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dicionario de filosofia japiassu, Notas de estudo de Filosofia

Dicionário de filosofia

Tipologia: Notas de estudo

2012

Compartilhado em 04/08/2012

jordana-peixoto-da-costa-6
jordana-peixoto-da-costa-6 🇧🇷

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Baixe dicionario de filosofia japiassu e outras Notas de estudo em PDF para Filosofia, somente na Docsity! Hilton Japiassú Danilo Marcondes DICIONÁRIO BÁSICO DE FILOSOFIA terceira edição revista e ampliada Jorge Zahar Editor Rio de Janeiro 2001 Digitalizado por TupyKurumin SUMÁRIO PREFÁCIOS BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ABREVIATURAS DICIONÁRIO INDICE DE NOMES EASSUNTOS BIBLIOGRAFIA CONSULTADA* AKOUN,André(org.) 1977 La philosophie,LesEncyclopédiesduSavoir Moderne,Paris, CEPL. ANGELES, Peter A. 1981 Dictionary of Philosophy,Nova York, Barnes & Noble.BARTHOLY, Marie Claude(et al.) 1975 Philosophie/Épistémologie: précis devocabulaire,Paris,Magnard. BARTHOLY, Marie Claude(etal.) 1978 La science: épistémologie générale,Paris,Magnard. BRUGGER, Walter 1959 Diccionario de filosofia(trad.esp.), Barcelona, Herder. CORBISIER 1974 Enciclopédia filosófica,Petrópolis,Vozes. CUVILLIER, Armand 1986 Vocabulário de filosofia(trad.port.), Lisboa,LivrosHorizonte,5aed.EDWARDS, Paul(org.) 1972 The Encyc loped ia o f Ph i losophy ,N o v a Y o r k , M a c m i l l a n & F r e e P r e s s , 4vols:FERRATERMORA,José 1981 Diccionario de filosofía,Madri,Alianza,3aed., 4 vols. 1986 Diccionario de grandes filósofos,Madri,Alianza,2 vols.FLEW, A. 1979 ADictionary of Philosophy,Londres,Pan Books. LACEY, A.R. 1986 ADictionary of Philosophy,Londres,Routledge & Kegan Paul, 2aed.LALANDE,André 1951 Vocabulaire technique et critique de la philosophie,Paris,PUF,6aed.LEGRAND,Gérard 1986 Vocabulaire Bordas de la philosophie,Paris,Bordas. LERCHER, Alain 1986 Les mots de la philosophie,Paris,Bordas. MORFAUX, Louis-Marie 1980 Vocabulaire de la philosophie et des sciences humaines,Paris, Armand Colin.MUCCHIELLI, Roger 1971 Histoire de la philosophie et des sciences humaines,Paris,Bordas. * Para a elaboração deste Dicionário levamos em conta, além das obras mencionadas acima, várias obras de história da filosofia e os textos dos próprios filósofos. Quanto aos títulos das obras dos filósofos, optou-se por mantê-los na língua original nos casos do inglês, do francês, do espanhol e do italiano, por serem línguas mais conhecidas; nos demais casos os títulos foram traduzidos para o português, de modo a facilitar a compreensão do leitor, sem que isto indique entretanto que haja necessariamente uma tradução publicada em português. ABREVIATURAS al. alemão c. circa,por volta de esp. espanhol fr. francês gr. grego hebr. hebraico ingl. inglês it. italiano lat. latim port. português séc. século vols. volumes NOTA GERAL Para facilitar a consulta deste dicionário, utilizamos uni tríplice sistema de remissão: — no interior do verbete, sob a forma de um asterisco (*) precedendo uma palavra tratada em outro lugar (cf. ordem alfabética); — no final do verbete, sob a forma de Ver,remetendo a um verbete correspondente, fornecendo informações complementares ao assunto tratado no verbete definido; — enfim, num índice complementar e alfabético com todos os termos tratados nos verbetes. A Abelardo, Pedro (1079-1142) Filósofo medieval francês, destacou-se sobretudo nos cam-pos da lógica e da teologia. E autor de diversos tratados de lógica, dentre os quais a Dialectiva e a Lógica " ingredientihus ". de grande influência em sua época. Escreveu também obras de teologia como o Sic et non (Pró e contra), em que sistematiza uma série de controvérsias religiosas na forma característica do método escolástico, e a Introdução à teologia, depois condenada pela Igreja. Em relação ao problema dos universais, manteve uma posição conhecida como *conceitualismo. Foi discípulo de *Roscelino, um dos principais defensores do *nominalismo nesse período, e de Guilherme de Champeaux, defensor do *realismo, contra o qual polemizou posteriormente. Para Abelardo, os universais são conceitos, "concepções do espirito", realidades mentais que dão significa-do aos termos gerais que designam propriedades de classes de objetos. E importante também a contribuição de Abelardo à lógica e à teoria da linguagem — a ciência sermocinalis — sobre-tudo quanto à sua discussão da noção de significado; bem como à ética, considera a intenção do agente fundamental na avaliação de um ato como bom ou mau. Abelardo foi uma personalidade controvertida, que se envolveu em inúmeras polêmicas durante sua vida, as quais narrou em sua História de minhas calamidades, sendo célebres suas desventuras amorosas com Heloísa. absoluto (lat. absolutas, de absotvere: desligar de, absolver) I . Diz-se daquilo que não comporta nenhuma exceção ou restrição. Ex.: poder absoluto, necessidade absoluta. 2. Diz-se do que é em si e por si, independentemente de qualquer outra coisa, possuindo em si mesmo sua própria razão de ser, não comportando nenhum limite e sendo considerado independentemente de toda relação com um outro. Ex.: Deus é o Ser absoluto de quem tudo depende_ em relação ao qual tudo é relativo. 3. Independente de toda e qualquer referência convencional. Assim, movimento absoluto é o que não pode ser referido a nenhum ponto fixo no espaço; espaço absoluto é o que independe dos objetos que o preenchem: tempo absoluto é o que independe dos fenómenos que nele acontecem. Oposto a relativo. 4. Para Hegel, a filosofia kantiana representa o ponto extremo da separação entre o homem e o absoluto. As formas que o espírito assume (formas naturais, históricas e religiosas) se recapitulam e se anulam no e pelo saber filosófico, que se identifica com seu próprio objeto, conseqüentemente, com o saber absoluto. Assim, o absoluto é ao mesmo tempo definido como ser e como resultado, como um racionalismo que unifica o mundo e o pensamento, pois o universo é regido pela razão, sendo as mesmas as leis do pensamento racional e as leis da natureza: "O que é racional é real, o que é real é racional" (Hegel). abstração (lat. tardio abstractio, de abstrahere: separar de) 1. Operação do espírito que isola, para considerá-Io à parte. um elemento de uma representação, o qual não se encontra separado na realidade. Ex.: a forma de um objeto independentemente de sua cor. 2. Processo pelo qual o espírito se desvincula das significações familiares do vivido e do mundo das percepções para construir *conceitos. 3. Na filosofia hegeliana, o momento da abstração ou do *universal abstrato, por oposição ao universal concreto, constitui a etapa do entendimento no devir do espírito. A atitude filosófica que lhe corresponde é a do dogmatismo. 4. Na linguagem corrente, as palavras "abstrato" e "abstração" possuem uma certa conotação pejorativa. Assim, dizemos de alguém que "ele se perde em abstração", dá preferência às "idéias abstratas"e não se atém aos "fatos concretos". Notemos o sentido paradoxal da expressão "fazer abstração de", que significa "afastar, não se levar em conta". Há a idéia de separação (algo é isolado de seu conjunto), mas com o objetivo de não se ocupar dele. No sentido filosófico, quando algo é isolado por abstração, é para se fixar nele a atenção. abstrato (lat. abstractus) 1. Diz-se daquilo que é considerado como separado, independente de suas determinações concretas e acidentais. Uma idéia abstrata é aquela que se aplica à essência considerada em si mesma e que é retirada, por abstraçào, dos diversos sujeitos que a possuem. Ex.: a brancura. a sabedoria, o orgulho etc. Ela é tanto mais abstrata quanto maior for sua *extensão: o vivente é mais abstrato do que o animal, pois compreende também o vegetal. 2. Produto da abstração que consiste em analisar o real mas considerando separadamente aquilo que não é separado ou separável. Oposto a concreto. absurdo (lat. absurdus: discordante, incongruente) I. Aquilo que viola as leis da lógica por ser totalmente contraditório. E distinto do falso, que pode não ser contraditório. Ex.: a existência do movimento perpétuo. A demonstração por absurdo é aquela que demonstra uma proposição tentando provar que sua contraditória conduz a uma conseqüência manifestamente falsa: ora, de duas interpretação espiritualista de Platão. Sua filosofia tem como preocupação central a relação entre a fé e a razão, mostrando que sem a fé a razão é incapaz de promover a salvação do homem e de trazer-lhe felicidade. A razão funciona assim como auxiliar da fé, permitindo esclarecer, tornar inteligível, aquilo que a fé revela de forma intuitiva. Este o sentido da célebre fórmula agostiniana Credo ut intelligam (Creio para que possa entender). Na Cidade de Deus, Sto. Agostinho interpreta a história da humanidade como conflito entre a Cidade de Deus, inspirada no amor a Deus e nos valores cristãos, e a Cidade Humana, baseada exclusivamente nos fins e interesses mundanos e imediatistas. Ao final do processo histórico, a Cidade de Deus deveria triunfar. Devido a esse tipo de análise, Sto. Agostinho é considerado um dos primeiros filósofos da história, um precursor da formulação dos conceitos de historicidade e de tempo histórico. A influência do pensamento agustiniano foi decisiva na formação e no desenvolvimento da filosofia cristã no período medieval, sobretudo na linha do *platonismo. Tanto as Confissões quanto as Retratações (escritas no final de sua vida) fazem dele um precursor de Descartes, de Rousseau e do existencialismo: "Se eu me en-gano, eu existo." Ver patrística. Agrippa, Heinrich Cornelius (1485-1535) 0 pensador cético Agrippa (nascido em Colônia, Alemanha) desempenhou um papel importante nas primeiras décadas do século XIV não so-mente com suas especulações teosóficas, herméticas. cabalísticas e gnósticas, que suscitaram vivas polêmicas, mas sobretudo por ter-se con-vertido num dos grandes promotores do ceticismo, contra o qual iria contrapor-se Descartes. Num mundo onde nada é seguro, onde tudo é possível, nada é verdadeiro, proclama Agrippa, só há lugar para a *dúvida. Se nada é seguro, só o erro é certo. Portanto, temos de aceitar a incerteza e a vaidade das ciências e contentar-nos com a fé pura e simples em Deus. Obras principais: De occulta philosophia (1510) e De incertitudine et vanitate scientiarum (1526). Ver ceticismo. Alain (1868-1951) Professor, jornalista e defensor da liberdade individual. Emile-Auguste Chartier, mais conhecido pelo pseudônimo de Alain (nasceu em Mortagne. França), influencia-do por Montaigne e Comte, tornou-se um representante típico de um racionalismo cético e de um *liberalismo pacifista bastante extremado, embora hostil ao marxismo e à psicanálise. Obras principais: Systènie des beaux-arts (1926). Propos (entre 1920 e 1935), Éléments de philosophie (1941). Albert, Hans (1921- ) Filósofo e sociólogo alemão. professor na Universidade de Mannheim. procurou desenvolver um racionalismo crítico inspirado em Popper, questionando a crítica dialética e o método hermenêutico. Segundo Albert. o racionalismo crítico deve ser aplicado não só a uma proposta de fundamentação da ciência, mas também à interpretação da própria ação humana. Obras principais: Tratado da razão crítica (1968), Construção e crítica: ensaios para a filosofia do racionalismo critico (1972), Desvarios transcendentais: os jogos lingüísticos de Karl-Otto Ape/ e seu deus hermenêutico (1975). Alberto Magno, sto . (c.1200-1280) Homem de saber enciclopédico, donde seu apelido Doctor Universalis, conhecido sobretudo por ter sido mestre de Tomás de Aquino e um dos principais responsáveis pela introdução e difusão do pensamento de Aristóteles na tradição filosófica e teológica medieval. Nasceu na Ale-manha e pertenceu à Ordem dos Dominicanos, tendo sido professor na Alemanha e em Paris. Escreveu comentários a praticamente todas as obras de Aristóteles, e divulgou as ciências grega e islâmica no Ocidente cristão. Ver escolástica. alegoria (gr. allegoria) 1. Representação de uma idéia por meio de imagens. Ex.: uma alegoria da justiça. Diferentemente do símbolo, a alegoria é um simbolismo concreto: "O símbolo está para o sentimento assim como a alegoria está para o pensamento" (Alain). Ver metáfora. 2. Relato apresentando um problema filosófico sob a forma de um simbolismo. Ex.: a alegoria da caverna de Platão. A alegoria pode ser considerada um simbolismo concreto, embora seu procedimento guarde freqüentemente algo de abstrato, enquanto o símbolo vale por si mesmo e pelos sentimentos que sugere, servindo para atingir o que a razão não consegue alcançar: os personagens de uma alegoria são percebidos mais como a personificação de uma idéia do que como pessoas. Enquanto a alegoria é clara, o símbolo guarda algo de obscuro e de equívoco. Alexandre de Afrodísias (sécs.Il-1ll d.C.) Filósofo grego peripatético de Afrodísias, na Cária, que floresceu no séc. IT da era cristã. Foi discípulo de *Arístocles de Messena. Notabilizou-se primeiramente por seus comentários sobre Aristóteles, mas no Renascimento gozou de certo prestígio por seus próprios escritos filosóficos: Sobre o destino; Sobre a alma, e alguns outros. Alexandria, escola de Nome pelo qual é conhecida uma importante corrente filosófica neoplatônica que floresceu nos três primeiros séculos da era cristã em Alexandria, no Egito, um dos principais centros culturais da época, incluindo pensadores judeus e cristãos. Destacam-se dentre seus principais representantes o judeu Filon (c.20 a.C.-c.50 d.C.), e os cristãos Orígenes (c.185- 254) e Clemente (séc. III). Ver neoplatonismo. algoritmo (de al-Korismi: matemático árabe do séc.IX) Em um sentido mais amplo e geral, trata-se de um procedimento ou seqüência de instruções para a realização de uma operação de cálculo em um número finito de passos. alienação (lat. alienatio, de alienare: transferir para outrem; alucinar, perturbar) 1. Estado do indivíduo que não mais se pertence, que não detém o controle de si mesmo ou que se vê privado de seus direitos fundamentais, passando a ser considerado uma coisa. 2. Em Hegel, ação de se tornar outrem, seja se considerando como coisa, seja se tornando estrangeiro a si mesmo. 3. Situação econômica de dependência do proletário relativamente ao capitalista, na qual o operário vende sua força de trabalho como mercadoria, tornando-se escravo (Marx). Para Marx, a propriedade privada, com a divisão do trabalho que institui, pretende permitir ao homem satis-fazer suas necessidades; na realidade, ao separá-lo de seu trabalho e ao privá-lo do produto de seu trabalho, ela o leva a perder a sua essência, projetando-a em outrem, em Deus. A perda da essência humana atinge o conjunto do mundo humano. As alienações religiosas, políticas etc. são geradas pela alienação econômica. De modo particular, a alienação política é exercida pelo Estado, instrumento da classe dominante que submete os trabalhadores a seus interesses. A alienação religiosa é aquela que impede o homem de reconhecer em si mesmo sua humanidade, pois ele a projeta para fora de si, num ser que se define por tudo aquilo que o indivíduo não possui: Deus; ela revela e esconde a essência do homem, transportando-a alhures, no mundo invertido da divindade (Feuerbach). 4. Os termos "alienado" e "alienação" ingressam no vocabulário filosófico graças a He-gel e a Marx. Se, em Hegel, a alienação designa o fato de um ser, a cada etapa de seu devir, aparecer como outro distinto do que era antes, em Marx, ela significa a "despossessão", segui-da da idéia de escravidão. Assim, quando dizemos hoje que o trabalho é um instrumento de alienação na economia capitalista, estamos re-conhecendo que o operário é despossuldo do fruto de seu trabalho. Ver fetichismo; reificação. 5. Hoje em dia, podemos falar de outra forma de alienação: não se trata apenas de uma alienação do homem na técnica ou pela técnica, nem tampouco somente da alienação do Eu (como acredita Marx), mas de uma alienação em relação ao próprio mundo: o homem não somente se perde em sua produção, mas perde seu próprio mundo. que é ocultado, esterilizado, banalizado e desencantado pela técnica, com tudo o que implica de sentimento de absurdo, de privação de norma, de isolamento de si, de falta de comunicação etc. alma (lat. anima: sopro vital) I. Por oposição ao *corpo, a alma é um dos dois princípios do composto humano: princípio da sensibilidade e do pensamento, fazendo do corpo vivo algo distinto da matéria inerte ou de uma máquina. 2. Na filosofia aristotélico-escolástica, a alma humana, que é uma alma pensante, constitui o principio mesmo do pensamento. Ela é um princípio de vida: "ato primeiro de um corpo natural organizado" (Aristóteles) ou, então, "forma de um corpo organizado tendo a vida em potência". 3. Para Descartes, alma é sinônimo de pensamento ou de *espírito: "Sou uma substância cuja essência toda ou a natureza não é outra senão a de pensar." Depois de instituir o cogito como verdade primeira, Descartes conclui: "A proposição `Eu existo' é necessariamente verdadeira todas as vezes que a pronuncio ou que a concebo em meu espírito. De sorte que eu, quer dizer, a alma, pela qual sou o que sou, é inteira-mente distinta do corpo." Mas quem sou eu, quando duvido? Uma coisa que pensa, uma res cogitans, uma mente (mens). Assim se funda a distinção da alma (imortal) e do corpo (parte da res extensa). 4. Para outros filósofos, Schelling, por exemplo, a alma é o princípio de unidade e de movi-mento sustentando a continuidade do mundo (orgânico e inorgânico) e unindo toda a natureza num organismo universal. Essa idéia da alma do mundo já é bastante freqüente nos séc's.XVI e XVII. 5. Observemos que, na filosofia antiga e clássica, alma é sinônimo de espírito e se opõe a corpo. Contudo, enquanto o corpo se destrói, seu princípio oposto, a alma, é indestrutível: donde a "imortalidade da alma"; não se fala da "imortalidade do espírito". No vocabulário contemporâneo da filosofia, só se emprega o termo "espírito". Aliás. depois de Kant, os problemas concernentes à existência de Deus ou à imortalidade da alma não revelam mais da filosofia. 6. Hegel fala da "bela alma" para designar uma atitude existencial do indivíduo que procura preservar sua pureza moral, sem se engajar na ação, refugiando-se na pureza de seu coração. Alquié, Ferdinand (1906-1985) Professor honorário na Universidade de Paris-Sorbonne, o francês Ferdinand Alquié possui uma obra bas-tante rica versando tanto sobre os 'filósofos do século XVII quanto sobre metafísica, poesia e o surrealismo. Destacou-se por ter editado as obras completas de Descartes na França e por estar publicando as de Kant. Sua preocupação filosófica fundamental consiste em refletir sobre a dualidade entre a consciência intelectual e a consciência afetiva. Acredita numa filosofia eterna, pois defende a tese segundo a qual todos os grandes filósofos, apesar de suas diferenças, praticamente disseram a mesma coisa: em nome do ser, fizeram uma crítica do objeto. Obras principais: Le découverte métaphysique de l'homme chez Descartes (1950), La nostalgie de l'être (1950), La critique kantienne de la méta-physique (1968), Signification de la philosophie (1971). Le cartésianisme de Malebranche (1974), Le rationalisme de Spinoza (1981). Althusius, Johannes (1557-1638) A importância do pensador alemão Althusius reside no fato de ter sido ele o fundador da doutrina do *direito natural. Com sua obra principal, intitulada Política (1603), torna-se o primeiro defensor dos direitos dos povos. Como huguenote (ou calvinista), não somente criticou as barbaridades perpetradas pelo catolicismo na horrível noite de São Bartolomeu (todos os huguenotes foram mortos em Paris) como também deu uma interpretação racional do Estado e da sociedade em geral. Surge a idéia de "povo", tendo autoridade para destituir o rei quando ele não agir em seu interesse. O Estado nada vais é do que o man-datário do "povo" (a burguesia), o verdadeiro soberano. Althusser, Louis (1918-1990) Filósofo marxista francês. desenvolveu uma interpretação original do pensamento de Marx na perspectiva estruturalista, combatendo o humanismo marxista e o marxismo-leninismo. Procurou analisar as bases teóricas do pensamento de Marx, estabelecendo diferentes etapas no desenvolvimento de sua argumentação, que caracterizou recorren-do ao conceito de *Bachelard de corte epistemológico, privilegiando sobretudo a fase madura correspondente a O capital. Buscou, assim, desenvolver a teoria marxista a partir do conceito de ciência empregado por Marx, considerando entretanto a ciência não apenas como fenômeno de *superestrutura, mas como produção de conhecimento. chegando inclusive a propor uma teoria do processo de produção do conhecimento. O materialismo dialético de Marx se caracterizaria assim como teoria filosófica, procuran- do Althusser investigar as bases epistemológicas dessa teoria, hem como seu papel político. Obras principais: .1 favor de Adarx (1965), Ler "O capital"( I 966- 968. com outros autores, dentre os quais Balibar, Establet, Rancière), Lenin e a filosofia (1969) e o influente Ideologia e apare-lhos ideológicos de Estado (1970). altruísmo Conceito estabelecido por Augusto Comte para designar o amor mais amplo possível ao outro, vale dizer. a inclinação natural que nos levaria a escolher o interesse geral de preferência a nossos próprios interesses. Em seu sentido mais moral. por oposição a egoísmo e a egocentrismo, altruísmo designa a atitude gene-rosa que consiste em sacrificar efetivamente seu interesse próprio em proveito do interesse do outro ou da comunidade. ambigüidade (lat. ambiguitas: duplo senti-do) 1. Duplo sentido de uma palavra ou de uma expressão. 2. Condição do ser humano que reside na impossibilidade de fixar. previamente, um sen-tido para sua existência. "Não devemos confundir a noção de ambigüidade com a de absurdo. Declarar a existência absurda é negar que ela possa dar-se um sentido; dizer que ela é ambígua é afirmar que o sentido jamais lhe é fixado. que ele deve incessantemente ser conquistado" (Si- mone de Beauvoir). Amônio Sacas Filósofo grego (nascido em Alexandria) que floresceu na primeira metade do séc.11l da era cristã.. 'Fendo abandonado o Cristianismo. fundou o *neoplatonismo em Ale- xandria, onde Plotino, Orígenes e Longino fo-ram seus discípulos. amor (lat. amor: afeição, simpatia) 1. Tendência da sensibilidade suscetível a transportar-nos para um ser ou um objeto reconhecido ou sentido como bom. Ex.: o amor materno, o amor da glória. 2. Sentimento de inclinação e de atração ligando os homens uns aos outros. a Deus e ao mundo. mas também o invididuo a si mesmo. Error outras palavras. inclinação para uma pessoa. sob todas as suas formas e em todos os graus. desde o amor-desejo (inclinação sexual) até o amor-paixão e o amor-sentimento. "0 amor é uma emoçào da alma causada pelo movimento dos espíritos, levando-a a unir-se voluntaria-mente aos objetos que lhe parecem ser convenientes" (Descartes). 3. Amor ahlativo é a tendência oposta ao egoísmo. ao amor possessivo. pois se define pela doação e pelo devotamento ao outro. Ex.: o amor ao próximo. 4. O chamado amor puro é aquele que se tern apenas para com Deus, na mais total e perfeita gratuidade. "O amoré essa afeição que nos faz encontrar prazer nas perfeições daquele que amamos. e nada há de mais perfeito que Deus. Para amá-lo, basta considerarmos suas perfeições. As perfeições de Deus são as de nossas almas, mas Ele as possui sem limites." (Leibniz) 5. Amor-próprio é o sentimento da dignidade pessoal e do respeito por si. 6. Amor platónico é aquele que prescinde de toda sensibilidade para alegrar-se coin as belezas intelectuais ou espirituais e com a essência mesma no belo. 7. Nietzsche retoma dos estóicos a expressão "amor fati". literalmente "amor do destino" (implicando tuna idéia de fatalidade), para de-signar a alegria e o desejo do filósofo por aquilo que deve acontecer: o futuro. amoral (gr. a: privação, e lat. moralis) 1. Diz-se do que não é suscetível de ser qualificado moralmente ou que se revela estranho ou contrário ao domínio da moral. 2. Diz-se do que se apresenta como desprovido não somente de moralidade, mas de todo e qualquer senso moral. Ex.: o individuo amoral é aquele quc nem mesmo tern consciência dos juízos morais. amoralismo Doutrina ou atitude que rejeita ou desconhece o valor dos imperativos éticos e das práticas morais. Ver imoralismo. Amoroso Lima, Alceu (1893-1985) ensaísta, professor universitário e pensador brasileiro (nascido no Rio de Janeiro). Formado pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, foi catedrático de introdução á ciência do direito, de economia, de sociologia e de literatura em várias escolas superiores do Rio até 1963. Exerceu a crítica literária em vários jornais, sob o pseudônimo de Tristão de Ataíde. Participou do movimento modernista de 1922. Convertido ao catolicismo em 1928. passou a exercer uma forte influência no meio intelectual brasileiro, sobretudo por sua crítica literária e por seus numerosos ensaios sobre direito, pedagogia, sociologia e a situação política nacional. Não sendo propriamente um filósofo, desenvolveu um pensamento bastante marcado pelos filósofos cristãos preocupados com a defesa de um "humanismo integral". (Ver Jacques Mari-tain). Tornou-se, assim, um líder do catolicismo dito "progressista" no Brasil. Presidiu o Centro Dom Vital, de 1928 a 1963. Foi membro da Academia Brasileira de Letras. Seus livros mais importantes são, além de sua obra ficcional: Adeus á disponibilidade e outros adeuses (1928), Debates pedagógicos (1932). Pela re-forma social (1933), Mitos de nosso tempo (1943), Humanismo pedagógico (1944), 0 trabalho no mundo moderno (1959) e Revolução, reação ou reforma (1964). Ver filosofia no Brasil. análise (gr. analysis, de analyein: desligar, decompor um todo em suas partes) 1. Divisão ou decomposição de um todo ou de um objeto em suas partes, seja materialmente (análise química de um corpo), seja mentalmente (análise de conceitos). Opõe-se à *síntese, ato de composição que consiste em unir em um todo diversos elementos dados separadamente. Alguém que possui um espírito de síntese, por oposição a quem possui um espírito analítico, é aquele que é apto para considerar as coisas em seu conjunto. 2. Procedimento pelo qual fornecemos a explicação sensata de um conjunto complexo. Ex.: a análise de um romance, de um fato histórico. 3. Método de conhecimento pelo qual um todo é dividido em seus elementos constitutivos. "O segundo preceito (do método) consiste em dividir cada uma das dificuldades em tantas partes quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las" (Descartes). Opõe-se ao método da síntese, indo das proposições mais simples às mais complexas: "Conduzir por ordem meus pensamentos, a começar pelos objetos mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para galgar, pouco a pouco, como que por degraus, até o conhecimento dos mais complexos" (Descartes). 4. "A operação que conduz do exame de uma totalidade T à proposição 'P faz parte de T' chama-se análise." (Bertrand Russell) analítico/analítica 1. Que diz respeito à análise ou à analítica; que se faz por meio de análise. Oposto a sintético. 2. Oposto a juizo *sintético, d juízo analítico é aquele cujo atributo pertence necessariamente à essência ou à definição do sujeito. Ex.: os corpos são extensos. 3. Uma proposição é analítica quando se pode validá-la ou invalidá-la sem recorrer à observação, embora ela não forneça nenhuma informação sobre a realidade. 4. Em Aristóteles, a analítica é a parte da lógica que trata da demonstração; em Kant, é a parte da lógica transcendental (analítica transcendental) que tem por objeto "a decomposição de nosso conhecimento a priori nos elementos do conhecimento puro do entendimento", isto é, das categorias. analogia (gr. analogia: proporção matemática, correspondência) 1. Paralelo entre coisas diferentes levando-se em conta o seu aspecto geral. acordo dos dois primeiros momentos. Ex.: o não-ser é a antítese do ser, sua *síntese sendo o devir. 3. Em Hegel, que foi retomado por Marx, a antítese designa o momento negativo da dialética: antítese é a negação da tese, e a negação dessa negação culmina na síntese." Ver dialética. antrópico, princípio Princípio formulado pelo físico cosmólogo norte-americano Brandon Carter na década de 1970, estabelecendo que o ser humano só seria capaz de observar um uni-verso suficientemente estruturado para permitir a existência da própria vida humana; ou seja, se o universo em que nos encontramos fosse hostil à vida, não poderíamos observá-lo. Segundo a definição de Carter. "nossa posição no universo é necessariamente privilegiada, na medida em que é compatível com nossa existência enquanto observadores". Neste sentido, o princípio antrópico guarda relação com o argumento *cosmo-lógico. uma vez que é utilizado como argumento cm defesa da existência de um universo ordenado. antropocentrismo (do gr. anthropos: homem, e do lat. centram: centro) Concepção que situa e explica o homem como o centro do universo e, ao mesmo tempo, como o fim segun-do o qual tudo o mais deve estar ordenado e a ele subordinado: "O homem é a medida de todas as coisas" (Protágoras). antropologia (gr. anthropos: homem, e logos: teoria, ciência) I. Ciência do homem ou conjunto das disciplinas que estudam o homem. 2. Antropologia física: conjunto das ciências naturais que estudam o homem enquanto animal. 3. Antropologia cultural: ciência humana que tem por objeto de estudo as diferentes culturas e que investiga mais especialmente as chamadas sociedades primitivas. Englobando a etnografia e a etnologia, estuda as diversas culturas do homem em sua referência aos diferentes meios sociais. Nesse sentido, pode ser considerada o conjunto das disciplinas que investigam os agrupamentos humanos tanto sob o ângulo dos tipos físicos e biológicos como das tornas de civilização atuais e passadas. 4. Antropologia filosófica: "Conhecimento pragmático daquilo que o homem, enquanto ser dotado de livre-arbítrio, faz, pode ou deve fazer dele mesmo" (Kant). Para Kant, a antropologia divide-se em: antropologia teórica (ou psicologia empírica), que é o conhecimento do homem em geral e de suas faculdades; antropologia pragmática, que é o conhecimento do homem centrado em tudo aquilo que pode ampliar sua habilidade; antropologia moral, que é o conhecimento do homem centrado naquilo que deve produzir a sabedoria na vida, conforme os princípios da metafísica dos costumes. antropomorfismo (do gr. anthropos: homem, e morphé: forma) 1. Concepção pela qual explicamos os fenômenos físicos ou biológicos atribuindo-lhes motivações ou sentimentos humanos. 2. Atitude de espírito que consiste em conceber Deus à imagem e semelhança do homem e em atribuir-lhe modos de pensar, de sentir e de agir idênticos ou semelhantes aos modos humanos. 3. A similitude entre Deus e o homem aparece, tanto para Feuerbach quanto para Freud, como a fonte mesma da religião. Para Feuerbach, Deus é a essência da humanidade: o homem projeta num ser mítico todas as suas qualidades e adora, assim, sua própria essência, que ele não mais reconhece. Para Freud, Deus é o Pai morto: na horda primitiva, o grupo dos filhos, oprimido pelo pai que o exclui do poder e o afasta das mulheres, rebela-se e mata o pai; porém, para evitar a discórdia entre si e fugir da culpabilidade, restabelece a lei e os interditos que o pai havia instaurado; é desse conflito que surgem o poder divino e a neurose originária da religião. aparência (lat. apparentia: aparição, aspecto) 1. Aquilo que é dado das coisas ao sujeito na representação. Sinônimo de *fenômeno. 2. Aspecto enganador ou meramente superficial das coisas. Oposto a *realidade. aparências, salvar as Expressão utilizada para traduzir o preceito epistemológico grego: sozein phainomena: toda hipótese capaz de fornecer uma explicação aos fenômenos do mundo deve satisfazer uma condição: que tudo o que pudermos deduzir dessa hipótese seja conforme aos dados da experiência (aos fatos observáveis ou aparências). apatia (gr. apatheia: sem sensibilidade) 1. Estado de indiferença e de passividade afetiva no qual desaparece toda iniciativa. 2. Estado de total indiferença constituindo o soberano bem (Pirro). 3. Para os estóicos, estado da alma alcançado pela vontade e que a torna não somente inacessível à perturbação das paixões, mas insensível à dor. Apeiron Termo grego utilizado por *Anaximandro para designar "aquilo que não tem li-miar, extremidade ou limite", sendo considera-do, pois, como "infinito" e "imenso", como o princípio original dos seres, tanto de seu apare-cimento quanto de sua dissolução. Apel, Karl-Otto (1922- ) Filósofo alemão, professor na Universidade de Kiel, desenvolveu uma série de trabalhos sobre a linguagem e a comunicação humana em uma perspectiva que aproxima a *hermenêutica e a *teoria crítica da escola de *Frankfurt da semiótica de *Peirce e da filosofia analítica. em um diálogo bastante fértil. Obras principais: A idéia de linguagem na tradição do humanismo de Dante a Vico (1963), A filosofia analítica da linguagem e as ciências humanas (1965), A transformação da filosofia (1973), Pragmática lingüística e filosofia (org., 1976). apercepção 1. Termo criado por Leibniz para designar a * consciência (ou conhecimento) de si. 2. Em Kant, a apercepção ou consciência do Eu pode ser empírica ou *transcendental: é o "eu penso" que acompanha todo o ato do entendimento. apetite (lat. appetitus) Na tradição da *escolástica, o apetite designa a inclinação ou tendência de um ser ou de um individuo em direção a determinado objetivo. O apetite pode ser: a) natural (como o movimento da pedra para bai- 14 apodítico xo); b) sensível (próprio do animal, cujos senti-dos o levam para um objetivo particular); c) racional ou vontade (próprio do homem). apodítico (gr. apodeiktikós: demonstrativo) Modalidade do *juízo que é necessário de direi-to, exprimindo uma necessidade lógica, não um simples fato. "Os juízos são problemáticos quando admitimos a afirmação ou a negação como simplesmente possíveis (arbitrárias); são assertóricos quando os consideramos como reais (verdadeiros); e apodíticos quando os consideramos como necessários" (Kant). Assim, um juízo apodítico apresenta característica de universalidade e de necessidade. Ex.: um círculo é uma curva fechada de que todos os pontos são eqüidistantes do centro. apofântico (gr. apophantikós: que faz ver, conhecer) 1. Uma proposição apofântica é aquela que se limita a fazer uma declaração, afirmativa ou negativa, sem nenhuma preocupação de dar uma ordem, de manifestar uni desejo ou de interrogar. Ex.: Pedro é grande, ou Pedro não é grande. 2. Diz-se da teoria lógica dos juízos e das proposições: "A primeira espécie de discurso apofântico é a afirmação: a segunda é a negação" (Aristóteles). Uma proposição apofántica pretende descrever uma realidade ou revelar sua natureza. E caracterizada pela sentença declarativa ou asserção, podendo ser verdadeira ou falsa em relação à realidade que descreve. Ver logos. apolíneolapolinismo Termos criados por Nietzsche e derivados de Apolo, que ele opõe a Dioniso. Segundo Nietzsche, Apolo é o deus da medida e da harmonia, enquanto Dioniso é o deus da embriaguez, da inspiração e do entusiasmo. Apolíneo, diz Nietzsche, significa "contemplativo, que é fonte de harmonia e beleza", enquanto dionisíaco significa "de exaltação trágica e patética da vida". A palavra apolinisnao designa a contemplação extasiada de um inundo de imaginação e de sonho, do mundo da bela aparência que nos liberta do devir; por sua vez, o dionisismno concebe ativamente o devir. sente-o objetivamente como a "volúpia curiosa do cria-dor" (Nietzsche). apologética (gr. apologetikós: que defende, que justifica) Em seu sentido negativo, a apologética designa a parte da *teologia tradicional que tem por objetivo defender racionalmente a fé cristã contra todo e qualquer ataque a um de seus dogmas; em seu sentido positivo, é a parte da teologia que visa estabelecer, através de argumentos históricos e racionais, o fato mesmo da Revelação cristã. aporético (gr. aporetikós) Relativo a *aporia; sein solução. insolúvel. Diz-se dos diálogos socráticos de Platão, que terminam sem uma solução definitiva para a questão examinada, valorizando mais o exame do problema do que sua solução final. aporia (gr. aporia: impasse, incerteza) 1. Dificuldade resultante da igualdade de raciocínios contrários, colocando o espirito na incerteza e no impasse quanto à ação a empreender. 2. Dificuldade irredutível, seja numa questão filosófica, seja em determinada doutrina. Em outras palavras, dificuldade lógica insuperável num raciocínio. uma objeção ou um problema insolúvel: tudo o que faz com que o pensamento não possa avançar. Ex.: os vínculos entre o espirito e o corpo constituem uma aporia para a maior parte das doutrinas filosóficas. a poster ior i (expressão latina: posterior à experiência) Que é estabelecido e afirmado em virtude da *experiência. Ex.: a água entra em ebulição a 100 graus centígrados. Opõe-se a *a priori. Na lógica, essas duas expressões deter-minam os juízos. Um juízo a priori é independente da experiência, não tendo necessidade dela para ser verificado. Um juízo a posteriori, ao contrário, só pode ser estabelecido pela experiência. As proposições apoditicas exprimem juizos a priori; as proposições assertóricas ex-primem juízos a posteriori. apreensão (lat. apprehensio: compreensão, captação) O diais simples ato de conhecimento, através do qual o espírito capta imediata e diretamente os objetos ou os representa. a priori (expressão latina: anterior à experiência) L Que é logicamente anterior à experiência e dela independe. 2. Em Kant, são a pr ior i , quer dizer, universais e necessárias, as formas ou intuições puras da sensibilidade (espaço e tempo), as categorias do entendimento e as idéias da razão. 3. Idéia a priori: idéia preconcebida (e pre-conceituosa) ou hipótese anterior a toda e qual-quer verificação experimental: "E uma idéia que se apresenta sob a forma de uma hipótese cujas conseqüências devem ser submetidas ao critério experimental" (Claude Bernard). 4. Arbitrário, gratuito. não fundado cm nada de positivo. apriorismo Doutrina ou princípio que atribui papel central a experiências ou raciocínios a priori. Aquiles, paradoxo de Ver paradoxo. Aquino, sto. Tomás de (1227-1274) Nasceu na Itália. de família nobre, e entrou cedo na Ordem dos Dominicanos. Percorreu toda a Eu-ropa medieval. Depois dos estudos em Nápoles, Paris e Colônia (onde teve por mestre Alberto Magno), ensina em Paris e nos Estados do papa. Morreu quando se dirigia ao Concílio de Lyon. Sua imensa obra compreende duas Sumas: Suma contra os gentios e Suma teológica, vários tratados e comentários sobre Aristóteles. a Bíblia. Boécio etc., além das Questões disputadas. O pensamento de sto. Tomás está profundamente ligado ao de Aristóteles. que ele, por assim dizer, "cristianiza". Seu papel principal foi o de organizar as verdades da religião e de harmonizá-Ias com a síntese filosófica de Aristóteles, demonstrando que não há ponto de conflito entre fé e razão'. Sua teoria do conhecimento pretende ser. ao mesmo tempo, universal (estende-se a todos os conhecimentos) e crítica (determina os limites e as condições do conhecimento humano). O conhecimento verdadeiro seria uma "adequação da inteligência á coisa". Retomando a física e a metafisica de Aristóteles. estabelece as cinco "vias" que nos conduzem a afirmar racional-mente a existência de Deus: a partir dos "efeitos", afirmamos a causa. Estabelece sua concepção de natureza como ordem do mundo. ordem decifrável nas coisas e que permite fixar fins particulares a cada uma delas. Deus é a causa de tudo, mas não age diretamente nos fatos da criação: Ele instaurou um sistema de leis, causas segundas, ordenando cada um dos domínios naturais segundo sua especificidade própria. Deus é o primeiro motor imóvel, é a primeira causa eficiente, é o único Ser necessário. é o Ser absoluto, o Ser cuja Providência governa o mundo. Sto. Tomás mostra que há, em Aristóteles, uma filosofia verdadeiramente autônoma e independente do dogma, mas em harmonia com ele. Assim, sto. Tomás introduz no teísmo cristão o rigor do naturalismo peripatético. Porém, distingue o Estado e a Igreja, o direito e a moral, a filosofia e a teologia, a natureza e o sobrenatural. "A última felicidade do homem não se encontra nos bens exteriores. nem nos bens do corpo, nem nos da alma: só pode encontrar-se na contemplação da verdade." arbitrário (lat. arbitrarius: que depende do arbítrio) I. Que só depende da escolha, do arbítrio ou da decisão livre dos homens. Ex.: as palavras são sinais arbitrários ou convencionais. 2. É arbitrária toda decisão ou tomada de posição injustificada ou sem motivos racionais. Ex.: você não vai viajar porque eu não quero. 3. Poder arbitrário é um poder ilegal, independente das leis em virtude das quais ele se exerce. Arcesilau (316-241 a.C.) Filósofo grego, nascido na Eólia. fundador da Nova Academia: foi mestre de Carnéades. Utilizou o método dialético contra o dogmatismo dos estóicos e procurou retomar ao pensamento de Sócrates e Platão. Arendt, Hannah (1906-1975) Filósofa ale-mã. de origem judaica. estudou com Heidegger e Jaspers. tendo emigrado inicialmente para a França e depois para os Estados Unidos (1941), onde foi professora na New School for Social Research de Nova York. Notabilizou-se sobre-tudo por suas reflexões sobre a situação do mundo atual e sobre as crises que marcam nossa época: crise da religião, crise da tradição filosófica e crise (la autoridade política. Na filosofia política. é importante sua análise do totalitarismo, que interpreta como resultante precisamente da crise de autoridade. Para resolver essas crises, propõe a retomada de algumas características básicas dos movimentos revolucionários modernos como a Revoluçào Americana e a Francesa, em que o sistema de conselhos tornava as decisões políticas mais democráticas e participativas. Dentre suas principais obras destacam-se As origens do totalitarismo (1951) e A condição humana (1958). argumentação (lat. argumentado) Modo de apresentar e de dispor os argumentos, vale dizer, os raciocínios destinados a provar ou a refutar determinada proposição, um ponto de vista ou uma tese qualquer. Seu objetivo é o de convencer ou persuadir, mostrando que todos os argumentos utilizados tendem para urna única conclusão. argumento (lat. argumentum) Raciocínio formando um todo distinto e bem concatenado que tem por finalidade provar ou refutar *pro-posição ou urna *teoria. O termo "argumento" está sempre associado 'a um contexto de prova e conserva uma conotação jurídica ("o advogado desenvolve seus argumentos") explicando amplamente seu emprego em fórmulas já prontas: argumento *ontológico (para provar a existência de Deus), argumento *ad hominem (para atacar o indivíduo e não aquilo que ele diz). Aristarco de Samos (séc. Ill a.C.) Filósofo e astrónomo neopitagórico que defendeu a hipó-tese do *heliocentrismo e do movimento da Terra contra a concepção geocéntrica tradicional na Antigüidade, retomada posteriormente por Nicolau *Copérnico que a ele se refere. Aristipo (c.435-356 a.C.) Filósofo grego, nascido em Cirene; foi inicialmente sofista, de-pois discípulo de Sócrates e finalmente fundou o cirenaísmo ou escola cirenaica, ensinando que o prazer era a felicidade suprema da vida. Aristocles de Messena Filósofo grego peripatético do século II a.C. Foi mestre de Alexandre de Afrodísias. Escreveu um Tratado sobre filosofia, em dez volumes, do qual restam apenas fragmentos. Aristóteles (384-322 a.C.) Filósofo grego nascido em Estagïra, Macedônia. Discípulo de Platão na Academia. Preceptor de Alexandre Magno. Construiu um grande laboratório, graças à amizade com Felipe e seu filho Alexandre. Aos cinqüenta anos. funda sua própria escola. o Liceu, perto de um bosque dedicado a Apolo Líelo. Daí o nome de seus alunos: os peripatéticos. Seus últimos anos são entremeados de lutas políticas. O partido nacional retoma o poder em Atenas. Aristóteles se exila na Eubéia, onde morre. Sua obra aborda todos os ramos do saber: lógica, física, filosofia, botânica, zoologia. metafísica etc. Seus livros fundamentais: Retórica, bica a Nicómaco, Etica a Eudemo, *Órganon: conjunto de tratados da lógica, Eísi- ca, Política e Metafísica. Para Aristóteles, contrariamente a Platão, que ele critica, a idéia não possui uma existência separada. Só são reais os indivíduos concretos. A idéia só existe nos seres individuais: ele a chama de "forma". Preocupa-do com as primeiras *caatsas e com os primeiros princípios de tudo, dessacraliza o "ideal" platônico, realizando as idéias nas coisas. O primado é o da experiência. Os caminhos do conhecimento são os da vida. Sua teoria capital é a distinção entre *potência e *ato. O que leva à segunda distinção básica, entre matéria e forma: "a substância é a forma". Daí sua concepção de Deus corno Ato puro, Primeiro Motor do mundo, motor imóvel, Inteligência, Pensamento que ignora o mundo e só pensa a si mesmo. Quanto ao homem, é um "animal politico" submetido ao Estado que, pela educação, obriga-o a realizar a vida moral, pela prática das virtudes: a vida social é uni meio, não o fim da vida moral. A felicidade suprema consiste na contemplação da realização de nossa forma essencial. A política aparece como um prolongamento da moral. A virtude não se confunde com o heroísmo, mas é uma atividade racional por excelência. O equilíbrio cia conduta só se realiza na vida social: a verdadeira humanidade só é adquirida na sociabilidade. aristotelismo Tradição que se baseia no con-junto do sistema filosófico de Aristóteles e de seus discípulos, também conhecido pelo nome de "peripatetismo" porque o mestre ensinava passeando (peripatein: passear). Aristóxeno Filósofo grego (nascido em Ta-rento) peripatético do séc.IV a.C. Foi discípulo de Aristóteles. Restam de sua notadamente os marxistas; b) os partidários do *neopositivismo lógico, que rejeitam explicitamente as religiões e as metafísicas (Bertrand Russell, por exemplo); c) os partidários da tradição nietzschiana, que opõem aos indivíduos capazes de suportar a idéia de que "Deus morreu" a multidão que continua a viver como se Ele existisse etc. Ver deísmo; panteísmo. atividade (lat. activitas) 1. Caráter do que é ativo, podendo ser dito das coisas e das pessoas. Ex.: a atividade de um vulcão: um remédio ativo, uma secretária ativa. 2. Psicologicamente, conjunto de fenômenos psíquicos que levam o indivíduo à ação (tendência, desejo, inclinação, vontade). 3. Métodos ativos: procedimentos pedagógicos caracterizados pelo recurso aos grupos como meio de formação (trabalho em équipe), pelo apelo às motivações intrínsecas dos alunos, cabendo-lhes a iniciativa com vistas a descobertas pessoais. 4. Escola ativa: nome dado ao estabeleci-mento escolar onde se aplicam os princípios pedagógicos de J. Dewey, de O. Decroly e de outros (a partir da década de 20). Leva em conta interesses espontâneos da criança e sua formação pela prática ou ação. ato (lat. actum: fato realizado) 1. Todo exercício voluntário de poder material, ou espiritual, por parte do homem. Ex.: ato de coragem, ato de violência etc. 2. Uni ser em ato é um ser plenamente realizado, por oposição a um ser em potência de devir ou em potencialidade (Aristóteles). Ex.: a planta é o ato da semente, que permanece em potência enquanto não for plantada. 3. Ato puro é o Ser que não comporta nenhuma potencialidade e que se subtrai a todo e qualquer devir: Deus. 4. Na linguagem filosófica, ato se distingue da ação: ação designa um processo que pode comportar vários atos. "Passar ao ato" é fazer algo preciso. "Passar à ação" é empreender algo mais amplo. Por sua vez, ato e ação se opõem a pensamento ou palavra: pensar e falar não podem ter efeito sobre a matéria, ao passo que agir tem um efeito. Claro que nas relações entre os homens, pensar e falar são modos de agir. Finalmente, ato se opõe a potência: o ato designa aquilo que existe efetivamente; a potência designa aquilo que pode ser ou que deve ser. atomismo 1. Doutrina filosófica elaborada por Leucipo e desenvolvida por *Demócrito e *Epicuro, retomada depois pelo poeta latino *Lucrécio, segundo a qual a matéria é composta de átomos. isto é, de partículas elementares indivisíveis e tão pequenas que não podem ser percebidas a olho nu. Os átomos são eternos e possuem todos a mesma natureza, embora difiram por sua forma. 2. Atomismo psicológico: doutrina segundo a qual o pensamento e o espírito são um com-posto de elementos psíquicos separados como os átomos e as moléculas nos corpos materiais. 3. Atomismo lógico: teroria proposta por Ludwig * Wittgenstein e por Bertrand Russell, na década de 20, segundo a qual o significado de sentenças deve ser estabelecido a partir da análise das sentenças moleculares (complexas), decompondo-as em seus elementos (átomos) que seriam as unidades fundamentais do significado e que se relacionariam diretamente com entidades básicas no real. Esta teoria foi posteriormente abandonada por esses autores. átomo (gr. atomos: indivisível) 1. Na física grega, de Demócrito e de Epicuro, partícula indivisível da *matéria. Os átomos são eternos, imutáveis, possuem propriedades mecânicas (fi-gura, grandeza, peso, situação, movimento) mas são invisíveis, por causa de sua pequenez. Sua união dá origem aos corpos com propriedades sensíveis. 2. Na química moderna, partícula indivisível de matéria, isto é, indecomponível, nas condições ordinárias, por forças químicas ou físicas. Ex.: a molécula de hidrogênio é composta de dois átomos. 3. Teoria atômica: hipótese segundo a qual os corpos são formados de átomos, tendo, para cada corpo simples, um peso invariável (peso atômico) e produzindo, por sua combinação, os corpos compostos. Na física contemporânea, o átomo é um sistema composto de um núcleo constituído por prótons e nêutrons, em torno do qual se movem os elétrons. atributo (lat. attributus, de attribueee: atribuir) 1. Termo que é afirmado ou negado de um *sujeito (sinônimo de *predicado). Ex.: o homem (sujeito) é mortal (atributo). 2. Propriedade essencial de uma substância (oposto a acidente). "Por atributo, entendo aqui-lo que o entendimento percebe da substância como constituindo sua essência" (Espinosa). 3. Os atributos de Deus são aquelas propriedades que definem a sua essência. Podem ser metafísicos (ex.: a onisciência) e morais (ex.: a providência). atual (lat. actualis: ativo, prático) 1. Diz-se daquilo que se passa no momento presente, não no passado ou no futuro. Ex.: a época atual. 2. Diz-se daquilo que está em ato e não em *potência. Ver ato. atualização Passagem da *potência ao *ato (Aristóteles) ou do estado virtual ao estado real (atualização das lembranças). Aufhebuug (al. aufheben: conservar e supri-mir) Hegel utiliza esse termo, jogando com sua ambigüidade, para designar, no movimento dialético. a passagem de um estado a outro. Todo novo estado nasce da negação do estado prece-dente: visa aboli-lo mas, de certa forma, conservá-lo. Assim, designa a ação de ultrapassar uma contradição. "Aufheben tem um duplo sentido: significa guardar, conservar e, ao mesmo tempo, fazer cessar, pôr fim a. A idéia de conservar já contém nela mesma esse elemento negativo consistindo em que, para guardá-lo, algo é subtraído a um ser imediato" (Hegel). Aufklãruug Os filósofos do séc.XVIII se concebiam a si mesmos como inimigos das "trevas" da ignorância, da superstição e do despotismo. Por isso, procuraram situar-se no registro das Luzes ou *Razão (do Enlightenment, em inglês, das Lumières, em francês). Kant define as Luzes ou Iluminismo dizendo que elas são aquilo que permite ao homem sair de sua menoridade, ensinando-lhe a pensar por si mesmo e a não depender de decisões de um outro. "Sapere gude! tenha a coragem de usar sua própria inteligência. Eis a divisa das Luzes." Ver Iluminismo. Aurobindo, Sri (1872-1950) Místico e filósofo indiano, nascido em Calcutá. Em sua obra principal, A vida divina, interpreta o pensamento hindu sob a ótica das filosofias de *Plotino e *Bergson. Militante nacionalista, defende o yoga integral, através do qual o homem transcende seu conhecimento fragmentário e limita-do, bem como sua consciência individual. Austin, John Langshaw (1911-1960) Nascido na Inglaterra e professor durante toda a sua vida na Universidade de Oxford, Austin é um dos principais representantes da filosofia analítica, sobretudo da análise da linguagem ordinária e da teoria dos atos de fala, da qual foi o primeiro formulador e que posteriormente seria desenvolvida pelo filósofo norte-americano John Searle. Juntamente com Wittgenstein, éum dos responsáveis pela valorização, na filosofia analítica, da análise da linguagem a partir do uso concreto dos termos e expressões em seus con-textos habituais de fala. Considerava que a filosofia é essencialmente análise conceitual, ou seja. um método de esclarecimento do significa-do de expressões obscuras e problemáticas, método este que tem seu ponto de partida no exame do uso cotidiano desses termos, que devem então ser submetidos a uma cuidadosa e sutil análise filosófica, revelando distinções, estabelecendo relações e descobrindo pressupostos antes insuspeitados. A obra de Austin consiste basicamente em textos de conferências e cursos que ministrou em Oxford e nos Estados Unidos, reunidos e publicados postumamente: Philosophical Pa-pers (1961), Sense and Sensibilia (1962), ffow to do Things with Words (1962). autenticidade (do gr. authentes: perpetrador, mestre) Na filosofia de Heidegger, a autenticidade ou a existência autêntica é a modalidade do ser-aí (*Dasein) que assume sua situação de ser-para-a-morte, ao invés de refugiar-se na inautenticidade do On (das Man). isto é, na banalidade do cotidiano. autonomia (gr. autonomia) 1. *Liberdade política de uma sociedade capaz de governar-se por si mesma e de forma independente, quer dizer, com autodeterminação. 2. Em Kant. a autonomia é o caráter da vontade pura que só se determina em virtude de sua própria lei, que é a de conformar- se ao dever ditado pela razão prática e não por um interesse externo: "A autonomia da vontade é essa propriedade que tem a vontade de ser por si mesma sua lei (independentemente de toda propriedade dos objetos do querer). Portanto, o princípio da autonomia é: sempre escolher de tal forma que as máximas de nossa escolha sejam compreendidas ao mesmo tempo como leis universais nesse mesmo ato de querer". Toda a moral kantiana repousa na distinção entre a legalidade e a moralidade: uma ação legal é aquela que é feita em conformidade com o dever: uma ação moral é aquela que é feita por dever. Ver imperativo. Avenarius, Richard (1843-1896) Filósofo alemão nascido em Paris. Professor de filosofia em Zurique. Suíça (1877-1896). Foi o criador do empiriocriticismo, teoria da experiência pura em relação com o ambiente e o conhecimento, que ele apresentou em sua obra Crítica da experiência pura (1888-1890). Sua doutrina foi em parte defendida por Ernst Mach e fortemente atacada por Lenin em Materialismo e empiriocriticismo. Averróis ou Averroés (1126-1198) Nasci-do em Córdoba, Espanha. foi o niàis célebre dos filósofos árabes da Idade Média. Médico e homem de uma cultura enciclopédica, reúne em suas obras tudo o que os árabes tinham conservado da ciência grega. Seus comentários das obras de Aristóteles exerceram uma considerável influência nos pensadores medievais e, até mesmo, em alguns renascentistas. Contra Algazel e outros teóricos muçulmanos, que pregavam a "destruição dos filósofos", escreve a Destruição da destruição, na qual tenta harmonizar a filosofia com a religião, reabilitar a razão e defender a tese segundo a qual só há um intelecto para todo o gênero humano, as almas individuais sendo perecíveis. Defende ainda a eternidade do mundo, conseqüentemente a eternidade da matéria: Deus os criou desde toda eternidade: todas as coisas criadas, inclusive o homem, procedem de Deus por emanação. Os escolásticos. especialmente Tomás de Aquino, vão combater as teses averroístas de um intelecto agente único, da eternidade da matéria e da dupla verdade (o que é verdadeiro em teologia pode ser falso em filosofia, e vice-versa). Ver averroísmo. averroísmo Doutrina do filósofo medieval Averróis_ condensando tudo o que os árabes haviam conservado da ciência grega. Os comentários de Averróis sobre Aristóteles exerceram uma grande influência na escolástica. Seu livro Destruição da destruição. reabilitando a razão diante dos teóricos muçulmanos, sustenta que todo o gênero humano só possui um intelecto e que as almas particulares são mortais. Tomás de Aquino dedicou muito tempo em refutar os discípulos de Averróis, considerando o "aver- roísmo" como defensor de um certo "materialismo" e de um certo "panteísmo". Contudo, foi grande o esforço de Averróis e dos averroístas em harmonizar Aristóteles com a fé muçulmana. Avicebrón ou lbn Gabirol (1020-1070) Filósofo judeu, nascido em Málaga, Espanha, bastante influente na Europa medieval, sobretudo por seus comentários de Aristóteles e por suas teses sobre a composição das substâncias simples, sobre a existência da matéria e forma universais e sobre a vontade como fonte de vida. Seu livro mais conhecido, Fons vitae (A fonte da vida), constitui um verdadeiro tratado filosófico-teológico, no qual se destacam duas teorias: a) a da universalidade da matéria: onde houver forma haverá matéria, as coisas se individuando em virtude da forma, não da matéria; b) a da vontade como fonte de vida, pois ela é a primeira emanação de Deus e a força impulsionadora do universo: da vontade de Deus emana a forma que se une à matéria, sendo Deus a Forma pura. Avicena (980-1037) Depois de Averróis, Avicena é o mais importante filósofo árabe da Idade Média. Homem de cultura universal e médico protegido dos príncipes de Bucara (na Pérsia, onde nasceu), exerceu forte influência nos pensadores do séc.Xlll, sendo combatido por vários escolásticos. Ao fazer uma interpretação pouco intelectualista de Aristóteles, talvez influenciado pelo neoplatonismo, sustenta que o conhecimento depende da realidade dos objetos conhecidos e que podemos falar do ser sem recorrer às categorias aristotélicas. Critica ainda a noção aristotélica de primeiro motor imóvel, subordina a filosofia à fé e nega que a noção de substância se aplique a Deus. Redige várias obras de medicina muito utilizadas na Idade Média. A mais .importante é o Livro de cura, que trata de física. de moral e de metafísica. Escreveu ainda um Tratado das definições, A salvação, Livro de teoremas etc. Axelos, Kostas (1924- ) Filósofo grego (nascido em Atenas). radicado em Paris, onde dirigiu a revista Arguments (1957-1962), Axelos é um pensador solitário e trágico. Sua filosofia constitui uma meditação que vai de Heráclito à era tecnológica. identificando-se com uma verdadeira história do Ocidente. Para ele. o homem é o desafio do mundo. E o mundo é, para o homem, o supremo desafio. Situando-se fora das modas filosóficas, acredita no advento de um pensamento "questionador, planetário e mun- dialmente errante". Denuncia os traços depressivos, esquizofrênicos, histéricos e obsessionais de nossa civilização e de nossa cultura: "perde-mos o segredo da saúde sem termos descoberto o da loucura". O homem de hoje vive no medo do mundo. Para não ter que afrontá-lo, busca soluções fáceis. Sua obra principal é a trilogia: Le déploiement de l'errance (1961-1964), Le déploiement du jeu (1969-1977) e Le déploie-ment de l'enquête (1979). axiologia (do gr. axios: digno de ser estima-do, e logos: ciência, teoria) Teoria dos valores em geral, especialmente dos valores morais. O termo axiologia designa a filosofia dos valores, fundada em Baden por W. Windelband (1863-1915). Derivada do kantismo, ela estima que o conhecimento tem por origem não as coisas em si, mas a apreensão de uma relação entre as realidades e um ideal que é um absoluto, embora posto como valor. E a relação com esse valor que nos permite apreciar, julgar e conhecer uma realidade, um objeto, um ato, uma idéia e uma palavra. Ver valor. axioma (lat. e gr. axioma: valor) 1. Proposição evidente em si mesma e indemonstrável. 2. *Pressuposto em um sistema, ocorrendo sempre como premissa ou como ponto de partida para a demonstração de algo. Na exposição de um sistema, especialmente nas matemáticas, um axioma é uma proposição de partida, indemonstrável. mas que decidimos considerar como verdadeira porque parece evidente. Ex.: o todo é maior do que as partes; duas quantidades iguais a urna terceira são iguais entre si. axiomática Sistema formal no qua l são total-mente explicitados os termos não-definidos e as proposições não- demonstradas, estas sendo afirmadas como simples hipóteses (axiomas) a par-tir das quais todas as proposições do sistema podem ser deduzidas. Em outras palavras, a axiomática é o sistema hipotético-dedutivo formado pelo conjunto dos seguintes indemonstráveis: axiomas, definições e postulados. Ela res-ponde a três princípios básicos: a) é coerente quando uma proposição deduzida é verdadeira ou falsa; b) é simples quando nenhum indemonstrável invade os outros; c ) é saturada quando todo enunciado, em seu domínio, é decidivel, isto é, tem a possibilidade de ser verdadeiro ou falso. Ver método. Ayer, Alfred Jules (1910-1989) Filósofo inglês, principal introdutor do *neopositivismo na Inglaterra, estudou em Oxford e em Viena, tornando-se depois professor nas Universidades de Londres (1946-1959) e de Oxford (a partir de 1959). Defendeu o verificacionismo em teoria do significado e em filosofia da ciência, desenvolvendo inicialmente um pensamento fortemente antimetafíssico. Sua filosofia foi in- fluenciada sobretudo pelo empirismo inglês, pelo pensamento do *Círculo de Viena e pela filosofia analítica inaugurada na Inglaterra por *Russell e *Moore. Obras principais: Lingua-gem, verdade e lógica (1936), Fundamentos do conhecimento empírico (1940), As questões centrais da filosofia (1974), A filosofia do século XX (1982), Wittgenstein (1985). beatitude (lat. beatitudo) 1. Para Aristóteles, os estóicos, Descartes e Espinosa, estado de plenitude e de total contentamento do sábio tendo alcançado o Soberano bem. 2. Para a *teologia cristã. estado de total bem-aventurança ou de felicidade dos eleitos gozando, no céu, da contemplação eterna de Deus. Beauvoir, Simone de (1908-1986) Considerada a mais fiel discípula de *Sartre, a escritora francesa Simone de Beauvoir, nascida em Paris, é autora de ensaios (Le deuxième sexe é o mais conhecido, sendo pioneiro no movimento feminista), de romances (Les mandarins), de peças de teatro e de memórias: não é uma filósofa no sentido estrito da palavra. Neste domínio, não possui um pensamento próprio. Seu papel, na escola existencialista, não foi o de criar, mas de vulgarizar (o que faz com brilhantismo) e defender as grandes teses do movimento existencialista francês, particularmente as te-ses sartrianas. Empenhou- se, sobretudo, em aplicar a teoria à prática. E por isso que, se quisermos conhecer a moral sartriana, não é a Sartre que devemos recorrer, mas a Simone. As linhas gerais dessa moral existencialista encontram-se em dois ensaios: Pyrrhus et Cinéas (1944), que estabelece os princípios gerais da ação humana, e Por une morale de l'ambiguité (1947), que apresenta as regras da ação moral. As primeiras questões são as seguintes: Deve-mos agir? O que devemos fazer? Pouco antes de morrer, Simone escreveu um livro relatando suas relações com Sartre: Cérémonie des adieux. Ver existencialismo. behaviorismo (ingl. behaviour ou. nos Esta-dos Unidos. behavior: comportamento) 1. Método da psicologia experimental que consiste em fazer um estudo científico do homem e do animal, limitando-se à investigação de seus comportamentos (conjunto das reações sensoriais. nervosas, musculares e glandulares determina-das por um estímulo) como resposta a um estímulo externo, sem nenhuma referência à cons-ciência. Em outras palavras, trata-se de um método que consiste essencialmente em observar estímulos e comportamentos e em extrair daí as leis que os reúnem. 2. Doutrina que erige esse método psicológico em uma filosofia que defende a continuidade entre a vida animal e a vida humana, a passagem de uma á outra devendo operar-se por simples evolução. beleza Caráter do que é belo, podendo aplicar-se a coisas, a pessoas ou a obras de arte. O filósofo considera que o belo é aquilo que des-perta nos homens um sentimento particular chamado "emoção estética", e acredita que tal sentimento seja inteiramente desinteressado, muito embora seja parcialmente determinado pelos hábitos e pelos conhecimentos: até mesmo as emoções estéticas que sentimos diante de certos espetáculos da natureza dependem, pelo menos em parte, dos valores culturais do mo-mento. belo (lat. bellus: bonito) 1. Diz-se de tudo aquilo que. como tal, suscita um *prazer desinteressado (uma emoção estética) produzido pela contemplação e pela admiração de um objeto ou de um ser. Ex.: um belo castelo, uma mulher bela. 2. Diz-se de tudo aquilo que apresenta um *valor moral digno de admiração. Ex.: uma bela ação. 3. Conceito normativo fundamental da *estética que se aplica ao juízo de apreciação sobre as coisas ou sobre os seres que provocam a emoção ou o sentimento estético, seja em seu estado naural (urna bela paisagem), seja como produto da arte (pintura, música, arquitetura etc.) Todo belo é o resultado de uma apreciação, de um juízo de gosto subjetivo, isto é, pressupõe que não haja nada para ser conhecido. Kant define o belo como "aquilo que agrada universalmente sem conceito", vale dizer, como objeto de um juízo de gosto que depende da sensibilidade estética, não da inteligência conceitua!, referindo-se a um caso particular determinado, mas determinando um acordo universal dos su-jeitos. bem (lat. bene: bem) 1. Tudo o que possui um *valor moral ou físico positivo, constituindo o objeto ou o fim da ação humana. 2. Para Aristóteles, o bem é "aquilo a que todos os seres aspiram"; "O bem é desejável quando ele interessa a um indivíduo isolado; mas seu caráter é mais belo e mais divino quando se aplica a um povo e a Estados inteiros." Tanto para os antigos quanto para os escolásticos, o bem designa, em última instância, o Ser que possui a perfeição absoluta: Deus. 3. Os filósofos do séc.XVII retomam a tradição grega de um Bem transcendente como fim de toda ação moral. O Soberano Bem é identificado com Deus: "O Soberano Bem do espírito é o conhecimento de Deus, e a soberana virtude do espirito é a de conhecer Deus" (Espinosa). Assim, o Soberano Bem é o ponto culminante das morais da perfeição. 4. Enquanto conceito normativo fundamental na ordem ética, o bem designa aquilo que é conforme ao ideal e às normas da moral. Benjamin, Walter (1892-1940) Um dos mais originais pensadores da escola de *Frankfurt. Walter Benjamin nasceu na Alemanha, de família judia, revelando em seu pensamento forte influência da tradição cultural judaica, sobretudo da mística e da teologia. Inspirando-se em Marx, de cujo pensamento deu uma interpretação própria. Benjamin desenvolveu uma pro-funda reflexão critica sobre a arte e a cultura na sociedade de seu tempo, ainda que basicamente através de ensaios, artigos e textos fragmentários, publicados em revistas literárias e jornais. Em vários desses escritos. dentre os quais destaca-se seu ensaio sobre "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica", procura en-tender a mudança radical que se dá em relação à obra de arte, o que caracteriza, retornando urna idéia hegeliana, a perda de urna "aura", aquilo que faz do objeto de arte algo de único e especial. Ao reproduzir-se e difundir-se um objeto artístico. tal como acontece com o cinema e a fotografia, há uma ruptura com o modo tradicional de nos relacionarmos com esse objeto; por outro lado, essa nova relação contém um ele-mento revolucionário, capaz de contribuir decisivamente para a transformação das próprias estruturas sociais. Dentre seus escritos, destacam-se ainda um ensaio sobre Baudelaire e as "Teses sobre a filosofia da história". Sua obra completa (Gesammelte Schiriften. 6 vols.) foi publicada postumamente (1972-1975). Bentham, Jeremy (1748-1832) Filósofo inglês, fundador do *utilitarismo, desenvolvido depois por John Stuart Mill (1806- 1873). Para Bentham, o utilitarismo é a doutrina que, do ponto de vista moral, considera a utilidade como o principal critério da atividade. Trata-se de urna teoria da felicidade pensada segundo o modo de uma economia política ou em termos de gestão do capital-vida. Em seu livro mais importante, Princípios de moral e de legislação (1780), Bentham escreve: "A natureza colocou o homem sob o império de dois mestres soberanos: o prazer e a dor. O princípio de utilidade reconhece essa sujeição e a supõe como fundamento do sistema que tem por objeto erigir, com a ajuda da razão e da lei, o edificio da felicidade." O importante é que o homem procure calcular como obter o máximo de felicidade com um mínimo de sofrimento. Em outra obra, intitulada O panóptico (1786), Bentham elabora todo um plano de organização arquitetural das prisões a fim de submeter os prisioneiros a uma vigilância permanente e poder reinseri-los no sistema produtivo. Pretendia estender esse plano a todas as instituições de educação e de trabalho. Escreveu também outro livro muito importante : Defesa da usura (1787). Berdiaeff, Nicolas (1874-1948) Filósofo de origem russa nascido em Kiev, banido em 1922 e refugiado em Paris, Berdiaeff foi um dos inspiradores do *existencialismo cristão e do *personalismo comunitário. Sua filosofia da existência é, antes de tudo, uma filosofia da liberdade. Definia-se a si mesmo como um "senhor metafísico". Sempre se considerou um estrangeiro no mundo, desprovido de raízes, em estado de isolamento e de desgosto pela cotidianidade social: "Amei muito os jardins e as verduras, mas, cm mim mesmo, não há jardim." Sua vida foi uma luta contra o meio aristocrático de sua família. contra o meio revolucionário-marxista de sua adolescência e contra o meio ortodoxo de sua maturidade. Profundamente marcado por sua conversão ao cristianismo, in-surgia-se "contra tudo o que fazia parte do espírito do Grande Inquisidor" (Dostoievski), porque o Inquisidor é a escravidão. Sua obra niais importante. escrita no final da vida. foi Les sens de la crétion: Un essai de, justification de l'homme. Escreveu ainda: Cinq méditations sur 1 'existence (1936) e Esprit et réalité (1943). Bergson, Henri (1859-1941) Considerado o mais importante filósofo francês (nasceu em Paris) do início do século, Bergson teve grande influência em sua época. Foi professor no Collège de France (1900), membro da Academia Francesa (1914), e obteve o Prêmio Nobel da Literatura em 1927. Seu pensamento, fortemente espiritualista, pode ser visto como uma tentativa de recuperar a metafísica contra os ataques tanto do *kantismo quanto do positivismo. então pre-dominantes (final do séc.XIX). Ao desenvolver uma perspectiva dualista, opondo o espírito à matéria, formula um princípio vitalista —o *elã vital — rejeitando o materialismo, o mecanicismo e o determinismo. Propõe a criatividade e não a seleção natural como principio explicativo da evolução. Valoriza a *intuição contra o intelecto, considerando que este é incapaz de apreender a realidade em seu sentido mais pro-fundo e de explicar nossa experiência. Aplica essa distinção à análise do tempo, distinguindo entre *tempo (temps) e *duração (durée). sendo que esta última instância, o "tempo real", só pode ser apreendida intuitivamente e não como sucessão temporal. Analisou também a religião e a moral, considerando-as como originárias, por um lado, da sociedade natural, o que resulta em uma moral da obrigação e em uma religião estática, que é uma defesa contra a natureza hostil e, por outro lado, da sociedade aberta em que a moral é criadora de valores e a religião é dinâmica e criativa. Com o surgimento da *fenomenologia e do *existencialismo, sua influência entrou em declínio. Obras principais: Essai sur les données immédiates de la conscience (1889), Matière et mémoire (1896). Le rire (1900). L 'évolution créatice (1907). L 'énergie spirituelle (1919). Durée et simultanéité (1922). Les deux sources de la morale et de la religion (1932), La pensée et le mouvant (1934). Berkeley, George (1685-1753) George Berkeley nasceu na Irlanda. Estudou e lecionou em Dublim. Já aos 20 anos, descobre seu "gran-de princípio'', o *imaterialismo. desenvolvido no Tratado sobre os principios do conhecimento humano (1710) e sob a fórmula de diálogos nos Diálogos entre Hvlas e Philonous (1713). De-cano da Faculdade de Teologia de Dublim, faz grande propaganda pela evangelização da Amé-rica e vai para as Bermudas com tal objetivo (era bispo desde 1734). Kant toma Berkeley como exemplo do *idealismo dogmático. Seu grande princípio é sintetizado na expressão "esse est percipi", "ser é ser percebido": o ser das coisas consiste em ser percebido pelo sujeito pensante; logo. só a idéia é real: o ser tem por hase a determinação do ser como ser percebido ou conhecido. Nega, assim, a existência da matéria, pois esta é espiritualizada; só não chega ao *solipsismo (teoria afirmando que "só existe o eu"), porque afirma a existência de Deus. Nos-sas percepções não resultam da ação da matéria sobre nossa alma, mas do ato de um outro espírito distinto do meu. O mundo é o sistema de relações entre Deus e os espíritos humanos. Há uma imanência integral de meu espírito em minhas sensações: e uma imanência integral de Deus em meu espírito. A natureza nada mais é que uma relação entre Deus e eu; quanto a mim, eu nada mais sou, pelo pensamento, senão participação do pensamento divino. A doutrina de Berkeley chega a uni misticismo próximo ao de Plotino. E um idealismo, pois nega a matéria, mas é, sobretudo. um *espiritualismo, porque. em última análise, somente são reais os espíritos. A fórmula "esse est percipi" levou a uma outra mais profunda: "esse est percipere ". E o ato de perceber é apenas o modo humano do pensa-mento infinito. Ver empirismo. Bernal, John Dermond (1901- ) Bernal nasceu na Irlanda. Tornou-se membro da Royal Society of Sciences, de Londres, em 1937, e de várias academias científicas estrangeiras. Formado em física, foi um dos primeiros a se interessar pelas relações da ciência com a sociedade e a aplicar às ciências, em sua história, categorias de análise marxistas. Sua monumental obra. Science in History (1965), em três volumes. constitui uma tentativa exaustiva de analisar as relações recíprocas entre a ciência e a sociedade ao longo da história. Mostra ainda como a ciência contribuiu para modificar as convicções e práticas econômicas, sociais e políticas nos diversos sistemas: nômades, feudais, capitalistas e socialistas. Bernal é ainda o pioneiro dos estudos hoje denominados "sociologia da ciência". Tornou-se famoso seu livro The Social Function of Science (1939), por interpretar a ciência como uni importante complexo institucional cuja significação cultural e econômica constitui uma chave decisiva para com- preendermos alguns dos traços característicos da sociedade contemporânea. Escreveu ainda The Freedom qf Necessity (1949). Bernard, Claude (1813-1878) Nascido em Saint-Julien, o tisiologista francês Claude Bernard ganhou grande notoriedade em seu país quando. em 1865, publicou seu famoso livro Introdução ao estudo da medicina experimental, no qual aparece, pela primeira vez de modo sistemático, o método experimental, em suas três fases fundamentais: observação, hipótese e experimenta- ção. Essa obra aparece como um novo Discurso do método: a medicina e a fisiologia atingem o estádio da observação e da experimentação (estado positivo e científico, na linguagem de Com-te), após ter passado pelo estado teológico e pelo estado metafísico. Ao adotar uma concepção positivista da ciência (observação, estudo das relações entre os fenômenos observados, experimentação metódica, sem preocupação com as causas primeiras dos fenômenos), Claude Ber-nard desenvolve as regras de toda ciência experimental, vendo nela uma dialética entre o cientista que coloca questões à natureza (idéia-hipótese) e a experiência que, bem conduzida, é a resposta dos fatos. Para ele, a experimentação possui a dimensão de transformar o real criando novos fenômenos: "com a ajuda das ciências experimentais, declara, o homem se torna um inventor de fenômenos, verdadeiro contramestre da Criação". Ver método. Bertalanffy, Ludwig von (1 90 I - 1 972) Bertalanffy nasceu na Áustria, onde se formou em filosofia e biologia. A partir de 1948, passou a lecionar biologia molecular em várias universidades canadenses e americanas. Suas preocupações se voltaram para os trabalhos experimentais em biologia, fisiologia celular e embriologia. Mas se interessou também pelos estudos de comportamento social, por investigações filosóficas, tendo definido m n novo quadro teórico utilizável por todas as ciências modernas: a teoria geral dos sistemas. Esse empreendimento, contido em seu General Sustem Theory (1968), propõe, além de um quadro unitário do conjunto diversificado das ciências contemporâneas, um verdadeiro programa filosófico, uma espécie de "visão do mundo" a ser elaborada, tendo por hase a categoria de *sistema para pensar a vida. A teoria geral dos sistemas pode- ria, acredita, aplicar-se à totalidade do real. Ao distinguir entre os sistemas fechados (os do mundo inanimado) e os sistemas abertos (os organismos vivos, o psiquismo, as sociedades humanas e as línguas) Bertalanffy caracteriza estes últimos não somente por uma possibilidade de serem enriquecidos do exterior, mas pela existência de um princípio interno (individuante) de esforço capaz de explicar por que os sistemas abertos e seu devir próprio não são determinados pelas excitações que recebem. Portanto, critica as três grandes teorias reducionistas de nosso tempo: o behaviorismo de Wat-son e de Skinner, o marxismo e o freudismo, que reduzem a conduta animal e humana a reações determinadas pelas excitações do meio. Ao ver o mundo como uma hierarquia de sistemas, talvez Bertalanffy redescubra a crença numa ordem panteísta. Escreveu ainda, entre vários livros de biologia, Problems of Science: An Evaluation of Modern Biological and Scientific Thought (1952) e Robots, Men and Minds (1967). Binswanger, Ludwig (1881-1966) Psiquiatra suíço que, sob uma forte influência de Heidegger, desenvolveu toda uma teoria existencial do psiquismo e de suas perturbações: a Dasein análise. Trata-se de um "movimento existencial em psicologia", incluindo a psicoterapia existencial bem como a chamada "análise existencial" e a "fenomenología psiquiátrica", pro-curando compreender as neuroses ou psicoses dos indivíduos como formas de "ser-no-mundo". Obras principais: Introdução ao problema da psicologia geral (1922), 0 sonho e a existência (1954), 0 homem e a psiquiatria (1957), Melancolia e mania: Estudos fenomenológicos (1960), A loucura: Contribuição à sua investigação fenomenológica e analítico-existencial (1963). biologia (do gr. bios: vida e logos: teoria) Termo introduzido por *Lamarck (1802) para designar, dentro do campo das ciências naturais, a ciência da vida animal e vegetal, o que até então era conhecido como "história natural". Já presente na obra filosófica de numerosos sábios, desde Aristóteles, a biologia se diversificou, a partir do Renascimento, em vários ramos distintos: botânica. morfologia, anatomia e fisiologia. A reflexão filosófica freqüentemente se inspirou em questões biológicas (Descartes é um exemplo). A partir de *Spencer e de Darwin, não são poucos os que fazem da teoria evolucionista um objeto de reflexão, como, por exemplo, *Tei-Ihard de Chardin. Biran, Maine de Ver Maine de Biran. Bloch, Ernst (1885-1977) Filósofo marxista alemão de origem judaica, professor na Universidade de Leipzig, exilou-se nos Estados Unidos em 1933, regressando A. Alemanha Oriental em 1948 e radicando-se depois na Alemanha Ocidental (1958), onde foi professor na Universidade de Tübingen. O marxismo de Bloch é influenciado pelo idealismo alemão, sobretudo hegeliano, e pela tradição mística judaica e cristã, também encontrada na cultura alemã. O princípio fundamental de sua filosofia é a esperança (Hoffnung). Vê a história como algo que vai se fazendo de acordo com esse princípio, e define a consciência como "consciência antecipadora". Obras principais: Sobre o espirito da utopia (1918) e O princípio esperança (1954-1959). Blondel, Maurice (1861-1949) Filósofo francês (nascido em Dijon), que dedicou toda a sua vida a elaborar uma filosofia da ação. Rara ele, a ação deve ser entendida como "aquilo que é ao mesmo tempo princípio, meio e termo final de uma operação que pode permanecer imanente a si mesma". Ela é a questão da filosofia. Con-tudo, sua filosofia da ação se converte numa filosofia da contemplação ativa, adquirindo sua mais alta significação na visão de Deus. Partidário da ortodoxia católica, Blondel declara que a visão de Deus é a conseqüência necessária de uma filosofia que reflete sobre a ação humana. Porque o sobrenatural emerge na imanência e na ação e se insere em nós pela atração que o infinito exerce sobre o finito. Obras principais: A ação: Ensaio de uma crítica de vida e de uma ciência da prática (1893), 0 pensamento (1933), 0 Ser e os seres: ensaio de ontologia concreta e integral (1935). A ação humana e as condições de seu desabrochamento (1937), A filosofia e o espírito cristão, 2 vols. (1944-1946), Exigências filosóficas do cristianismo, póstuma (1950). Ver modernismo. boa consciência/má consciência A expressão "boa consciência" que, no plano moral, é a consciência daquele que se julga irrepreensível e isento de toda responsabilidade, torna-se pejorativa a partir do momento em que os existencialistas vêem nela a consciência satisfeita com a ordem exterior estabelecida ou só criticando-a de modo superficial para transformá-la em má consciência. Bodin, Jean (1530-1596) Durante toda a segunda metade do séc.XVI, quando os euro- pens cultos acreditavam viver num mundo "fechado, ao sabor de forças sobrenaturais incontroláveis, sob a ameaça permanente de Satã e de outros demônios, o jurista Jean Bodin (nascido em Angers. França) desenvolveu uma intensa atividade política e jurídica, tendo em vista não somente elaborar uma teoria da soberania do rei (o soberano é aquele que, sem ser déspota nem arbitrário, deve concentrar todos os poderes do Estado), mas justificar a caça às bruxas e perseguir os que utilizam as práticas mágicas. Sua doutrina da soberania encontra-se em Seis livros da República (1576). E sua feroz crítica da magia e da demonologia, em Demonomania dos feiticeiros (1580), verdadeiro tratado de "misoginia" no qual defende urna per§eguiçào siste- mática às bruxas, e sua sumária execução, após serem submetidas à tortura. Boécio (480-524) Filósofo romano, tradutor e comentador de Aristóteles, principalmente dos tratados de lógica, cuja tradução foi amplamente utilizada durante o período medieval. Boécio é, assim, considerado uma "ponte" entre a filoso-fia clássica e o pensamento medieval, tendo sido conhecido como o "último dos romanos e o primeiro dos escolásticos". Foi alto funcionário da corte do rei Teodorico, tendo, no entanto, caído em desgraça e sido condenado à morte. Na prisào, antes de ser executado, escreveu a Consolação da filosofia, em que expõe sua concepção filosófica eclética, sobretudo do ponto de vista ético e cosmológico, e medita sobre o papel da filosofia. Essa obra edificante foi extrema-mente popular no período medieval, tendo cau- sado estranheza, entretanto, que, sendo Boécio cristão, nela não faça nenhuma alusão ao cristianismo. Boécio é conhecido, na de conservador, Burke foi um defensor da Revolução Americana de 1776 e do direito à autodeterminação das colônias: entretanto, opôs-se vio-lentamente à Revolução Francesa em sua obra famosa Reflections on the Revolution in France (1790). Seu trabalho de estética, Philosophical influente na época. Escreveu também A Vindi-Inquiry into the Origin of our Ideas of the cation of Natural Society (1756), Letter to a Sublime and the Beautifid (1757), foi muito Noble Lord e Letters on a Regicide Peace. C cabala ou kabala (hebr. qabbalah: coisa recebida) 1. Obra filosófica de cunho bastante hermético, de data desconhecida, pretendendo estar vinculada, por uma tradição secreta, à religião original do povo hebreu. 2. Doutrina religiosa esotérica que tem como principais objetivos: a) decifrar ou interpretar o sentido secreto dos textos bíblicos; b) elaborar uma concepção de Deus mediante emanações sucessivas: c) sustentar uma concepção da cor-respondência entre os elementos e o universo, notadamente entre cada parte do corpo humano e cada parte do universo (entre o microcosmo e o macrocosmo). Apesar de severamente critica-da por vários filósofos judeus, sobretudo por Maimônides (1135-1204), por opor-se ao Tal-mude, a doutrina cabalística da emanação exerceu forte influência em alguns humanistas do Renascimento (*Pico della Mirandola) e em certas correntes "panteístas" ulteriores. Cabanis, Pierre Jean Georges ( 1757-1808) Médico e filósofo francês, nascido em Cosnac; foi professor de higiene e de medicina e participou ativamente da vida política do país (apoiou a Revolução Francesa, depois foi bonapartista); membro do grupo ideológico; discípulo do filósofo Condillac, divergiu dele posterior-mente em sua obra Rapports du physique et du moral ("Relações entre o físico c o moral", 1802). Cabanis formulou também um monismo naturalista. Calvino, João (1509-1564) Reformador protestante francês, nascido na Picardia. Calvino fez seus estudos de lógica, gramática e filosofia em Paris. Dedicou toda a sua vida a pregar em favor da religião reformada, que organizou na França e na Suíça. Durante seus últimos anos, fixou-se em Genebra, onde fundou um partido autoritário que, reforçado por refugiados estrangeiros, tornou-se majoritário no Conselho da cidade. Sua doutrina religiosa repousa nos seguintes princípios: a) retorno à Bíblia como fonte primeira e única da fé cristã; b) crença na predestinação; c) concepção de *graça inspirada em sto. *Agostinho. Teólogo rigoroso e chefe de estado autoritário, Calvino foi também um grande orador e um notável escritor. Sua estética, segundo *Weber, teria desempenhado um importante papel econômico no surgimento e desenvolvimento do capitalismo. Obras principais: Instituição da religião cristã (1536) e Tratado das relíquias (1543). Cambridge, escola de 1. Movimento filosófico, também conhecido como escola platônica de Cambridge, que se formou no séc.XVII, na Universidade de Cambridge, Inglaterra. Ins-pirado no *platonismo, no *neoplatonismo de Plotino e no cartesianismo, combatia o materialismo. Seus principais representantes foram Ralph Cudworth (1617-1688) e Henry More (1614- 1687). 2. A segunda escola de Cambridge, ou escola analítica de Cambridge, foi um movimento surgido na mesma universidade, no final do séc. XIX. com os seguintes princípios fundamentais: atitude antimetafisica, disposição de submeter todo problema à análise, rejeição do apelo à intuição. Essa escola teve grande influência no desenvolvimento da filosofia analítica. Seus re- presentantes principais foram George Edward Moore e Bertrand Russell. Campanella, Tommaso (1568-1639) Nascido na Calábria, Itália, tornou-se, como Giordano Bruno, dominicano. Muito interessado pela política, apresentou-se como reformador do mundo. Suspeito de conjurar contra a dominação espanhola. passou 27 anos na prisão, sendo torturado sete vezes. Por intervenção do papa, foi libertado. Instalou-se em Paris, onde dedicou a Richelieu seu tratado Do sentido das coisas e magia. Ai escreveu também sua famosa Cidade do Sol, obra utópica na qual saúda o jovem e futuro Luís XIV como o rei de seu "Estado-Sol" (donde a alcunha de "Rei-Sol" dada ao rei). Campanella tornou-se adversário declarado do aristotelismo e, conseqüentemente, de Tomás de Aquino. Perseguido pela Inquisição, defendeu uma doutrina segundo a qual não pode haver a menor contradição entre "o livro dos livros", a Bíblia, e "o livro da Natureza": ambos são sagrados. Em Cidade do Sol. postula uma monarquia universal acima da qual só há o papa. Imagina uma vida social rigorosamente ordena-da. Se o mundo é mau e funciona mal, é porque há muita liberdade pessoal e pouca ordem. Por isso, devemos administrar, reger e pôr tudo em ordem. Trata-se de uma ordem que engloba as mínimas coisas, não somente no racionalismo, mas na astrologia, ciência fundamental do Estado-Sol. O solé Deus e os planetas estabelecem com ele seu reino. Assim como as circunstâncias de nossa vida são reguladas pelo zodíaco, da mesma forma a ordem deve-se inspirar na posição dos planetas, dirigentes supremos da vida social. Tudo é determinado de cima, regulado em função da situação astral. desde o nascimento até a morte dos indivíduos e dos Estados. No Estado-Sol há um ministério do poder, um ministério da sabedoria e um ministério da harmonia. Nesse Estado. tudo está em ordem: ele é concebido como uma catedral, fortemente hierarquizado, com tudo no lugar e culminando numa Igreja da Inteligência. Camus, Albert (1913-1960) Embora não tenha sido um filósofo propriamente dito. o argelino Camus (nascido em Mondovi) abordou. em seus ensaios literários, vários ternas tratados pelos filósofos existencialistas, sobretudo o tema do * absurdo. Sem pretender fazer filosol ia ou metafísica, dizia que o único problema filosófico relevante é o suicídio, que só ocorre porque há um divórcio entre o homem e sua vida. E esse divórcio que produz o sentimento do absurdo e leva o homem a encontrar no suicídio unia solução. A tentação do absurdo e do suicídio é uma conseqüência do "silêncio não-racional do mundo". Esses temas são trata-dos em L 'étranger (1942), Le mythe de Sysiphe (1942) e La peste (1947). Mas o homem não deve sucumbir â tentação de cair no niilismo. deixar-se dominar pela alienação. Precisa rebelar-se contra sua situação de alienação. Em L'homme revolté (1951), Camus propõe uma rebelião autêntica, que não seja apenas individual ou "metafisica", mas que engaje o pensamento e a ação nas lutas e no destino comuns dos homens. Canguilhem, Georges (1904- ) Médico e filósofo francês, notabilizou-se por seus estudos de história das ciências, particularmente da biologia. Juntamente com Gaston Bachelard, para quemé um dos melhores historiadores, é considerado um dos fundadores da epistemologia histórica contemporânea. Seus trabalhos versam sobre o discurso médico e o discurso biológico: A formação do conceito de reflexo nos séculos XVII e XVIII (1955), 0 conhecimento da vida (1952), 0 normal e o patológico (1966), Estudos de história e de filosofia das ciências (1968), Introdução à história das ciências (1970), Ideo-logia e racionalidade na história das ciências da vida (1977). Cannabrava, Euryalo (1908-1978) Filósofo brasileiro (nascido em Cataguases, Minas Gerais) que desenvolveu seu pensamento como professor do Colégio Pedro 11 do Rio de Janeiro. Depois de passar por uma fase dogmática, na qual defendia uma "filosofia concreta", situada entre a fenomenología de Husserl e certo "existencialismo", voltou seu pensamento para o estudo sistemático das ciências e das diversas filosofias das ciências de seu tempo. Preocupado em reduzir a filosofia ao método, e o método à linguagem, tentou aplicar os métodos formais da matemática aos conteúdos empíricos das ciências. Seu objetivo, com isso, consistia em elaborar uma filosofia científica aplicável aos mais variados domínios, inclusive ao da política. Obras principais: Descartes e Bergson (1943), Elementos de metodologia filosófica (1956), Introdução à filosofia científica (1956), Ensaios filosóficos (1957), Estética da crítica (1963), Teoria da decisão filosófica: Bases filosóficas da matemática, da lingüística e da teoria do conhecimento (1977). Ver filosofia no Brasil. cânon ou cânone (lat. canon, do gr. kanon: regra) 1. conjunto de *normas ou *regras lógicas. morais ou estéticas: "Entendo por cânon o conjuntos dos princípios a priori para o uso legítimo de certas faculdades de conhecer em geral. Assim, a lógica geral, em sua parte analítica, é um cânon para a razão em geral" (Kant). 2. Conjunto de regras dc fé promulgadas pelos Concílios da Igreja Católica ou de regras morais estabelecidas pelo direito canônico, isto é, pelo direito da Igreja Católica. caos (gr. káos, do verbo khainen, abrir-se. entreabrir-se) 1. Termo utilizado aparentemente pela primeira vez na Teogonia de Hesíodo (séc. VIII a.C.), designando o vazio causado pela separação entre a Terra e o Céu a partir do momento de emergência do *Cosmo, designa também para os gregos o estado inicial da matéria indiferenciada, antes da imposição da ordem aos elementos. 2. Na física moderna, designa a imprevisibilidade de sistemas complexos, isto é, a existência de fenômenos em relação aos quais não é possível fazer previsões ou cálculos precisos dadas alterações, mesmo que pequenas, nas condições iniciais. Capital, O (Das Kapital) Obra fundamental de Karl Marx, composta entre 1885 e 1894, na qual propõe uma nova economia política, descreve as contradições do capitalismo e indica um determinado sentido para a história. O livro I (do próprio Marx) analisa "o desenvolvimento da produção capitalista": os livros II e 111 (redigi-dos por Engels a partir das notas de Marx) tratam do "processo de circulação do capital" e do "processo de conjunto da produção capitalista"; o livro IV (redigido por Kautsky, a partir das notas de Marx) trata das "teorias da mais-valia". caráter (lat. character, do gr. charakter: sinal gravado) Conjunto das disposições psicológicas (inatas ou adquiridas) e dos comportamentos habituais de um indivíduo permitindo-lhe ter um controle sobre si e agir com firmeza, retidão e honestidade. Ex.: um homem de caráter. Ver personalidade. carisma (gr. charisma: graça, favor) 1. Em seu sentido religioso, o carisma constitui um dom sobrenatural conferido pelo espírito a um indivíduo, mas para o uso do hein comum da comunidade: dom da sabedoria, da ciência, da cura das doenças, da profecia etc. 2. Em seu sentido sociocultural, o carisma é toda irradiação pessoal de um indivíduo, vale dizer, uma "qualidade extraordinária de uni personagem que é, por assim dizer. dotado de forças ou de caracteres sobrenaturais ou sobre-humanos" (Max Weber). 3. Poder carismático é o poder exercido por um indivíduo que se singulariza por qualidades prodigiosas, pelo heroísmo, pela abnegação à causa dos outros e por outras particularidades exemplares fazendo dele um líder ou um chefe merecedor de admiração, de respeito. de acata-mento etc. Ex.: o poder carismático exercido pelos profetas; no campo político, o poder exercido por um governante plebiscitado, pelo gran-de demagogo etc. Carnap, Rudolf (1891-1970) Um dos mais influentes filósofos do *fisicalismo ou positivismo lógico. juntamente com Moritz *Sehlick, fundador do *Círculo de Viena, Carnap nasceu na Alemanha e foi professor na Universidade de Viena e posteriormente na Universidade de Chi-cago e de Los Angeles. tendo emigrado para os Estados Unidos por razões políticas. Em sua obra mais importante, A estrutura lógica do mundo (1928), procura construir um sistema que mostre a relação entre os teoremas gerais da física e os dados observacionais da experiência. Mais tarde modifica de certo modo essa concepção, mantendo no entanto que a experiência deve sempre confirmar as teorias científicas, através da aplicação da teoria da probabilidade. Defende esse ponto de vista em sua obra Os fundamentos lógicos da probabilidade (1950). Seguindo o pensamento de Frege e Russell, escreveu A sintaxe lógica da linguagem (1934) e Significa-do e necessidade, em que considera fundamental, para o desenvolvimento da ciência, a construção de uma lógica rigorosa da linguagem. Essa concepção influenciará fortemente uma filosofia da ciência formulada em bases analíticas, sobretudo nos Estados Unidos. Escreveu também Conceituação fesicalista (1926) e O problema da lógica da ciência (1934). Carnéades (c.215-129 a.C.) Filósofo grego nascido em Cirene; foi discípulo de Arcesilau e o sucedeu como líder da *Nova Academia. E considerado o representante mais importante do probabilismo, filosofia que sustentava que não existe verdade, nias Chardin, Pierre Teilhard de Ver Teilhard de Chardin, Pierre. Charron, Pierre (1541-1603) Teólogo, filósofo cético e famoso pregador francês, nascido em Paris. Inspirado nos Essais, de Montaigne, escreveu Livres de la sagesse, onde defende a liberdade de religião e faz uma apologia da razão, que o leva a ser acusado de ateísmo. Publicara, anteriormente, em 1594, Les trois verités. Chestov, Leon (1866-1938) Filósofo e ensaísta russo, estudou na Universidade de Mos-cou e viveu em S. Petersburgo, tendo se exilado na França após a revolução comunista. Um dos principais inspiradores do *existencialismo contemporâneo, foi uni pensador profundamente religioso, podendo mesmo ser considerado um cético fideísta. Na fase final seu pensamento foi influenciado por *Kierkegaard. Afirmava que "todo pensamento profundo começa com o desespero". Principais obras: A apoteose da falta de fundamento: ensaio de pensamento anti-dogmático (1905), A filosofia da tragédia (1927), Kierkegaard e a filosofia existencial (1936), A idéia de bem em Tolstoi e Nietzsche (1949). Chomsky, Noam (1928- ) Lingüista e filósofo norte-americano (nascido na Filadélfia), professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT), e criador da gramática gerativatransformacional, uma das principais correntes teóricas da lingüística contemporânea. Sua teoria concentra-se no fato de um falante de uma língua ser capaz de compreender e de gerar sentenças novas, ou seja, que nunca ouviu antes. A criatividade do falante explica-se por seu domínio implícito das regras básicas da gramática, sua competência lingüística. Distingue, as-sim, a competência do falante, o conjunto de regras que constituem a estrutura de uma língua, e o desempenho (performance), o uso efetivo da língua que é uni subconjunto do primeiro. A teoria lingüística deve, portanto, preocupar-se com a competência, chegando a estabelecer a existência de universais lingüísticos, princípios básicos comuns a todas as línguas, que seriam inatos e explicariam o desempenho, isto é, o uso concreto de línguas específicas. Suas hipóteses têm, portanto, grande importância para a psicologia cognitiva, já que essas estruturas forma-riam as hases do próprio pensamento. Do ponto de vista filosófico, é importante sua retomada do racionalismo clássico ao discutir o *inatismo e o *behaviorismo. Obras principais: Transformation Analysis (1955), The Logical Structure of Linguistic Theory (1956), Aspects of the Theory of Syntax (1965), Topics in the Theory of Generative Grammar (1966), Language and Mind (1968). Cícero (106-43 a.C.) Político, orador e filósofo romano, Marco Túlio Cícero foi um dos responsáveis pela difusão da filosofia grega no mundo latino, através de obras que influencia-ram fortemente a formação e o desenvolvimento da tradição clássica greco-romana. Sto. Agostinho, p.ex., teria se interessado pelo saber e pela filosofia despertados pela leitura do Hortensius, obra de Cícero hoje perdida, que consistia em um elogio da filosofia. Cícero não possui propriamente unia filosofia original, tendo sofrido basicamente a influência do platonismo, do epicurismo e do estoicismo. Pode ser considerado um filósofo político por suas obras De legibus e De republica. Inspirando-se em Platão e no estóico Crisipo, declara que "as leis são necessariamente inerentes a toda sociedade", o legislador devendo levarem conta, ao mesmo tempo, o ideal e as realidades, o valor e o fato. Afirma ainda que as três formas de governo (monárquica, aristocrática e democrática) são más em seu estado "puro", devendo ser conciliadas numa república, porque o serviço da república e da pátria é um "estado de espírito" que assegura, da parte dos governos e dos governados, a qualidade das constituições (já se esboça, aqui, o papel cívico dos cidadãos). Suas principais obras são: Sobre a natureza dos deuses, Sobre os oficios (tratando dos preceitos morais), Acadêmica (sobre o problema do conhecimento e o ceticismo), e inúmeras epístolas e discursos famosos por seu estilo. Cícero é responsável pela criação de todo um vocabulário filosófico em língua latina (o termo "moral" é considerado de sua autoria), e suas obras são uma fonte impor-tante sobre o pensamento de filósofos do período antigo e do helenismo, cujas obras se perderam. ciclo/cíclico (do gr. kyklos: círculo, roda) Idéia segundo a qual os fenômenos se repetem ou se reproduzem obedecendo sempre a uma mesma ordem e de modo ininterrupto. Desempenha um papel importante em certas concepções filosóficas e científicas: a) a observação dos fenômenos astronômicos regulares (ciclo lunar, por exemplo) supõe o tempo como um infinito cíclico (Aristóteles) ou como a base do * "eterno retorno" (Nietzsche); b) a existência de ciclos econômicos nas sociedades agrícolas indica a existência de um ciclo nas civilizações (nasci-mento, desenvolvimento e decadência); c) a constatação da existência de ciclos no interior do mecanismo de produção e de distribuição (no sistema capitalista) leva os economistas a fala-rem de ciclos econômicos (não se reproduzem com uma regularidade imutável, pois sofrem variações); d) a constatação do ressurgimento de certas doenças mentais leva os psicopatologistas a falarem do caráter cíclico de certas doenças (a psicose maníaco-depressiva, por exemplo). Cidade de Deus, A (De Civitate Dei) Obra de sto. *Agostinho, escrita entre 413 e 426, na qual apresenta a primeira grande concepção cris-tã de tempo histórico, desde a criação do mundo até o termo último, a Parusia (fim dos tempos), precedendo um estado definitivo de paz e de felicidade eternas. Assim, a humanidade. sub-metida às vicissitudes da *história. está em mar-cha para um destino comandado pela Providência divina. A "cidade terrestre" (pagã), fundada no "amor de si e no desprezo de Deus", não pode fornecer uni ideal de civilização nem tam-pouco ser fonte de felicidade para os homens. Os estados terrenos são comandados pela sede de dominação. A "Cidade de Deus", ao contrário, fundada no "amor de Deus até o desprezo de si", é comandada pelos valores cristãos que implicam o bom uso da liberdade, prefigurando a cidade celeste. ciência (lat. scientia: saber, conhecimento) 1. Em seu sentido amplo e clássico, a ciência é um *saber metódico e rigoroso, isto é, um conjunto de conhecimentos metodicamente adquiridos, mais ou menos sistematicamente organizados, e suscetíveis de serem transmitidos por um pro-cesso pedagógico de ensino. 2. Mais modernamente, é a modalidade de saber constituída por um conjunto de aquisições intelectuais que tem por finalidade propor uma explicação racional e objetiva da realidade. Mais precisamente ainda: é a forma de conhecimento que não somente pretende apropriar-se do real para explicá-lo de modo racional e objetivo, mas procura estabelecer entre os fenômenos obser- vados relações universais e necessárias, o que autoriza a previsão de resultados (efeitos) cujas causas podem ser detectadas mediante procedi-mentos de controle experimental. ciência e filosofia, relação entre Para Platão, a ciência é unia introdução à filosofia; é ela que permite o discurso verdadeiro, mas seus conceitos exigem ser justificados pela filosofia; por isso, a ciência é a mediação entre o sensível e o discurso absolutamente verdadeiro, que é o da filosofia. Cor Descartes, a filosofia deixa de ser o acabamento para tornar-se o pressuposto da ciência. Sua imagem é famosa: o saber é como uma árvore cujas raízes são a metafísica, o tronco a ciência física, e os ramos as ciências aplicadas. O saber científico se desenvolve de modo autônomo. e não mais como um momento do caminho da sabedoria: é ele que torna o homem mestre e dominador da natureza. O papel da filosofia é o dc procurar as raízes e o funda- mento do conhecimento realizado pela ciência. Sein a legitimação metafisica, a ciência permanece um saber sem garantia. Já para Kant, não é mais possível fundar a ciência (que progride) na metafísica. Seu empreendimento crítico visa delimitar esses domínios. Mas o conhecimento científico não constitui um conhecimento das coisas em si, do real nele mesmo, pois torna -se conhecimento apenas dos fenômenos. Portanto, a ciência perde toda legitimidade quando pretende falar para além de toda experiência possível. Contudo, se o saber está todo do lado da ciência, nem por isso constitui o todo do pensamento nem tampouco do destino humano. Kant reserva, ao limitar o saber, uni lugar à crença. Por-tanto. com Kant, termina o velho sonho da filosofia, de construir, apenas pela razão, um discurso absolutamente verdadeiro, a ciência sendo apenas sua realização parcial e derivada. Doravante, só a ciência conhece. "Conhecer" não é mais contemplar um ser fora de nós, como um "em-si", mas construir: só podemos conhecer estruturas e os limites do espírito, isto é, somente a coisa para nós, tal como ela nos aparece: o fenômeno. E por isso que a metafísica, que pretende atingir a coisa em si, fracassa, pois seus três objetos, o Eu. o mundo e Deus, não correspondem aos dados da experiência. ciência e valores A ciência não pode ser considerada como um saber absoluto e puro, cuja racionalidade seria totalmente transparente e cujo método constituiria a garantia de uma objetividade incontestável. Não é um mundo à parte, espécie de reino isolado onde os cientistas fariam "pesquisas puras", desinteressadas, preocupados apenas com a busca do conheci-mento verdadeiro. Evidentemente, eles trabalham para construir conhecimentos tão rigorosos, racionais e objetivos quanto possível: refe- rem-se a normas racionais, testam suas teorias confrontando-as com a experiência. Contudo, na prática, as coisas se complicam, e as pesquisas nem sempre possuem a transparência e a objetividade que, de bom grado, lhes emprestamos. As idéias científicas não são totalmente independentes da filosofia, da religião e das ideologias que impregnam o meio cm que vivem os pesquisadores. Por isso, é muito questionável o chamado "princípio da neutralidade", ou seja, o princípio segundo o qual os cientistas estariam isentos, imunes, em nome de sua racionalidade objetiva, de formular todo juízo de valor, de manifestar toda e qualquer preferência pessoal, de ser responsáveis por toda e qualquer decisão de ordem política ou implicando questões de tipo ético, posto que, por seu objetivo, seu conhecimento seria universal, válido em todos os tempos e lugares, para além das sociedades e das formas de cultura particulares. cientificidade Este termo evoca os critérios que nos permitem definir o que constitui um conhecimento científico de fato e distingui-lo claramente das outras formas de saber não-científicas. Dois são os critérios mais correntes: o recurso à dedução racional e o recurso à verificação experimental. Só há conhecimento cien-tífico a partir do momento em que podemos repetir determinado fenômeno ou prever com certeza o aparecimento desse fenômeno, sob determinadas condições. Insatisfeito com o critério da verificabilidade, defendido pelos empiristas lógicos — segundo o qual uma teoria só é científica quando suscetível de uma verificação experimental real ou possível —, Karl Pop-per propõe um critério demarcatório entre o científico e o não-científico. Trata-se do critério da refutabilidade, da testabilidade ou da falsificabilidade, o que significa dizer que uma teoria só é científica quando pode ser refutada pela experiência. Se a física é uma ciência verdadeira, é porque faz predições que a experiência, em princípio, pode contradizer. A psicanálise, em contrapartida, aparece corno não-científica, pois os "fatos" a confirmam sempre. Assim, a refutabilidade constitui o verdadeiro critério de de-marcação entre o científico e o não-científico, ou seja, o verdadeiro critério de cientificidade: de um lado. temos teorias suscetíveis de serem refutadas experimentalmente; do outro, aquelas que resistem aos testes experimentais; as primei-ras são teorias científicas, as segundas são teorias metafísicas. cientificismo Ideologia daqueles que, por deterem o monopólio do saber objetivo e racional, julgam-se os detentores do verdadeiro conhecimento da realidade e acreditam na possibilidade de uma racionalização completa do saber. Trata-se sobretudo de uma atitude prática segun-do a qual "fora da ciência não há salvação", porque ela teria descoberto a fórmula laplaciana do saber verdadeiro. Essa atitude está fundada em certas normas latentes que se expressam em três "artigos de fé": 1) a ciência é o único saber verdadeiro; logo, o melhor dos sabedores; 2) a ciência é capaz de responder a todas as questões teóricas e de resolver todos os problemas práticos, desde que hem formulados, quer dizer, positiva e racionalmente; 3) não somente é legítimo mas sumamente desejável que seja confia-do aos cientistas e aos técnicos o cuidado exclusivo de dirigirem todos os negócios humanos e sociais: corno somente eles sabem o que é verdadeiro, somente eles podem dizer o que é bom e justo nos planos ético, político, econômico, educacional etc. cinismo (do lat. cynicus, do gr. kynikós: como um cão) I. Escola filosófica de Antístenes (444-365 a.C.), discípulo de Sócrates, assim chamada porque ele ensinava no Cynosarge (mausoléu do cão) e se considerava a si mesmo o cão. Sua doutrina foi retomada por Diógenes, que também se considerava o cão, em função de seu estilo de vida: desprezava todas as convenções sociais e as leis existentes, sua filosofia pregando um retorno à vida simples conforme à natureza. 2. Em seu sentido moral_ o cinismo é uma atitude individual que consiste no desprezo, por palavras e atos, das convenções, das conveniências. da opinião pública, da moral admitida, ironizando todos aqueles que ' a elas se submetem e adotando. em relação a eles, um certo amoralismo mais ou menos agressivo, mais ou menos debochado. Cioran, Émile Michel (1911-1995) Considerado por muitos o filósofo-poeta da decomposição, da podridão e do vazio que espreitam e ameaçam as atitudes humanas e as coisas, Cio-ran (natural da Romênia e radicado em Paris desde 1937) defende a tese segundo a qual toda doutrina, ideologia ou crença conduz a uma "farsa sangrenta"; e os grandes sistemas nada mais são do que tautologias. Por isso. seu pensamento é fragmentário e anti-sistemático, preocupado apenas em despertar as pessoas e "trans-tornar" suas vidas. Obras principais: Précis de décomposition (1949), Syllogismes de l'amertume (1952), La tentation d 'exister (1956), Histoire et utopie (1960), La chute dans le temps (1964), Le mauvais demiurge (1969), De l'in-convenient d'être né (1973), Exercícios de admiração (1986). traduzido para o português. círculo (lat. circu/us) 1. Reciprocidade lógica entre dois termos, cada um podendo ser deduzi-do a partir do outro. 2. Círculo vicioso: falha de raciocínio que consiste em provar, uma pela outra, duas proposições não-demonstradas: A por 13 , c t3 por A. 3. Círculo hermenêutico: dificuldade d o método hermenêutico ou interpretativo segundo a qual "toda compreensão do mundo implica a compreensão da existência, e reciprocamente" (Heidegger). Portanto, na ordem do vivido, só procuramos o que já encontramos. Esse círculo constitui a única garantia de rigor que convém aos fatos antropológicos. Essa antecipação. mola do método hermenêutico, constitui um elemento característico de sua estrutura. A circularidade não constitui um defeito do método, mas um caráter do objeto. Para Heidegger. "a estrutura de antecipação" própria à "explicação" constitui "a expressão" da "estrutura existencial de antecipação do próprio ser-aí". Essa antecipação nada mais é do que a pré-compreensão a partir da qual poderá desenvolver-se uma explicitação (e não uma explicação) verdadeiramente compreensiva. Círculo de Viena Associação fundada na década de 20 por um grupo de lógicos e filósofos da ciência, tendo por objetivo fundamental che-gar a uma un/fìcação do saber científico pela eliminação dos conceitos vazios de sentido e dos pseudoproblemas da metafísica e pelo emprego do famoso critério da verificabilidade que distingue a ciência (cujas proposições são verificáveis) da metafísica (cujas proposições inverificáveis devem ser supressas). Ao recusar a introdução dos elementos sintéticos a priori no conhecimento, o Círculo, liderado por Rudo l f Car-nap, visando eliminar definitivamente a metafísica, prega que todos os enunciados científicos devem ser sempre a posteriori, pois não são outra coisa senão simples constatações, ou seja, enunciados protocolares, só tendo significado pelo conjunto lógico. isto é, pelo sistema das transformações analíticas no qual se integram. Fica questionado, assim, o empreendimento kantiano. A lógica simbólica, assim definida, nada nos ensina sobre o mundo, pois não é uma teoria, mas um sistema de convenções livremente escolhidas. Ao ser criticado por Tarski cm função de reduzir a lógica a uma mera sintaxe, Carnap (juntamente com W i t t g e n s t e i n ) se volta para a elaboração de uma semântica lógica, isto é, para o estudo das relações entre uma lingua-gem e os sistemas de objetos ou interpretações que tornam os enunciados verdadeiros. Concebe, então, a filosofía como uma semiótica que estuda a natureza da linguagem da ciência. Esta semiótica compreende: a) uma sintaxe (teoria das relações formais entre os signos); b) uma semántica (teoria das interpretações); c) uma pragmática (teoria da relação da linguagem com o locutor e com o ouvinte). Chega. assim, a um "neopositivismo" que reduz o papel da filosofia ao de c/arificação da linguagem científica. W i t t g e n s t e i n escreve que " o objetivo da filosofia é a clarificação do pensamento", não tendo nenhum conteúdo próprio. Ela não é uma interpretação do Eu, do mundo e de Deus, mas uma tentativa de clarificação de toda expressão: "Os Iimites de minha linguagem são os limites de meu universo", proclama Wittgenstein. O Círculo de Viena (formado ainda por Otto Neurath, Moritz Schlick, Ernest Nagel, Hans Reichenbach, entre outros) exerceu uma forte (mas breve) influência na filosofia e mantém até hoje, com a filosofia analítica (anglo-saxônica), rela- ções bastante confusas. Ver fisicalismo. cirenaísmo (de Cirene, cidade da Cirenaica, atual Líbia) Escola e doutrina filosófica fundada por Aristipo (séc.IV da era cristã), que professa o mais absoluto hedonismo, ou seja, a total identidade entre o prazer (ou volúpia) e a virtude (ou bem). Clarke, Samuel (1675-1729) Filósofo e teólogo inglês, estudou na Universidade de Cambridge, tornando-se amigo e discípulo de *Newton. Procurou demonstrar a existência de Deus e dos princípios morais utilizando-se de um método matemático, defendendo a compatibilidade entre a religião revelada e a natural. Notabilizou-se sobretudo por sua correspondência com *Leibniz (1715-1716), em que defendeu as teorias newtonianas de *espaço e *tempo contra as críticas de Leibniz. claro/obscuro Duas palavras muito empregadas na linguagem filosófica do sec.XVII para dar precisão ao termo vago *"idéia". Para Des-cartes, uma idéia clara é unia idéia manifesta e evidente, "presente e manifesta a um espírito atento"; é distinta quando não podemos confundi-la com nenhuma outra. Consideremos um exemplo: uma criança tem uma idéia obscura do círculo quando não sabe distingui-lo de uma figura oval ou de diversas figuras curvas; tem uma idéia clara do círculo quando é capaz de distinguí-lo de qualquer outra figura curva; con-tudo, embora clara, essa idéia será confusa se a criança só souber dizer o que é o círculo mostrando exemplos ou descrevendo-o imprecisa-mente; só terá uma idéia distinta do círculo quando souber defini-lo precisamente como o conjunto dos pontos eqüidistantes de um mesmo ponto chamado centro, cujos raios são iguais e cujo diâmetro é o dobro do raio. classe (lat. classes: grupo convocado para as armas) 1. Em seu sentido lógico, classe é um conjunto de seres, de objetos ou fatos, em nú-mero indeterminado, todos possuindo certas características comuns. 2. Em seu sentido sociológico, significa, numa sociedade determinada, o estrato ou grupo de indivíduos que possui, sem nenhuma existência legal, a mesma condição social. Ex.: a classe burguesa, a classe operária. 3. Luta de classes: para o marxismo, é o conflito entre a classe operária e a classe burguesa. Ver luta de classes. Cleantes (331-232 a.C.) Filósofo grego (nascido em Troade) estóico, foi discípulo de Zenão de Cicio e o sucedeu como chefe da escola estóica. Restam apenas fragmentos de suas obras. Clemente de Alexandria (c.150-c.215) Um dos principais expoentes da escola platônica cristà de *Alexandria. Seus ensinamentos e sua obra foram fundamentais para a síntese entre a doutrina cristã e a filosofia grega, sobretudo platônica. que se desenvolveu nos primeiros séculos da era cristã. Segundo sua visão, alguns filósofos gregos. dentre eles Sócrates, Platão e os estóicos, antecipam algumas verdades do cristianismo, ainda que de forma "encoberta" e imperfeita. Principais obras remanescentes: Protéptico, Pedagogo e Stromata. coerência (do lat. cohaerere: estar junto, es-tar unido) Compatibilidade entre elementos de um sistema, constituindo um todo integrado. A teoria da *verdade como coerência, ou teoria coerentista da verdade, sustenta que uma crença, proposição ou juízo são verdadeiros enquanto pertencem a um sistema de crenças, proposições, juízos, compatíveis entre si, preservando portan-to a consistência e a integridade do sistema. cogito (do lat. cogitare: cogitar, pensar; cogito: penso) 1. Para Descartes. o cogito ergo sum ("penso logo existo") é o primeiro princípio da filosofia, inaugurando uma revolução que consiste em partir da presença do pensamento e não da presença do suficiente ou, ainda, a condição sine qua non, isto é. a circunstância sem a qual (sine qua) o fenômeno não pode ser produzido. 2. Na filosofia política, a expressão "condição humana" tende a suplantar a de "natureza humana" para designar a situação singular e única de cada homem no mundo (físico e social) e na história. 3. Na expressão, freqüente em matemática, "condição necessária e suficiente" (assim for-mulada: "para que... é necessário e basta ... ", ou ainda, "se... e somente se ..."), a palavra "con-dição" é sinônimo de causa, pois apenas um elemento está em jogo. condicional (do lat. tardio condicionalis) 1. Uma proposição é condicional quando afirma uma condição ou hipótese: se fizer sol, irei à praia amanhã. Um silogismo é condicional quando a premissa maior submete a conclusão a uma condição: "se fizer sol, irei à praia; ora, faz sol; logo, irei à praia." 2. Condicional contrafatual: aquele cujo antecedente é uma sentença subjuntiva no passado; a rigor, ele é inverificável ou indecidível, não podendo ser tratado em termos das noções de verdade ou de falsidade. Ex.: "Se Hitler tivesse morrido em 1938, a Segunda Guerra Mundial não teria acontecido." condicionamento 1. Ato de condicionar, isto é, de estabelecer uma associação entre uma estimulação e um processo de excitação, tendo por finalidade fazer animais ou homens adquirirem determinados comportamentos. Ver reflexo condicionado. 2. Do ponto de vista pedagógico, técnicas de treinamento ou "adestramento" utilizadas para certos fins educacionais. 3. Técnicas de terapêutica psiquiátrica, geral-mente fazendo uso de medicamentos. 4. Técnicas de publicidade comercial com a finalidade de criar certas motivações de compra. 5. Do ponto de vista político, técnicas de propaganda ideológica com o objetivo de remodelar as opiniões políticas dos individuos (lava-gem cerebral) por ameaças, sevicias ou recompensas. Condillac, Étienne Bonnot de (1715-1780) Filósofo francês ligado ao movimento enciclo- pedista. Desenvolveu uma filosofia influenciada em grande parte pelo empirismo de Locke, critïcando o racionalismo e o inatismo da filosofia cartesiana. Para Condillac, a origem de todo conhecimento está na sensação. Para ilustrar essa tese recorre à imagem da estátua de mármore, na qual, a partir da atribuição de um sentido, se desenvolveria todo o conhecimento. Todas as faculdades superiores da mente, incluindo a abstração, nada mais seriam do que transformações das sensações originárias. Condillac foi também um dos primeiros filósofos a enfatizar o papal da linguagem como sistema simbólico no processo de formação do conheci-mento. Obras principais: Essai sur l'origine des connaissances humaines (1749), Traité des sensations (1755), Le commerce et le gouvernement considerés relativement l'un à l'autre (1776), Langue des calculs, póstuma (1798). Sua obra teve grande influência no pensamento francês do séc.XIX, sobretudo no campo da psicologia, e prenunciou as teorias lingüísticas modernas. Condorcet (1743-1794) Considerado o último dos philosophes, o francês (nascido em Ribemont) Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat, marquês de Condorcet, membro da Academia de Ciências de Paris e seu secretário vitalício a partir de 1776, foi o único a tomar parte na Revolução Francesa. Foi membro da Assembléia Legislativa da Convenção Nacional. Acusado pelos jacobinos, preso e condenado à morte, envenenou-se para não subir ao cadafalso. Defendeu ardorosamente a harmonia entre o progresso científico e o progresso moral da humanidade. O progresso social é indissociável do progresso científico e técnico. A ciência é um instrumento de conhecimento e de ação. Via o séc.XVIII como a expressão de uma aliança entre a ciência e a política. Segundo ele, o Estado deveria intervir como avalista financeiro do desenvolvimento técnico e científico. Assim, a política da ciência se reduziria à política para a ciência. Condorcet sonhava com uma república das ciências na qual haveria uma simbiose entre saber e poder, porque o progresso do saber passa pelo poder político; do mesmo modo, o interesse do Estado exigiria uma consulta aos sábios: assim como a ciência organizada tem necessidade da "proteção esclarecida do governo", da mesma forma o governo, para tirar partido da ciência, tem necessidade de consultar os sábios. Convencido da fé no poder que a razão possui de assegurar a felicidade e a igualdade dos homens, Condorcet procurou congregar a esperança baconiana de uma ciência organizada com a esperança revolucionária de uma ciência que organizasse e reorganizasse o sistema social em seu conjunto. Com ele, o Século das Luzes prolonga a utopia técnica em visão messiânica: a sociedade dos sábios é chamada a ocupar um lugar privilegiado e a tornar-se o modelo da sociedade ideal. Sua obra mais conhecida, Esboço de urn quadro histórico dos progressos do espírito humano, foi escrita na prisão e publica-da postumamente em 1795, conduta (lat. conductas, de conducere: conduzir juntamente) 1. *Valor moral de uma *ação, apreciado segundo certas normas de bem e de mal: boa ou má conduta. 2. Diferentemente do comportamento, reduzido pela psicologia behaviorista às reações do organismo em seu meio, a conduta é, como o comportamento, uma resposta a uma motivação, mas fazendo intervir componentes psicológicos, motrizes e fisiológicos. Segundo o neurologista e psicólogo francês Pierre Janet, "a psicologia da conduta é o estudo do homem em suas relações com o universo e, sobretudo, em suas relações com os outros homens". Ver comportamento. Confissões (Confissiones) Obra de sto. Agostinho (400) na qual combina elementos autobiográficos e pensamento filosófico. Influenciada pelo pensamento neoplatônico, visa demonstrar que o homem se perdeu pelo pecado mas foi salvo pela graça divina. Seu método da reflexão sobre si, que descobre em nós uma "Presença mais profunda que nós mesmos", mostra que Deus é incompatível com um conhecimento racional, pois se situa fora do tempo, e interroga sobre a significação da inquietude e da angústia próprias à condição humana. Ver escolástica. conhecer (lat_ cognoscere) Apreender direta-mente algo: "Conhecer designa um gênero cujas espécies são constatar, compreender, perceber, conceber etc." (A. Lalande). Ver conhecimento. conhecimento (do lat. cognoscere: procurar saber, conhecer) 1. Função ou ato da vida psíquica que tem por efeito tornar um objeto pre-sente aos sentidos ou à inteligência. 2. Apropriação intelectual de determinado campo empírico ou ideal de dados, tendo em vista dominá-los e utilizá-los. O termo "conhecimento" designa tanto a coisa conhecida quanto o ato de conhecer (subjetivo) e o fato de conhecer. 3. A teoria do conhecimento é uma disciplina filosófica que visa estudar os problemas levantados pela relação entre o sujeito cognoscente e o objeto conhecido. As teorias empiristas do conhecimento (como a de Hume) se opõem às intelectualistas (como a de Descartes). Ver crítica; gnoseologia. conhecimento aproximado Na epistemologia histórica de *Bachelard, o conhecimento aproximado (conaissance approchée) é aquele que, diferentemente do saber aproximativo ou do saber objetivo (verdadeiro), aproxima-se de seu objeto por retificações sucessivas e constan-tes, revelando as condições segundo as quais o verdadeiro pode ser extraído do falso, numa polêmica constante em relação ao erro e num requestionamento contínuo dos saberes já objetivados. conjetura (lat. conjectura) Diferentemente da *hipótese, a conjetura é uma simples suposição inverificável ou ainda não verificada. conotação (do lat. tardio connotare) 1. Propriedade que um conceito possui de designar um ou vários caracteres que fazem parte de sua definição. Ex.: o conceito "homem" conota ao mesmo tempo animal e mamífero; a palavra latina esse significa a existência e conota a essência. Os termos "conotação" e "denotação" são sinônimos, respectivamente, de *compreensão e de *extensão. Podemos dizer que a conotação e a denotação designam o modo como a compreensãoe a extensão do conceito se realizam no momento em que o empregamos. 2. Elemento ou o conjunto dos elementos que servem de referência objetiva para definirmos uma palavra, ou seja, o conjunto das idéias evocadas por uma palavra. Ex.: vermelho = perigo, sangue etc. consciência (lat. conscientia: conhecimento de algo partilhado com alguém) 1. A percepção imediata mais ou menos clara, pelo sujeito, daquilo que se passa nele mesmo ou fora dele (sinônimo de consciência psicológica). A cons-ciência espontânea é a impressão primeira que o sujeito tem de seus estados psíquicos. Difere da consciência reflexiva, ou seja, do retorno do sujeito a sua impressão primeira, permitindo-lhe distinguir o seu Eu de seus estados psíquicos. Campo de consciência é o conjunto dos fatos psíquicos presentes na consciência do individuo. 2. Do ponto de vista moral, a consciência e o juízo prático pelos quais nós, como sujeitos, podemos distinguir o bem e o mal e apreciar moralmente nossos atos e os atos dos outros. Nesse sentido. falamos de consciência moral. Quando dizemos que alguém tem boa consciência, queremos significar que possui um senti-mento, fundado ou não. de ser irrepreensível nesse ou naquele ato de sua conduta geral. A expressão má consciência é utilizada para designar o sentimento de mal-estar ou de culpa moral, de arrependimento ou de remorso, de um indivíduo que não conseguiu realizar bem, corno queria, ou não conseguiu realizar completamente seu dever, aquilo pelo que se julgava responsável. 3. Não podemos empregar o termo "cons-ciência" de maneira absoluta: toda consciência é consciência de alguma coisa, isto é, a necessidade, para a consciência, de existir como cons-ciência de outra coisa distinta dela mesma, o que Heidegger exprime dizendo que o homem é um "ser-no-mundo". 4. Em nossos dias, nem o sujeito do discurso nem tampouco o sujeito psicológico e o sujeito histórico podem ser definidos relativamente a uma consciência fundadora de verdade ou. mes-mo, de liberdade. Longe de ser a fonte de todo conhecimento ou de toda ação, freqüentemente ela se revela como desconhecimento: não so-mente é impotente para conhecer-se a si mesma, mas pode converter-se em fonte de ilusões tenazes, que são outros tantos obstáculos à formação dos saberes que definem nossa modernidade. E o que mostra. por exemplo, a teoria do inconsciente de Freud: encontramo-nos diante do problema da mentira da consciência ou da consciência como mentira. 5. Hegel fala da "consciência infeliz", ou seja, do estado da consciência de si que culmina no dìlaceramento cristão entre a "encarnação" da perfeição divina e o sentimento que o indivíduo tem de não indentificar-se corn essa perfeição. 6. A tomada de consciência é o ato pelo qual a consciência intelectual do sujeito se apodera de um dado da experiência ou de seu próprio conteúdo. Ver tomada de consciência: inconsciente; boa consciêncialmá consciência. 7. Consciência de classe designa, para os teóricos marxistas. o conjunto de conteúdos da consciência que, na realidade, são determinados pelo pertencimento a uma classe social e, por conseguinte. pela posição que o sujeito ocupa no sistema econômico. Assim, a consciência de classe de um burguês seria necessariamente contrária à de um proletário, pois seus interesses são divergentes. consciente (lat. consciens) 1. Em seu sentido objetivo, o termo "consciente" se aplica aos atos ou estados pessoais percebidos pelo *sujei-to, quer de modo espontâneo, quer de modo reflexivo (ex.: estar consciente de um erro);.em seu sentido subjetivo, aplica-se ao próprio sujei-to que percebe (ex.: estou consciente do movi-mento de meu braço). 2. Em seu sentido moral, designa a qualidade de alguém que assume, com conhecimento de causa, a responsabilidade por seus atos, avaliando-os relativamente aos atos dos outros. Ver inconsciente. consenso (lat. consensus: acordo; juízo unânime) Acordo estabelecido, entre indivíduos ou grupos, sobre seus sentimentos, opiniões, vontades etc., como condição para que haja uma concórdia social. Há consenso geral quando todos aderem a um princípio, a uma asserção, a urna crença ou a uma tomada de decisão como critério do melhor e do mais verdadeiro, a una- nimidade sendo considerada como atitude mais razoável para a realização de determinado objetivo. conseqüência (lat. consequentia: sucessão, seqüência) Proposição que decorre necessariamente de outra e que, uma vez admitidos os princípios ou as hipóteses, não podemos negar sem entrar em contradição. Difere da conclusão, que é a última conseqüência de um raciocínio. conseqüente (lat. consequens) 1. Diz-se que um fenômeno é conseqüente quando seu apare-cimento segue regularmente o surgimento de um fenômeno anterior. 2. *Inferência ou *raciocínio conforme às leis da lógica: o conseqüente é uma proposição que se segue de outra numa inferência e que exprime a conseqüência da primeira. No exemplo: "se não chover, haverá uma catástrofe", "se não chover" é o antecedente, e "haverá uma catástrofe" é o conseqüente. 3. Diz-se que uma pessoa é conseqüente quando ela se revela coerente em seus pensamentos, em suas palavras, em seus atos e no conjunto de sua personalidade. Caso contrário, diz-se que ela é "inconseqüente". constitutivo Segundo Kant, as categorias ou conceitos puros do entendimento são constitutivos, pois constituem (fundamentam, estabelecem) o objetivo do conhecimento, tornando possível a sua determinação a part i r dos dados da sensibilidade. São portanto condições de possibilidade do conhecimento. Ver regulativo. construtivismo 1. Genericamente, trata-se de uma teoria do *conhecimento que se baseia numa concepção essencialmente *dialética das relações entre o *sujeito cognoscente e o * objeto conhecido (mundo exterior), a *Razão sendo ao mesmo tempo estruturante do *real e estruturada por ele. 2. Nome dado à corrente epistemológica inaugurada por *Bachelard para designar que, no processo de conhecimento, o objeto não á um "dado" que se apresenta ao pensamento científico sem colocar problemas, como se fosse algo evidente, imediatamente percebido pela experiência empírica ou por ela representado como protocolo de uma constatação isenta de toda implicação teórica, mas um constructo. algo de construído, isto é, um objeto pensado, elaborado em função de uma problemática teórica que possibilita submeter a uma interrogação sistemática os aspectos do real relacionamento pela questão que lhe é posta pelo sujeito. Neste sentido, é construtivista toda teoria do conheci-mento que não admite que o objeto "real" seja um mero produto do pensamento ou que se manifeste apenas em sua totalidade concreta, afirmando que ele é um objeto construído, um objeto concreto pensado: a Razão (sujeito) vai ao Real (objeto), não parte dele. 3. Nome dado à teoria epistemológica interacionista de J. *Piaget, segundo a qual, no pro-cesso de conhecimento, para estabelecermos as relações do sujeito com o objeto, devemos rejeitar as hipóteses empiristas, pois os conhecimentos científicos, longe de constituírem um simples reflexo do real, resultam de uma atividade do sujeito que organiza e estrutura os dados da experiência a fim de compreendê-los. 4. Na *lógica e na matemática, uma teoria é construtivista quando afirma que os objetos de que trata só são reais se podem ser construídos, ou se for possível provar sua existência; e uma proposição só pode ser considerada verdadeira se for possível efetivamente construir uma *pro-va de sua verdade. Opõe-se portanto às concepções realistas ou platônicas segundo as quais os objetos abstratos, como os objetos da matemática, existem de maneira autônoma independentemente de nossa apreensão deles. contemplação (lat. contemplatio: ação de olhar atentamente) 1. Estado de espírito passivo aplicado a uma idéia ou a um objeto. Para Platão, a atividade do filósofo é visão e contemplação (teoria) do mundo das essências: a teoria ou contemplação é a visão, pela alma, no término da ascensão espiritual, da idéia do bem, último cognoscível, causa de tudo o que é direito e belo. Aristóteles opõe contemplação a ação; a contemplação seria o modo de atividade de Deus. 2. Filosoficamente, o estado de espírito de alguém totalmente absorvido ou extasiado na busca de conhecimento de um objeto inteligente. Ex.: a contemplação da verdade. 3. Teologicamente, a contemplação consiste num estado místico em que o indivíduo tem uma visão direta e amorosa de Deus ou das coisas divinas. 4. Atitude de alguém que, cativado por um sentimento estético, revela-se desinteressado e simples espectador, sem preocupações racionais. 5. A filosofia racionalista procurou recalcar e deformar o veio místico da contemplação. A tal ponto que, quando Nietzsche fala do homem contemplativo, considera-o um ser "mesquinho, débil e domesticado", pois para ele a contemplação seria um subterfúgio para se evitar a ação. No entanto, o pensamento contemporâneo, resgatando certas fontes orientais, começa a reva- lorizar os temas de uma visão interior. A contemplação. como uma espécie de viagem do indivíduo no interior de si mesmo, permite-lhe abrir-se ao mundo e, até mesmo, constitui uma virtude terapêutica. contestação (lat. contestatio) Recusa mais ou menos sistemática não somente da ordem estabelecida e do poder legal em vigor, mas de todas as coerções sociais, políticas, jurídicas, religiosas. ideológicas etc., com seus sistemas de valores mais ou menos coercitivos. conteúdo 1. Denomina-se conteúdo da cons-ciência o conjunto das representações ou dos fatos da consciência que, em um determinado momento, a constituem. 2. Do ponto de vista lógico, o termo designa a matéria particular de uma proposição e se opõe à forma, isto é, à sua estrutura geral e abstrata. Ex.: na proposição "Todos os homens são mor-tais", distinguimos a forma da proposição uni-versal e afirmativa (todos os A são B) do con-teúdo a que se referem (os conceitos de homem e mortalidade). contingência (lat. tardio contingentia: acaso) I. Caráter de tudo aquilo que é concebido como podendo ser ou não ser, ou ser algo diferente do que é. 2. Nafilosofia existencialista, caráter daquilo que não possui, em si mesmo, sua própria razão de ser: "o ser é sem razão. sem causa e sem necessidade; a própria definição do ser nos dá sua contingência original" (Sartre). 3. Acontecimento do qual não podemos reduzir o aparecimento a um feixe de causalidades; é um acontecimento (como uma emergência) de ocorrência possível mas incerta. 4. Assim como Deus é o *necessário, porque é a causa de sua existência, o homem é um ser contingente. E essa contingência pode estender-se a todo elemento do mundo real, pois nada neste mundo possui seu princípio de existência em si mesmo: "O essencial é a contingência. Quero dizer que, por definição, a existência não é necessária. Existir é ser-aí, simplesmente; os existentes aparecem, se deixam encontrar, mas não podemos jamais deduzi-los" (Sartre). Contínuo (lat. continuus: sem interrupção) L Tudo aquilo que constitui uma realidade ainda não dividida em partes distintas: o espaço, o tempo, o movimento. 2. 0 princípio de continuidade (em Leibniz e em Kant) é aquele segundo o qual não há saltos na Natureza, ou seja, entre seus seres ou seus fenômenos, não há solução de continuidade. 3. No sentido matemático, uma grandeza ou quantidade continua é aquela que varia, para mais ou para menos, por diferenças infinitamente pequenas. Oposto a descontínuo ou discreto. contradição (lat. contradictio) 1. Oposição entre duas proposições incompatíveis, uma afirmativa e a outra negativa. Em outras palavras, o fato de afirmar e negar, ao mesmo tempo, algo de uma mesma coisa. Ex.: a diferença do ser e (Ver cosmo.) A filosofia transcendental de Kant, ao se comparar com a revolução copernicana, estabelece que a cosmo-logia não constitui mais um problema para a filosofia. Doravante, ela se dá por tarefa elaborar urna teoria do conhecimento, de suas condições de possibilidade, pois numa concepção infinitista do mundo não há mais lugar para a noção de cosmo, vinculada à noção de totalidade. A natureza (phvsis) é homogênea, sem regiões do ser separadas, sem relações estruturadas por um centro nem tampouco pela oposição do alto e do baixo, do céu e da Terra. Enquanto indica a priori os lugares naturais das coisas e as direções do movimento, a cosmologia constitui um obstáculo à instauração da física como ciência experimental. Observemos que toda cosmologia supõe a possibilidade de um conhecimento do mundo como sistema e de sua expressão num discurso sistemático. O postulado de urna totalização do mundo pelo saber é indispensável para que se opere a totalização do próprio saber. Por isso, o fato de una filosofia constituir-se num sistema do mundo torna-se evidente quando possuímos uma imagem do mundo que é a de uma totalidade fechada, finita e hierarquizada. O mesmo não ocorre quando possuímos urna imagem do universo infinita, sem ordem e descentrada, corno a copernicano-galileana. cosmológico, argumento Expressão que serve para designar urna das provas tradicionais da existência de Deus: a existência contingente do mundo exige a existência absolutamente necessária de um ser que dá ordem a esse mundo e é princípio de causalidade do universo material. cosmovisão (do gr. kosmos: mundo, e lat. visão: visão) Ver tVeltanschauung. Cournot, Antoine Augustin (1801-1877) Matemático, economista e filósofo francês (nascido em Gray). Com sua obra Recherches sur les principes mathématiques de la théorie des richesses (1838), introduziu a aplicação da ma-temática ao estudo dos problemas econômicos. Foi ainda o primeiro a formular uma completa teoria do monopólio. Realizou pesquisas sobre o cálculo das probabilidades, apresentando-as em Exposition de la théorie des chances et des probabilités (1843). Escreveu também Traité de l'enchaînement des idées Jòndamentales dans les sciences et dans l'histoire (1861) e Matérialisme, vitalisme, rationalisme (1875). Cousin, Victor (1792-1867) 0 nome do francês Victor Cousin está ligado a dois episódios marcantes da vida intelectual de seu país após a Restauração de 1815: a) na qualidade de grande mandarim do ensino na França. reintroduziu a filosofia cartesiana como a filosofia oficial em todos os níveis de escolaridade_ b) está na origem do ecletismo, uma espécie dc espiritualismo histórico que consiste em recolher e justapor, nos diversos sistemas filosóficos, as teses consideradas verdadeiras sem se preocupar com sua coerência. Em seus Primeiros ensaios de filosofia (1840), Cousin define o ecletismo como "um método histórico supondo uma filosofia avançada capaz de discernir o que há de verdadeiro c o que há de falso nas diversas doutrinas" a fim de que. após uma depuração, possa ser instaurada "unia doutrina melhor e mais ampla'" . I'er ecletismo. Crantor Filósofo grego (nascido na Cilicia) que viveu no séc.IV a.C.: foi discípulo de Xenócrates e de Polémon. É considerado o primeiro comentador de Platão. Autor de uma carta de condolências. Sobre a aJliçáo, que abriu uma nova era na literatura. Crates de Atenas Filósofo grego do séc.11l a.C. Diretor da *Academia. sucede a Polémon, a partir de 273 a.C. Cráti lo Filósofo grego que floresceu na segunda metade do séc.V a.C. Foi discípulo de I-leráclito e mestre de Platão. quê deu o nome dc Crátilo a um de seus diálogos. o qual trata da origem da linguagem. Cratipo Filósofo grego peripatético que floresceu no séc.l a.C., em Atenas. Foi tutor do filho de Cícero. crença (lat. medieval credentia) 1. Atitude pela qual afirmamos, com certo grau de *probabilidade ou de *certeza, a realidade ou a verdade de uma coisa, embora não consigamos comprová-la racional e objetivamente. 2. Do ponto de vista religioso, assentimento firme e seguro do espírito, sem justificação racional, à existência de uma reali dade transcendente ou divina. Sinônimo de fé. criação (lat. creatio) 1. A idéia de criação está ligada à de autor, de uma dependência da obra criada relativamente a seu criador, de uma novidade, que pode ser absoluta ou relativa. A concepção metafísico-teológica admite que o mundo não é eterno, mas que começa no tempo. Chama-se criação o fato de ter ele adquirido sua existência. Assim, a idéia de criação está vinculada à idéia de começo no tempo e do tempo. Na tradição judaico-cristã, por exemplo, a criação é o ato pelo qual Deus tirou o universo do nada (ex nihilo), produzindo-o sein nenhuma matéria preexistente. Esse conceito teológico de criaçào (oposto à simples "produção" ou "fabricação"). fazendo vir ao ser uma realidade da qual não existia nenhum exemplo anteriormente nem tampouco nenhum elemento preexistente. desempenhou um grande papel na metafísica do séc.XVII. notadamente em Descartes. que fala dc unia "criaçào contínua", ação pela qual Deus conserva o mundo na existência; e em Malebranche, que diz: "Se o mundo subsiste, é porque Deus quer que o mundo exista. A conservação das criaturas não é, da parte de Deus, senão sua criação continua." 2. ('riaçño cu'tistica: produção original do "gênio" nas belas-artes. A idéia de criação artística se opõe a noção de produção, à noção de fabricação e à idéia de reprodução. Não se trata. porem. de uma criação ex nihilo. pois a obra é nova e parte de elementos preexistentes. criacionismo (do lat. creare: criar. gerar) Doutrina teológico-metafísica de inspiração judaico-cristão, segundo a qual não somente Deus tirou o universo do nada (ex nihilo), isto é, o produziu sem matéria preexistente, mas criou para cada indivíduo uma alma imortal. Ver evolucionismo. cr ise (gr. krisis: escolha, seleçào. decisão) 1. Em seu sentido primeiro, a crise designa a manifestação aguda de uma doença, um momento de desequilíbrio sensível. Ex.: uma crise de asma. 2. Em um sentido genérico, significa uma mudança decisiva no curso de um processo. provocando um conflito ou um profundo estado de desequilíbrio. 3. Politicamente, é um conflito que afeta os membros de um Estado, a natureza de suas instituições e de seu regime político. 4. Em seu sentido moral, é um conflito resultante da contestação dos valores morais. religiosos ou filosóficos tradicionais. que passam a ser considerados como superados e nefastos ao desenvolvimento e à plena realização do homem. 5. Economicamente. uma crise pode ocorrer por insuficiência de produção ou. ao contrário, por superprodução. Trata-sede uni desequilíbrio entre produção e consumo, seja por insuficiência de produção. seja por excesso. Crisipo (c.28-c.205 a.C.) Filósofo grego (nascido em Soles. Cilicia) estóico: sucedeu a Cleantes na direção do *Pórtico. É considerado a figura mais importante do chamado estoicismo antigo, pois admite-se que foi ele quem deu estrutura e solidez ao pensamento estóico. sobretudo no campo da lógica. Restam apenas fragmentos dos mais de 700 tratados que lhe são atribuídos. Ver estoicismo. critério (gr. krlterion: aquilo que serve para julgar) 1. Sinal graças ao qual reconhecemos uma coisa e a dintinguimos de outra. 2. Sinal graças ao qual reconhecemos a verdade e a distinguimos do erro. Ex.: a evidência. crít ica (gr. kritiké: arte de julgar) 1. Juízo apreciativo, seja do ponto de vista estético (obra de arte). scia do ponto de vista lógico (raciocímo), seja do ponto de vista intelectual (filosófico ou científico), seja do ponto de vista de uma concepção, de uma teoria. de uma experiência ou de uma conduta. 2. Atitude de espírito que não admite nenhuma afirmação sem reconhecer sua legitimidade .icional. Difere do espirito crítico. ou seja. da aitude de espírito negativa que procura denegrir ostematicamente as opiniões ou as ações das outras pessoas. 3. Na filosofia. a crítica possui o sentido de análise. Assim, a filosofia crítica designa o pensamento de Kant e de seus sucessores. Suas três obras principais se intitulam: Crítica da ra_do pura, Crítica da ea_do prática e Crítica do juízo. Nessas obras, a palavra "crítica" tem o sentido de "exame de valor". Do uso kantiano da palavra "critica", deriva o termo ''criticismo" que designa a filosofia de Kant. Ver criticismo. Crítica da razão prática (Kritik der praktischen Vernunji) Segunda das "três criticas" de Kant, trata da questão da fundamentação da *ética na razão prática radicalmente distinta da razão teórica, objeto de análise da "primeira crítica", a *Crítica da rasgo pura. Kant procura determinar a natureza da moral e o tipo de adesão que os princípios práticos comportam. Esta adesão total pressupõe os *postulados da liberdade, da imortalidade da alma e da existência de Deus. inacessíveis à razão teórica. Ver Kant. Crítica da razão pura (Kritik der reinen I'ernunft) Primeira obra da chamada fase crítica, trata-se da mais importante e influente de Kant (I° ed. 1781. 2° ed. com alterações. 1787), na qual expõe um novo programa filosófico: a filosofia. diferentemente da ciência não deve pretender conhecer o mundo, mas sim revelar os funda-mentos da ciência, estabelecendo as condições de possibilidade do conhecimento. Contém três partes: a Estética Transcendental (ou teoria das formas puras da sensibilidade, as intuições de espaço e tempo); a Analítica Transcendental (ou teoria dos conceitos e de nossas formas de entendimento do mundo): a Dialética Transcendental (ou teoria daquilo que não podemos conhecer, ou teoria dos *númenos: a totalidade do mundo, a imortalidade da alma e a existência de Deus). A (Titica se propõe assim a definir a fonte. as formas e os limites de todo conheci-mento humano. "Deve grande influência no desenvolvimento da teoria do conhecimento e mes-mo da filosofia da ciência na Alemanha ao final do séc.XIX, sobretudo com o *neokantismo. Ver Kant. Critica do, juízo (Kritik der Urteilskraft) Terceira c última das "três críticas" de Kant, publicada em 1790. Embora tendo como objetivo a análise do juízo estético, ou de gosto, na realidade Kant, por meio do exame da "faculdade de julgar", empreende nesta obra uma verdadeira revisão de suas posições anteriores, considerando a "Crítica do juízo como mm meio de articular as duas partes da filosofia —a teoria e a prática — em uni todo integrado". Esta obra, cuja influência não foi tão significativa quanto à de duas primeiras Críticas, tem sido, no entanto, revalorizada mais recentemente. Ver Kant. criticismo (do al. Kritizismus) Doutrina kantiana que estuda as condições de validade e os limites do uso que podemos fazer de nossa razão pura. Por extensão, toda doutrina que faz da crítica do conhecimento a condição prévia da pesquisa filosófica. Quando tenta situar sua pró-pria filosofia, Kant o faz relativamente a dois perigos: a) o perigo do dogmatismo, que confia demasiado na razào, sem desconfiar bastante das ilusões especulativas; b) o perigo do empirismo que, por medo dos erros dogmáticos, tende a reduzir tudo à experiência. O criticismo kantiano procura instaurar um justo uso da razão, após fazer uma triagem daquilo que lhe é possível e daquilo que lhe escapa. Ao colocar a questão básica "O que é conhecer?", transforma os dados da resposta afirmando que, no conheci-mento, o sujeito não apreende as coisas tais como são "em si", mas as submete à sua lei, isto é, às formas a priori da sensibilidade (espaço e tempo) e às categorias de seu entendimento. Critolau Filósofo peripatético do séc.11 a.C. Enviado, juntamente com Carnéades e Diógenes da Babilônia, pelos atenienses, em 156 a.C., para ensinar filosofia em Roma. os seus ensinamentos não agradaram aos romanos mais antigos, que conseguiram a expulsão dos três. Croce, Benedetto (1866-1952) Um dos filósofos mais importantes deste século, Benedetto Croce destacou-se sobretudo por sua obra no campo da estética e pelo seu sistema filosófico inspirado em Hegel. Fundou na Itália, em 1903, a revista La Critica, na qual publicou grande parte de seus trabalhos e que teve grande repercussão filosófica e literária. Croce desenvolveu uma "filosofia do espírito" de raízes hegelianas. Segundo essa visão, o espírito teria uma dimensão teórica e uma dimensão prática. A teórica, por sua vez, se desdobraria em estética e lógica; c a prática. em economia e ética. Em seu sistema, procura desenvolver cada uma dessas áreas. Sua filosofia é marcada por uma perspectiva histórica e uma preocupação com a cultura de sua época. Os elementos básicos de seu sistema encontram-se nas seguintes obras: Estética como ciência da expressão e lingüística geral (1902), Lógica (1905). Filosofia da prática (1909), Teo-ria e história da historiografia (1917). crucia l , experiência Ver experiência crucial. Cruz Costa, João (1904-1978) Filósofo brasileiro (nascido em São Paulo) e professor da USP. Cruz Costa se vinculou à corrente de pensamento lançada no Brasil. nos anos 30, por Leônidas Rezende, denominada "versão positivista do marxismo". Com efeito, para ele, a filosofia deveria ser conceituada como "positiva". pois a obra de Comte inaugura. escreve, "uma das fases mais ricas e interessantes de um novo estilo de filosofar". Contudo, se a filosofia positiva de Comte merece ser preservada, de- vendo apenas ser complementada pelo materialismo histórico, o mesmo não deve ser dito de sua teoria da reforma social, que procura instituir "uma autoridade com todos os traços de direita". Ademais, Cruz Costa tentou aplicar sua versão positivista do marxismo A. realidade brasileira: via uma relação profunda entre a doutrina positivista e o conjunto das contraditórias condições que deram origem à vida nacional e que a impelem. Apesar de ser um produto de importação. há nela "traços que revelam a sua mais perfeita adequação às condições de nossa formação. às realidades profundas de nosso espírito". Obras principais: A filosofia no Brasil (1945), O pensamento brasileiro (1946), Contribuição à história das idéias no Brasil (1956), O positivismo na República (1956) e Panorama da história da .filosofia no Brasil (1960). Ver filosofia no Brasil. Cudworth, Ralph (1617-1688) Filósofo inglês. chefe da escola platônica de *Cambridge do séc.XVII. Foi professor de hebraico na Universidade de Cambridge (1645-1688). Em sua obra mais importante, The True Intellectual System of the Universe (1678), refuta o *determinismo e defende o *livre-arbítrio. Escreveu também o Treatise concerning Eternal and Immutable Morality. publicado postumamente (1731). culpabilidade (do lat. culpa: falta) 1. Senti-mento do indivíduo com consciência de ter co-metido uma violação grave a uma regra moral, religiosa ou social e pela qual ele se sente responsável. 2. Para os filósofos existencialistas cristãos (Kierkegaard e Gabriel Marcel, por exemplo), a culpabilidade consiste num sentimento de *finitude e de *contingência da existência humana. revelando-se na consciência da falta e provocan-do uma angústia suscetível dc buscar a transcendência divina. 3. Na psicanálise, estado patológico e dolo-roso de um indivíduo que se sente culpado dc uma falta imaginária, isto é. que não cometeu, tendo sua fonte no complexo de Edipo ou numa exigência moral criada pelo superego. culto (lat. cultus) Toda homenagem de devoção ou de adoração prestada interiormente pelo homem a Deus, expressando-se por um conjunto de práticas, ritos e cerimônias religiosas. Por extensão, todo um conjunto de ritos e práticas de veneração ou de propiciação de divindades. de ancestrais, de seres sobrenaturais ou de certos símbolos. cultura (lat. cultura) 1. Conceito que serve para designar tanto a formação do espírito humano quanto de toda a personalidade do homem: gosto, sensibilidade, inteligência. 2. Tesouro coletivo de saberes possuído pela humanidade ou por certas civilizações: a cultura helênica, a cultura ocidental etc. 3. Em oposição a natura (natureza), a cultura possui um duplo sentido antropológico: a) é o conjunto das representações e dos comporta-mentos adquiridos pelo homem enquanto ser social. Em outras palavras, é o conjunto histórica e geograficamente definido das instituições características de determinada sociedade, designando "não somente as tradições artísticas, científicas, religiosas e filosóficas de uma sociedade. mas também suas técnicas próprias, seus costumes políticos e os mil usos que caracterizam a vida cotidiana" (Margaret Mead): b) c o proces- so dinâmico de socialização pelo qual todos esses fatos de cultura se comunicam e se impõem em determinada sociedade, seja pelos processos educacionais propriamente ditos, seja pela difusão das informações em grande escala, a todas as estruturas sociais, mediante os meios de comunicação de massa. Nesse sentido, a cultura praticamente se identifica com o modo de vida de uma população determinada, vale dizer, com todo o conjunto de regras e comportamentos pelos quais as instituições adquirem um significado para os agentes sociais e através dos quais se encarnam em condutas mais ou menos codificadas. 4. Num sentido mais filosófico, a cultura pode ser considerada como um feixe de representações, de símbolos, de imaginário, de atitudes e referências suscetível de irrigar, de modo bastante desigual, mas globalmente, o corpo social. 5. Cultura de massa é uma expressão, de uso ambíguo, freqüentemente utilizada para designar a possibilidade de uma população ter acesso aos bens e obras culturais produzidos no passado e no presente. seja o processo de degradação. Curso de filosofia posit iva (Cours de philosophic positive) Obra fundamental de Augusto *Comte. composta entre 1830-1842. e principal exposição de sua doutrina do *positivismo. Pre-tende substituir as especulações teológicas e metafísicas sobre a causa primeira por uma representação sistemática e positiva do universo. Após expor a "lei clos três estados" ("espinha dorsal do positivismo"). procura mostrar que a finalidade do saber científico é a previsão: "sa-ber para prever". A humanidade ingressou as-sim na era do saber positivo ou científico. Trata-se agora de fundar a ciência e a filosofia dos fenômenos sociais. As ciências se classificam segundo sua generalidade e simplicidade decrescentes. No desfecho dessa hierarquia, a filosofia social (sociologia) aparece como coroamento do conjunto do saber. Cusa, Nicolau de Ver Nicolau de Cusa. interpretação do texto torna-se assim o problema teórico central. Suas principais obras são: Blindness and Insight: Es-says in the Rethoric of Contenipgrary Criticism (1971), Allegories of Reading: Figural Language in Rousseau, Nietzsche, Rilke and Proust (1979) e ainda The Rethoric of Romanticism (1984) e The Resistance to Theory (1986), publicados postumamente. demiurgo (gr. demiourgos: aquele que traba-lha para o povo) No pensamento grego, particularmente de Platão, o demiurgo é um *deus ou o princípio organizador do universo, que traba-lha a *matéria (o caos) para dar-lhe uma *forma. Ele não a cria, apenas a modela contemplando o mundo das idéias. democracia (do gr. demos: povo e kratos: poder) 1. Regime político no qual a soberania é exercida pelo *povo, pertence ao conjunto dos cidadãos, que exercem o sufrágio universal. "Quando, na república. o povo detém o soberano *poder, temos a democracia" (*Montesquieu). Segundo *Rousseau, a democracia, que realiza a união da *moral e da *política, é um estado de direito que exprime a *vontade geral dos cidadãos, que se afirmam como legisladores e sujeitos das leis. 2. Democracia direta é aquela em que o poder é exercido pelo povo, sem intermediário; democracia parlamentar ou representativa é aquela na qual o povo delega seus poderes a um parlamento eleito; democracia autoritária é aquela na qual o povo delega a um único indivíduo, por determinado tempo, ou vitaliciamente, o conjunto dos poderes. 3. Geralmente, as democracias ocidentais constituem regimes políticos que, pela separação dos poderes legislativo, executivo e judiciário, visam garantir e professar os direitos funda-mentais da pessoa humana, sobretudo os que se referem à liberdade política dos cidadãos. Demócrito (c.460-c.370 a.C.) Filósofo grego (nascido em Abdera) atomista e considerado o primeiro pensador materialista. Para solucionar o problema de Parmênides e dos *eleatas, fazendo do ser uma unidade fechada e imutável e tornando incompreensível o movimento, Demócrito desenvolve o atomismo, a teoria do átomo, criada por Leucipo e destinada a conciliar o ser imóvel dos eleatas com a pluralidade mobilista de Heráclito. Seu atomismo se resume em dizer que: a) as qualidades sensíveis (sabor, odor, quente, frio, cor etc.) são aparências; b) esses corpúsculos, que são os átomos, não possuem nenhuma qualidade sensível, pois só têm propriedades geométricas (grandeza e forma); c) o movimento é função da existência do vazio. A novidade física e lógica do atomismo é a concepção mecanicista da *necessidade: "nada nas-ce do nada, nada retorna ao nada"; "tudo o que existe nasce do *acaso e da necessidade". Os átomos constituem a explicação última do mundo. Ao escapar do monismo imobilista de Parmênides e do pluralismo mobilista de Heráclito, Demócrito adota um ritmo ternário: duas teorias contrárias (tese e antítese) se conciliam fundindo-se numa síntese superior. Hegel retomará esse ritmo de três tempos e fará dele a grande lei do mundo. demônio (lat. daemon, do gr. daimon: gênio bom ou mau) 1. Na filosofia grega, gênio (espírito) bom ou mau, inferior a um deus, mas superior ao homem: o demônio de Sócrates era um gênio que lhe inspirava e dava conselhos. 2. Na religião cristã, o demônio é um anjo mau (diferente dos anjos), também chamado *diabo, Satã ou Satanás, princípio ativo de todo mal. demonstração (lat. demonstratio: ação de mostrar) Operação que, partindo de proposições já consideradas conhecidas ou demonstradas, permite-nos estabelecer a verdade ou falsidade de uma outra proposição chamada de conclusão. Em outras palavras, raciocínio que permite passar de proposições admitidas para uma proposição que resulta necessariamente delas. Por ex-tensão, mas num sentido meio impróprio, fala-se de demonstração experimental quando se estabelece um fato. uma lei ou uma teoria pela experiência. A expressão adequada seria verificação experimental, a que estabelece a validação de uma hipótese. denotação (lat. denotatio, de denotare: de-signar, indicar por meio de sinais) 1. Propriedade que um termo possui de designar todos os objetos pertencentes à classe definida pelo conceito e de abarcar toda a *extensão do conceito que lhe dá sentido. Denotação e *conotação são sinônimos. respectivamente, de extensão e compreensão. 2. Na lingüística atual, denotação é o conjunto das idéias evocadas por uma palavra, isto é. o conjunto dos elementos que servem de referência objetiva para definir uma palavra. deontologia (ingl. deontologv. do gr. deon: que é obrigatório, e logos: ciência, teoria) Termo criado por Bentham em 1834 para designar sua moral utilitarista, mas que passou a significar, posteriormente, o código moral das regras e procedimentos próprios a determinada categoria profissional. Ex.: a deontologia médica, fundada no juramento de Hipócrates. derelição (lat. derelictio) 1. Em sentido religioso, estado de total abandono, mesmo por parte de Deus, em que se encontra o indivíduo. Ex.: o Cristo na cruz. 2. Para Heidegger, a derelição é o sentimento do ser-aí (*Dasein) de estar jogado no mundo e de ser abandonado a si mesmo num mundo profundamente inautêntico e anônimo. Essa derelição não é um estado que seria possível superar: não está ligada nem a um momento histórico nem tampouco a uma concepção religiosa do pecado, mas intrinsecamente à inautenticidade e à degradação que afetam o ser-aí. Derrida, Jacques (1930- ) Filósofo francês (nascido na Argélia), professor na EcoleNormale Supérieure de Paris. Influenciado pelo *estruturalismo de *Lévi-Strauss e * Latan, bem como pela *fenomenologia de *Husserl e o pensamento de *Heidegger, Derrida desenvolveu um pensamento fortemente idiossincrático, caracteriza-do pela criação de uma terminologia própria e pela proposta do método da "desconstrução", no qual se pode detectar a influência das idéias da fase final do pensamento de Heidegger sobre o caráter essencialmente não-representationai da *linguagem. Derrida critica assim o logocentrismo, o lugar central que o discurso racional ocupa em nossa tradição intelectual, sobretudo na *metafísica. Identifica a metafísica com o discurso, com a *consciência que fala a si mes-ma e é o lugar da verdade e da unidade do ser. A "desconstrução" visa assim "dissolver" a linguagem para que esta dê lugar ao que Derrida chama de "escritura'". Sua gramatologia seria assim o "saber da escritura", não se tratando de uma ciência, mas de um fazer aparecer o horizonte histórico em que a "escritura" tem lugar. Procura tratar o que considera temas "margi- nais", à margem da tradição, o que está "fora dos livros", de uma forma deliberadamente fragmentada, procurando situar-se "no limite do discurso". A repetição, a polissemia, a diferença e a disseminação são os instrumentos da "des-construção", método que tem tido grande in-fluência sobretudo na crítica literária contemporânea. Obras principais: A voz e o fenômeno: introdução ao problema do signo na fenomenologia de Husserl (1967), Gramatologia (1967), A escritura e a diferença (1967), A dissemina-cão (1972), Margens da filosofia (1972), Ensaio sobre a origem dos conhecimentos humanos (1973). lilas (1974). A verdade na pintura (1978). Descartes, René (1596-1650) René Descartes nasceu na França, de família nobre. Aos oito anos. órfão de mãe, é enviado para o colégio dos jesuítas de La Flèche, onde se revela um aluno brilhante. Termina o secundário em 1612, con-tente com seus mestres, mas descontente consigo mesmo, pois não havia descoberto a Verdade que tanto procurava nos livros. Decide procurá- la no mundo, Viaja muito. Alista-se nas tropas holandesas de Maurício de Nassau (1618). Sob a influência de Beeckmann, entra em contato coin a física copernicana. Em seguida, alista-se nas tropas do imperador da Baviera. Para rece-ber a herança da mãe. retorna a Paris, onde freqüenta os meios intelectuais. Aconselhado pelo cardeal Bérulle, dedica-se ao estudo da filosofia, com o objetivo de conciliar a nova ciência coin as verdades do cristianismo. A fim de evitar problemas coro a Inquisição, vai para a Holanda (1629), onde estuda matemática e física. Escreve muitos livros e cartas. Os mais famosos: O discurso do método, As meditações metafisicas, Os princípios de filosofia, O tratado do homem e o Tratado do mando. Convidado pela rainha Cristina, vai passar uns tempos em Estocolmo, onde morre de pneumonia um ano depois. Suas frases mais conhecidas: "Toda filosofia é como uma árvore cujas raízes são a metafísica e as ciências os ramos"; "O *bom senso (ou *razão) é o que existe de mais bem repartido no mundo"; "Jamais devemos admitir alguma coisa corno verdadeira a não ser que a conheçamos evidentemente como tal"; "A pro-posição Penso, logo existo é a primeira e mais certa que se apresenta àquele que conduz seus pensamentos coin ordem". Toda a obra de Des-cartes visa mostrar que o conhecimento requer, para ser válido, um fundamento metafísico. Ele parte da *dúvida metódica: se eu duvido de tudo o que me vem pelos sentidos, e se duvido até mesmo das verdades matemáticas, não posso duvidar de que tenho consciência de duvidar, portanto, de que existo enquanto tenho essa consciência. O *cogito é, pois, a descoberta do espírito por si mesmo, que se percebe que existe como sujeito: eis a primeira verdade descoberta para o fundamento da metafísica e cuja evidência fornece o critério da idéia verdadeira. Assim, a metafísica é fundadora de todo saber verdadeiro. desconstrução Método de análise e interpretação de textos que caracteriza também uma postura filosófica, tendo como ponto de partida o pensamento de Jacques *Derrida. sobretudo sua Gramatologia (1967). Segundo Derrida. "a desconstrução não consiste cm passar de um conceito a outro, mas sim em inverter e deslocar uma ordem conceitual bem como a ordem nãoconceitual à qual esta se articula" (Signature, évenement, contexte, 1972). Procura assim explorar os vários significados ocultos e implícitos que constituem o modo de operação do texto, sua "disseminação", revelando suas contradições internas e estabelecendo um sentido que pode ir além e mesmo contra o pretendido pelo autor. A chamada "escola de Yale" nos Estados Unidos, com Paul *de Man, Harold Bloom e outros, notabilizou-se nas décadas de 70 e 80 pela prática da desconstruçào principalmente na crítica literária. descontínuo No sentido matemático, grandeza ou quantidade descontínua ou discreta é a que varia por passagem súbita de um valor a outro: por exemplo, a seqüência dos números inteiros. Oposto a contínuo. desejo (do lat. desiderare: aspirar a, desejar) 1. De modo geral, podemos definir o desejo como uma tendência espontánea, consciente. orientada para um objetivo concebido ou imaginado. 2. No sentido filosófico, o dcsejo, como a linguagem, é uma tendência especificamente humana, distinta da simples necessidade. Assim, o Eros platônico enfatiza o objeto "sobrenatural" do desejo, o amor dos belos corpos levando a alma a elevar-se ao amor do bem inteligível. Em Descartes, "a paixão do desejo é uma agi- tação da alma causada pelos espíritos animais que a dispõem a querer para o futuro aquilo que ela se apresenta ser conveniente. Assim, não desejamos somente a presença do bem ausente, mas também a conservação do presente". Segundo Hegel. a verdadeira finalidade do desejo não é o objeto sensível, mas a unidade da subjetividade consigo mesma, unidade procurada através do reconhecimento de um outro desejo. 3. Conceitos: "Nào é pela satisfação dos desejos que se obtém a liberdade, mas pela destruição do desejo" (Epicteto). "O desejo é a essência mesma do homem, isto é, o esforço pelo qual o homem se esforça para perseverar em seu ser" (Spinoza). "O dcsejo é a autodeterminação do poder de um sujeito pela representação de um fato futuro" (Kant). desmistificação Toda denúncia verbal ou escrita visando desiludir um grupo de pessoas ou uma coletividade a respeito de uma opinião ou de um conjunto de opiniões, crenças e valores considerados como falsos, preconceituosos, ilusórios e mistificadores. Ver mito; crítica. destino (do lat. destinare: fixar, determinar com antecipação) Poder mais ou menos personificado capaz de governar tudo o que existe no universo e de determinar, uma vez por todas e irremediavelmente. tanto o curso geral dos acontecimentos quanto o devir da história humana. Em outras palavras, o destino é essa espécie de poder misterioso capaz de determinar, conforme o que está dito ou escrito no "Iivro dos destinos"_ tudo aquilo que acontecerá aos homens por uma necessidade absoluta, inexorável, irracional e inflexível. Ver fatalidade. Destutt de Tracy (1754-1836) 0 francês Destutt de Tracy foi um nobre oficial do rei que aderiu à Revolução. Construiu suateoria política a partir da prática. Juntamente com *Cabanis, criou a palavra *"ideologia". Em 1811, publicou Elementos de ideologia e, em 1822, o Tratado de economia política. Antes de Comte, já defende a criação de uma sociologia ou "fisica social" tendo por finalidade observar os movi-mentos objetivos do corpo social. Constatou que "o supérfluo das sociedades é absorvido pelas classes superiores, ao passo que as classes inferiores absorvem a miséria" (tema retomado por Marx em sua teoria da "mais-valia"). Observou que a sociedade está dividida em duas "classes": os assalariados e os empregadores. a primeira sendo a mais numerosa e a mais pobre. E afirmou que a política e as medidas sociais deveriam fundar-se numa ciência positiva. Pediu a criação de "escolas de administração" e de "institutos de estudos políticos". Chamou de "ciências ideológicas" o que mais tarde seria chamado de "ciências morais e políticas" e hoje de "ciências humanas". desvelamento 1. Em Platão. a *verdade (alethéia) significa desvelamento do ser, isto é. descobrimento daquilo que estava oculto, retira-da do véu. 2. Na metafísica de Heidegger, o desvela-mento significa a idéia segundo a qual o ser da coisa se desvela, manifesta-se nas condições mesmas de seu aparecer, de seu "fenômeno", a verdade nada mais sendo que a manifestação do ente. enquanto ele deixa de ser ocultado pelas preocupações da vida cotidiana e do caráter aberto do ser. determinação (lat. determinatio) 1. Ato pelo qual alguém, após ter analisado os motivos prós e contras, toma voluntariamente partido ou se decide. Nesse sentido psicológico. "agir com determinação". "estou determinado a fazer isso" são expressões mais ou menos sinônimas de "decidido", de "decisão". 2. Designa o fato de ser causa determinante ou condição necessária de alguma coisa, provocando diretamente sua existência ou ocorrência. determinismo (do al. Determinismus) 1. Co-mo princípio segundo o qual os fenômenos da natureza são regidos por leis, o determinismo é a condição de possibilidade da ciência: "A definição do determinismo pela previsão rigorosa dos fenômenos parece a única que a física pode aceitar, por ser a única realmente verificável" (Louis de Broglie). 2. Doutrina filosófica que implica a negação do *livre-arbítrio e segundo a qual tudo, no universo, inclusive a vontade humana. está sub-metido à necessidade. Com Descartes, a natureza é matemática em sua essência: uma natureza que não fosse matemática contradiria a idéia de perfeição divina. Para Espinosa. 'não há na alma nenhuma vontade absoluta ou livre". Em Kant, o determinismo deixa de ser metafísico para fazer parte da legislação que o espírito impõe às coisas para conhecê-las. Não há opo sição entre o determinismo e a liberdade, porque ele pertence à ordem dos fenômenos, enquanto a liberdade pertence à ordem numenal. 3. 0 princípio do determinismo universal é aquele segundo o qual todos os fenômenos naturais estão ligados uns aos outros por relações invariáveis ou leis. Inaugurado por Laplace, este princípio afirma que o conhecimento do estado do universo, num momento dado, e o conheci-mento das leis da mecânica permitem prever rigorosamente todos os estados futuros, porque não há nenhuma independência das séries causais. "Devemos considerar o estado presente do universo como o efeito de seu estado anterior e como a causa daquilo que vai seguir-se. Uma inteligência que, por um instante dado, conhecesse todas as forças de que a natureza é animada e a situação respectiva dos seres que a compõem, englobaria na mesma fórmula os movimentos dos maiores corpos do universo e os do mais leve átomo; nada seria incerto para ela, e o futuro, como o passado, seria presente a seus olhos" (Laplace). Observemos que esse determinismo cada vez mais cede lugar a um postulado mais próximo da realidade científica: o real é inteligível. Fala-se ainda de determinismo psicológico: nosso passado, nossa educação e nossa situação social determinam (são a causa de) aquilo que acreditamos ser nossas escolhas. Em outras palavras, o determinismo psíquico é uma teoria segundo a qual toda idéia, toda imagem, toda representação etc., vindo espontaneamente à consciência. encontra-se necessariamente liga-da ao conflito patogênico do qual ela é a representação despistada. Deus (lat. deus) 1. Para o crente, Deus é o Ser *transcendente e perfeito, criador do Universo e, segundo os dogmas, responsável por tudo o que nele acontece (Providência). Para o descrente, Deus é uma ilusão antropomórfica construída a partir de uma extensão ao infinito das qualidades humanas, e cuja origem reside, segundo os pontos de vista, na necessidade de se ter segurança ou num estado da afetividade que vai até a patologia. Ver ateísmo. 2. No pensamento filosófico, Deus é um absoluto visado numa fé, num sentimento interior, nào constituindo o objeto de um saber racional. Não se trata do Deus criador dos teólogos. mas da razão última da harmonia das coisas. Porque a máquina complexa do mundo exige um relojoeiro, e sua perfeição supõe um ser perfeito. Não se trata, como dizia Pascal, do "Deus de Abraão. de Isaac e de Jacó", mas do "Deus dos sábios e dos filósofos". Para a concepção teísta, Deus é o Ser absoluto, princípio da existência, ser em si e por si, pessoal e distinto do mundo. considerado como onipotente, onisciente, imutável, eterno (e outros atributos), como princípio de inteligibilidade e de verdade. como princípio de perfeição moral, de amor, de soberana bondade, de justiça suprema, devendo ser objeto de um amor total por parte dos ho-mens. Para a concepção panteísta, Deus é o ser supremo imanente (não transcendente) à Natureza, isto é, substancialmente idêntico ao mundo: Deus sive Natura, dizia Espinosa. 3. A escolástica e, posteriormente, a filosofia clássica tentaram estabelecer provas da existência de Deus. cabendo ao filósofo fornecer à fé uma base racional. Kant, reconhecendo que se trata de um uso ilegítimo da razão, reduz essas "provas" a três: a) a prova fisico-teológica: a ordem que se manifesta no mundo não pode ser compreendida sem um desígnio superior, uma finalidade; portanto, há um ser inteligente que é a causa dessa ordem das coisas; b) a prova cosmológica: a existência contingente do mundo exige um ser absolutamente necessário; c) a prova ontológica: a idéia de Deus é a de um Ser tendo todas as perfeições; um tal Ser não pode não existir, pois não seria mais o ser possuindo todas as perfeições; faltar-lhe-ia uma, a de existência. Portanto, a idéia de Deus é a única que nos obriga a sair da idéia e afirmar a realidade do objeto da qual ela é a idéia. Contudo, recusando à metafísica suas pretensões ao conheci-mento, Kant conclui que Deus só pode ser conhecido como postulado da razão prática (da moral). 4. 0 conceito de divindade possui uma universalidade que se manifesta na oposição, existente em todas as sociedades. entre o *sagrado e o profano. sendo mesmo anterior a todo tipo de religião. Quanto à crítica da idéia de Deus, dirige-se sobertudo à interpretação de um ser pessoal (o *panteísmo concebe Deus como imanente ao mundo). Além de *Nietzsche, que prega "a morte de Deus", muitos ateus reduzem a *teologia a um problema antropológico, Deus sendo um produto da sociedade (*Comte. *Marx) ou da instancia parental (*Freud). Ver deísmo: teísmo. não devemos filosofar; ora, para sabermos se devemos filosofar, precisamos filosofar; e para sabermos se não deve-mos filosofar, precisamos ainda filosofar; conclusão: devemos filosofar. 2. Situação embaraçosa em que nos encontramos. devendo escolher necessariamente entre dois partidos ou pontos de vista rejeitáveis caso não fôssemos obrigados a escolher. Ex.: o dile-ma do cirurgião diante da situação de ter que sacrificar a mãe ou o filho no momento do parto; nào podendo salvar ambos, precisa optar. Dilthey, Wilhelm (1833-1911) 0 filósofo alemão Wilhelm Dilthey engajou-se numa via de pensamento (aberta por Schopenhauer e Nietzche) valorizando a chamada "teoria da visão cio mundo" (Weltanschauung), em que "viver é apreciar". avaliar, escolher, dar sua "interpretação" ao mundo natural: cada sistema filosófico tem por verdade a psicologia de seu autor, sua "visão do mundo", exprimindo-se numa "maneira de ver" que é "uni modo de ser'. Sua obra fundamental é a Introdução ao estudo das ciências humanas (1883). na qual critica a concepção positivista da *explicação (causal e racionalista) e procura compreender a realidade humana, essencialmente social e histórica. A ciência de base, sobre a qual devem repousar as (eisteswissenschaften (ciências do espirito), por oposição às Naturwissenschaften (ciências da natureza), é a psicologia enquanto estudo do indivíduo como consciência e como unidade psicofísica. Compreender não é explicar, é conhecer intuitivamente por uma participação vivida. Portanto, temos necessidade de uma psicologia compreensiva descritiva e analítica que reconheça a unidade estrutural da individualidade e seu modo de ser no mundo ("seu estilo", diz Dilthey). O leitmotiv de Dilthey: "Explicamos a natureza, mas compreende-mos o homem." Em sua outra obra básica, O mundo do espírito, Dilthey mostra que as idéias da filosofia baseada nas ciências físicas e naturais não podem satisfazer um pensamento preocupado em entender o valor de nossa vida, em estudar, não sua gênese ou sua história, mas seu fundamento: "A vida não nos é dada imediata-mente, ela nos é explicada pela objetivação do pensamento". Ao pretender dar um fundamento às ciências particulares do homem, da sociedade e da história, Dilthey postula a criação de novos métodos e de conceitos psicológicos mais sutis adaptados à vida histórica: além disso, procura evidenciar. em todas as manifestações humanas, a totalidade da vida psíquica, a ação do homem todo, com sua vontade, sensibilidade e imaginação. Diodoro de Tiro Filósofo grego do séc.11 a.C. Foi discipulo de Critolau e o sucedeu como chefe da escola peripatética em Atenas. Interessando-se principalmente pela filosofia moral, procurou conciliar a ética dos estóicos com a dos epicuristas. Diógenes, o Cínico (c.400-c.25 a.C.) Filósofo grego, nascido cm Sinope. um dos principais representantes da escola cínica, viveu em Atenas. Sua filosofia consistia em desprezar a riqueza e rejeitar as convenções sociais_ defendendo a auto- suficiência: vivia em um tonel. Conta-se que quando caminhava um dia com uma lanterna acesa na mão em plena luz do sol, alguém perguntou-lhe o que fazia e Diógenes respondeu: "Procuro um homem". Numa via-gem que fez de Atenas para Egina, foi capturado por piratas que o venderam como escravo a um rico homem de Corinto, que lhe restituiu a liberdade. Alexandre. o Grande, foi visitá-lo em Corinto e perguntou-lhe se desejava alguma coisa: "Sim, que te afastes um pouco, pois estás encobrindo o Sol" . Diógenes da Babilônia ou de Selêucia Filósofo grego estóico do sec.11 a.C. Foi discípulo de Crisipo. E considerado um dos mais importantes filósofos da escola estóica. Envia-do, juntamente com Critolau e Carnéales, pelos atenienses, em 156 a.C., para ensinar filosofia em Roma, os seus ensinamentos não agradaram aos romanos mais antigos, que conseguiram a expulsão dos três. Diógenes Laércio Biógrafo grego do séc.11l da era cristã; escreveu uma obra (em dez volu- mes) sobre os filósofos gregos, conhecida sob o título de Vida, doutrinas e sentenças dos filósofos ilustres, que é a única fonte de informações sobre muitos dos filósofos ali mencionados. dionisíaco Termo utilizado por *Nietzsche, derivado do deus Dioniso, deus da embriaguez, da inspiração e do entusiasmo, para designar a *vontade de potência, cujo enfraquecimento po-demos encontrar na massa do rebanho: ela é a pulsão fundamental da vida. Contra a moral do pecado, precisamos querer viver, declara Nietzsche, pois é o "instinto" que representa o poder criador da vida. Ao combater a transcendência, defende a idéia de que o homem deve ser ultra-passado num esforço de criação pessoal. Donde a necessidade de uma transmutação dos valores: o bem encontra-se na exaltação do sentimento de poder: o mal, em tudo que o contraria. Oposto a *apolíneo. dionisíaco/dionisismo Ver apolíneo/apolinismo. direito (lat. directos: reto, correto) 1. Em seu sentido vulgar, poder moral que alguém tem de possuir. Fazer ou exigir uma coisa, seja aquilo que é conforme a uma regra precisa (ter direito a, ter um direito sobre), seja aquilo que é simplesmente permitido (ter o direito de). 2. Direito positivo: conjunto das nonnas qu das leis criadas pelos homens, suscetíveis de reger determinada sociedade numa determinada época. 3. Direito natural: aquele que resulta da própria natureza do homem, superior a toda convençào ou legislação positiva, sendo inalienável. "Aquilo que se convencionou chamar de teoria do direito natural, ao lado do direito real, isto é. positivo, criado pelos homens e, por conseguinte, variável, um direito ideal, natural, imutável_ que ela identifica com ajustiça...; ela considera a natureza como a fonte de onde emanam as normas do direito ideal e justo. A natureza, a saber, a natureza em geral ou a natureza do homem em particular, desempenha o papel de autoridade normativa, isto é, criadora de normas" (Hans Kelsen). Assim, para os teóricos do direito natural. o direito é o conjunto das leis necessárias, universais. deduzidas pela razão da natureza das coisas e que serviria de fundamento para o direito positivo. Existe uma oposição fundamental entre direito e fato. Um fato se impõe pela força de sua existência, enquanto o direito é legítimo. Num nível vais propriamente filosófico, distinguimos as verdades de direito e as verdades de fato: as primeiras não dependem em nada dos acontecimentos, podendo ser afirmadas não importa onde e não importa quanto: dois e dois são quatro; quando às segundas, dependem de um acontecimento, não podendo ser afirmadas antes que o acontecimento se produza; ex.: Descartes morreu em 1650. discreto (lat. discretos) Ver descontínuo. discursivo (lat. medieval discursivos) Diz-se do modo de conhecimento mediato, ou seja, que atinge seu objetivo através das etapas de um raciocínio ou de uma demonstração. Além da forma intuitiva de conhecimento, diz Descartes, a dedução é necessária, porque nem tudo pode ser conhecido diretamente. A conclusão de um raciocínio matemático só é atingida de modo dis-cursivo. por uma seqüência de proposições que se encadeiam necessariamente umas às outras. discurso (lat. discursos: conversação) I. Na acepção tradicional, o discurso não é uma simples seqüência de palavras, nias um modo de pensamento que sc opõe à intuição. Freqüente-mente denominado "pensamento discursivo''. ele é um pensamento operando num raciocínio, seguindo um percurso, atingindo seu objetivo por uma série de etapas intermediá rias: movi-mento do pensamento indo de um juízo a outro juízo, percorrendo (discurso) um ou vários intermediários antes de atingir o conhecimento. Os lógicos introduziram a expressão "universo do discurso" para designar o conjunto ao qual vinculamos, pelo pensamento, os objetivos dos quais falamos. 2. A filosofia contemporânea. especialmente a filosofia da linguagem. a hermenêutica e o existencialismo, valoriza a análise do discurso como método próprio à filosofia. considerando o dis-curso não apenas como o simples texto, mas como o próprio campo de constituição do significado em que se estabelece a rede de relações semânticas com a visão de mundo que pressupõe. Discurso do método (Discours de la méthode) Obra de Descartes publicada em 1637. constituindo sua verdadeira autobiografia intelectual, na qual expõe os princípios de sua filosofia "para bem conduzir sua razão e procurar a verdade nas ciências". Trata-se na realidade da introdução filosófica a três tratados científicos de Descartes, Dióptrica, A4eteoros e Geometria. Seu objetivo, opondo-se à ciência tradicional e à filosofia especulativa dos antigos, é o de construir uma filosofia e estabelecer regras firmes permitindo ao homem tornar-se "mestre e possuidor da natureza". Estas regras são a da certeza ou evidência ("Jamais aceitar como verdadeira coi-sa alguma a não ser que se imponha a mim como evidente"), a da análise ("Dividir cada dificuldade a ser examinada em tantas partes quanto possível e necessário para resolvê-la"), a da síntese ("Conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos mais simples e mais fáceis de serem conhecidos, para atingir paulatina e gradativamente o conhecimento dos mais com-plexos") e a da enumeração ("Fazer enumerações tão exatas e revisões tão gerais dando-me a garantia de não omitir nada"). Ver método. disjuntivo (lat. disjunctivos) Que expressa alternativa, que se expressa por meio do emprego do conectivo ou: ele virá ou não virá. Ver juízo; terceiro excluído, princípio ou lei, do. distinção (lat. distinctio) Operação que tem por efeito isolar, do ponto de vista da percepção ou do pensamento, o elemento distinguido da-quilo que o cerca. A reflexão filosófica estabelece duas distinções: a) a distinção real, efetuada pelo sujeito sobre objetos realmente diferentes uns dos outros: b) a distinção lógica, criada pelo próprio sujeito. distinto (lat. distinctus, de distinguere: separar bem) I. Em *Descartes, caráter de uma percepção ou de um conceito que os torna evidentes c, como tais, critérios da verdade. Opõe-se a confuso. Com a clareza (uma idéia é clara quando ela é "presente e manifesta a um espírito atento"), a distinção define a *evidência, critério da verdade. O conhecimento distinto é aquele "que é de tal forma preciso e diferente de todos os outros. que só compreende em si aquilo que parece manifestamente àquele que o considera como deve". 2. Para *Leibniz, a distinção de uma idéia não se faz relativamente a outras idéias, pois ela é distinta em si mesma, pelo conhecimento de seus elementos constitutivos. divindade (lat. divinitas) 1. Noção mais ampla que a de *Deus. designando tudo o que é sobrenatural ou superior ao homem, podendo ser pessoal ou impessoal. 2. Nas religiões monoteístas, qualidade que caracteriza a essência metafísica de Deus, quer dizer, aquilo pelo qual ele é Deus. divisão (lat. divisio) I. Separação de um objeto em suas partes. 2. Operação lógica pela qual distinguimos e separamos, na extensão de um conceito, as diferentes classes ou espécies que ele compreende. divisão do trabalho Ver trabalho. dogma (lat. e gr. dogma: opinião, crença, ponto de vista) 1. Doutrina ou opinião filosófica transmitida de modo impositivo e sem contestação por uma escola ou corrente de pensamento, fazendo apelo a uma adesão incondicional. 2. Doutrina religiosa fundada numa verdade revelada e que exige o acatamento e a aceitação incondicionais por parte dos fiéis. No catolicismo, o dogma possui duas fontes: as Escrituras e o Magistério da Igreja. Está contido, em substância, no credo ou símbolo dos Apóstolos (Concílio de Nicéia, ano 325). Assim, os dogmas da Trindade e da Imaculada Conceição. por exemplo, são "verdades reveladas" estabeleci-das pela Igreja como fundamentais e incontestáveis, mesmo que pareçam desafiar a razão. Ver dogmática; dogmatismo. dogmática (lat. dogmaticus, do gr. dogmatikós) 1. Diz-se da pessoa que afirma uma opinião ou emite um ponto de vista de modo doutoral e categórico, sem admitir contestação ou crítica. 2. Parte da teologia que tem por objeto de estudo os dogmas da fé. 3. É dogmática, por oposição a crítica, diz Kant, toda pretensão do conhecimento de atingir o absoluto. Ex.: a metafísica dogmática. dogmatismo 1. Toda doutrina ou toda atitude que professa a capacidade do homem atingir a certeza absoluta; filosoficamente, por oposição ao ceticismo, o dogmatismo é a atitude que consiste em admitir a possibilidade, para a razão humana, de chegar a verdades absolutamente certas e seguras. 2. No sentido vulgar, atitude que consiste em afirmar alguma coisa, de modo intransigente e contundente, sem provas nem fundamento. 3. Toda atitude de conhecimento que consiste em acreditar estar de posse da certeza ou da verdade antes de fazer a crítica da faculdade de conhecer (Kant). 4. A tradição marxista utiliza o termo "dogmatismo" para qualificar a tendência de se con-gelar uma teoria em fórmulas estereotipadas, cortando-as da prática e da análise concreta: "O marxismo não é um dogma. mas um guia para a ação" (Engels). 5. Observemos que, desde a Antigüidade, existem os filósofos céticos e os filósofos dogmáticos. Os primeiros se recusam a crer nas verdades estabelecidas, enquanto os segundos defendem as verdades de sua "escola". E com a representação kantiana da história da filosofia que o termo "dogmatismo" adquire um sentido novo: o criticismo só se define opondo-se aos dois perigos inversos, o empirismo e o dogmatismo. O dogmatismo consiste em crer que a razão pode edificar sistemas sólidos sem ter sido antes depurada pela crítica (cf. sentido 3). Kant visa às filosofias de Leibniz e de Wolf, nas quais o conhecimento se desenvolve a priori, sem recorrer à experiência: visa também ao empirismo, que reduz tudo à experiência, sem se inter-rogar sobre as formas a priori. doutrina (lat. doutrina: ensinamento, teoria) Conjunto sistemático de concepções de ordem teórica ensinadas como verdadeiras por um au-tor, corrente de pensamento ou mestre. Ex.: a doutrina de Tomás de Aquino, a doutrina do liberalismo. doxografia (do gr. doxa: opinião, e graphein: escrever) Complicação das doutrinas ou opiniões (dosa) de filósofos, de forma sintética ou resumidas. As doxografias são as primeiras "histórias" da filosofia, sendo considerada a primeira a obra de *Teofrasto, discípulo de Aristóteles, intitulada Opiniões dos físicos. A mais famosa das doxografias da Antigüidade é a de *Diógenes Laércio, Vidas, doutrinas e sentenças dos filósofos ilustres, na qual encontramos uma exposição sistematizada segundo as doutrinas das diferentes escolas, ao contrário da obra de Teofrasto, puramente cronológica. dualismo (do lat. dualis: em número de dois) 1. Na filosofia, o termo "dualismo" é freqüentemente empregado em referência a Descartes, cujo sistema filosófico repousa no dualismo do pensamento e da extensão: portanto, doutrina segundo a qual a realidade é composta de duas substâncias independentes e incompatíveis. 2. Toda doutrina que admite, num domínio qualquer, dois princípios ou realidades irredutíveis: matéria e vida, razão e experiência, teoria e prática etc. A essa concepção, que requer dois princípios irredutíveis de explicação, opõe -se o monismo, doutrina que afirma a unidade do ser na multiplicidade de seus atributos e de suas manifestações. Ver monismo; pluralismo. Dühring, Karl Eugen (1833-1921) Filósofo, jurista e economista alemão, nascido em Berlim. Discípulo de *Feuerbach e pensador polêmico, Dühring procurou unir o *positivismo ao *materialismo. Suas teses foram atacadas por Engels em seu Anti- Dühring (1878). Principais obras filosóficas: Dialética natural (1861), Filosofia da realidade (1895). Dummett, Michael Anthony Eardley (1925-) Filósofo inglês. catedrático de lógica na Universidade de Oxford e professor visitante em diversas universidades americanas. Tem participado ativamente do movimento contra a discriminação racial na Grã-Bretanha. Pode ser con-siderado um dos principais filósofos da lingua-gem na tradição da filosofia *analítica. Seu trabalho é voltado sobretudo para o desenvolvi-mento da lógica intuicionista. No campo da filosofia da linguagem, notabilizou-se como intérprete de *Frege e de *Wittgenstein, desenvolvendo principalmente uma semântica baseada, não na noção de verdade, mas na de justificabilidade da asserção da sentença. E autor de: Frege, The Philosophy of Language (1973), The Justification of Deduction (1973), Elements of Intuitionism (1977), Truth and other enigmas (1978), Immigration: where the debate goes wrong (1978), The Interpretation of Frege's Philosophy (1981), The logic basis of metaphysics (1991). Duns Scotus, John (c.1265-1308) Francis-cano de origem escocesa, de cuja vida pouco se conhece, estudou nas Universidades de Oxford e Paris, tendo sido professor nesta última, conhecido como Doctor subtilis, o doutor sutil. A originalidade de Duns Scotus, em relação A. tradição escolástica a que pertence, está em sua valorização do indivíduo, tanto do ponto de vista metafísico, ao estabelecer a inteligibilidade como uma propriedade do singular, contraria-mente às doutrinas platônica e aristotélica então dominantes, quanto do ponto de vista ético, ao defender o livre-arbítrio. A respeito da querela dos *universais, sua posição é a de que o indivíduo é inteligível em virtude do caráter formal do princípio de individuação — a haecceitas (a "ecceidade", aquilo que faz de um indivíduo o que ele é, como indivíduo). Assim, Sócrates, além de ter a forma de um ser humano, o que o define, possui também a "socrateidade", uma propriedade individual sua, um princípio formal que o distingue, enquanto Sócrates, de todos os outros seres humanos. Suas principais obras são a Opus parisiensis ("Obra de Paris") e a Opus oxoniensis ("Obra de Oxford"), também conhecida como Ordinatio, ambas provavelmente compilações por seus discípulos de seus cursos. Sua filosofia, e a de seus seguidores, é conhecida como escotismo. Ver ecceidade; individual. duração (lat. medieval duratio) 1. Em seu sentido genérico, parte finita do *tempo: duraçào de um raciocínio. Em filosofia, distinguimos o tempo e a duraçào. O tempo é a medida da duração. diz Descartes. Por sua vez, Leibniz opõe o tempo à duração como o espaço A. extensão, a duração sendo a ordem de sucessão entre as percepções reais. 2. Bergson opõe a duração (durée) ao tempo. Para ele, o tempo é a idéia matemática que fazemos da duração para raciocinar. A duração só pode ser apreendida por intuição, ao passo que o tempo é apreendido pela inteligência que divide e quantifica; válida para aquilo que é da ordem da quantidade, a inteligência fracassa em apreender o qualitativo (a duração): o tempo matematizado de nossos relógios não passa de uma falsa representação (espacial) da duração real e concreta, que escapa à quantificação. Portanto, a duração é uma realidade concreta, a trama mesma do devir da consciência, que só pode existir como tal caso se lembre de seu passado, mas inventando a cada instante para adaptar-se ao presente. 2. Ciências eidéticas são as que tomam por objeto as relações entre as *essências ideais (lógica e geometria); é a intuição eidética que nos permite apreender as essências; redução eidética consiste em se passar do fenômeno empírico ou existencial à sua essência. Einstein, Albert (1879-1955) Considerado o maior cientista de nosso século, o alemão Albert Einstein (nascido em Ulm) tem sua importância no campo da filosofia, porque, ao escrever Mein Welthild (1934) (traduzido por Como eu vejo o mundo), apresenta-se, no dizer de Alexandre Koyré, como "a revanche de Des-cartes sobre os positivistas". Seu livro reflete bem uma teoria metafísica de cientista. Mesmo admitindo a crítica de Hume, ele se recusa a eliminar a especulação metafísica. Sem dúvida, os sentidos constituem a fonte do conhecimento. Contudo. "as noções presentes em nosso pensa-mento e em nossas expressões da linguagem são todas, do ponto de vista lógico, criações livres do pensamento e não podem ser obtidas das experiências sensíveis por via indutiva". O ape-go de Einstein ao *determinismo, que o impediu de aceitar as relações de indeterminação de Heisenberg, levou-o a certo *espinosismo e a uma "religião cósmica" suscetível de fundar, segundo ele, a ordem descoberta pelas ciências. Ele recusa um Deus justiceito e a Providência, mas aceita, como Descartes, um Deus geômetra: "Na base de todo trabalho científico um pouco delicado encontra-se uma convicção análoga ao sentimento religioso que o mundo é fundado sobre a razão e pode ser compreendido. Essa convicção, ligada a um sentimento profundo de uma razào superior, que se manifesta no mundo da experiência, constitui para mim a idéia de Deus: na linguagem ordinária, podemos chamá-la de panteísta" (Espinosa). elã vital A expressão francesa élan vital (em português, "elã vital") é utilizada por Bergson para designar um impulso original de criação de onde provém a vida e que, no desenrolar do processo evolutivo, inventa formas de complexidade crescente até chegar, no animal, ao ins-tinto e, no homem, à intuição, que é o próprio instinto tomando consciência de si mesmo e de seu devir criador. eleatas Filósofos pré-socráticos da escola eleática (da Eléia, antiga cidade no sul da Itália), fundada por Xenófanes e a que pertencem Parmênides e Zenào de Eléia, que afirmam a identidade absoluta do ser consigo mesmo e a impossibilidade do devir e do movimento. "Quanto à nossa tribo eleata, que começou com Xenofonte, ela expõe o que se denomina Tudo é Um" (Platão). elemento (lat. elementum) 1. Segundo uma longa tradição, remontando a Empédocles e, em seguida, aos estóicos, os elementos são os "ingredientes"constitutivos de toda matéria: água, fogo, ar e terra. Alguns alquimistas acrescentaram um quinto elemento: o éter ou *quinta-essência. Nos sécs.XVIII e XIX. eram chamados elementos o que hoje denominamos corpos simples. 2. São considerados elementos de uma ciência, os princípios e os primeiros conceitos a partir dos quais é construída dedutivamente: os elementos da álgebra. emanação (lat. emanatio) Diferentemente da criação, a emanação é um processo segundo o qua] Deus ou o Ser criador gera ou produz os seres particulares que constituem o universo. sem que haja descontinuidade nesse processo de geração. A emanação implica a sucessão dos seres no tempo e, por conseguinte, o devir. Ex.: o bramanismo repousa na idéia de uma emanação contínua dos seres finitos a partir do infinito; segundo a Cabala, os Sephirots nascem por emanação do Absoluto; segundo o neoplatonismo, o Real é constituído de emanações a partir do Uno, através da Inteligência e da Alma. emanatismo Doutrina panteísta segundo a qual o universo não foi criado por um ato livre do poder divino, mas procedeu (ou emanou) necessariamente de Deus pelo efeito de urna lei da própria natureza divina. emergência (do lat. emergere: mergulhar) Termo utilizado pelos filósofos para designar o fato de um fenômeno brotar de um outro, não podendo ser analisado em termos de explicação causal. Assim, um fenômeno é denominado emergente quando é impossível, a partir das leis disponíveis no momento, fornecer-lhe uma explicação causal. Por isso, a emergência se reduz a uma constatação, sendo relativa a um estado histórico do desenvolvimento das ciências. Emerson, Ralph Waldo (1803-1882) Filósofo romântico norte-americano, nascido em Boston, estudou na Universidade de Harvard. Influenciado por pensadores românticos como Schelling, desenvolveu uma filosofia idealista, sobretudo em sua principal obra, Nature (1836). Nietzsche e Bergson foram seus admiradores. Mais recentemente tem havido urna retomada do interesse por suas idéias críticas da sociedade industrial e da cultura de massas. Empédocles (483-430 a.C.) Filósofo grego (nascido em Agrigento) pré-socrático, Empédo- cies propôs uma explicação geral do mundo, considerando todas as coisas como resultantes da fusão dos quatro princípios eternos e indestrutíveis: terra, fogo. ar e água. Esses princípios ou elementos são misturados ou separados pelo amor e pelo ódio. empiria Experiência sensível bruta, antes de toda e qualquer elaboração. empírico (lat. empiricus, do gr. empeirikós: médico que confia apenas na experiência) 1. Qualificativo daquele que procede da experiência imediata ou passada, sem estar preocupado com uma doutrina lógica. Por extensão, qualifica aquele que procede por experiências sucessivas. 2. Designa tudo aquilo que constitui o campo do conhecimento antes de toda intervenção racional e de toda sistematização lógica. empiriocriticismo (al. Empiriokritizismus) Sistema filosófico da experiência pura. criado por Richard Avenarius. que excluía todas as suposições metafísicas que atuam não somente no racionalismo, mas em todas as correntes filosóficas. Algumas dessas teses foram aceitas e defendidas por Ernst Mach. Lenin escreveu a obra /ilaierialirnto e empiriocriticismo especial-mente para censurar os russos partidários desse princípio filosófico. Ver Lenin; Mach Ernst. empirismo (fr. empirisme) I. Doutrina ou teoria do conhecimento segundo a qual todo conhecimento humano deriva, direta ou indiretamente, da experiência sensível externa ou in-terna. Freqüentemente fala-se do "empírico" como daquilo que se refere ã experiência, às sensações e às percepções, relativamente aos encadeamentos da razão. O empirismo, sobretudo de Locke e de 1-lume, demonstra que não há outra fonte do conhecimento senão a experiência e a sensação. As idéias só nascem de um enfra- quecimento da sensação, e não podem ser inatas. Daí o empirismo rejeitar todas as especulações como vãs e impossíveis de circunscrever. Seu grande argumento: "Nada se encontra no espírito que não tenha, antes, estado nos sentidos." "A não ser o próprio espírito", responde Leibniz. Kant tenta resolver o debate: todos os nossos conhecimentos, diz ele, provêm da experiência, mas segundo quadros e fbrmas a priori que são próprios de nosso espírito. Com isso, tenta evitar o perigo do dogmatismo e do empirismo. Ver racionalismo. 2. Empirismo lógico: é o mesmo que *físicalismo, positivismo lógico ou neopositivismo. em-si 1. Na filosofia clássica, o em-si caracteriza a * substância que existe nela mesma e não em outra coisa. 2. Na filosofia existencialista, o em-si (ensoi) é tudo o que não é existência (pour-soi): "Ele é o ser que é plenamente aquilo que é" (Sartre), coincidindo com a matéria, com a coisa opaca e sem consciência. 3. Por oposição a "relativamente", o em-si significa ainda "absolutamente". "que não de-pende de outra coisa", "independentemente do conhecimento que temos da coisa". Em Kant, a coisa em si ou "númeno" se opõe ao fenómeno, ou seja, a coisa para nós. em-si-para-si Em Hegel, etapa final do devir dialético do espírito, no qual o ser e a consciência se reconciliam no saber absoluto. Em Sartre. ideal impossível perseguido pelo homem e que o tornaria Deus. Enciclopédia (fr. encyclopédie) 1. "Esta pa-lavra significa encadeamento de conhecimentos: é composta da preposição grega en, dos substantivos kyklos, círculo e paideia, conhecimento" (Diderot). A obra coletiva da Enciclopédia é composta de vinte volumes, o primeiro publica-do em Paris em 1751 (ver item seguinte). O titulo mesmo já nos dá a entender que se trata de um saber total, de um saber finito e circular, mas abrangendo todos os saberes particulares dispersos numa espécie de universitas scientiarum (totalidade dos saberes). 2. Os enciclopedistas: designação conferida aos colaboradores da Enciclopédia fundada por Denis Diderot e por d'Alembert e editada de 1751 a 1766, através de mil peripécias e interdições. A Enciclopédia teve uma grande influência não somente na burguesia esclarecida, mas também em muitos pequenos comerciantes e nos artesãos. Os enciclopedistas constituíam um grupo, ou "clã", de pensadores que fizeram de seu empreendimento uma arma de combate contra os abusos do sistema monárquico, contra a autoridade em matéria de pensamento científico e, em grande parte, contra a religião cristã. Não elaboraram uma obra de vanguarda, mas fizeram uma espécie de balanço geral, de maneira volun tária e entusiasta. de todo o saber existente. Trata-se de um empreendimento coletivo intelectual permitindo a passagem dos elementos filosóficos disparatados (deísmo, antropocentrismo, idéias morais do livro exame etc.) para a ideologia de uma época, ideologia esta que preparou a Revolução Francesa. 3 . 0 "enciclopedismo" designa nas tendências "iluministas" e "liberais" que se manifestam em muitos dos artigos da Enciclopédia, um compêndio abrangendo todos os conhecimentos humanos. tanto das "artes mecânicas" quanto das "artes liberais", expressando idéias de tole-rância religiosa, de otimismo em relação ao futuro da humanidade, de confiança no poder da razão, de oposição aos autoritarismos, de entusiasmo pelo progresso etc. energia (do lat. tardio energia, do gr. energeia: atividade) Capacidade que possui um sis-tema de realizar um trabalho. Por extensão dessa noção à cosmologia, a energia tornou-se indissociável da noção de matéria. O princípio de conservação da energia foi integrado por Einstein na teoria da relatividade sob a fórmula E _ ntc' (na qua' m designa a massa e c a velocidade da luz). Enesidemo Filósofo grego (nascido em Cnosso) cético, que floresceu no séc.l a.C.; foi professor em Alexandria. Tornou-se famoso por ter sistematizado em dez tropos os motivos da dúvida. De sua obra Discursos pirrônicos, conhecem-se apenas comentários feitos por outros autores. engajamento (do fr. engager: aliciar, filiar-se) I. Nas filosofias existencialista e personalista, o engajamento é a tomada de consciência, pelo homem, de que ele é um ser-no-mundo, está sempre situado, devendo lutar contra todo quietismo, contra toda atitude contemplativa para comprometer-se. por sua ação, com a mudança desse mundo, de nossa realidade histórica. 2. Na filosofia de Sartre, para a qual a existência precede a essência, e o homem não é outra coisa senão aquilo que faz de si mesmo, o engajamento, ou seja, o projeto e sua realização, é aquilo que torna o sujeito responsável por si mesmo e pelos outros: "O homem se encontra numa situação organizada, onde ele está engaja-do, engaja por sua escolha a humanidade, e não pode evitar escolher." Engels, Friedrich (1820-1895) Principal colaborador dc *Marx. Engels nasceu na Ale-manha. estudou na Universidade de Berlim. onde ligou-se aos "jovens hegelianos". e dedicou-se a múltiplas atividades, desde o jornalismo, a militância política e o trabalho filosófico até a administração da indústria de seu pai em Manchester. Inglaterra. Engels foi não só colaborador teórico de Marx. mas também seu amigo mais íntimo. tendo-o ajudado inclusive financeiramente. Em 1845. publicou com Marx . . 1 sagra-da família, em que eles rompem ao mesmo tempo com o idealismo hegeliano e o materialismo mecanicista. Torna-se por vezes difícil separar, nas principais teses do marxismo, quais as idéias de Marx c quais as de Engels, já que ambos escreveram quase sempre juntos desde que se conheceram em 1844. Considera-se, geralmente. que o materialismo dialético. especial-mente a dialética da natureza, é unia criação típica de Engels, sendo. no entanto, de grande importância e influência no desenvolvimento da filosofia marxista. Além das obras que escreveu juntamente com Marx. podemos citar as seguintes de sua autoria: A situação das classes trabalhadoras na Inglaterra (1845), Socialismo atri- p i c o e socialismo cientifico (1860). I . u d w i g Feuerbach e a fim da filosofia clássica alemã (1866). .a transformação da ciência pelo Sr. OUhl- ng, conhecida como AntiDühring (I878). Dialetien do riature-a (escrita entre 1878-1888. porém publicada postumamente em 1925). e o clássico .1 origem da fmllia, da propriedade privada e do Estado (1884). Ensaios (Essais) Obra de Montaigne. escrita entre 1580-1588. na qual descreve a natureza humana e suas contradições, sobretudo no do-mínio do saber, em estilo de cunho bastante pessoal . Expressa uma atitude cética. visando combater o dogmatismo e defender a tolerância. L, a fraqueza do homem. devida às ilusões produzidas pelos sentidos, pela imaginação e pelas paixões que o leva a adotar unia atitude cética e perguntar-se "Quem sou eu?". A sabedoria consiste em seguir os conselhos da natureza para "saber gozar lealmente por si mesmo", sabendo escolher os prazeres moderados (conforme o *epi- curismo) e suportar o sofrimento e a morte (segun-do o *estoicismo). Esta obra teve grande influência sobre o pensamento de Descartes. I'er Montaigne. Ensaios sobre o entendimento humano (An Essai on Human ( ndcr.stancóng=) Principal obra de Locke no campo da teoria do conheci- mento, consiste em uma discussão sobre os "limites do entendimento humano" e em uma defesa da concepção empirista da origem das *idéias na experiência sensível. Locke redigiu esta obra ao longo de praticamente 20 anos a partir de conversas com cientistas ingleses da época como Robert Boyle e outros membros da Royal Society, publicando-a em 1690. Foi gran-de sua influência no desenvolvimento da filoso-fia empirista não só na Grã-Bretanha, mas também na França no séc.XVIII. Ver Novos ensaios sobre o entendimento humano; Locke. ente (trad. do al. Seiende, de sein: ser) Empregado para traduzir o termo grego to on e o alemão das Seiende, particípios presentes do verbo ser, o termo "ente" aparece, na filofosia de Heidegger, para designar o ser que existe, o ser concreto. Há uma confusão entre o existente (designado o homem) e o ente, "designando tudo o que nos encontra, nos cerca, nos conduz, nos constrange. nos enfeitiçae nos preenche, nos exalta e nos decepciona" (Heidegger), sem nos apresentar o ser em si, o ser absoluto. Esse ente geral se distingue dos entes particulares (objetos, astros, pedras, etc.) por seu caráter de totalidade. enteléquia (lat. entelechia, do gr. entelecheia: aquilo que é perfeito) Em Aristóteles, a enteléquía se opõe â *potência, como o que é realizado se opõe ao que é virtual, sendo sinónimo de ato: movimento do ser em ate que tende à sua perfeição. Leibiniz chama as mônadas de enteléquias, no sentido em que se bastam a si mesmas c em que possuem. nelas mesmas, a fonte de suas ações internas. entendimento (do lat. anterdere: tender para). I. Na filosofia, o termo "entendimento". também conhecido pelo vocábulo *"intelecto" (lat. intellectus), designa a faculdade que o homem possui de compreender ou de pensar por idéias gerais ou conceitos, e não através de imagens. Descartes dá um bom exemplo: posso conceber. pelo entendimento, um polígono de mil lados, mas não posso ter dele nenhuma imagem precisa. A geometria moderna nos fornece outro exemplo: vivemos um universo de três dimensões, mas não podemos ter a imagem de um objeto situado num universo com mais de três dimensões. 2. Em Descartes, faculdade de conhecer, de perceber e de compreender pela inteligência, só podendo exercer-se de modo válido mediante a vontade. Porque a vontade é primeira, ilimitada. fundadora e indivisível: eia é o sinal distintivo da res cogitans. Face a esse poder. o entendi-mento aparece corno bastante fraco: é a faculdade de informação da vontade. mas sem poder próprio. A vontade pode decidir ir contra o entendimento apenas para afirmar sua liberdade. 3. Em Kant, o entendimento é a faculdade de julgar por meio de conceitos. Se a primeira fonte de nosso conhecimento é a sensibilidade, a segunda é o entendimento, poder de julgar. poder de conhecer não-sensível. Assim, na organização kantiana das faculdades, o entendimento é situado entre a sensibilidade e a razão. A sensibilidade, onde reinam as formas a priori do espaço e do tempo, é o lugar da intuição. No entendimento, as sensações são arrumadas em série pelas regras a priori das categorias. Enfim. a razão, "faculdade dos princípios". tenta prolongar a série por idéias "reguladoras'. entidade (lat. entizas: essência do que é um ser) Entre os escolásticos e cartesianos, a entidade é, no domínio do pensamento. sinônimo de "coisa" (o eu é uma entidade) e designa a realidade total do ser individual: "entidade ou ser da coisa" (Descartes). Em seguida, o termo adquiriu um sentido mais vago, passando a significar simplesmente "algo", ''alguma coisa" sem determinação particular. entropia (gr. entropié: volta, retorno) "A entropia é a quantidade termodinâmica que mede o nível de degradação da energia de um sistema" (Jacques Monod). O termo passa a ter uma aplicação geral, designando a medida de desordem de uni sistema, uma vez que o equilíbrio térmico é considerado o estado mais provável em que se encontra o universo. A entropia significa, assim, a extinção e a "morte". por perda de energia, do universo. enunciado (lat. enunciatio) 1. Proposição que não afirma nem nega. mas que é apresentada como hipótese ou definição. Em outras palavras. am enunciado é toda proposição efetivamente formulada. 2. Também é considerado um enunciado o conteúdo de uma proposição independentemen-:e da consideração de seu valor de verdade ou do ato de fala (afirmação, negação, ordem etc.) que se realiza. 3. Enunciado protocolar (Protokol Satz): segundo os membros do *Círculo de Viena (positivistas lógicos). que tomam essa expressão para designar aquilo que os lógicos anteriores chamavam de convenção, mas radicalizando o sentido dessa noção, os enunciados científicos nada mais são que constatações cujo sen-tido é fornecido apenas pelo sistema de trans-formações no qual eles se integram, a lógica que dele resulta nada nos ensinando sobre o mundo. éon (gr. aiôn: eternidade, tempo muito longo) Termo utilizado por certos platónicos e pelo gnosticismo para designar os seres intermediários entre o Ser supremo ou Princípio absoluto e todas as demais coisas do mundo, através das quais exerce sua ação. O conjunto dos éons constitui, para os gnósticos, o pleorema (plenitude). epagógico (do gr. epagoge: indução) Na lógica, sinónimo de indutivo. aquele que discorda de nosso ponto de vista. escatologia (do gr. eschatos: último. e logos: ciência. teoria) Doutrina que diz respeito aos fins últimos da humanidade, da natureza ou do indivíduo depois da morte. o que implica a crença na vida futura. Em outras palavras, crença ou doutrina que diz respeito aos fins últimos do homem e da humanidade, mas sob uma forma religiosa. Contudo, a noção de eseatologia, quando reduzida à fórmula empregada por Pas-cal e Kant: "para onde vamos?", não é totalmente estranha às meditações modernas distantes da religiào: o marxismo revolucionário apresenta uma certa escatología. Ver messianismo. Esclarecimento Ver Iluminismo. escola (lat. sccola, do gr. eschole) 1. Na linguagem filosófica, tanto pode designar um grupo de filósofos em torno de um mestre quanto uma tendência perpetuada por certo tempo por filósofos historicamente ligados uns aos ouros. As condições do ensino da filosofia na Antigüidade nos asseguram a existência concreta de escolas: a *Academia, o *Liceu. o *Pórtico, a escola *megárica etc. 2. Nos tempos modernos, até o séc.XIX, quando se falava de a Escola, referia-se à escolástica. Hoje em dia, os filósofos não se dividem mais em escolas. escolástica (lat. scholasticus, do g r . scholast i kos , de scholazein: manter uma escola) J . Ter-mo que significa originariamente "doutrina da escola" e que designa os ensinamentos de filosofia e teologia ministrados nas escolas eclesiásticas e universidades na Europa durante o período medieval. sobretudo entre os sécs.IX e XVII. A escolástica caracteriza-se principalmente pela tentativa de conciliar os dogmas da fé cristã e as verdades reveladas nas Sagradas Escrituras com as doutrinas filosóficas clássicas. destacando-se o *platonismo e o *aristotelismo. O primeiro periodo da escolástica é marcado pela influência do pensamento de sto. Agostinho e do platonismo, desenvolvendo-se sobretudo a partir da chamada "Renascença Carolfngia", isto é, da criação da Academia palatina fundada na corte de Carlos Magno (séc.IX). O período áureo da escolástica corresponde ao da influência de Aristóteles, cujas obras foram traduzidas para o latim em torno dos sécs.XII-XIII. hem como às interpretações da filosofia aristotélica trazidas para o Ocidente pelos filósofos árabes e judeus. O aristotelismo forneceu assim a base de gran-des sistemas da filosofia cristã como o de Tomás de *Aquino. O período final da escolástica se deu nos sécs.XIV- XVII, sendo marcado polo conflito entre diferentes correntes de pensamento e interpretação doutrinais, e pelas novas des-cobertas científicas. A Reforma Protestante e o humanismo renascentista fizeram com que a escolástica, que representava a tradição atacada. entrasse em crise. A escolástica sobreviveu, entretanto, mesmo durante o período moderno_ representando um pensamento cristão tradicional. Ver patrística; tomismo; universais. 2. O termo "escolástica" possui, às vezes, um sentido pejorativo, originário sobretudo da reação contra a tradição medieval pelo pensa-mento moderno. designando um pensamento dogmático. tradicional. formalista e repetitivo, preocupado com discussões estéreis e contrário n qualquer inovação. Escoto Erígena, João (c.810-c.877) Figura enigmática_ cuja vida é pouco conhecida. teólogo e filósofo de origem irlandesa. viveu na corte de Carlos. o Calvo. Sua importância deveu-se sobretudo ás traduções do grego para o latim de obras do Pseudo-Dionfsio (também conhecido como Dionisìo. o Areopagita) e de são Gregário dc Nissa_ filósofos da *patrística grega, dc tradição platônica, que se tornaram graças a isso extremamente influentes no pensa-mento medieval. Sua principal obra é o tratado, de inspiração neoplatônica. De divisione naturae (Sobre a divisão da Natureza. 865), no qual estabeleceu uma hierarquia das criaturas, a partir de sua origem no Criador, a que tendem, por natureza. voltar. Essa obra constitui um dos primeiros e principais sistemas em sua época, a sintetizar a filosofia platónica e o pensamento cristão. tondo grande ìmportãncia para a formação da tradição escolástica. escravo 1. Nas sociedades greco-romanas, o escras o designa uni indivíduo cuja vida é salva. após um combate, sua força de trabalho devendo ser posta a serviço do comprador. podendo também ser comprada. E neste sentido quê *Ilegel toma o tamo em sua *'dialética do senhor e do escravo''- ao transformar a natureza e a si mes-mo por seu trabalho, o escravo acede à liberdade. 2. *Nietzsche utiliza a expressão "moral dos escravos' para designar a moral dos fracos que perverteram os valores originais. pretendendo passar sua impotência por uma virtude. I er trabalho. esotérico (gr. esoterilvos: do interior). I. Diz-se do en sin a niento ou doutrina que era ministra-do, nas escolas gregas de filosofia, principal-mente na de Aristóteles. apenas aos discípulos já instruídos. Nas seitas religiosas, diz-se do que c secreto (doutrina ou ensinamento). transmitido apenas a uni pequeno grupo de iniciados. Opõe-se a exotérico. qua significa "aberto ao público cm geral". 2. 0 termo "esotérico" se aplica_ hoje. tanto ao quo é secreto (ensinamento, doutrina). não podendo ser divulgado, quanto ao que é hermético. só podendo ser compreendido por um pequeno grupo de iniciados ou especialistas. Em nossos dias. muita gente toma o termo ''esotérico" com o significado de misterioso. oculto ou de dificil acesso. espaço (lat. spatium: área, extensão) I. Em seu sentido geométrico, concepção abstrata de um ambiente vazio de todo conteúdo sensível e caracterizado pela continuidade. homogeneidade e tridimensionalidade. 2. Filosoficamente. é o meio homogêneo e ilimitado, definido pela exterioridade mútua de suas partes (impenetrabilidade), contendo todas as extensões finitas e no qual a percepção externa situa os objetos sensíveis e seus movimentos. Em outras palavras, sistema de referências graças ao qual podemos pensar a coexistência ou a simultaneidade, no tempo, dc dois objetos diferentes: dois objetos não podem ocupar, ao mes-mo tempo, o mesmo lugar. Para Kant, o espaço é uma "intuição pura" ou "uma forma a priori da sensibilidade", quer dizer. não é uma construção do espírito nem tampouco uma realidade independente de nós, mas um dado original de nossa sensibilidade, algo que é constitutivo de nosso modo de perceber e sem o qual não poderíamos ter sensações distintas: porque dois objetos percebidos ou são sucessivos (intuição do tempo) ou são simultâneos (intuição do espaço. espécie (lat. species: aspecto, aparência) 1. Na lógica clássica, a espécie constitui um dos universais designando aquilo em que se divide o gênero, isto é, aquilo que é compreendido em sua extensão: o homem é uma espécie do gênero animal. 2. No sentido biológico. classe dos seres vivos caracterizada por formas bem definidas e constituindo um tipo hereditário de fecundidade ilimitada. 3. No sentido teológico, particularmente no catolicismo, aparência sensível da presença real do corpo e do sangue de Cristo (no sacramento da Eucaristia) sob a forma do pão e do vinho. especulação (lat. speculatio: observação, contemplação) I . Emprego desinteressado da razão em questões de ordem abstrata e distantes da experiência concreta, sem preocupação prática. No sentido clássico, sinônimo de teoria, contemplação. Sobretudo a partir do pensamento moderno, por influência do empirismo e do racionalismo crítico, a especulação adquire um sentido negativo, sendo um uso gratuito e inverificável da razão, cujos resultados por este motivo não são comprováveis nem confiáveis. Oposto a crítica. 2. Segundo Kant, a especulação é o uso da razão visando objetos inacessíveis à experiência humana, portanto incapaz de produzir um conhecimento legítimo, resultado da combinação da sensibilidade e do entendimento. "O fim último a que se relaciona a especulação, em seu uso transcendental, diz respeito a três objetos: a liberdade da vontade, a imortalidade da alma e a existência de Deus" (Crítica da razão pura). especulativo (lat. tardio speculativus) Relativo à especulação, que faz uso da especulação ou que resulta desta. Para Kant, o conhecimento especulativo é aquele que diz respeito aos objetos inacessíveis à experiência, designando assim a pretensão da metafísica a ser ciência. Oposto a prático. Espeusipo (c.407-339 a.C.) Filósofo grego (nascido em Atenas), sobrinho e discípulo de Platão, assumiu a direção da *Academia, após a morte do tio (348 ou 347 a.C.). Resta apenas um fragmento de uma de suas obras intitulada: Sobre os números pitagóricos. Espinosa, Baruch (1632-1677) De família judia portuguesa, o filósofo Baruch Espinosa nasceu em Amsterdam. Holanda. Estudou o he-breu, o Talmude e a Bíblia. Aprendeu espanhol, português. holandês e francês. Logo rompeu com a ortodoxia judaica, mas sem se aproximar do cristianismo. Acusado de judeu e de ateu, de ímpio e de fatalista, tentou explicar seu ponto de vista sobre a religião. Em seu Tratado teológico-político (1670), colocou o problema das relações entre religião e Estado. Reconheceu ao Estado, poder soberano, o direito e o dever de fazer reinar a paz interior na comunidade, bem como de organizar as ações exteriores. A ética, demonstrada segundo o método geométrico (1677) é sua obra principal. Uma demonstração rigorosa, ordenada numa impecável série de teoremas. revela seu aspecto polêmico: trata-se de uma máquina de guerra contra a filosofia dominante, sobretudo contra a teoria do sujeito voluntário, pela qual o homem pretende converter-se em mestre e possuidor da natureza. A essa vontade livre, Espinosa opõe uma única necessidade, vida interna de todo o universo: todas as coisas (inclusive os homens) são modos da substância única que é Deus. A inteligência pode chegar ao saber absoluto; a essência de Deus e das coisas é totalmente inteligível; Deus é a natureza concebida como totalidade; dessa totalidade, o entendimento humano só pode conceber dois atributos: o pensamento e a extensão; mas as coisas singulares existem realmente; todo conhecimento verdadeiro se realiza por uma dedução de tipo geométrico: a idéia não consiste na imagem nem nas palavras. mas no exercício do intelecto que coincide com seu objeto: o homem não é um império num império, mas está submetido às leis comuns da natureza. Precisa-mos analisar as diferentes instituições em seu funcionamento: que poder as produz? Quais são seus efeitos? Eis o objetivo da obra inacabada Tratado politico (1677). A alegria, a tristeza e o desejo são três afeições primitivas das quais nascem todas as outras. O bem, o mal, o belo e o feio não constituem propriedades das coisas. mas modos de imaginar. Como a superstição constitui a grande ameaça do homem, a tarefa do filósofo é eminentemente política: denunciar os sistemas politicos que só se impõem aos homens inspirando-lhes paixões tristes. E na cidade que o homem realiza sua liberdade: "O sábio é mais livre na cidade, onde obedece à lei comum, do que na solidão onde só obedece às suas paixões": "Não devemos confundir o sen-tido de um discurso com a verdade das coisas" Se o Deus sive Aatura " de Espinosa não é um Deus criador, pessoal e juiz, nem por isso pode ser dissolvido no mundo (panteísmo). espinosismo Nome genérico dado ao destino póstumo da filosofia de Espinosa. fundada num racionalismo integral que recusa toda distinção "moral", toda subjetividade, toda finalidade da natureza e que concebe o homem como um simples "modo finito da substância infinita" e não mais como o centro e o fim do universo. O espinosismo, rejeitado no séc.XVIII como um "sistema ateu" e reabilitado no séc.XIX como uma filosofia panteísta da natureza. opõe-se vigorosamente ao irracionalismo, pois entende que tudo o que existe deve ter uma explicação racional. Marx, Nietzsche e Freud. na medida cm que elaboram unia visão naturalista do homem e do mundo. adotam uma postura espinosista. Ver Espinosa. espírito (lat. spiritus: sopro) 1. Na filosofia herdada de Descartes, o espírito é o princípio do pensamento: "Meu espírito, isto é, eu mesmo enquanto sou apenas uma coisa que pensa" (Descartes). Opõe-se ao corpo. à matéria, à extensão, na medida em que é indivisível e totalizante (a matéria é divisível e diversifican-te). O espírito testemunha nossa liberdade relativamente à natureza que é necessária e determinada. Enfim, é o aspecto espiritual ou religioso de nossa existência, oposto ao aspecto sensual. carnal e mundano. E o princípio do pensamento c da reflexão cio homem. 2. Em seu sentido metafísico, notadamente em Hegel, o espírito, absolutamente primeiro, é a verdade da natureza: é a idéia que chegou ao ser-para-si: essa interiorização do ser-fora-de-si. que é a natureza. desenvolve-se do espírito subjetivo (alma. consciência, fatos psíquicos) ao espírito objetivo (direito, costumes, moralidade) e ao espirito absoluto (através da arte. da religião) a fim de chegar à filosofia, que é a forma última na qual se unem a arte (representação sensível) e a religião. 3. Alen) de designar entidades totalmente incorpóreas (Deus e o anjos, na teologia cristã, são "puros espíritos"), a palavra "espírito" de-signa ainda certas entidades sobrenaturais admitidas por certos povos ditos "primitivos" (o "Grande Espírito") ou. na linguagem corrente. o "sentido profundo" de algo: "ele não entendeu o espírito da coisa". o "espírito" de um texto, de um discurso etc. espir i tual ismo Concepção que privilegia o *espírito ou *alma, em relação à *matéria ou ao *corpo, mantendo que o espírito constitui uma natureza autônoma e de caráter mais puro. mais elevado. A doutrina filosófica de Victor *Cousin é conhecida como espiritualismo eclético. Ver dualismo. Oposto a materialismo. espontâneo/espontaneidade (lat. spontaneus: de livre vontade, voluntário) 1. Que se faz voluntariamente. sem causa externa; ex.: ação espontânea, ato feito d c livre e espontânea vontade. Instintivo, irrefletido: ex.: movimento físico espontâneo. 2. Segundo Kant, opõe-se a passividade, caracterizando a atividade do espírito no conheci-mento. "Designamos pelo nome de 'sensibilidade' a capacidade que tem nosso espírito de receber representações, enquanto afetado de al-guina maneira; por oposição a essa. receptividade. a faculdade que temos de produzir nós mes-mos as representações, ou a espontaneidade de nosso conhecimento, chama-se entendimento" (Kant. Critica da razão pura). esquema/esquematismo (gr. skema: con-torno. delimitação, forma, figura) 1. Na teoria do conhecimento kantiano, o esquema é o ele-mento que permite a aplicação dos conceitos puros do entendimento (as categorias) à experiência, tratando-se portanto de um elemento mediador entre o *entendimento e a *sensibilidade. "Tal representação mediadora é o esquema transcendental" (Kant, Critica da razão pura, Doutrina transcendental do juízo, sobre o esquematismo dos conceitos puros do entendi-mento). O esquema é um produto da *imaginação, embora não seja uma imagem. "O esquema dos conceitos sensíveis, tais como as figuras no espaço... é um produto da imaginação pura a priori" (Kant, id), por meio da qual tornam-se possíveis as imagens. 2. Kant denomina esquematismo o proceder do entendimento com o esquema. Reconhece, entretanto, a dificuldade de caracterizar a natureza do esquematismo, que é uma "arte oculta nas profundezas da alma humana, cujo modo de operar será sempre dificil à Natureza nos permitir descobrir ou revelar a nossos olhos" (Kant, id.). essência (lat. essentia) 1. Para a escolástica, é uma das grandes divisões do ser: é o ser mesmo das coisas, aquilo que a coisa é ou que faz dela aquilo que ela ó. Para cada ser distinguimos uma essência e uma existência que ela pode ou não comportar. A essência repousa na tradição platônica das idéias, retomada na teoria aristotélica das "formas inteligíveis". Platão distingue um mundo invisível, permanente e sempre idêntico a si mesmo (o mundo das essências) e um mundo visivel e flutuante (o mundo sensível): o primei-ro é a garantia da realidade do segundo. Aristóteles retoma a noção de essência no contexto do problema da linguagem. Se tudo é mutante, se tudo é acidente (como queriam os sofistas), não há discussão possível. Distinguindo a essência dos acidentes, ele resolve o problema dos sofistas: "Instruir Clínías é matá-lo, pois suprimir Clínías ignorante também é suprimir Clínias". Asim, é a essência de Sócrates que se mantém através de seus diversos acidentes. 2. Na filosofia contemporânea, a essência não define nem revela a natureza do homem. Porque o homem, ao vir a ser. não possui essência, apenas unia condição, urna situação: "a essência do ser-aí (Dasein) consiste apenas em sua existência" (Heidegger); é o homem mesmo quem produz aquilo que ele é, por sua liberdade: ele é projeto, isto é, aquilo que ele é capaz de fazer de si mesmo; nele, "a existência precede a essência" (Sartre). 3. 0 termo essencial significa algo direta-mente ligado à essência e opõe-se a acidental. Na linguagem comum, adquire o sentido de "muito importante", de "o mais importante", de "fundamental": "o essencial é a saúde". essencialismo Doutrina filosófica que confere, contrariamente ao existencialismo, o primado à essência sobre a existência, chegando mesmo, em suas reflexões, a fazer total abstração dos existentes concretos. Trata-se de uma filosofia do ser ideal, que prescinde dos seres reais. A filosofia de Hegel pode ser considerada essencialista. estado (lat. status, de stare: ficar em pé) A idéia de "estado" implica as idéias de passividade e de imobilismo, sendo oposta à de ação e (:i de movimento. Na física, o estado de um corpo significa esse corpo em determinado momento. Mas o termo "estado" pode ser tomado em vários sentidos: 1. Estado de consciência: é um fato psíquico (sentimento, emoção) consciente. 2. Estado de natureza: situação, imaginada por certos filósofos (Hobbes e Rousseau), na qual seriam encontrados os homens antes de se organizarem em sociedade — reconstituição hipotética, sem validade histórica. 3. 0 Estado: conjunto organizado das instituições políticas, jurídicas, policiais, administrativas. econômicas etc., sob um governo autônomo e ocupando um território próprio e independente. E diferente de governar (conjunto das pessoas às quais a sociedade civil delega, direta ou indiretamente, o poder de dirigir o Estado); diferente ainda da sociedade civil (conjunto dos homens ou cidadãos vivendo numa certa sociedade e sob leis comuns); diferente também da nação (conjunto dos homens que possuem um passado e um futuro comuns, entre outras nações), o Estado constitui a emanação da sociedade civil e representa a nação. 4. Para os empiristas Hobbes e Locke, o Estado é o resultado de um pacto entre os cidadãos para evitar a autodestruição através da guerra de todos contra todos. Na concepção marxista. o Estado nada mais é do que a forma de organização que a burguesia se dá no sentido de garantir seus interesses e de manter seu poder ideológico sobre os homens: "Através da emancipação da propriedade privada da comunidade, o Estado adquiriu uma existência particular, do lado de fora da sociedade civil; mas ele não é senão a forma de organização que necessariamente os burgueses se deram ... com objetivo de garantir reciprocamente a sua propriedade e seus interesses" (Marx- Engels). Este Estado-nação se define pela fusão entre o Estado tal como ele se constitui na Europa do século XVIII, como soberania e administração dos homens e do território que eles ocupam — e uma sociedade civil de tipo novo, caracterizada pela propriedade privada burguesa, tendo por fim a rentabilidade, o lucro e o crescimento das riquezas. estados, teoria dos três Teoria formulada por Augusto Comte (ele a chama de "lei") segundo a qual a humanidade teria passado, em seu processo histórico de desenvolvimento, de uma etapa teológica (caracterizada pela crença em poderes sobrenaturais organizadores do uni-verso) ao estado metafísico (no qual a crença teológica teria sido substituída pela confiança em princípios abstratos, apreendidos racional e aprioristicamente) para atingir, finalmente, o estado positivo ou científico, no qual o escola de Mégara. Atribui-se a formulação do paradoxo de Epimênides. Ver Epimênides, paradoxo de. Euclides (c.450-c.380 a.C.) Filósofo grego (nascido em Mégara ou em Gela, Sicília); foi discípulo de Sócrates, daí ser conhecido como "o Socrático", e fundou a escola megárica, ou escola de Mégara, também chamada escola erística. Restam apenas títulos de suas obras. Eudemo de Rodes Filósofo grego que floresceu no séc.IV a.C.; foi discípulo de Aristóteles. É considerado um dos grandes peripatéticos. Restam fragmentos de seus escritos relacionados com a doutrina aristotélica. eudemonismo (do gr. eudaimonia: felicidade) Doutrina moral segundo a qual o fim das ações humanas (individuais e coletivas) consiste na busca da felicidade através do exercício da virtude, a única a nos conduzir ao soberano bem, por conseguinte, à felicidade. É essa identificação do soberano bem com a felicidade que faz da moral de Aristóteles um eudemonismo; também a moral provisória de Descartes pode ser entendida como um eudemonismo (que não se deve confundir com *hedonismo). evidência (lat. evidentia) Em seu sentido cor-rente, tudo aquilo que se impõe ao espírito com uma força tal que parece desnecessário demons-trá-lo ou prová-lo. Ex.: "O todo é maior do que a parte" (Euclides). Precisamos distinguir as "falsas evidências" das "evidências objetivas" . Para Descartes, somente a evidência intelectual pode constituir critério de objetividade. A primeira regra do método consiste "em nada aceitar por verdadeiro a não ser que se imponha a mim como evidente" . Uma idéia evidente é uma idéia ao mesmo tempo clara (presente ao espírito) e distinta (definida): a verdade das evidências é garantida metafisicamente pela veracidade divina; e as ciências são fundadas em evidências racionais primeiras. As falsas evidências são as dos preconceitos, as da infância e as dos senti-dos. O modelo das evidências intelectuais é o das matemáticas. Aquilo que se chama de modo tautológico de "evidência absoluta" é apenas o grau absoluto da certeza. evolução (lat. evolutio) 1. Para os naturalistas do séc.XVIII: desenvolvimento, por simples engrandecimento, de um ser pré- formado. 2. Para os zoólogos do séc.XIX: transformação, no decorrer das épocas, das espécies; para os embriologistas, desenvolvimento epigenético do embrião, recapitulando, pelo menos sumaria-mente, a filogênese. 3. Para Herbert Spencer: transformação uni-versal definida sobretudo pela integração e pela diferenciação progressivas: "A evolução é uma integração de matéria durante a qual esta passa de uma homogeneidade indefinida, incoerente, para uma heterogeneidade definida, coerente." 4. No sentido biológico atual, a evolução designa a transformação de uma espécie viva em outra espécie, seja sob a ação lenta de certos fatores externos, seja por mutações bruscas. Por analogia, transformação de um personagem real ou imaginário, sobretudo no que diz respeito a seu caráter e sentimentos. Por extensão, transformação do próprio caráter, dos senti-mentos, de um conjunto de idéias, de uma doutrina etc. evolucionismo 1. Nome genérico das diver-sas doutrinas ou teorias filosóficas que utiliza-ram o transformismo biológico ou que se desenvolveram apoiadas nele. O que têm em comum é o fato de constituírem um relativismo orienta-do no tempo para um absoluto incognoscível (Spencer) ou místico (Teilhard de Chardin). 2. Concepção biológica segundo a qual todas as espécies derivam umas das outras por um processo de transformação natural. Ver transformismo: criacionismo. 3. Doutrina filosófica segundo a qual a evolução constitui a lei geral dos seres (matéria, vida, espírito e sociedades), capaz de reger, por conseguinte, tanto as ciências quanto a própria moral. 4. Para Charles Darwin (1809-1882). célebre por ter criado a teoria segundo a qual "a luta pela vida e a seleção natural são consideradas como os mecanismos essenciais da evolução dos seres vivos", é a idéia de seleção natural que se encontra no cerne da questão da evolução: os organismos vivos formam populações denominadas espécies e apresentam "variações": graças a essas variações, certos individuos são melhor "adaptados" a seu meio e engendram uma descendência mais numerosa. A seleção natural designa o conjunto dos mecanismos que fazem a triagem elos melhores indivíduos: assim, graças à "luta pela viela", as populações evoluem lentamente, isto é. se transformam c se diversificam produzindo formas cada vez mais complexas. exegese (gr. exegesis, de exegeisthai: explicar, interpretar) Interpretação filológica ou doutrinal de textos fundamentais caracterizados por sua incompreensibilidade literal e por sua obscuridade devidas ao fato de terem sido escritos há muito tempo, em outro contexto cultural. Ex.: a exegese da Bíblia, dos textos das leis etc. existência (do lat. tardio exsisventia) 1. Para a escolástica, a existência é uma cias divisões do *ser, exprimindo simplesmente o "fato de ser'', o fato de ser realmente. de ter uma existência substancial. Oposto a essência. 2. Para o *existencialismo contemporâneo, esse termo designa o modo de ser próprio do existente humano. a realidade humana naquilo que tem de absurdo, de deliberado (pela tomada de consciência) e de irredutível ã consciência (contingência e factividade). A existência e' "ek sistência", isto é, arrancamento perpétuo de um mundo. de uma *situação no mundo com o qual não pode confundir -se. pois é "para-si" e não "cm-si". Assim, é a mesma coisa dizer que o homem existe e que ele existe como *consciência ou *liberdade. Ver Dasein; essência. existencialismo (fr. existentialisme) Filoso-fia contemporánea segundo a qual, no homem, a existência. que se identifica com sua liberdade, precede a essência: por isso, desde nosso nasci-mento. somos lançados e abandonados no mundo, sem apoio e sem referência a valores; somos nós que devemos criar nossos valores através de nossa própria liberdade e sob nossa própria responsabilidade. Quando Sartre diz que a existência precede a essência. quer mostrar que a liberdade é a essência do homem: "A liberdade do para-si aparece como seu ser." Assim, a filosofia existencialista é centrada sobre a existência e sobre o homem. Ela privilegia a oposição entre a existência e a essência. Quanto ao homem, ele e aquilo que cada um faz de sua vida, nos limites das determinações físicas. psicológicas ou sociais que pesam sobre ele. Mas não existe uma natureza humana da qual nossa existência seria um simples desenvolvimento. O cerne do existencialismo é a liberdade, pois cada indivíduo é definido por aquilo que ele faz. Daí o interesse cios existencialistas pela política: somos responsáveis por nós mesmos e por aqui-lo que nos cerca, notadamente, a sociedade: aquilo que nos cerca é nossa obra. Como o pensamento filosófico (abstrato e generalizante) não apreende a existência individual, na qual a angústia tem um papel preponderante. o existencialismo abre-se para a literatura e para o teatro, fazendo a filosofia despontar em romances e peças teatrais. existente (al. das Seiende) Designa toda *realidade concreta. as coisas, os outros homens, o *Dasein (o ser-aí ou a realidade humana). En-quanto existente. o homem é ao mesmo tempo o ser entre as coisas existentes, o ser cont a realidade humana dos outros e o ser em relação consigo mesmo. "O existente é o ser-no-mundo" (l-Ieideggcr). I'er ente. exotérico Ver esotérico. experiência (lat. experiencia) Distinguimos, na palavra "experiência", um sentido geral (experience, em inglês) e um sentido técnico, próximo de experimentação (experiment, em inglês). 1. Em seu sentido geral, a experiência é um *conhecimento espontâneo ou vivido, adquirido pelo indivíduo ao longo de sua vida. Ela aparece em relação à vida corrente (dizemos: "homem de experiência") ou em relação com a teoria do conhecimento. Para o empirismo, todo conheci-mento deriva da experiência. Para o nacionalismo, ao contrário, a experiência nada nos ensina, pois é aquilo que precisa ser explicado, não havendo experiência que não esteja impregnada de teoria. Ver empina. 2. Em seu sentido técnico, experiência é a ação de observar ou de experimentar com a finalidade de formar ou de controlar uma hipó-tese. Assim, a experiência (no sentido de experiment) é o fato de provocar, partindo de condições bem determinadas, uma observação tal que seu resultado seja apto a fazer conhecer a natureza do fenômeno estudado. Sinônimo de experimento. 3. Conceitos: "A experiência é um princípio que me instrui sobre as diversas conjunções dos objetos no passado" (1-lume). "Nenhum conhecimento a priori nos é possível senão o de objetos de uma experiência possível" ; "A experiência é um conhecimento empírico, isto é, um conhecimento que determina objetos por percepções" (Kant). experiência crucial Expressão criada por Francis Bacon para designar, por "exemplos da cruz", situações em que o sábio se encontra diante de duas hipóteses contraditórias (como o peregrino que, na encruzilhada dos caminhos, não sabe que estrada tomar). O sábio procede, pois, a uma experiência, sendo-lhe permitido excluir uma das hipóteses e confirmar a outra. Trata-se de uma experiência que se funda no princípio de contradição, que nos diz que uma coisa não pode ser ao mesmo tempo ela mesma e seu contrário. experiencia Experiência vivida por um indivíduo na qual ele se encontra existencialmente comprometido ou implicado. experimentação Interrogação metódica dos fenômenos, efetuada através de um conjunto de operações, não somente supondo a repetibilidade dos fenômenos estudados, mas a medida dos diferentes parâmetros: primeiro passado para a matematização da realidade. A experimentação "verifica" uma hipótese oriunda da experiência e chega, eventualmente, a uma lei, dita experimental. experimentalismo (ingl. experimentalism) 1. Ato de recorrer à experiência concreta (de ordem perceptual, intuitiva, ativística, axiológica ou mística) na fonte da verdade. Oposto a intelectualismo. 2. John Dewey usou o termo para indicar que a educação deve basear-se na experiência, em-pregando-a como sinônimo de *instrumentalismo. experimento (lat. experimentam) Ver experiência. explicação (lat. explicatio) 1. Segundo a tradição empirista, a explicação consiste no conhecimento das leis de coexistência ou de sucessão dos fenômenos, de seu "como": se uma descrição diz o que é um objeto, uma explicação mostra como ele é assim. Um fato particular é explicado quando fornecemos a lei da qual sua produção constitui um caso. 2. Para os racionalistas, ao contrário, a explicação consiste na determinação das causas dos fenômenos, de seu "por quê", ou seja, em des-cobrir o conseqüente pré-formado em seus antecedentes, em reduzir os fatos à sua causa, a única causalidade inteligível sendo a adequação da causa ao efeito. 3.O trabalho da explicação, tipicamente uma atividade da ciência, reduz a explicação à des-coberta das leis capazes de dar conta dos fenômenos. êxtase (gr. ekstasis: ação de estar fora de si) 1. Em seu sentido estrito, estado ao mesmo tempo afetivo e intelectual marcado exterior-mente por uma imobilidade quase total e por uma diminuição das funções de relação. 2. Para os filósofos neoplatônicos, especial-mente Plotino, união íntima com o Uno, na qual a alma, desligada do mundo, do conhecimento sensível e de si mesma, aniquila-se na substância infinita de Deus. 3. Estado psíquico caracterizado por um sentimento de beatitude e de união a um absoluto qualquer. Estado místico da vida religiosa de união amorosa com Deus, caracterizado por um alheamento do mundo sensível e pelo fato de alcançar as realidades sobrenaturais por uma intuição Supra-racional ou espiritual. Extensão (lat. extentio) Quando considerarnos urn conceito que designa uma classe de objetos, levamos em conta extensão ou denotacão: a extensão do conceito "filosófico" é maior que a do conceito "filosófico brasileiro". Quando o consideramos por um conjunto de características, consideramos sua *compreensão ou conotação: a compreensão do conceito "fïlósoto brasileiro" é maior que a do "filósofo". A física do séc.Xll, e a metafísica que a completa, caracterizam a matéria pela extensão: ela é o atributo principal da substância corporal, diz Descartes. e os corpos só são conhecidos pela figura e pelo movimento. externalista Ver internalista/externalista. extrínseco Ver intrínseco/extrínseco. Em nossos dias, os filósofos da liberdade declaram que "não há moral geral" (Sartre), mas escolhas de existência. A felicidade não é mais um fim a ser atingido, mas uma função cíclica e intermitente, só surgindo na medida em que a afirmamos. Por sua vez, podemos falar da felicidade sem considerar a forma da sociedade em que ela se manifesta: "Freud estabeleceu o vin-culo profundo entre a liberdade e a felicidade humana, de um lado, e a sexualidade. do outro: a sexualidade fornece a fonte original da felicidade e da liberdade e. ao mesmo tempo. a razão de suas restrições necessárias na civilização" (Herbert Marcuse). Assim, para Freud, "a felicidade não é um valor cultural": está subordinada às exigências do trabalho e da produção. Ver bem: contemplação. 5. Conceitos: "Urna vida feliz é impossível sem a sabedoria, a honestidade e a justiça, e estas, por sua vez, são inseparáveis de uma vida feliz" (Epicuro). "Ser feliz é necessariamente o desejo de todo ser racional mas finito; portanto, é inevitavelmente um princípio determinante de sua faculdade de desejar" (Kant). "Para sermos felizes, precisamos pensar na felicidade do outro" (Bachelard). fenomenal (do gr. phainomenon) Que é relativo ao *fenômeno, ou composto de fenômenos. Ex.: realidade fenomenal. "Quando falo de objetos no espaço e no tempo, não falo das coisas em si, pois ignoro tudo sobre elas, mas apenas das coisas fenomenais, isto é, da experiência, como um modo de conhecimento que apenas o homem possui" (Kant, Prolegómenos). fenomenalismo Doutrina segundo a qual o homem não pode conhecer as coisas em si, somente os *fenômenos (no sentido kantiano). Contrariamente ao fenomenismo, não considera as coisas em si ou "númenos" como simples palavras vazias de sentido, mas nelas reconhece uma realidade. A doutrina de Kant é um fenomenalismo. fenomenismo Concepção filosófica atribuí-da sobretudo a Hume, que não admite a existêncïa de nenhuma *substância, considerando a realidade como composta exclusivamente de *fenômenos e das percepções e idéias que formamos destes. Ver materialismo; objetivismo: subjetivismo. Oposto a substancialismo. fenômeno (gr. phainomenon, de phainesthai: aparecer) 1. Desde sua origem grega, o termo "fenômeno" tem um sentido ambíguo, oscilan-do entre a idéia de "aparecer com brilho" e a idéia de simplesmente "parecer". Assim, o fenômeno é algo de pouco seguro e, em última instância, urna ilusão. Daí a oposição metafísica entre o ser e o parecer: o ser em si não pode ser percebido por nossos sentidos; aquilo que nos aparece é apenas a diversidade dos seres particulares. O termo "fenômeno" adquire, então, o sentido genérico de "tudo o que é percebido, que aparece aos sentidos e à consciência". 2. 0 termo "fenômeno" passou a ser utiliza-do nas ciências experimentais e nas ciências humanas para designar não uma coisa, mas um processo, uma ação que se desenrola. Assim, a física e a química denominam "fenômeno" toda modificação que ocorre no estado de um corpo: o movimento é um fenômeno (o corpo em movimento se desloca); a dilatação dos gases é um fenômeno, mas os gases são corpos: a digestão (ein biologia) é um fenômeno, mas o aparelho digestivo é um conjunto de órgãos. 3. Na filosofia de Kant, o termo "fenômeno" adquire um sentido particular, por oposição a "númeno". O "númeno" designa a coisa em si, tal como existe fora dos quadros do sujeito. Quanto ao "fenômeno", designa o objeto de nossa experiência, ou seja, aquilo que aparece nos quadros que lhe conferem as formas a priori da sensibilidade e as leis do entendimento. Mas Kant distingue a matéria do fenômeno, isto é. a sensação, e a forma do fenômeno, ou seja, o modo como essa sensação é ordenada em nosso espírito. O fenômeno se define, pois, como "um composto daquilo que recebemos das impressões e daquilo que nossa própria faculdade de conhecer tira de si mesma". Sendo assim, o fenômeno nada tem de uma aparição ilusória, mas constitui o fundamento mesmo de todo o nosso conhecimento. Segundo Kant, é essa dis-tinção fundamental entre fenômeno e "númeno" que permite resolver a antinomia entre determinismo e liberdade. Porque o homem, como fenômeno, é determinado. no tempo, pelas leis da causalidade; como "númeno", porém, permanece livre (não é determinado por essas leis). 4. A expressão "salvar os fenômenos" consiste em acrescentar hipóteses suplementares a uma teoria de modo que os fatos que pareciam contradizê-Ia possam ser explicados por ela. Assim, para Galileu, "o real encarna o matemático. Por isso, ele não admite uma separação entre a experiência e a teoria. A teoria não se aplica aos fenômenos de fora, ela não `salva' esses fenômenos, mas exprime sua essência" (Alexandre Koyré). fenomenologia 1. Termo criado no séc. XVIII pelo filósofo J.H. Lambert (1728-1777), designando o estudo puramente descritivo do *fenômeno tal qual este se apresenta à nossa experiência. 2. *Hegel emprega o termo em sua henomrenoiogia do espírito (1807) para designar o que denomina de 'ciência da experiência da eons-ciência ', ou seja_ o exame cio processo dialético de constituição da *consciência desde seu nivel mais básico, o sensível, até as formas mais elaboradas da consciencia de si, que levariam finalmente à apreensão do *absoluto. 3. Corrente filosófica. fundada por *Ilusserl, visando estabelecer um método cie fundamentação da ciência c de constituição da filoso-f ia como ciência rigorosa. O projeto fenomenológico se define como uma "volta às coisas mesmas'', isto e. aos fenômenos, aquilo que aparece á consciência. que se dá como seu objeto intencional. O conceito de *intencionalidade ocupa um lugar central na fenomenologia, delin indo a própria consciência como intencional. como voltada para o mundo: "toda consciência e consciência de alguma coisa" (Husserl). Dessa forma. a fenomenologia pretende ao mesmo tempo combater o *empirismo e o *psicologismo e superar a oposição tradicional entre *realismo e *idealismo. fenomenologia pode ser considerada unha das principais correntes filosóf'ieas deste século, sobretudo na Alemanha c na França, tendo influenciado fortemente o pensa-mento cíe *IIcidegger c o existencialismo cie *Sartre. e dando origem a importantes desdobra-mentos na obra de altores como *Merlcan-Ponlv e *Ricouer. I-"cr redução. Fenomenologia do espirito (Plmononxenologre des Geisies) Obra de *1 legel. publicada em 18(17, contem o resultado do amadurecimento de seus cursos na Universidade de lena (1801-1806). buscando traçar o processo de constituição da *consciência. cada um cie seus momentos negando parcialmente o precedente e fazendo-a aceder a um grau de realidade suplementar. A consciência se eleva. das representações mais elementares do Ser absoluto (Deus) à sua representação lilosôlica adequada: parte cia ingênua "certeza sensível-" para atingir o -'saber absolu- to". Segundo l legel. "este volume expõe o devir do saber". Fm suma. const i tu i o que chamou de "ciência cia experiência da consciência'", examinando a história pela qual o homem se eleva até o *Absoluto. Trata-se de uma antropologia. des- crevendo as "representações da consciência" (1 parte) e as "experiências do espírito" (21). fenomenotécn ica "Termo cr iado por Bache-la rd para des ignar sua f i losof ia "racionalista aplicada" ou "materialismo racional" que se atual iza na ação polêmica constante da razão, visando objetivar os fenômenos científicos apesar dos caracteres dos objetos comuns, determinar o abstrato-concreto através de uma técnica de produção dos fenômenos: produção teórica dos conceitos e produção material do objeto do Trabalho teórico. Feuerbach, Ludwig (1804-1872) 0 filósofo alemão (nascido em Landshut) Ludwig Feuerbach e um pensador clue faz parte da ''esquerda hegeliana''. Rompeu com Hegel em 1837. porque não reconhecia no movimento da história a "razão'' clue Hegel nele colocava. Criticou sua filosofia procurando seu verdadeiro conteúdo. Hegel havia posto no cume de todo o processo dialét ico a idéia absoluta. Feuerbach interpretou essa idéia cie modo teológico e. em seguida.. a condenou. colocando o homem no lugar de. Deus (ou idéia). F,m A essência do crrslrunrsino e em .1 essência dcr religião (1841). mostra clue a religião é uma *alienação do ho-mem. adoração de ídolos criados pelos homens que prgietam suas esperanças em vez de realizá-las. Segundo l'ngels, essa opinião teve um grande eleito e m Marx. Es tá na or igem do chamado "humanismo ateu" rad ica l o homem cr ia os deuses à sua imagem e semelhança, transfere para o Ccu o ideal de justiça que não consegue realizar na terra. Feverabend, Paul K. (1924-1994) Professor na liuiversidade da Califórnia(Berkeley), Paul K. Fe_verahend (nascido em Viena, Austria) sempre se interessou pela f ís ica. pelo teatro e pelas letras. Fm 1954, recebeu, cio presidente da república cia Austria. um prêmio por seus traba-lhos nas ciências e c m belas-artes. Em seguida, marcado pelo "segundo" Wittgenstein e por Karl Popper. miem por isso deixou cie criticá-los. Dcu-se conta de clue a lógica formal constitui um elemento pernicioso para o desenvolvimento da filosofia. Revoltou-se contra o empirismo e adotou uma postura epistemológica por ele con-siderada "anarquista". Cansado de buscar uma metodologia geral suscetível de englobar tanto a ciência quanto os mitos, a metafísica e as artes, declarou abertamente que só há uma "regra" metodológica: "Admite-se tudo" ou "Tudo vale". Assim, seu "anarquismo epistemológico" é enfático: nenhuma teoria possui o privilégio da verdade sobre as outras; cada uma funciona mais ou menos, e sua concorrência é a única condição do progresso científico. Além de numerosos artigos em revistas e coletâneas, escreveu as obras: Against Method: Outline of an Anarchistic Theory of Knowledge (1975), Philosophical Papers (1981), em 2 vols., Farewell to Reason (1987). ficção (do lat. fingere: fingir, imaginar) Em seu sentido filosófico, é uma construção elaboradapela imaginação graças àqual um indivíduo acredita poder resolver um problema real (metafísico, lógico, moral ou psicológico). Ex.: o Gênio Maligno, de Descartes. Fichte, Johann Gottlieb (1 7 6 2 - 1 81 4 ) Nascido em Rammenau, Alemanha, e profunda-mente marcado pela obra de Kant. o filósofo Fichte é um dos principais representantes do chamado idealismo alemão pós-kantiano. Foi professor nas Universidades de leva e Berlim, tendo chegado a reitor desta última (1812). O ponto de partida da obra de Fichte são os pro- blemas kantianos da fundamentação da experiência e da relação entre a necessidade causal do mundo natural e a liberdade no mundo moral. Posteriormente desenvolveu uma filosofia que prenunciava o idealismo absoluto de Hegel, formulando urna noção de "ego" como um ser ativo e autônomo em um sistema determinado pela Natureza. O "ego" resulta assim de um ato de auto- afirmação da consciência originária, constituindo o mundo objetivo — o "não-ego" — a partir das aparências. Seu idealismo, nesse sentido, dissocia-se da filosofia de Kant, sobre-tudo por abandonar a distinção kantiana entre objeto e coisa-em-si. Sua ética humanista e seu idealismo prático antecipam certas idéias do existencialismo como o fazer-se do homem por si mesmo. Obras principais: Discursos à nação alemã (1807-1808), em que defende a regeneração da Alemanha, então ocupada por Napoleão, e a necessidade de reformas sociais, e Doutrina da ciência (1810), em que expõe seu sistema. Ficino, Marsílio (1433-1499) No plano das idéias, o filósofo e humanista Marsílio Ficino (nascido perto de Florença, Itália) encontra-se na origem do movimento renascentista. Ao traduzir para o latim o Corpus hermeticum, e, pela primeira vez, as obras completas de Platão e do neoplatônico Plotino, tornou-os acessíveis a um grande público. Em sua interpretação filosófica desses textos. Ficino insuflou vida nova em vários de seus conceitos. sobretudo no de "luz original". que deu nascimento ao mundo e continua a iluminar o universo. Ao inverter os valores neoplatônicos. Ficino torna a vida pre-sente mais preciosa, pois ela se ilumina a partir de uma luz interior. Contudo, não aspiramos a essa "luz original pois seu reflexo se torna mais importante, e se chama beleza. Preocupado ainda em "demonstrar" a imortalidade da alma e cm estabelecer uma harmonia entre a razão e a fé revelada, Ficino partiu em busca de uma "paz da fé". resultante de uma união das crenças cristãs com a tradição grega depurada de seus elementos estranhos. Converteu-se, assim, num defensor da unidade da religião através da variedade dos ritos religiosos. Sua mensagem essencial consiste em dizer que tanto o sagrado quanto o sublime, o misterioso, o incognoscível e o "para-além" se revelam a nós na beleza deste mundo presente. Porque é a beleza que nos dá testemunho da luz e nos revela este mundo regido por forças maravilhosas. A obra essencial de Ficino consiste cm 18 livros intitulados Theo-logia platonica (escritos entre 1469 e 1474). fideísmo (do lat.(ides: fé, crença) 1. Doutrina que admite que a religião ou as verdades de fé constituem objeto de pura crença. essas verdades sendo independentes de toda e qualquer justificativa racional. 2. Doutrina segundo a qual as verdades fundamentais da ordem especulativa ou da ordem prática não devem ser justificadas pela razão, mas simplesmente aceitas como objeto de pura fé. O fideísta é, sobretudo, um crente, alguém que não admite que a razão seja suficiente para responder às grandes questões como a da existência de Deus ou da imortalidade da alma: uma resposta afirmativa a essas questões só pode repousar na fé. Ele é malvisto pela Igreja católica. que defende a idéia de que a razão possui um valor eminente, tanto para explicar o mundo quanto para fundar a crença em Deus. figuras do silogismo São as quatro categorias nas quais se distribuem os modos possíveis de todo silogismo aristotélico. São determinadas pelo lugar do termo médio na premissa maior e na premissa menor (ele jamais aparece na conclusão). Assim, obtemos quatro figuras: SP: na primeira figura, o termo médio é sujeito na premissa maior e predicado na menor. PP: na segunda figura, o termo médio é predicado nas duas proposições. SS: na terceira figura, o termo médio é sujeito nas duas proposições. PS: na quarta figura, o termo médio é predicado na maior e sujeito na menor. Ver silogismo. Filodemo (c. 110-28 a.C.) Filósofo grego (nascido em Gadara, Síria) epicurista; ensinou em Roma. Encontraram-se, nas ruínas de Herculano, trinta e seis tratados atribuídos a esse filósofo. filodoxia (do gr. philia: amizade, e doia: opinião) Platão opõe os filodoxos, os "amantes da opinião" , que se comprazem com as aparências e com a diversidade das coisas, aos filósofos, que procuram a idéia por detrás da diversidade das coisas. Kant também opõe filodoxia a filosofia, mas num sentido diferente. Para ele, a filodoxia nada mais é do que um diletantismo da reflexão filosófica, no qual são levantadas questões filosóficas sem preocupação de se che-gar à verdade ou a soluções rigorosas. Filolau Filósofo grego (nascido em Crotona ou em Tarento) que viveu no séc.V a.C.; pitagórico; fundou uma escola pitagórica em Tebas e foi um dos primeiros a divulgar o pensamento de Pitágoras. Restam apenas fragmentos de suas obras. Filon Filósofo grego, de origem judaica e cognominado "o Platão judeu"; viveu no séc.I da era cristã em Alexandria e é um dos principais representantes da chamada escola de *Alexandria. Chefiou uma embaixada de cinco judeus que foram a Roma pedir ao imperador que dispensasse os membros da comunidade judaica de prestarem culto divino à estátua do impera-dor. Como filósofo, procurou conciliar os ensinamentos do Velho Testamento com a filosofia de Platão e Aristóteles. Foi o inspirador do *neoplatonismo e da literatura cristã. Obras principais: Sobre a vida contemplativa e Deus é um ser imutável. Filon de Larissa Filósofo grego (nasceu em Larissa) que viveu nos sécs.Il e I a.C. Dirigiu a *Nova Academia (c. 110 a.C.). filosofia É difícil dar-se uma definição genérica de filosofia, já que esta varia não só quanto a cada filósofo ou corrente filosófica, mas também em relação a cada período histórico. Atribui-se a Pitágoras a distinção entre a sophia, o saber, e a philosophia, que seria a "amizade ao saber", a busca do saber. Com isso se estabeleceu, já desde sua origem, uma diferença de natureza entre a ciência, enquanto saber específico, conhecimento sobre um domínio do real, e a filosofia que teria um caráter mais geral, mais abstrato, mais reflexivo, no sentido da busca dos princípios que tornam possível o próprio saber. No entanto, no desenvolvimento da tradição filosófica, o termo "filosofia" foi freqüente-mente usado para designar a totalidade do saber, a ciência em geral, sendo a metafísica a ciência dos primeiros princípios, estabelecendo os fundamentos dos demais saberes. O período medie-val foi marcado pelas sucessivas tentativas de conciliação entre razão e fé, entre a filosofia e os dogmas da religião revelada, passando a filosofia a ser considerada ancilla theologiae, a serva da teologia, na medida em que fornecia as bases racionais e argumentativas para a construção de um sistema teológico, sem contudo poder questionar a própria fé. O pensamento moderno recupera o sentido da filosofia como investigação dos primeiros princípios, tendo portanto um papel de fundamento da ciência e de justificação da ação humana. A filosofia crítica, principal-mente a partir do Iluminismo, vai atribuir à filosofia exatamente esse papel de investigação de pressupostos, de consciência de limites, de crítica da ciência e da cultura. Pode-se supor que essa concepção, mais contemporânea, tem raízes no ceticismo, que, ao duvidar da possibilidade da ciência e do conhecimento, atribuiu à filoso-fia um papel quase que exclusivamente questionados. Na filosofia contemporânea, encontra-mos assim, ainda que em diferentes correntes e perspectivas, um sentido de filosofia como investigação crítica, situando-se portanto em um nível essencialmente distinto do da ciência, em-bora intimamente relacionado a esta, já que descobertas científicas muitas vezes suscitam questões e reflexões filosóficas e freqüentemente problematizam teorias científicas. Essa relação reflexiva entre a filosofia e os outros campos do saber fica clara sobretudo nas chamadas "filosofia de": filosofia da ciência, filosofia da arte, filosofia da história, filosofia da educação, filosofia da matemática, filosofia do direito etc. filosofia analítica Corrente de pensamento que se desenvolveu sobretudo na Inglaterra e nos Estados Unidos a partir do início deste século. com base na influência de filósofos como Gottlob *Frege, Bertrand *Russell. George Ed-ward *Moore e Ludwig *Wittgenstein. dentre outros Caracteriza-se, em linhas gerais, pela concepção de que a *lógica e a teoria do *significado ocupam um papel central na filosofia, sendo que a tarefa básica da filosofia é a análise lógica das sentenças, através da qual se obtém a solução dos problemas filosóficos. Há, no en-tanto. profundas divergências sobre as diferentes formas de se conceber esta análise. Ver Carnap; Círculo de Vrena:: linguagem; Quine: semântica: significado Filosofia como ciência rigorosa, A (PhilosopiTic als strenge F0'issenschaft) Obra de *Husserl. publicada entre 1910-1911. na qual critica tanto os partidários do *naturalismo cien-tífico. quanto os defensores do *historicismo e define a filosofia como *fenomenología, vale dizer, corno apreensão do sentido dos fenômenos, pois somente ela pode captar o único ser apoditicamente dado (ou absoluto), o ser da *consciência Ciência das essências, a filosofia mostra que a consciência, pela *intencionalidade, capta a "coisa mesma". finalidade", segundo o qual todo agente age segundo um fim, pretende dar conta de um objeto ou de um ser que designa sua função. 3. Kant popularizou a expressão "reino dos fins", isto é, da moral concebida como ligação sistemática entre os seres racionais que podem tornar a si mesmos como fonte e objetivo da moralidade. Assim, o provérbio "quem quer os fins quer os meios" é substituído pela fórmula "o fim justifica os meios". Ver teleologia. finalismo Doutrina que transpõe o princípio de finalidade para a ordem da metafisica, com o objetivo de explicar os fenômenos do mundo material ou moral, tanto pela intervenção de um espírito criador e providencial quanto em função de um futuro "apocalipse" que virá justificar tudo o que sc passou anteriormente. finitismo 1. Doutrina que afirma o fim do mundo. 2. Tcoria ou doutrina que sustenta que unia determinada entidade ou domínio é finito. f ini tude (do lat. finitus, de flnire: findar, limitar) A filosofia moderna se constitui tomando uma posição em relação ao tema do finito e do infinito, tema inaugurado pela transformação do "cosmo'' grego. 1. No pensamento grego, a finitude tem um sentido de acabamento: o mundo é finito, limitado: a ordem que nele reina (o cosmo) repousa no limite. O 'infinito" só tem o sentido de inacabado, de imperfeito. 2. O pensamento cristão introduz, na origem do mundo criado. um Deus perfeito e infinito. O infinito ganha uni sentido positivo, mas a finitude do mundo criado não sai da ordem das coisas. E somente no séc.XV, com Nicolau de Cusa, que surge a idéia de um mundo infinito: o finito passa a subordinar-se ao infinito como o imperfeito ao perteito. Os filósofos da existência falam do senti-mento subjetivo da finitude: a finitude do ser humano é sua contingência radical; pelo medo, pela angústia ou pelo sentimento do absurdo, o homem experimenta os limites de seu ser, a contingência radical de sua existência. Fink, Eugen (1905-1975) Filósofo alemão, nascido em Konstanz, aluno e posteriormente colaborador de *Husserl, foi inclusive autor da Sexta meditação cartesiana de Husserl, tendo sido professor na Universidade de Freiburg, onde estudou com Husserl. Para ele, a tarefa da reflexão fenomenológica é a de descobrir a "origem do mundo", e não a de fundar nosso conhe- cimento do mundo, como pretende a reflexão crítica. Procurou ainda fundar especulativament e a atitude descritiva da *fenomenologia. Obras principais: Representação e imagem (1930), 0 problema da jenomenologia de Husserl (1938), Contribuição à história dos inícios da ontologia (1957). 0 jogo como símbolo cósmico (1960). A filosofia de Nietzsche (1960), Ser e homem, sobre a natureza da experiência ontológica (1977). Fischer, Kuno (1824-1907) Filósofo e crítico literário alemão (nascido em Sandewalde); foi professor de Windelband: lecionou em leva (1856) e em Iieidelberg (1872-1907) e foi seguidor de Hegel. Escreveu uma monumental História da filosofia moderna em seis volumes (1852-1877), além de várias outras obras filosóficas e de estudos literários. física/físico (lat. physica. do gr. physike: ciência da natureza) I. O termo "tísico" designa a realidade material, concreta, objeto de nossos sentidos, em contraste com a realidade psíquica, subjetiva. interior, bem como a realidade espiritual ou abstrata. Ex.: mundo físico, objeto físico. Oposto a abstrato. Per matéria. 2. Como ciência do mundo natural, a física está desde sua origem estreitamente ligada à filosofia. As *cosmologias dos primeiros tilóso-Ibs, os *pré-socráticos, também denominados por Aristóteles de "fisiólogos". são precisamente uma tentativa de explicar o mundo material através de causas naturais e da existência de elementos primordiais, que seriam os princípios explicativos de toda a realidade. Física e *meta-física têm assim praticamente urna origem co-mum, como aspectos da tentativa de explicação da realidade em seu sentido mais próximo da experiência sensível e em seu sentido mais abstrato, teórico, especulativo. Com o surgimento da ciência moderna a partir do séc.XVII, a física tem um grande desenvolvimento, dando origem á físico-matemática c servindo de modelo para todas as ciências, sobretudo devido à con- tribuição de Newton, à construção de uma axiomática, de uma teoria rigorosa do mundo natural. Kant dirá então que a filosofia deveria ambicionar atingir o estágio acabado em que a tísica se encontrava. No período contemporâneo, as teorias físicas, como a da relatividade, e a mecânica quântica questionam os pressupostos centrais da física newtoniana e suscitam impor-tantes questões para a filosofia da ciência, relacionadas com o realismo e o construtivismo, com as noções de tempo e espaço, verdade e verificação etc. Do mesmo modo, a discussão sobre o estatuto epistemológico das ciências humanas leva ao questionamento da adoção da física clássica como modelo de todas as ciências em geral. fisicalismo (al. Phvsikalismus) Termo criado por Rudolf *Carnap em sua obra Conceituação fisicalista (1926) e que passou a designar a doutrina filosófica do *Círculo de Viena. o em-pirismo lógico. positivismo lógico ou neopositivismo. Sua idéia central é a de que a linguagem da *física constitui um paradigma para todas as ciências, naturais e humanas (dentre estas últimas sobretudo a psicologia), estabelecendo a possibilidade de se chegar a uma ciência unificada. Essa linguagem, por sua vez, se reduz a sentenças protocolares, que descrevem dados da experiência imediata, e a sentenças lógicas que são analíticas. A verificação empírica e o formalismo lógico são assim as bases da doutrina fisicalista. "Uma das tarefas mais importantes, relativas d lógica da ciência, será o desenvolvi-mento das operações que o lisicalismo sustenta que são possíveis: indicar as regras sintáticas para a inserção dos diferentes conceitos biológicos, psicológicos e sociológicos na linguagem física. Essa análise dos conceitos de lingua-gens parciais conduz à concepção de uma linguagem unitária que suprimiria o estado de dispersão que reina atualmente na ciência" (R. Carnap. O problema da lógica da ciência, 1934). fixismo Doutrina segundo a qual as espécies não se transformam no curso das idades, pois foram criadas por Deus tais corno se encontram atualmente. Per transformismo; evolucionismo. Fontenelle, Bernard le Bovier de (1657-1757) Filósofo racionalista francês, foi um dos principais seguidores de *Descartes, sobretudo no campo da ciência da natureza e da astronomia, embora em suas últimas obras tivesse desenvolvido uma teoria do conhecimento de caráter empirista. Defendeu, em sua obra Digréssion sur les anciens et les modernes (1688), a filosofia moderna contra os tradicionalistas, na célebre querela entre os antigos e os modernos. Teve grande influência no pensamento iluminista francês do séc.XVIII, tendo ocupado o cargo de secretário perpétuo da Academia de Ciência (1699). Dedicou-se também a atividades literárias e ao estudo das religiões, notabilizando-se por seu L'origine des fables (1680). Outras obras: Entretiens sur la pluralité des mondes (1686), Éloge de Newton (1727). forma (lat. forma) 1. Princípio que determina a matéria, fazendo dela tal coisa determinada: aquilo que, num ser, é inteligível. A matéria e a forma constituem o par central da física aristotélica. A forma é aquilo que, na coisa, é inteligível. podendo ser conhecido pela razão (objeto da ciência): a essência, o "definível" . A matéria é considerada como um substrato passivo que deve tomar forma para se tornar tal coisa. Matéria e forma só podem ser dissociadas pelo pensamento. 2. Kant retoma essa concepção, em sua teoria do conhecimento, razão pela qual sua filosofia pode ser qualificada de formalista, na medida em que a forma nela é o produto da atividade autônoma do espírito. Assim, ele chama de "for-mas" as instituições da sensibilidade e as categorias do entendimento que, dominando a matéria, constituem-na em fenômenos. A forma designa aquilo que vem do sujeito, as estruturas de seu modo de conhecer (formas a priori): "chamo de matéria no fenômeno aquilo que corresponde à sensação; mas aquilo que faz com que o diverso do fenômeno seja coordenado na intuição, segundo certas relações, chamo de for-ma do fenômeno" . 3. Enquanto oposta a elemento isolado, a forma designa a percepção global de um conjunto. É nesse sentido que se fala da teoria da forma (em alemão: Gestalttheorie): trata-se, antes de tudo, de uma teoria psicológica, mas que se estendeu a outros domínios de conhecimento. Segundo essa teoria, só percebemos conjuntos de elementos. Por exemplo, quando vejo algo, vejo ao mesmo tempo uma certa forma (no sentido de contorno ou forma geométrica), uma certa cor, uma certa distância etc. Esse conjunto percebido é chamado de forma. formal (lat. formalis) 1. Em seu sentido vulgar, refere-se a: a) uma preocupação excessiva com os aspectos exteriores (educação formal); b) aquilo que possui um caráter abstrato, sem relação com o real (argumentação formal); c) aquilo que é apresentado de modo explicito e categórico (uma ordem formal). 2. Uma verdade é formal quando diz respeito à forma do conhecimento e é conforme às regras da lógica; por sua vez, uma moral é formal quando só considera a forma da moralidade, não se preocupando com as conseqüências de sua realização. 3. Hegel freqüentemente opõe formal a substancial. Nas relações sociais, por exemplo, a família é substancial e natural, ao passo que são formais as relações entre os cidadãos que vivem numa sociedade civil que não dá a devida importância às relações humanas. 4. Causa formal. Ver causa. formalismo (fr. formalisme) 1. Atenção e preocupação exageradas com os detalhes de pura forma, através de um pensamento de tipo mecânico: formalismo jurídico, prática forma-lista de ritos. 2. Doutrina segundo a qual o valor moral de um ato depende não daquilo que realmente é feito, mas da intenção que comandou sua realização. 3. Na linguagem matemática, é chamada de formalismo a doutrina segundo a qual as verdades matemáticas são puramente formais, repousando unicamente num jogo de convenções e de símbolos. 4. Na estética, doutrina que atribui uma importância excessiva à forma (literária, artística etc.), em detrimento do "fundo". formalização Construção de um sistema de conhecimentos por redução às suas estruturas formais e abstração feita de seu conteúdo empírico ou intuitivo. A formalização constitui a tarefa fundamental da disciplina denominada "logística", "lógica simbólica", "lógica matemática" ou simplesmente, em seu sentido mais antigo, "lógica formal". Ela se tornou hoje um instrumento de análise e de formulação indispensável ao matemático, ao lingüista, ao filósofo, ao informático e, de modo geral, a todo aquele que está preocupado em controlar, com uma precisão máxima, as démarches de seu pensamento e a organização de seus discursos. foro (íntimo) (lat. forum: lugar público) Em seu sentido moral, é o tribunal interior da *cons-ciência dos individuos, o lugar onde ela toma soberanamente suas decisões, independente-mente das coerções exteriores. fortuito (lat. fortuitos) Que se produz por acaso, que depende do acaso, aparecendo como algo de imprevisível e que acontece de repente. Ver acaso. Foucault, Michel (1926-1984) Um dos mais influentes pensadores franceses contemporâneos, identificado inicialmente com o estruturalismo — do qual certamente sofreu a influência, embora desenvolvendo um pensamento próprio, extremamente criativo e original —, Foucault nasceu em Poitiers e foi professor no Collège de France (1970). Empreendeu urna importante análise epistemológica do surgimento das ciências humanas e de seu papel em nossa cultura, bem como uma crítica à noção tradicional de sujeito. Por outro lado. foi também grande a influência do próprio método de análise do discurso proposto por Foucault. Seu ponto de partida é o conceito de epìsteme, uma rede de significados — uma "formação discursiva" — que caracterizaria uma determinada época nos diversos domínios da sociedade e da cultura: da literatura à ciência, da arte à filosofia. A análise arqueológica, que realizou, representa um método original em história das idéias, cujas bases são formuladas em sua obra Arqueologia do saber (1969). Essa análise é essencialmente uma análise do discurso, tomado no entanto em um sentido prévio a qualquer categorização, procurando estabelecer relações não-tematizadas e examinar com rigor corno as categorizações se dão no discurso. como o próprio discurso se constitui. Foucault questiona, em sua obra A s palavras e as coisas, uma arqueologia das ciências humanas (1966), a noção de sujeito e a idéia de ciências humanas que dela se origina, tendo ficado célebre sua conclusão de que "o homem é uma invenção que a arqueologia de nosso pensamento mostra claramente a data recente, e talvez também o fim próximo". Mais tarde, inspirando-se em Nietzsche, desenvolveu seu método em outra direção. que chamou de "genealogia", conceito que introduziu em seu Pitiiar e punir (1975). A genealogia é essencial-mente uma análise histórica de como o poder pode ser considerado explicativo da produção dos saberes. Os discursos são vistos agora a partir das condições políticas que os tornam possíveis. O poder, contudo, deve ser visto aí de uma forma difusa, não se identificando necessariamente com o Estado, mas nas várias instâncias da vida social e cultural, em uma perspectiva que Foucault denominou "microfísíca do poder". No primeiro volume de sua última obra, História da sexualidade, desenvolveu sua aná-lise nessa direção. Foucault visitou diversas vezes o Brasil e sua obra teve grande impacto em nosso meio acadêmico e cultural. Além dos já citados, destacam-se ainda os seguintes livros: História da loucura na idade clássica (1961), 0 nascimento da clínica (1963), A ordem do dis-curso (1971). História da sexualidade em três volumes: A vontade do saber (1976), 0 uso dos praaeres (1984) e O cuidado de si (1984). Fourier, Charles (1772-1837) O filósofo e reformador social francês Charles Fourier (nascido em Besançon) é um dos socialistas utópicos. Sua doutrina é urna vigorosa acusação aos comerciantes considerados "aranhas, sangues-sugas, abutres e espoliadores" de serem responsáveis pelo triste estado da sociedade, pelo feudalismo que persiste e pelo assassinato dos tra- balhadores. Ataca também a religião ("obra de um aventureiro charlatão"), a instituição familiar e "a civilização'' (sinônimo de todas as perversões). Fourier, cujos "falanstérios" (comunidades cooperativistas) foram experimental-mente implantados na Europa e nos Estados Unidos, teve a idéia da orientação profissional, defendeu a propriedade comunitária, postulou a federação das comunidades, defendeu o princípio "a cada um segundo suas necessidades", advogou a utilização profissional das "motivações". sonhou com comunidades de trabalho, com cooperativas de produção de consumo, e com uma espécie de co-gestão. Obras principais: Tliéa'ie des quatre mouvements et destinées générales (1808). Truité de I 'association domes-tique et agricole (1822), Le monde industriel et sociétaire (1829), La Plisse industrie morcelée (1835-1836). Franca, Leonel (1893-1948) Pensador ca tólico brasileiro. nascido em S. Gabriel, Rio Grande do Sul. Padre jesuíta, estudou em Roma. Foi fundador da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1941) e da Revista Ver-bum. exercendo urna importante liderança nos meios católicos em sua época, juntamente com Alceu *Amoroso Lima. Procurou renovar a filosofia cristã, sobretudo o *neotomismo, integrando em seu pensamento uma visão profundamente espiritual com uma reflexão sobre a sociedade e a cultura. Foi autor de um grande número de obras, destacando-se A Igreja, A Reforma e a civilização (1923), A psicologia da fé (1935), A crise do mundo moderno (1941), bem como Noções de história da filosofia (la ed. 1918), durante muito tempo um dos principais manuais de ensino da filosofia em nosso país. Frankfurt, escola de Nome genérico para designar um grupo de filósofos e pesquisadores alemães que, unidos por amizade no início dos anos 30, emigraram com o advento do nazismo, só retornando à Alemanha depois da guerra: Theodor *Adorno, Walter *Benjamin, Max *Horkheimer, Herbert *Marcuse. Jtirgen *Ha-bermas etc. A pretensão básica do grupo foi a de elaborar uma teoria crítica do conhecimento, de um lado, aprofundando as origens hegelianas de Marx, e, de outro, introduzindo um questionamento no sistema de valores individualistas. Assim, a escola de Frankfurt elucidou o caráter contraditório de conquista racional do mundo. pois a racionalidade científica e técnica consegue o feito de converter o homem num escravo de sua própria técnica. Procedeu ainda, de modo mais ou menos radical, segundo os autores, a uma crítica da "massificação" da indústria cultural, dos totalitarismos, da concepção positivista do mundo etc. Frege, Gottlob (1848-1925) Considerado o criador da *lógica matemática e um dos principais iniciadores da filosofia analítica, Frege nasceu na Alemanha e foi professor de matemática na Universidade de Iena. Inspirando-se em Leibniz, reformulou toda a lógica tradicional, construindo um sistema para apresentá-Ia em lingua-gem matemática. Assim, é com base em sua Begriffsschrift (Conceitografia, 1879) que se desenvolveram o cálculo proposicional e o cálculo dos predicados. Uma das maiores contribuições de Frege ao desenvolvimento da lógica foi a invenção do quantificador e o uso de variáveis para formalizar a generalidade na linguagem natural. Grande parte do pensamento de Frege é voltada para questões de fundamentação da matemática, tais como a noção de prova e a natureza do número. Frege foi um dos principais defensores do *logicismo, considerando que a matemática pode ser reduzida à lógica: bem como do platonismo, ao definir números e relações matemáticas como objetos abstratos existentes autonomamente, independentes de nosso pensamento. A partir de suas investigações sobre a linguagem matemática, desenvolveu, entretanto, profundas reflexões sobre a natureza da linguagem e do significado, que se aplicam à linguagem natural. E famosa sua defesa da necessidade de se distinguir entre o sentido (Sinn) e a referência ou significação (Bedeutung) de uma sentença. Essas reflexões, assim como sua obra em lógica, abriram caminho para o desenvolvimento da filosofia da linguagem de tradição analítica, influenciando especialmente auto-res como Russell. Carnap e Wittgenstein. Suas obras principais, além da já citada, são: Funda- mentos da aritmética (1884) e As leis fundamentais da aritmética, 2 vols. (1893-1903), incluindo ainda inúmeros artigos dentre os quais se -destacam o influente "Sobre o sentido e a referência" (1892) e " 0 pensamento: uma investigação lógica" (1918). Freud, Sigmund (1856-1939) Criador da psicanálise, e um dos autores que mais profundamente revolucionaram o pensamento de nossa época, Freud nasceu em uma família judaica de Freilberg, na Morávia, então parte do Império Austro- Hímgaro. Formou-se em medicina na Universidade de Viena (1881), onde seguiu al-guns cursos de *Brentano. Mais tarde tornou- se professor da universidade, passando também a manter um consultório em Viena. Começou a desenvolver sua teoria psicanalítica no início do século, alcançando grande fama e notoriedade. Em 1910, foi fundada a Associação Internacional de Psicanálise, sendo Freud seu primeiro presidente. Em 1938, com a anexação da Austria pela Alemanha, exilou-se na Inglaterra, onde veio a falecer no ano seguinte. A teoria freudiana teve grande impacto não só na psiquiatria e na psicologia, mas na filosofia e nas ciências humanas e sociais cm geral. Especialmente para a filosofia, sua revelação do *inconsciente como lugar de nossos desejos reprimidos, origem de nossos sonhos e fonte de nosso imaginário, provocou um profundo questionamento da tradição filosófica racionalista que definia o ho-men) precisamente por sua consciência e racionalidade. "A psicanálise nos ensina que a essência do processo de repressão não consiste em suprimir, negar uma representação que indica urna puisão. mas em impedi-la de tornar-se consciente. Dizemos assim que se encontra em um estado 'inconsciente', e podemos fornecer provas sólidas de que. mesmo inconsciente, ela produz efeitos, alguns dos quais podem até atingir finalmente a consciência." Freud desenvolveu assim um exame de um lado da natureza humana em grande parte ignorado até então pela filosofia, forçando a revisão da conceituação filosófica do pensamento, da razão, da consciência e da vontade. Também para a análise da cultura e da sociedade, a contribuição de Freud foi considerável, especialmente em seus estudos sobre a relação entre ordem social e culpa, que. segundo ele, se encontraria na própria gênese da sociedade, na morte do pai primitivo por seus filhos que o devoram e assumem seu 3. Michel *Foucault retoma o método genealógico inaugurado por Nietzsche, mas para investigar os processos de formação dos *discursos, sua formação ao mesmo tempo dispersa, descontínua e regular. A genealogia passa a ser uma *arqueologia dos conjuntos conceituais, que ele considera como um tipo novo de epistemologia histórica, englobando tanto a filosofia, a literatura e as artes quanto os métodos científicos. Esse estudo se distingue da genealogia pelo fato de não procurar as origens e as conti- nuidades históricas, mas de detectar, para uma fase dada, as mais fortes *estruturas: as formações culturais deixam de ser consideradas ''documentos" c se convertem em "monumentos". generalização (do lat. generalis: que pertence a um gênero). 1. Operação mental que consiste em estender a toda uma classe de seres ou de fenômenos aquilo que é constatado em alguns seres: é assim que se formam os conceitos em-píricos. 2. Operação pela qual passamos de proposições especiais a proposições mais universais: a gravitação universal é uma generalização da queda dos corpos. 3. Nas ciências experimentais. o problema da generalização é colocado a partir do chamado *método indutivo: como induzir uma proposição universal a partir de um número limitado de casos particulares? A indução por enumeração completa é quase impossível. l'er indução. gênero (lat. gerais: origem. nascimento) Ter-mo ou conceito que engloba outros termos ou conceitos. ou seja, que possui, relativamente a eles. uma maior *extensão. Ex.: animal é gênero relativamente a vertebrado: vertebrado é gênero relativamente a mamífero. O conceito que, relativamente ao género. possui uma menor extensão. conseqüentemente. uma maior *compreensão. é chamado de espécie. lrer universal. gênio (lat. genius: espírito tutelar) 1. O deus do nascimento: cm seguida, o deus tutelar de cada indivíduo e que conduz seu *destino. 2. Conjunto de disposições naturais excepcionais. seja de um indivíduo, de um grupo ou de um povo. num determinado domínio das artes. das ciências, das letras etc., conferindo-lhes uma notável especificidade. Ex.: o gênio de Mozart, de Newton; o gênio da civilização grega. 3. Conjunto de disposições naturais pelas quais um individuo sai do ordinário ou do co-mum, revelando alguém superdotado de um po-der de criação que se manifesta no domínio das artes: "Para se julgar objetos belos, torna-se necessário o gosto; mas para as belas-artes, é necessário o gênio"(Kant). 4. Gênio maligno: hipótese pela qual Descartes, supondo a existência de um "gênio mau" astucioso, enganador e poderoso, eleva a *dúvida universal e hiperbólica a seu mais alto grau (pois nem mesmo a matemática a ela escapa): "que ele me engane o quanto quiser, ele (gênio maligno) não poderá jamais fazer com que eu nada seja, enquanto eu pensar esse algo." geocentrismo (do gr. geo: terra, e lat. centrum: centro) Teoria astronômica, de inspiração aristotélico-ptolomaica, segundo a qual não so-mente a Terra é imóvel, mas situa-se no centro do mundo (teoria derrubada pela teoria heliocêntrica de Copérnico e de Galileu). Ver heliocentrismo. geração (do lat. generatio) "Geração" forma par com o termo "corrupção", na filosofia de Aristóteles, para designar os dois aspectos extremos da "evolução" cíclica da matéria viva: a geração é a passagem da *potência ao *ato, é a criação; a corrupção é a passagem inversa, é a destruição. Ver corrupção. geral (do lat. generalis) 1. 0 adjetivo "geral" deriva de "gênero", como "especial" é o adjetivo derivado de "espécie". Ex.: o fato de ser vertebrado é uma propriedade geral dos mamíferos, o que significa que os mamíferos pertencem ao gênero mais amplo dos vertebrados. 2. "Geral" é sinônimo de "universal" e se opõe a particular. E nesse sentido que se diz que "a indução conclui do particular ao geral". No dizer de Descartes, "é próprio de nosso espírito formar propriedades gerais do conhecimento das particulares". Gestalt, teoria da A teoria da Gestalt (do al. Gestalttheorie: teoria da forma) é um princípio psicológico, que se estendeu a outros domínios de conhecimento, segundo o qual não per-cebemos jamais senão conjuntos de elementos. Por exemplo, quando vejo algo, vejo ao mesmo tempo uma certa forma (no sentido de contorno ou forma geométrica), uma certa cor, uma certa distância etc. Esse conjunto percebido se chama forma, significando configuração, estrutura e organização. O gestaltismo é a teoria (principal-mente dos psicólogos Kurt Koff(a e Wolfgang Kõhler) segundo a qua] a percepção é um fato global redutível a um agrupamento de sensações, desenvolvendo-se no campo determinado pela pregnância das formas. Ela se apóia na análise das ilusões de ótica. Geulincx, Arnold (1624-1669) Filósofo flamengo (nascido em Antuérpia, Bélgica) cartesiano; foi professor em Leiden. Holanda; contribuiu para a divulgação da filosofia de Descartes, ou cartesianismo, nesse país, e também do *ocasionalismo, do qual foi um dos fundadores. Autor de um livro sobre lógica. Gilson, Etienne (1884-1978) Nascido em Paris, França, Gilson foi um dos mais importan-tes historiadores do pensamento filosófico da Idade Média da primeira metade de nosso século. Lecionou em Estrasburgo, na Sorbonne, no Collège de France e, finalmente, em Toronto (Canadá). Forneceu as bases históricas mais sólidas para o desenvolvimento do *neotomismo. Ninguém melhor do que ele elaborou uma síntese tão completa das influências do pensa-mento medieval, sobretudo de Tomás de Aqui-no, na filosofia moderna, sobretudo na de Des-cartes. Seu pensamento pessoal gira em torno de duas correntes: a gnoseológica, ou seja, uma teoria do conhecimento de cunho "realista metódico", e a metafísica, de inspiração tomista mas preocupada com uma interpretação "existencial" da realidade. Para ele, a realidade é, ao mesmo tempo, auto-identidade (platonismo), substância (aristotelismo), essência (agostinismo) e existência (tomismo). Obras principais: Le thomisme (1919), Etudes de philosophie mé- diévale (1921), La philosophie au Moyen Age, 2 vols. (1922), Saint Thomas d'Aquin (1927), Etudes sur le rôle de la pensée médiévale dans la formation du système cartésien (1930), L'es-prit de la philosophie médiévale (1932), Réalisme thomiste et critique de la connaissance (1939), L'être et l'essence (1948). Girard, René (1923-) Considerado o "He-gel do cristianismo", o filósofo francês (nascido em Avignon) Girard é professor na Universidade de Stanford (Califórnia). Ao analisar os tex-tos antropológicos e as grandes obras literárias, e após experimentar o que chama de a "hipótese mimética" de nossa atual sociedade de consumo, René Girard defende a tese segundo a qual a violência, o "assassinato fundador", encontra-se na origem de toda sociedade e de toda cultura. Ao desviar para uma vítima expiatória (logo imolada) a violência mimética desencadeada entre os membros do grupo, o assassinato fundador restaura a paz social e funda o religioso. Dessa forma, em todas as sociedades, os ritos e os interditos têm por finalidade prevenir o retorno da violência mimética o u repet i r os mecanismos do sacrifício pacificador. Acreditando que "de-vemos ho je pensar escandalosamente", ele denuncia o fracasso das ideologias, da filosofia e das ciências do homem, e elabora uma reflexão original sobre o Novo Testamento, o mais "subversivo" texto da história da humanidade, de-clara. Obras principais: Mensonge romantique et vérité romanesque (1961), La violence et le sacré (1972), Critique dans un souterrain (1976), Des choses cachées depuis la fondation du monde (1978), Le bouc émissaire (1982). Glucksmann, André (1937- ) Filósofo francês conhecido por sua militância junto aos chamados *"novos filósofos". Enquanto filósofo político e militante nas lutas travadas em prol dos direitos do homem, Glucksmann concebe a reflexão filosófica como inseparável das lutas contemporâneas. Por isso, no cerne de suas meditações, situa-se a teoria da guerra e da opressão: "Chamo moderno o mundo onde as guerras de religião, os campos de concentração e os poderes maciços de destruição tentam fun-dar uma ordem." Os temas constantes de suas obras são a guerra, a violência e o poder do Estado: Le discours de la guerre (1967), Stratégie et révolution en France (1968), La cuisinière et le mangeur d'hommes (1975), Les maîtres penseurs (1977), Le discours de la guerre: Eu-rope 2004 (1979), Cynisme et passion (1981), La force du vertige (1983). gnose (gr. gnosis: conhecimento) I. Na história das religiões, o termo "gnose" é reservado ao conjunto das doutrinas heréticas que, nos sécs.Il e III, ameaçaram a unidade do cristianismo. Em substância, a gnose consiste em afirmar a possibilidade da salvação religiosa pelo conhe- cimento intelectual, sem o dom direto da graça divina. Por extensão, o termo passou a designar o conhecimento esotérico e perfeito das coisas divinas pelo qual se pretende explicar o sentido profundo de todas as religiões. Em outras palavras, conhecimento das coisas religiosas superiores ao conhecimento comum dos crentes ou ao ensinamento das Igrejas. 2. Atualmente, a partir do livro de Raymond *Ruyer sobre La gnose de Princeton (1974), não são poucos os astrônomos, físicos e biólogos a se considerarem gnósticos, em busca de um conhecimento que deve desembocar numa sabedoria que nos protegerá dos perigos da civilização industrial, em particular, do excesso de informações no qual ela mergulha o indivíduo. Os gnósticos desconfiam também das ciências humanas e de todas as falsas espiritualidades. A sabedoria gnóstica é a conseqüência de uma ontologia não-materialista. As categorias explicativas do mecanicismo são cientificamente obsoletas, as causas mecânicas ou eficientes de-vendo ser substituídas por causas "informacionais". E sobre o modelo da percepção ou da memória que os gnósticos representam para si mesmos todos os elos existentes no universo. Assim, acreditam numa dimensão invisível do real, em algo que está além do espaço e do tempo e num Deus monista e panteísta, pois, no começo, temos o Logos, a Consciência, a Vida, o Grande Ordenador. gnoseología (do gr. gnosis: conhecimento, e logos: teoria, ciência) Teoria do *conhecimento que tem por objetivo buscar a origem, a natureza, o valor e os limites da faculdade de conhecer. Por vezes o termo "gnoseología" é tomado como sinônimo de *epistemología, embora seja mais amplo, pois abrange todo tipo de conheci-mento, estudando o conhecimento em sentido mais genérico. gnosticismo (do gr. gnostikós: que sabe). 1. Conjunto de correntes situadas à margem do cristianismo, surgidas nos dois primeiros séculos de nossa era, na bacia mediterrânea, e pregando uma salvação religiosa pelo conhecimento intelectual, Foram condenadas pela Igreja católica. 2. Por extensão, gnosticismo é toda doutrina que supõe existir um conhecimento superior ou uma explicação total das coisas, sem vínculos necessários com uma religião. Gõdel, Kurt (1906-1978) Matemático e 16-gico nascido em Brno, Tcheco-Eslováquia; foi professor na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, a partir de 1938, destacando-se por seus teoremas sobre os limites dos sistemas formais e influenciando fortemente o desenvolvimento da lógica e da matemática neste século. Em 1931, publicou uma prova da existência de sentenças indecidíveis em qualquer sistema for-mal da aritmética, conhecido como teorema de Gõdel ou teorema da incompletude da aritmética. Simplificadamente, o teorema de Gõdel estabelece que em qualquer sistema formal S da aritmética haverá uma sentença P da linguagem de S tal que se S é consistente nem P nem sua negação poderão ser demonstrados em S. Como corolário desse teorema temos o chamado segundo teorema de Gõdel, estabelecendo que a consistência de um sistema formal da aritmética não pode ser demonstrada formalmente no próprio sistema; ou seja, nenhum sistema formal contém em si mesmo a prova de sua consistência. Os teoremas de Gõdel tiveram grande importância na discussão sobre os fundamentos da matemática por mostrarem as limitações inter-nas dos sistemas formais, levando à revisão dos projetos em filosofia da ciência que pretendiam encontrar na lógica matemática a linguagem perfeita para a ciência. Escreveu: Sobre a completude do cálculo lógico, tese (1930), além de vários artigos e ensaios, entre os quais "Alguns resultados meta-matemáticos sobre completude e consistência" (1930) e "A consistência da hipótese do contínuo" (1940). Goldmann, Lucien (1913-1970) Radicado na França a partir de 1934, o filósofo romeno (nascido em Bucareste) Lucien Goldmann foi bastante influenciado por Lukács, Max Weber, Dilthey e Jean Piaget. Tornou-se muito conhecido com sua obra O deus escondido (Le dieu caché, 1956), na qual, utilizando uma metodologia marxista, elabora uma interpretação original de Pascal e Racine, estudando-os em seu contexto sócio-histórico-cultural. Advogando sempre um "marxismo aberto" ou "não- ortodoxo", contribuiu bastante para a elucidação dos fundamentos filosóficos das ciências humanas, fundado na idéia de uma "consciência possível" e no método dialético. Defendeu a tese de que a filosofia não é uma arquitetura dogmática imposta aos fatos humano-sociais, mas um instrumento para interpretá-los. Obras principais: In- troduction à la philosophie de Kant (1948), Sciences humaines et philosophie (1952), Le dieu caché: Etude sur la vision tragique dans les "Pensées" de Pascal et dans le théatre de Racine (1956), Marxisme et sciences humaines (1970). Górgias (c.485-380 a.C.) O retórico e filósofo grego (nascido na Sicília) sofista Górgias foi professor de oratória e retórica em Atenas. Como filósofo, não acreditava na existência de uma ciência real. Para ele, é impossível saber o que existe verdadeiramente e o que não existe. Nada existe, porque nem o ser nem o não-ser são dados da experiência. Por isso, não há uma relação do ser com o não-ser, pois o juízo se tornaria impossível caso o ser participasse do não-ser e vice-versa. Se existisse alguma coisa, não poderíamos eonhecê-la, porque a realidade sensível não é inteligível, e o que seria inteligível não é dado, portanto é inexistente. Se pode-mos conhecer alguma coisa, nada podemos dizer sobre ela. Uma vez que a linguagem é perfeita- mente arbitrária, as palavras traem o pensamento. Portanto, todo juízo distinto de "o ser é" (juízo estéril por sua imobilidade) é absurdo, pois confunde sujeito e atributos. gosto (lat. gustus: sabor) 1. Um dos cinco sentidos, sinônimo de paladar, tornou-se, num sentido genérico, o instrumento e o árbitro do discernimento estético. 2. Na filosofia de Kant, o gosto é a "faculdade de julgar o belo". Quando ele fala em "juízo do gosto", quer dizer duas coisas: a) "o gosto é a faculdade de julgar um objeto ou um modo de representação, sem nenhum interesse, por uma satisfação ou uma insatisfação. Chama-mos de belo o objeto de uma tal satisfação" ; b) "pelo juízo do gosto (sobre o belo), atribuímos a cada um a satisfação proporcionada por um objeto ... Poderíamos mesmo definir o gosto pela faculdade de julgar aquilo que torna nosso sen- timento, procedendo de uma representação dada, universalmente comunicável, sem a mediação de um conceito" . graça (lat. gratia: favor) 1. Na linguagem teológica, dom gratuito concedido por Deus a um crente concernente à sua salvação, à remis-são de seus pecados ou à sua constância na provação — graça natural, quando o eleva ao estado sobrenatural; graça atual, quando lhe permite praticar o bem e evitar o mal. Foi a propósito da graça que se desenvolveu a querela da *casuística. 2. Na linguagem estética, é uma qualidade (ritmo, charme etc.), própria do movimento real ou sugerido, por vezes situada acima da beleza ou considerada como uma forma de beleza que consiste na harmonia e no charme das formas, das atitudes e dos movimentos das coisas e dos seres. Gramsci, Antonio (1891-1937) Político e pensador marxista italiano; foi um dos fundado-res do Partido Comunista Italiano em 1921. sendo nomeado seu secretário geral em 1924. Eleito deputado logo em seguida, foi preso pelo regime fascista, vindo a morrer na prisão, onde compôs grande parte de sua obra teórica. Para Gramsci, o marxismo deve ser interpretado como uma "filosofia da praxis", como urna prática política revolucionária com uma firme base teórica. Divergiu da interpretação oficial do marxismo na União Soviética sob Stalin. e pro-curou recuperar os elementos dialéticos hegelianos da teoria marxista. E considerado um dos inspiradores do eurocomunismo contemporâneo. A maior parte de sua obra foi publicada postumamente, destacando-se as Cartas da prisão (1947) e os Cadernos da prisão, 6 vols. (1964). Toda a sua formação e seus escritos devem ser colocados sob o signo da história e do historicismo. Porque seu pensamento crítico se elabora a partir de três questões básicas: por que história? corno a história? que história? E é em sua representação do marxismo que vai encontrar suas razões da história: "os cânones do materialismo histórico só são válidos post Jactuni", não devendo tornar-se uma hipótese sobre o presente e o futuro, grandeza (do lat. grandis: grande) Tudo aquilo suscetível de mais ou de menos, podendo ser mensurado direta ou indiretamente por referência a uma escala graduada. Há duas espécies de grandezas: contínuas (extensão geométrica) e descontínuas (números). gratuito, ato Ato que seria praticado por um indivíduo sem nenhuma outra determinação ou motivação senão o capricho ou o arbítrio do momento (ou instante) que, apesar de racional. representa o exercício de uma arbitrariedade total. O objetivo de um ato gratuito, para aquele que o realiza, é o de afirmar, contra a moral e, mesmo, contra a razão, sua liberdade. Trata-se de uma noção mais literária que filosófica, introduzida por André Gide. gregarismo (do lat. gregarios: relativo a re-banho) Atitude ou tendência mais ou menos instintiva de certos seres vivos a se unirem para formar bandos com o objetivo de viverem, como rebanho, uniões duráveis. No homem, essa tendência, chamada de mentalidade gregária, leva os indivíduos a uni certo conformismo e a ado-tarem passivamente os modos de pensar, sentir, agir e reagir do grupo. Grotius, Hugo (1583-1645) 0 jurista e estadista holandês (nascido em Delft) Huig de Groot, mais conhecido pelo nome latino de Hugo Grotius. foi preso por questões religiosas e condenado á prisão perpétua em seu país (1619). F,m 1621. conseguiu fugir para a França e. no momento em que o direito divino se tornou a doutrina oficial da monarquia absoluta na França. Hugo Grotius publicou seu O direito da guerra e da paz (1625), inaugurando o direito internacional num domínio particularmente cruel: o da guerra. Nessa obra, afirmava e demonstrava que existe um direito natural (jus gentium, direito das gentes), independente da religião, baseado na razão e nas necessidades humanas fundamentais. Esse direito natural (primeira fórmula dos Direitos do Homem), expressão mais segura de uma consciência moral uni-versal, fundava o direito internacional, portanto, devia aplicar-sc á guerra. Porque a guerra não se justifica por um objetivo de paz, dizia Grotius. Por isso, a primeira providência a se tomar, no final de uma guerra. é eliminar-se todo traço de ódio possível dc reiniciá-la. Daí a obrigação de se instaurar um direito concernente ao tratamento dos prisioneiros. às alianças militares etc.. pois "não podemos nos permitir tudo", diz Grotius. que invoca a humanidade, a opinião pública e o julgamento de Deus. Seu direito natural vai inspirar o séc.XVlll, sobretudo Locke e Rousseau. Guattari, Felix (1930-1992) Filósofo, psicanalista e militante pol i t ico. defensor das causas das minorias e mais recentemente também da ecologia, nascido na França. Notabilizou-se sobretudo por sua obra O anti-Edipo (1972). escrita em parceria com *Deleuze, em que questiona alguns dos pressupostos tradicionais da psicanálise freudiana, abrindo caminho para a valorização das relações entre o inconsciente e o campo social. Aplicava suas concepções teóricas na Clínica La Borde, onde dedicava-se ao tratamento de psicóticos. Foi ainda autor dentre outras obras de Caosmose; um novo paradigma estético (1992), e O que é a filosofia? (1992), também com Deleuze. Hartmann se propôs elaborar uma filosofia sis-temática que desse conta cias questões centrais da tradição filosófica. caracterizando esse seu projeto corno "uma filosofia de problemas". Nesse sentido, é uni dos poucos filósofos do séc.XX a desenvolver urna obra englobando todos os campos fundamentais da filosofia: ontologia. filosofia da natureza, filosofia do espírito, estética, teoria do conhecimento e lógica, ordem segundo a qual se constitui para ele o sistema filosófico. Principais obras: Metafisica do conhecimento (1921), A filosofia do idealismo alemão, 2 vols. (1923-1929), Fundamentos de ontologia (1935), Possibilidade e efetividade (1938). A estrutura do mundo real (1940), Filosofia da natureza (1950). hedonismo (do gr. hedoné: prazer) I. Nome genérico das diversas doutrinas que situam o prazer como o soberano bem do homem ou que admitem a busca do prazer corno o primeiro princípio da moral: a doutrina dos cirenaicos. 2. Num sentido mais estrito, o hedonismo pode ser entendido corno um pensamento egocêntrico e egoísta, preocupado apenas com os prazeres. O fenômeno atual do consumismo, freqüentemente acompanhado de uma certa preguiça intelectual e moral, ilustra esse modo de pensar. Enquanto se opõe às morais tradicionais do esforço e da renúncia, o hedonismo constitui o modo de pensar de certos discípulos de Nietzsche. Não confundi-lo com *epicurismo, para o qual a felicidade consiste na total ausência de perturbação (ataraxia). Hegel, Georg Wilhelm Friedrich (1770-1831) O mais importante filósofo do idealismo alemão *pós-kantiano e um dos que mais influenciou o pensamento de sua época e o desenvolvimento posterior da filosofia, Hegel nasceu em Stuttgart, na Alemanha, estudou filosofia na Universidade de Tübingen e foi professor nas Universidades de lena (1801-1806). Heidelberg (1816-1818) e Berlim (1818-1831), chegando a reitor desta última (1829). Pode-se considerar a filosofia de Hegel corno o último grande sistema da tradição clássica. Seu pensamento. extrema-mente complexo, desenvolveu-se na tradição do idealismo alemão. devendo ser compreendido sobretudo como uma ruptura com a filosofia transcendental kantiana. Partindo de urna refle- xão sobre os grandes eventos históricos como a Revolução Francesa e as guerras napoleônicas, que marcaram a época em que viveu. Hegel considerava que a análise da consciência, realizada na perspectiva transcendental, ignorava a origem e o processo de formação dessa cons-ciência, tomando-a como dada e analisando-a em abstrato. Sua filosofia parte assim da necessidade de examinar, em primeiro lugar. as etapas de formação da consciência, tanto em seu senti-do subjetivo, no indivíduo, quanto em seu sen-tido histórico, ou cultural, representado pelo desenvolvimento do espírito (Geist). A Fenomenología do espírito (1807), subintitulada "ciência da experiência da consciência", é a obra que inaugura esse pensamento. que será desenvolvi-do de forma sistemática em obras subseqüentes, bem como em cursos e conferências. Hegel traça aí o percurso da consciência humana até chegar ao espírito absoluto, ou ainda, as etapas do caminho que o espírito percorre através da cons-ciência humana até chegar a si mesmo. Em sua Ciência da lógica (1816), formula sua "filosofia do conceito", através da qual pretende examinar "a natureza das eventualidades puras que for-mam o conteúdo da lógica ... os pensamentos puros, o espírito que pensa, sua essência". A filosofia de Hegel é dialética, porém esta não deve ser vista aí como um método, mas como uma concepção do real mesmo, a contradição constituindo a essência das próprias coisas: "to-das as coisas são contraditórias em si". Segundo Hegel, portanto, em suas Lições sobre a história da filosofia (1819-1828), os grandes sistemas filosóficos do passado não devem ser vistos como um conflito em si, mas como antecipando, de alguma forma, uma parcela da verdade sobre o real. O seu sistema representaria assim o fim da filosofia, a superação da oposição entre os diferentes sistemas e a síntese das verdades que todos contêm, resultado de sua análise das etapas do desenvolvimento do espírito. Suas principais obras, além das já citadas, são: Propedêutica filosófica (1809- 1816), Enciclopédia das ciências filosóficas (1817) e Princípios da filosofia do direito (1821). hegelianismo Nome genérico atribuído ao destino póstumo da filosofia de Hegel, que for-mou um grande número de discípulos que logo se dividiram em dois grupos: os hegelianos de direita e os hegelianos de esquerda. Assim. o impacto do sistema hegeliano sobre a filosofia foi inegável. Esse sistema, que se esforça por reunir o espírito e a natureza, o universal e o particular, o ideal e o real, foi tomado como referência. tanto por pensadores conservadores (de direita) quanto por revolucionários (de esquerda), tanto por crentes quanto por ateus. Os hegelianos de direita se tornaram os campeões do liberalismo. Quanto aos hegelianos de esquerda, apoiando-se na teoria da religião e da sociedade, converteram-se em defensores ardorosos da transformação revolucionária da sociedade. Entre estes últimos, Feuerbach e Marx foram os mais ilustres. Lenin dizia: "Para se compreender Marx, é preciso ter compreendido Hegel."Ver Hegel; devir; historicidade. Heidegger, Martin (1889-1976) Um dos filósofos alemães mais importantes e influentes deste século, Heidegger nasceu em Messkirch e foi inicialmente professor na Universidade de Freiburg (1916), onde havia estudado com *Husserl. Em 1923, foi nomeado professor-titular na Universidade de Marburgo e sucedeu a 1-Iusserl na cátedra de filosofia em Freiburg (1928), chegando a reitor da universidade por um breve período (1933). O envolvimento de Heidegger com o nazismo, ainda que possa ser considerado superficial, fez com que, após a ocupação da Alemanha em 1945 pelos aliados, fosse afastado da universidade. Autorizado a retornar em 1952. voltou a lecionar, entretanto de forma intermitente. A obra mais marcante de Heidegger. que no entanto permanece inacabada, é Ser e tempo (1927), na qual se afasta da *fenomenologia de seu mestre Husserl e inicia seu caminho de reflexão sobre o sentido mais profundo da existência humana, bem como sobre as origens da metafísica e o significado de sua influência na formação do pensamento ocidental. Procura assim recuperar a importância fundamental da questão do *ser, que na tradição do pensamento moderno dera lugar à problemática do conhecimento e da ciência. E necessário para Heidegger realizar uma destruição da onto-logia tradicional para recuperar o sentido original do ser. Propõe assim toda uma nova terminologia filosófica que possa dar conta desse sentido. A existência só pode ser compreendida a partir da análise do *Dasein (o ser-aí), do ser humano aberto à compreensão do ser. Heidegger retoma, em seguida. a questão clássica da tradição filosófica — o problema da *verdade — examinando-a em relação aos conceitos de ser e conhecer. para estabelecer sua gênese e seu sentido. Segundo Heidegger, a filosofia é uma exploração contínua: "o permanente em um pensamento é o caminho". A partir dos anos 30, dá-se a Limosa "virada" (Kehre) em seu pensa-mento. Busca então nos fragmentos dos pré-socráticos (sobretudo *Parmênides e *Heráclito) as fontes da filosofia e uma forma mais direta e originária de apreensão do ser, de sua presença. de sua manifestação, anterior A. constituição da noção metafísica de verdade, que segundo ele, nasceu com *Platão. E através da linguagem. sobretudo da linguagem poética, que essa apreensão se dá, já que "a linguagem é a morada do ser". Em sua fase final, a obra de I Ieidegger torna-se menos sistemática, mais fragmentária, mais poética, correspondendo à sua visão de um sentido mais originário do pensamento filosófico e de sua forma de expressão. Suas principais obras são: Ser e tempo (1927), Kant e o problema da metafísica (1928), Sobre a essência da verdade (1930, publicada em 1943), Introdução à metafísica (1935, publicada em 1953), Caminhos que não levam a lugar nenhum (Holzwege, 1950), Carta sobre o humanismo (1946), além de inúmeros artigos, ensaios e conferências publicados em coletâneas. Heisenberg, Carl Werner (1901-1976) Físico alemão, estudou nas Universidades de Munique e Gottingen, e foi professor nas Universidades de Leipzig (1927-1941) e Berlim (1941-1945). Em 1932, recebeu o Prêmio Nobel de Física. Desenvolveu importantes pesquisas no campo da mecânica quântica, revelando sem-pre uma preocupação com as relações entre física e filosofia no que diz respeito aos funda-mentos da física e às implicações filosóficas das novas teorias surgidas nesse campo. São impor-tantes para a filosofia, especialmente em relação ao problema da causalidade, as conseqüências de seu "princípio da incerteza"ou da indeterminação. Obras principais: Princípios físicos da teoria dos quanta (1930), Mudanças nos funda-mentos da ciência natural (1935). Problemas filosóficos da ciência nuclear (1952), Física e filosofia: a revolução na ciência moderna (1956). Ver indeterminismo. helenismo Em um sentido amplo, helenismo refere-se à influência que a cultura grega (helênica, de Hellas. ou Grécia) passou a ter no Oriente Próximo (Mediterrâneo oriental: Síria, Egito, Palestina, chegando até a Pérsia e Mesopotâmia) após a morte de Alexandre (323 a.C.) e em conseqüência de suas conquistas. Como um dos períodos em que se divide tradicional-mente a história da filosofia, o helenismo vai da morte de Aristóteles (322 a.C.) ao fechamento das escolas pagãs de filosofia no Império do Oriente pelo imperador Justiniano (525 d.C.). O período do helenismo é marcado na filosofia pelo desenvolvimento das escolas vinculadas a uma determinada tradição, destacando-se a *Academia de Platão, a escola aristotélica, a escola epicurista, a escola estóica, o *ceticismo e o pitagorismo. Nessa época, houve uma tendência predominante ao ecletismo e muitos filósofos sofreram a influência de diferentes escolas. O principal centro de cultura do helenismo foi Alexandria no Egito. heliocentrismo (do gr. helios: sol, e lat. centrum: centro) Sistema astronômico de Copérnico e de Galileu segundo o qual não é a Terra, mas o Sol, o centro de nosso sistema planetário; a Terra, como os demais planetas, giraria em torno do Sol (revolução) e em torno de si mesma (rotação). Ver geocentrismo; Aristarco de Sa-mos. Helvétius, Claude Adrien (1715-1771) Filósofo materialista francês, colaborador da *Enciclopédia, partidário do *sensualismo ateu segundo o qual tudo, inclusive o juízo intelectual, deve ser explicado pela sensibilidade física. Para ele, o prazer e a dor desempenham um papel importante na vida psíquica; e o interesse constitui uma noção central da existência indi- vidual. Em sua obra básica, Do homem, de suas faculdades intelectuais e de sua educação (1772), afirma o papel determinante das relações entre indivíduo e sociedade, e da educação como emanando da sociedade. Escreveu também o tratado Do espírito (1758). Hempel, Carl Gustav (1905- ) Filósofo da ciência alemão (nascido em Orianenburg) radicado nos Estados Unidos desde 1937, Hempel sempre esteve ligado ao movimento do *empirismo lógico, mas sem seguir dogmaticamente suas posições. Preocupado, sobretudo, com a análise lógica da linguagem científica, escreveu dezenas de artigos para elucidar os problemas da formação dos conceitos científicos, os problemas básicos da indução e da confirmação das hipóteses. e para examinar a função das leis gerais na história (para ele, a explicação histórica deveria ser semelhante à explicação das ciências naturais). Seus dois livros mais impor-tantes são: Aspects of Scientific Explanation and Other Essays in the Philosophy of Science (1965) e Philosophy of Natural Science (1966). Heraclides do Ponto Filósofo e astrônomo grego do séc.1V a.C.; foi discípulo de Platão. É considerado o primeiro a afirmar que a Terra girava em torno de seu próprio eixo. Restam apenas fragmentos de suas obras. heraclitismo Nome genérico das diversas doutrinas inspiradas em Heráclito, afirmando uma filosofia da mobilidade universal e negando a possibilidade de se manter um discurso coe-rente sobre o ser sem se fazer apelo a uma noção contraditória: o logos (espécie de "razão co-mum") é o princípio unificador do discurso, capaz de harmonizar as forças opostas, mesmo que essa harmonia se exprima no conflito ("pai de todas as coisas"). Por extensão, toda doutrina que considere a mudança e o devir como a substância fundamental das coisas. Per Heráclito; devir. Heráclito (sécs.Vl-V a.C.) Considerado o filósofo do *devir, do vir-a-ser, do movimento, o grego (nascido em Efeso) Heráclito é o mais importante pré-socrático. Filósofo melancólico e obscuro, de estilo oracular, contentava-se com a representação: o sol é novo cada dia. O uni-verso muda e se transforma infinitamente a cada instante. Um dinamismo eterno o anima. A substância única do cosmo é um poder espontâneo de mudança e se manifesta pelo movimento. Tudo é movimento: 'Punta rei", isto é, "tudo flui", nada permanece o mesmo. As coisas estão numa incessante mobilidade. E a verdade se encontra no devir, não no ser: "Não nos banha-mos duas vezes no mesmo rio." E a unidade da variedade infinita dos fenômenos é feita pela "tensão oposta dos contrários". "Tudo se faz por contraste", declarou. "Da luta dos contrários é que nasce a harmonia." Se nossos sentidos fosse m bastante poderosos. veríamos a universal agitação. Tudo o que é fixo é ilusão. A imortalidade consiste em nos ressituarmos no fluxo universal. O pensamento humano deve participar do pensamento universal imanente ao uni-verso. E o princípio unificador que governa o mundo é o *logos. Herbart, Johann Friedrich (1776-1841) Pode ser considerado como o lógico e o organizador da pedagogia moderna e o projetador da psicologia científica. Seus dois livros fundamen- tais, Pedagogia geral deducida do fìm do echrcação (1806) e .1 psicologia como ciência (1824-1825) constituem uma resposta a Wolff e Kant. Conferiu á pedagogia uma missão humanista e humanitária: a de formar o homem do futuro, de modelar o homem universal através do desabrochamento do individual. Admite que é pelo sentido e pelo sensível que todo conheci-mento se constrói. Para ele, "instruir é fazer nascer e fazer adquirir idéias". Daí todo o segredo da educação: "despertar o interesse para assegurar a apercepção" dos alunos. O educador deve-se referir incessantemente à experiência. São quatro os tempos do "ato didático": a) mostrar (descrever, observar, detalhar, analisar etc.); b) associar (comparar, ordenar, apreender relações. pôr em ordem etc.); c ) sistematizar (extrair a lei, fazer a síntese, induzir, deduzir, raciocinar); d) praticar (executar o aprendido, reconhece-lo no real, realizá-lo, aplicá-lo). Herder, Johann Gottfried (1774-1803) Filósofo alemão (nascido em Mohrungen) das Luzes, discípulo de Kant. Embora discordando da filosofia transcendental e rompendo com o mestre, Herder elaborou uma teoria do conheci-mento em que a origem do conhecimento deve ser procurada nas sensações da alma; por sua vez, as categorias deixam de ser noções trans- cendentais para se converterem em resultados da organização da vida. Sua doutrina da l inguagem e sua filosofia da história levaram-no a considerar a linguagem em seu caráter evolutivo cons-tante e a reconhecer que todas as realidades naturais evoluem e progridem: todo o universo possui um caráter evolutivo-histórico. Preocupado com o concreto e com o individual, estudou as comunidades humanas, suas linguagens, seus costumes, suas religiões e suas "mentalidades". Livros mais importantes: Tratado sobre a origem da linguagem (1772), Outra filosofia da história da humanidade (1774), Do conhecer e do sentir da alma humana (1778), idéias para uma filosofia da história da humanidade, 4 vols. (1784-1791), Entendimento e experiência, razão e linguagem, uma metacrítica da razão pura (1800). heresia (lat. haeresis, do gr. hairesis: ação de tomar, escolha, seita) Doutrina contrária aos ensinamentos oficiais de uma Igreja e a seus dogmas religiosos: a heresia jansenista. Por ex-tensão, toda doutrina contrária às concepções estabelecidas ou oficialmente reconhecidas corno verdadeiras: a idéia de movimento perpétuo real é urna heresia científica. hermenêutica (gr. hermeneutikós, de hermeneuein: interpretar) I. Termo originalmente teológico. designando a metodologia própria à interpretação da Bíblia: *interpretação ou exegese dos textos antigos, especialmente dos tex-tos bíblicos. 2. 0 termo passou depois a designar todo esforço de interpretação científica de um texto difícil que exige urna explicação. No século XIX, Dilthey vinculou o termo "hermenêutica-d sua filosofia da "compreensão vital": as for-mas da cultura, no curso da história, devem ser apreendidas através da experiência íntima de um sujeito; cada produção espiritual é somente o reflexo de uma cosmovisão (Weltanschauung) e toda filosofia é uma `'filosofia de vida". 3. Contemporaneamente. a hermenêutica constitui uma reflexão filosófica interpretativa ou compreensiva sobre os símbolos e os mitos em geral. O filósofo Paul Ricoeur. por exemplo, fala de duas hermenêuticas: a) a que parte de uma tentativa de transcrição filosófica do freudismo, concebido como um texto resultando da colaboração entre o psicanalista e o psicanalisado: b) a que culmina numa "teoria do conheci-mento", oscilando entre a Leitura psicanalítica e uma fenomenologia. hermetismo 1. De Hermes, deus grego que, entre outros atributos, possuía o "conhecimento sutil". Os livros herméticos_ atribuídos ao deus egípcio Hermes Trimegisto, cujos fragmentos foram encontrados no séc.11l e traduzidos para o grego no séc.XV (por Marsilio Fieino). contêm uma doutrina filosófica oculta, cultivada por certos alquimistas da Idade Média. Apresentam- se como uma iniciação a uma espécie de alquimia espiritual, e têm por fundamento certas correspondências secretas entre o visível e o invisível, entre o homem e o universo, ou seja, entre o microcosmo e o macrocosmo: o hermetismo abriria o acesso à luz que faz do homem um ser novo como o ouro original, que o arrancaria da matéria e o conduziria ao Deus do amor. revelado em sua criação. O hermetismo influenciou bastante o Iluminismo e, no séc.XIX, foi retomado como etiqueta para o ocultismo. 2. Característica de todo pensamento considerado hermético, isto é. fechado, de difícil acesso e compreensão, necessitando de uma interpretação que revele seu sentido ou só podendo ser decifrado por iniciados. Hessen, Johannes (1889-1971) Professor de filosofia na Universidade de Colônia (nasceu em I,obberich_ Alemanha) e sistematizador de várias disciplinas filosóficas. Hessen, bastante influenciado pelo agostinismo, procurou elaborar uma filosofia cristã suscetível de articular as principais contribuições da *fenomenologia, do *neokantismo e da teoria dos valores. Obras principais: A filosofia da religião do neokantismo (1919). Teoria do conhecimento (1926), O problema da substância na filosofia moderna (1932), Filosofia dos valores (1940), Tratado de filosofia, 3 vols. (1947-1950). heterodoxia (gr. heterodoxos: que tem uma opinião diferente) Toda doutrina ou opinião contrária a um saber oficial, instituído e institucionalizado. seja de ordem filosófica, religiosa, política etc. Per heresia. Oposto a ortodoxia. heteronomia (do gr. heteros: outro, e nomos: lei) Condição de um indivíduo ou de um grupo social que recebe de fora. de um outro, a lei à qual obedece. Em *Kant, por oposição à *autonomia da vontade. a heteronomia compreende todos os princípios da moralidade aos quais a vontade deve submeter-se: educação, constituição civil. sentimentos etc. heurístico (do gr. l,euriskern: encontrar) 1. Que se refere à descoberta e serve de idéia diretriz numa pesquisa, de enunciação das condições da descoberta científica. 2. Diz-se que um método é heurístico quando leva o aluno a descobrir aquilo que se pretende que ele aprenda: a maiêutica socrática é. por excelência, um método heurístico. Não devemos confundir heurística ou hipótese de trabalho com *erística, do grego eristikos, que anima a disputa, a controvérsia. A erística é a arte da discussào e de manejar, no debate, sutilezas lógicas, hilemorfismo ou hilomorfismo (do gr. hylé: matéria, e morphé: forma) Doutrina aristotélico-tomista segundo a qual todos os corpos constituem o resultado de dois princípios distintos mas absolutamente complementares: a matéria (helé) e a forma (morphé); a matéria sendo aquilo de que a coisa é feita (pedra, madeira etc.), e a forma que faz com que a coisa seja isto ou aquilo utilitário. Na guerra de todos contra todos, há a necessidade de um pacto social entre os indivíduos-cidadãos, cada um renunciando à sua liberdade em favor do soberano absoluto. Holbach, Paul Henri (ou Heinrich) Dietrich, Barão de (1723-1789) Filósofo francês (nascido na Alemanha), radicado desde cedo em Paris. Inteiramente dedicado ao estudo e à atividade literária, conviveu com todos os intelectuais de sua época e foi grande colabora-dor da *Enciclopédia. Considerado o "Mecenas dos filósofos", fez uma crítica severa das crenças cristãs e lutou contra todos os tipos de preconceitos: religiosos, sociais e políticos. Inteiramente favorável à visão mecánica do mundo, fez uma verdadeira apologia da ciência, da natureza e da razão. Sua filosofia é profunda-mente naturalista e materialista. Para ele, só havia uma realidade: a matéria. Não há Providência nem acaso. O homem nada mais é do que uma parte da natureza material. Holbach com-bateu tanto o *teísmo quanto o *destino e aderiu sem vacilar ao *ateísmo materialista. Obras principais: O sistema da natureza ou as leis do mundo físico e do mundo moral (1770), 0 bom senso ou as idéias naturais opostas às idéias sobrenaturais (1772), O sistema social (1773 ), .l política natural. 2 vols. (1773), ,-1 moral universal (1776). holismo (ingl. holism, do gr. holos: total, completo) I. Doutrina que considera que a parte só pode ser compreendida a partir do todo, que privilegia a consideração da totalidade na explicação de uma realidade, sustentando que o todo não é apenas a soma de suas partes, mas possui uma unidade orgânica. 2. Em biologia, é a doutrina que considera o organismo vivo como um todo indecomponível. 3. Teoria formulada pelo estadista sul-africano Jan Christiaan Smuts (1870-1950). cm sua obra Holism and Evolution (1926), afirmando que o universo e especialmente a natureza viva constituem-se de unidades que formam "todos" (como organismos vivos) que sào mais do que a simples soma das partículas elementares. 4. Holista: adepto ou seguidor do holismo: holista ou holistico: relativo ao holismo (ex.: teoria holística ou holista, sistema holístico ou holista). Holton, Gerald (1922- ) Filósofo e historia-dor das ciências norte-americano que recebeu parte de sua formação em Viena antes de estabelecer-se nos Estados Unidos. Sua obra remete diretamente à de Alexandre Koyré, de quem retomou o método rigoroso; sofreu a influência de Gaston Bachelard. Seus dois livros funda-mentais. Thematic Origins of Scientific Thought (1973) e The Scientifc Imagination (1978) vêm-nos lembrar que o progresso científico não é outro senão o progresso literário, filosófico ou artístico e que as preocupações fundamentais do homem moderno se ligam diretamente às das gerações passadas. Professor de história das ciências em Harvard, I lolton fundou a revista Science, Technology and Human Values, por estar convencido de que os cientistas manifestam certa indiferença em relação à história das ciências. Diferentemente daqueles que só se interessam pelos períodos gloriosos do passado das ciências. Holton, à semelhança de Bache-lard, não estudou a ciência do passado, mas a ciência atual cm seu passado. Suas investigações versam, em grande parte, sobre a natureza da imaginação científica, a natureza da imaginação individual do cientista articulando-se com o desejo coletivo de inovação, no qual se entrelaçam tanto as determinações psicológicas quanto as determinações sócio-econômicas. Essa concepção ilumina numerosas questões essenciais ao trabalho científico, seu funcionamento e sua organização. Por isso, a história das ciências. nessa perspectiva, desempenha um papel impor-tante de elo de ligação entre a epistemologia e a "política das ciências". Porque a ciência é um fato cultural total, não devendo vais prevalecer o mal-entendido histórico entre ciência e filoso-fia, humanismo e tecnologia. homem (lat. homo, hominis) O que é o homem? Seria um objeto real ou apenas uma idéia? Seria uma certa variedade animal, que os antropólogos chamam de Horno sapiens? O fato é que o homem existe no planeta Terra há dezenas de milhares de anos. Hoje em dia, quando se fala da ''morte do homem" (M. Foucault), trata-se da idéia ocidental de homem, criada pelo cristianismo e pela Antigüidade greco-latina. A Biblia afirma a posição dominante do homem sobre a natureza (Adão. Noé) e conta a Aliança que o Deus único e criador estabeleceu com urna parte dos descendentes de Adão. Além disso, afirma que o próprio Deus se fez homem para salvar os homens. O fato de o homem relacionar-se com Deus torna-o diferente do resto da natureza. Aos poucos, o pensamento grego ela-bora a idéia de que o homem é "um animal dotado de razão" (Aristóteles). As duas corren-tes vão-se encontrar na Idade Média, graças aos esforços conceituais da escolástica. Com o Re-nascimento, há uma reviravolta: a Terra deixa de ser o centro do mundo. gira em torno do Sol. descobre-se a existência de outros homens além do oceano etc. E a época do humanismo, na qual a idéia de homem vai laicizar-se. Utiliza-se a matemática para se descrever e conhecer o mundo (Galileu, Newton). Na dúvida metódica de Descartes, a única evidência que subsiste é o "eu penso. logo existo". Tudo o que não é pensa- mento é reduzido à extensão submetida às leis matemáticas da mecânica. Assim, o homem se converte num ser abstrato. num mestre do uni-verso, simplesmente porque sabe que pensa e porque sabe medir a extensão. O prodigioso desabrochar das ciências parece confirmar essa visão (a *Enciclopédia e a filosofia das Luzes). No séc.XIX, o homem, sujeito do conhecimento desde o séc.XVII, torna-se objeto de conheci-mento: começam a nascer as ciências do homem. Darwin situa o homem numa linhagem evolutiva e mostra que ele também é um animal. Marx mostra que os homens não dominam as leis da economia, mas são dominados por elas. A psicologia descobre que o homem está longe dc fazer o que quer, de ser o que acredita ser. A idéia de homem é abalada. Questiona-se o cerne mesmo dessa idéia: a razão. O que entendemos hoje por homem? Afinal, "o que é o homem'?", se perguntava Kant. Se a idéia de homem morreu, nem por isso o homem concreto deixou de existir. homeomerias (gr. homoiomereia: "semen-tes" das coisas) Termo criado por Aristóteles para designar os elementos "materiais" ou as "sementes" das coisas que. na doutrina de Anaxágoras, se reúnem para formar os diferentes corpos existentes no mundo. Estas ''sementes', que se encontravam confundidas com o caos primitivo, foram agregadas a partir do momento em que esse caos foi ordenado por uma inteligência (* "vous"). Cada "semente" de cada cor-po se encontra cm todo corpo. Assim, chamamos de "ouro", por exemplo, aquele corpo que contém o maior número de "sementes" de ouro. Homo fiber Expressão criada por Bergson para designar, em oposição ao Homo sapiens dos zoologistas. o homem primitivo quando, guiado apenas pelos instintos, revelou-se um fabricador de instrumentos antes de "pensar" propriamente: é da essência do homem "fabricar coisas e fabricar a si mesmo" (Bergson). Ao ser popularizada essa expressão, passou-se a atribuir ao Honro faber os produtos das indústrias rudimentares e "arcaicas" da era pré-industrial. Dela surgiram outras expressões: Homo oecono- micus (designando o modelo ideal sobre o qual os economistas analisam os problemas de troca e de trabalho). f lomo loquax (designando o homem cujo pensamento teria surgido de uma reflexão sobre a linguagem), Homo sociologicus, Homo lodens etc. Horkheimer, Max (1895-1973) Um dos fun-dadores e principais membros, juntamente com *Adorno, da escola de *Frankfurt, Horkheimer nasceu na Alemanha, doutorando-se pela Universidade de Frankfurt. onde dirigiu a partir de 1930 o famoso Instituto de Pesquisas Sociais. que viria a ser o núcleo da escola. Em 1934, foi para os Estados Unidos, onde lecionou na Universidade Columbia. em Nova York, regressando em 1950 à Alemanha. Horkheimer desenvolveu_ cm estreita colaboração com Adorno, uma profunda reflexão sobre o projeto filosófico, político, científico e cultural do *Iluminismo, e sua influência na formação da sociedade contemporànea e ele sua ideologia. no célebre Dialética do llunuinismo (1947). Sua obra é voltada sobretudo para temas centrais da sociedade con-temporánea como a família, a questão da autoridade política e do autoritarismo. a cultura de massas. a ideologia da sociedade burguesa. Apesar de crítico do materialismo dialético, llorkheimer pode ser considerado uni neomarxista por seu uso de categorias do marxismo cm suas análises e por sua critica ao positivismo socio- lógico. Obras principais: .1 situação atual da filosofia social (193 1); Estudos sobre a autoridade e u fonúlia (1936). em colaboração com *Marcuse e outros membros da escola; for uma critica da razão instrumental (1967). Muitos de seus artigos e ensaios foram publicados na Re-vista de pesquiso social, que dirigiu destacando-se Um novo conceito de ideologia (1930) e Teoria tradicional e teoria crítica (1937). humanidade (lat. humanistas) 1. Como sinônimo de gênero humano, o conceito de "humanidade" designa o conjunto dos seres huma-nos. Fala-se, assim, da "história da humanidade", do devotamento ou trabalho para "o bem da humanidade" ou da "religião da humanidade" (expressão de Comte, que considera a humanidade um ser coletivo). 2. Conjunto de características específicas do ser humano que o torna diferente dos outros animais. Assim, quando pedimos a alguém para "agir com humanidade", pedimos-lhe que aja com bondade natural, com indulgência, com "humanismo", sem crueldade, com justiça etc. Ver humanismo. 3. No sentido atual e forte do termo, humanidades designa "as disciplinas que contribuem para a formação (Bildung) do homem, independentemente de qualquer finalidade utilitária imediata, isto é, que não tenham necessariamente como objetivo transmitir um saber científico ou uma competência prática, mas estruturar uma personalidade segundo uma certa paidea. vale dizer, um ideal civilizatório e uma normatividade inscrita na tradição, ou simplesmente proporcionar um prazer lúdico" (S.P. Rouanet, As razões do Iluminismo). humanismo (do lat. humanizas) Movimento intelectual que surgiu no Renascimento. Lutando contra a esclerose da filosofia escolástica e aproveitando-se de um melhor conhecimento da civilização greco-latina, os humanistas (Erasmo, Tomás Morus etc.) se esforçaram por mostrar a dignidade do espírito humano e inauguraram um movimento de confiança na razão e no espírito critico. Por uma espécie de deslocamento, o termo "humanismo" tomou dois sentidos particulares: a) na filosofia, designa toda doutrina que situa o homem no centro de sua reflexão e se propõe por objetivo procurar os meios de sua realização; b) na linguagem universitária, designa a idéia segundo a qual toda formação sólida repousa na cultura clássica (chamada de huma- nidades). Numa palavra, o humanismo é a atitude filosófica que faz do homem o valor supre-mo e que vê nele a medida de todas as coisas. Herdeiro de Kant, o humanismo contemporâneo, sobretudo dos existencialistas e de certas corren- tes marxistas, define o homem como o ser que é o criador de seu próprio ser, pois o humano, através da história, gera sua própria natureza. Hume, David (1711-1776) O filósofo e historiador escocês David Hume nasceu em Edimburgo. Estudou filosofia e se interessou pelas letras. Abandonou o curso de direito e dedicou-se ao comércio, passando três anos na França (1734-1737). Retornou à Inglaterra, tornou-se secretário do general Saint Clair e o acompanhou a Viena e Turim. Em 1744, candidatou-se a uma cadeira de filosofia em Edimburgo, foi acusado de ateísmo e não nomeado. Posterior-mente, candidatou-se à cadeira de lógica em Glasgow, para substituir Adam Smith, e fracas-sou novamente. Conseguiu ser nomeado bibliotecário da faculdade de direito, onde se dedicou a uma grande atividade literária. Em 1763, re-tornou à França como secretário da embaixada, onde conheceu Rousseau. Voltou á Inglaterra e tornou-se subsecretário de Estado (1767-1768). No ano seguinte (1769), regressou então a Edimburgo, onde permaneceu até sua morte. A filosofia de David Hume caracteriza-se como um *fenomenísmo que procede ao mesmo tempo do *empirismo de Locke e do *idealismo de Berkeley: também é conhecida por ser um *ceticismo, na medida em que reduz os princípios racionais a ligações de idéias fortificadas pelo hábito e o eu a uma coleção de estados de consciência. Suas obras principais são: A Treatise of Human Nature (1739), Essays Moral and Political (1741), An Enquiry Concerning Hu-man Understanding (inicialmente intitulado Philosophical Essays Concerning Human Understanding) (1748), Political Discourses (1752), History of England during the Reigns of James I and Charles I (1754 ss.), Dialogues on Natural Religion (1779), póstuma. Abordam os seguintes temas fundamentais: a) não é possível nenhuma teoria geral da realidade: o homem não pode criar idéias, pois está inteiramente submetido aos sentidos; todos os nossos conhecimentos vêm dos sentidos; b) a ciência só consegue atingir certezas morais: suas verdades são da ordem da probabilidade; c) não há causalidade objetiva, pois nem sempre as mesmas causas produzem os mesmos efeitos; d) convém que substituamos toda certeza pela probabilidade. Eis seu ceticismo, a condição da tolerância e da coexistência pacífica entre os homens. Trata-se de um ceticismo teórico, não válido na vida prática. Husserl, Edmund (1859-1938) Criador da *fenomenologia, Husserl nasceu em Prosznitz, na Morávia (atual República Tcheca), tendo estudado matemática e filosofia nas Universidades de Leipzig, Berlim e Viena, onde sofreu a influência de *Brentano. Foi professor nas Universidades de Halle (1887), Gottingen (1906) e Freiburg (1938). Sua filosofia desenvolveu-se inicialmente como uma reação contra o ,psicologismo e o naturalismo, então largamente dominantes nos meios acadêmicos alemães. Conservou da influência de Brentano a retomada do conceito aristotélico de *intencionalidade, en-tendido aqui como a direção da consciência ao objeto, ao real, que é definidora da própria consciência e que será um dos conceitos-chave de sua teoria fenomenológica. Sua obra Idéias para uma fenomenologia pura e uma filosofia fenomenológica (1913) propõe a fenomenologia como uma investigação sistemática da consciência e de seus objetos. Segundo Husserl, os objetos se definem precisamente como correlatos dos estados mentais, não havendo distinçào possfvel entre aquilo que é percebido e nossa per- cepção. A experiência inclui, entretanto, não só a percepção sensorial, mas todo objeto do pensamento. A filosofia de Husserl é assim uma forma de idealismo transcendental, fortemente influenciada por Kant, uma tentativa de descrição fenomenológica da subjetividade transcendental. dos modos de operar da consciência. Foi grande a influência de Husserl na filosofia contemporânea, especialmente na Alemanha, onde Heidegger e Scheler foram seus discípulos. e na França, mais diretamente com o desenvolvimento de uma filosofia fenomenológica (*Merleau-Ponty) e indiretamente com o *existencialismo. Suas obras mais importantes são: Filosofia da aritmética (1891) e Investigações lógicas (1900- 1901) da chamada fase "pré-fenomenológica", A filosofia como ciência rigorosa (1910-1911), Idéias para uma fenomenologia pura e uma filosofia fenomenológica (1913), Lógica formal e transcendental (1929), Meditações cartesianas (1931), A crise das ciências européias e a fenomenologia transcendental (1936). Huxley, Thomas Henry (1825-1895) Biólogo e filósofo inglês (nascido em Ealing), Tho-mas Huxley foi um ardoroso defensor da teoria da evolução do naturalista Charles Darwin (1809-1882). Obras principais: Zoological Evidences as to /tlan's Place in Nature (1863), Lay Sermons (1870). Science and Culture (1881), Evolution and Ethics (1893). hybris Nome que designa, em grego, toda espécie de desmedida, de exagero ou de excesso no comportamento de uma pessoa: orgulho, insolência. arrehatamento etc. Bastante emprega-do na filosofia moral, esse termo se opõe a medida, equilíbrio. Hyppolite, Jean (1907-1968) Filósofo francês que se notabilizou por ter contribuído para uma espécie de "renascimento hegeliano" na França. Considerava l i ege l o filósofo moderno "central", de quem teriam partido as grandes filosofias contemporâneas: marxismo, fenomenologia e existencialismo. Por isso, procurou pôr essas correntes em diálogo com o pensamento hegeliano a fim de se reconciliarem com a história e, finalmente, com a *liberdade, "a reconciliação mesma". Obras principais: Génese et structure de la Phénoménologie de l'esprit de Hegel (1946), Introduction à la philosophie de l'histoire de Hegel (1948), Sens et existence dans la philosophie de Maurice Merleau-Ponty (1963), Figures de la pensée philosophique, 2 vols. (1971).
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