cod=59>. BARROS, Hercules. Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos. Na contramão da lei. Disp. em: < http://www.direitos.org.br/index.php? option=com_content&task=view&id=2624&Itemid=2>. CARDOSO, Antonio Pessoa. Associação dos Magistrados Brasileiros. As leis ridículas no Brasil. Disp. em: < http://www.amb.com.br/index.asp? secao=artigo_detalhe&art_id=525>. CHAUI. Marilena. Explicações para a violência impedem que a violência real se torne compreensível. Disp. em: <http://www.cefetsp.br/edu/eso/comportamento/ violenciachaui.html>. DOTTI, René Ariel. A crise do Sistema Penitenciário. Disp. em: < http:// www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/12441/12005>. FERREIRA, Helder. Instituto de Pesquisas Econômicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal. O crescimento dos homicídios de crianças e adolescentes no brasil: 1980 a 2003.Disp.em:<http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/ publicacoes/bpsociais/bps_11/ENSAIO2_Helder.pdf>. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Escola Aberta. Disp. em: <http:// www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=escola_aberta.html>. GOMES, Luiz Flávio. Industria das prisões. Disp. em: < http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=9478>. Ministério da Saúde. Saúde no Sistema Penitenciário. Disp. em: <http:// bvsms.saude.gov.br/bvs/periodicos/informesaude/informe163.pdf>. LARA, Daniela. A crise no sistema penitenciário brasileiro. Dis. em: <http:// www.direitonet.com.br/textos/x/47/77/477/ DN_a_crise_do_sistema_penitenciario_brasileiro.doc>. MENESES FILHO, Francisco Fernando de Morais. Crepúsculo do sistema penitenciário. Disp. em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1009>. Ministério da Justiça. Disp. em: <http://www.mj.gov.br>. Ministério Público do Estado do Paraná. MP na Imprensa: Cadeias lotadas e calor nas celas são convite para fugas / 95 detentos não voltam para a cadeia / Falta PAGE \* MERGEFORMAT 14
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved