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Guias e Dicas
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Manual de diagnóstico e tratamento de acidente por animais peçonhentos, Manuais, Projetos, Pesquisas de Engenharia Florestal

O presente manual resulta da revisão e fusão do Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes Ofídicos (1987) com o Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos (1992). Destina-se, principalmente, aos profissionais da área da saúde, contendo informações atualizadas que visam fornecer subsídios técnicos para identificação, diagnóstico e conduta deste tipo de agravo à saúde. Os procedimentos e a bibliografia aqui referidos representam uma linha de orientação básica, se

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

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Baixe Manual de diagnóstico e tratamento de acidente por animais peçonhentos e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Engenharia Florestal, somente na Docsity! F U N A S A VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos Brasília, outubro de 2001 Sumário I – Ofidismo ............................................................................................................ 9 1. Introdução...................................................................................................... 9 2. Epidemiologia ................................................................................................ 9 3. Serpentes de importância médica ................................................................... 12 Acidente Botrópico ........................................................................................... 21 1. Introdução ...................................................................................................... 21 2. Ações do veneno ............................................................................................. 21 3. Quadro clínico ................................................................................................ 21 4. Complicações ................................................................................................. 23 5. Exames complementares ................................................................................. 24 6. Tratamento ..................................................................................................... 24 7. Prognóstico ..................................................................................................... 25 Acidente Crotálico ............................................................................................ 26 1. Introdução ...................................................................................................... 26 2. Ações do veneno ............................................................................................. 26 3. Quadro clínico ................................................................................................ 26 4. Complicações ................................................................................................. 28 5. Exames complementares ................................................................................. 28 6. Tratamento ..................................................................................................... 28 7. Prognóstico ..................................................................................................... 29 Acidente Laquético .......................................................................................... 29 1. Introdução ...................................................................................................... 29 2. Ações do veneno ............................................................................................. 30 3. Quadro clínico ................................................................................................ 30 4. Complicações ................................................................................................. 31 5. Exames complementares ................................................................................. 31 6. Diagnóstico diferencial .................................................................................... 31 7. Tratamento ..................................................................................................... 31 Acidente Elapídico ............................................................................................ 32 1. Introdução ...................................................................................................... 32 2. Ações do veneno ............................................................................................. 32 3. Quadro clínico ................................................................................................ 32 4. Exames complementares ................................................................................. 33 5. Tratamento ..................................................................................................... 33 6. Prognóstico ..................................................................................................... 34 Acidente por Colubrídeos ................................................................................ 35 1. Introdução ...................................................................................................... 35 2. Ações do veneno ............................................................................................. 35 3. Quadro clínico ................................................................................................ 35 4. Complicações ................................................................................................. 36 5. Exames complementares ................................................................................. 36 6. Tratamento ..................................................................................................... 36 II - Escorpionismo .................................................................................................. 37 1. Introdução ...................................................................................................... 37 2. Epidemiologia ................................................................................................. 37 3. Escorpiões de importância médica................................................................... 37 4. Ações do veneno ............................................................................................. 41 5. Quadro clínico ................................................................................................ 41 6. Exames complementares ................................................................................. 42 7. Tratamento ..................................................................................................... 43 III - Araneísmo ....................................................................................................... 45 1. Introdução ...................................................................................................... 45 2. Epidemiologia ................................................................................................. 45 3. Aranhas de importância médica ...................................................................... 45 Acidentes por Phoneutria ................................................................................ 50 1. Introdução ...................................................................................................... 50 2. Ações do veneno ............................................................................................. 50 3. Quadro clínico ................................................................................................ 50 4. Exames complementares ................................................................................. 51 5. Tratamento ..................................................................................................... 51 6. Prognóstico ..................................................................................................... 51 Acidentes por Loxosceles ................................................................................. 52 1. Introdução ...................................................................................................... 52 2. Ações do veneno ............................................................................................. 52 3. Quadro clínico ................................................................................................ 52 4. Complicações ................................................................................................. 54 5. Exames complementares ................................................................................. 54 6. Tratamento ..................................................................................................... 54 7. Prognóstico ..................................................................................................... 55 Acidentes por Latrodectus ............................................................................... 56 1. Introdução ...................................................................................................... 56 2. Ações do veneno ............................................................................................. 56 3. Quadro clínico ................................................................................................ 56 4. Complicações ................................................................................................. 57 5. Exames complementares ................................................................................. 57 6. Tratamento ..................................................................................................... 58 7. Prognóstico ..................................................................................................... 58 IV - Acidentes por Himenópteros ......................................................................... 59 1. Introdução ...................................................................................................... 59 2. Epidemiologia ................................................................................................. 59 3. Himenópteros de importância médica ............................................................. 59 Acidentes por abelhas ..................................................................................... 60 1. Características anatômicas do grupo ............................................................... 60 2. Ações do veneno ............................................................................................. 61 3. Quadro clínico ................................................................................................ 61 4. Complicações ................................................................................................. 63 5. Exames complementares ................................................................................. 63 6. Tratamento ..................................................................................................... 64 Acidentes por vespas ....................................................................................... 64 Acidentes por formigas ................................................................................... 65 1. Introdução ...................................................................................................... 65 2. Ações do veneno ............................................................................................. 65 3. Quadro clínico ................................................................................................ 65 4. Complicações ................................................................................................. 66 5. Diagnóstico ..................................................................................................... 66 6. Tratamento ..................................................................................................... 66 V - Acidentes por Lepidópteros ............................................................................ 67 1. Introdução ...................................................................................................... 67 2. Epidemiologia ................................................................................................. 67 3. Lepidópteros de importância médica ............................................................... 67 Dermatite Urticante causada por contato com lagartas de vários gêneros .................................................................................................. 70 1. Introdução ...................................................................................................... 70 2. Ações do veneno ............................................................................................. 70 3. Quadro clínico ................................................................................................ 71 4. Complicações ................................................................................................. 71 5. Tratamento ..................................................................................................... 71 Dermatite Urticante provocada por contato com mariposa Hylesia sp ...... 72 1. Introdução ...................................................................................................... 72 2. Ações do veneno ............................................................................................. 72 3. Quadro clínico ................................................................................................ 72 4. Tratamento ..................................................................................................... 72 Periartrite falangeana por contato com Pararama ...................................... 73 1. Introdução ...................................................................................................... 73 2. Ações do veneno ............................................................................................. 73 3. Quadro clínico ................................................................................................ 73 4. Exames complementares ................................................................................. 73 5. Tratamento ..................................................................................................... 74 Síndrome Hemorrágica por contato com Lonomia ........................................ 74 1. Introdução ...................................................................................................... 74 2. Ações do veneno ............................................................................................. 74 3. Quadro clínico ................................................................................................ 74 4. Complicações ................................................................................................. 75 5. Exames complementares ................................................................................. 75 FUNASA - outubro/2001 - pág. 10 2.2. Distribuição mensal dos acidentes A ocorrência do acidente ofídico está, em geral, relacionada a fatores climáticos e aumento da atividade humana nos trabalhos no campo (gráfico 2). Com isso, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, observa-se incremento do número de acidentes no período de setembro a março. Na região Nordeste, os acidentes aumentam de janeiro a maio, enquanto que, na região Norte, não se observa sazonalidade marcante, ocorrendo os acidentes uniformemente durante todo o ano. Gráfico 2 Distribuição mensal dos acidentes ofídicos - Brasil, 1990 a 1993 2.3. Gênero da serpente Em 16,34% das 81.611 notificações analisadas, o gênero da serpente envolvida não foi informado (tabela 2). Nos 65.911 casos de acidentes por serpente peçonhenta, quando esta variável foi referida, a distribuição dos acidentes, de acordo com o gênero da serpente envolvida, pode ser observada no gráfico 3. Tabela 2 Distribuição dos acidentes ofídicos, segundo o gênero da serpente envolvido Brasil, 1990 - 1993 % 73,1 6,2 1,1 0,3 16,3 3,0 nº acidentes 59.619 5.072 939 281 13.339 2.361 Distribuição Bothrops Crotalus Lachesis Micrurus Não informados Não peçonhentos nº de casos meses F U N A S A VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por Animais Peçonhentos Brasília, outubro de 2001 Sumário I – Ofidismo ............................................................................................................ 9 1. Introdução...................................................................................................... 9 2. Epidemiologia ................................................................................................ 9 3. Serpentes de importância médica ................................................................... 12 Acidente Botrópico ........................................................................................... 21 1. Introdução ...................................................................................................... 21 2. Ações do veneno ............................................................................................. 21 3. Quadro clínico ................................................................................................ 21 4. Complicações ................................................................................................. 23 5. Exames complementares ................................................................................. 24 6. Tratamento ..................................................................................................... 24 7. Prognóstico ..................................................................................................... 25 Acidente Crotálico ............................................................................................ 26 1. Introdução ...................................................................................................... 26 2. Ações do veneno ............................................................................................. 26 3. Quadro clínico ................................................................................................ 26 4. Complicações ................................................................................................. 28 5. Exames complementares ................................................................................. 28 6. Tratamento ..................................................................................................... 28 7. Prognóstico ..................................................................................................... 29 Acidente Laquético .......................................................................................... 29 1. Introdução ...................................................................................................... 29 2. Ações do veneno ............................................................................................. 30 3. Quadro clínico ................................................................................................ 30 4. Complicações ................................................................................................. 31 5. Exames complementares ................................................................................. 31 6. Diagnóstico diferencial .................................................................................... 31 7. Tratamento ..................................................................................................... 31 Acidente Elapídico ............................................................................................ 32 1. Introdução ...................................................................................................... 32 2. Ações do veneno ............................................................................................. 32 3. Quadro clínico ................................................................................................ 32 4. Exames complementares ................................................................................. 33 5. Tratamento ..................................................................................................... 33 6. Prognóstico ..................................................................................................... 34 Acidente por Colubrídeos ................................................................................ 35 1. Introdução ...................................................................................................... 35 2. Ações do veneno ............................................................................................. 35 3. Quadro clínico ................................................................................................ 35 4. Complicações ................................................................................................. 36 5. Exames complementares ................................................................................. 36 6. Tratamento ..................................................................................................... 36 II - Escorpionismo .................................................................................................. 37 1. Introdução ...................................................................................................... 37 2. Epidemiologia ................................................................................................. 37 3. Escorpiões de importância médica................................................................... 37 4. Ações do veneno ............................................................................................. 41 5. Quadro clínico ................................................................................................ 41 6. Exames complementares ................................................................................. 42 7. Tratamento ..................................................................................................... 43 III - Araneísmo ....................................................................................................... 45 1. Introdução ...................................................................................................... 45 2. Epidemiologia ................................................................................................. 45 3. Aranhas de importância médica ...................................................................... 45 Acidentes por Phoneutria ................................................................................ 50 1. Introdução ...................................................................................................... 50 2. Ações do veneno ............................................................................................. 50 3. Quadro clínico ................................................................................................ 50 4. Exames complementares ................................................................................. 51 5. Tratamento ..................................................................................................... 51 6. Prognóstico ..................................................................................................... 51 Acidentes por Loxosceles ................................................................................. 52 1. Introdução ...................................................................................................... 52 2. Ações do veneno ............................................................................................. 52 3. Quadro clínico ................................................................................................ 52 4. Complicações ................................................................................................. 54 5. Exames complementares ................................................................................. 54 6. Tratamento ..................................................................................................... 54 7. Prognóstico ..................................................................................................... 55 Acidentes por Latrodectus ............................................................................... 56 1. Introdução ...................................................................................................... 56 2. Ações do veneno ............................................................................................. 56 3. Quadro clínico ................................................................................................ 56 4. Complicações ................................................................................................. 57 5. Exames complementares ................................................................................. 57 6. Tratamento ..................................................................................................... 58 7. Prognóstico ..................................................................................................... 58 IV - Acidentes por Himenópteros ......................................................................... 59 1. Introdução ...................................................................................................... 59 2. Epidemiologia ................................................................................................. 59 3. Himenópteros de importância médica ............................................................. 59 Acidentes por abelhas ..................................................................................... 60 1. Características anatômicas do grupo ............................................................... 60 2. Ações do veneno ............................................................................................. 61 3. Quadro clínico ................................................................................................ 61 4. Complicações ................................................................................................. 63 5. Exames complementares ................................................................................. 63 6. Tratamento ..................................................................................................... 64 Acidentes por vespas ....................................................................................... 64 Acidentes por formigas ................................................................................... 65 1. Introdução ...................................................................................................... 65 2. Ações do veneno ............................................................................................. 65 3. Quadro clínico ................................................................................................ 65 4. Complicações ................................................................................................. 66 5. Diagnóstico ..................................................................................................... 66 6. Tratamento ..................................................................................................... 66 V - Acidentes por Lepidópteros ............................................................................ 67 1. Introdução ...................................................................................................... 67 2. Epidemiologia ................................................................................................. 67 3. Lepidópteros de importância médica ............................................................... 67 Dermatite Urticante causada por contato com lagartas de vários gêneros .................................................................................................. 70 1. Introdução ...................................................................................................... 70 2. Ações do veneno ............................................................................................. 70 3. Quadro clínico ................................................................................................ 71 4. Complicações ................................................................................................. 71 5. Tratamento ..................................................................................................... 71 Dermatite Urticante provocada por contato com mariposa Hylesia sp ...... 72 1. Introdução ...................................................................................................... 72 2. Ações do veneno ............................................................................................. 72 3. Quadro clínico ................................................................................................ 72 4. Tratamento ..................................................................................................... 72 Periartrite falangeana por contato com Pararama ...................................... 73 1. Introdução ...................................................................................................... 73 2. Ações do veneno ............................................................................................. 73 3. Quadro clínico ................................................................................................ 73 4. Exames complementares ................................................................................. 73 5. Tratamento ..................................................................................................... 74 Síndrome Hemorrágica por contato com Lonomia ........................................ 74 1. Introdução ...................................................................................................... 74 2. Ações do veneno ............................................................................................. 74 3. Quadro clínico ................................................................................................ 74 4. Complicações ................................................................................................. 75 5. Exames complementares ................................................................................. 75 FUNASA - outubro/2001 - pág. 10 2.2. Distribuição mensal dos acidentes A ocorrência do acidente ofídico está, em geral, relacionada a fatores climáticos e aumento da atividade humana nos trabalhos no campo (gráfico 2). Com isso, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, observa-se incremento do número de acidentes no período de setembro a março. Na região Nordeste, os acidentes aumentam de janeiro a maio, enquanto que, na região Norte, não se observa sazonalidade marcante, ocorrendo os acidentes uniformemente durante todo o ano. Gráfico 2 Distribuição mensal dos acidentes ofídicos - Brasil, 1990 a 1993 2.3. Gênero da serpente Em 16,34% das 81.611 notificações analisadas, o gênero da serpente envolvida não foi informado (tabela 2). Nos 65.911 casos de acidentes por serpente peçonhenta, quando esta variável foi referida, a distribuição dos acidentes, de acordo com o gênero da serpente envolvida, pode ser observada no gráfico 3. Tabela 2 Distribuição dos acidentes ofídicos, segundo o gênero da serpente envolvido Brasil, 1990 - 1993 % 73,1 6,2 1,1 0,3 16,3 3,0 nº acidentes 59.619 5.072 939 281 13.339 2.361 Distribuição Bothrops Crotalus Lachesis Micrurus Não informados Não peçonhentos nº de casos meses FUNASA - outubro/2001 - pág. 11 Gráfico 3 Distribuição dos acidentes ofídicos segundo o gênero da serpente peçonhenta Brasil, 1990 - 1993 2.4. Local da picada O pé e a perna foram atingidos em 70,8% dos acidentes notificados e em 13,4% a mão e o antebraço. A utilização de equipamentos individuais de proteção como sapatos, botas, luvas de couro e outros poderia reduzir em grande parte esses acidentes. 2.5. Faixa etária e sexo Em 52,3% das notificações, a idade dos acidentados variou de 15 a 49 anos, que corresponde ao grupo etário onde se concentra a força de trabalho. O sexo masculino foi acometido em 70% dos acidentes, o feminino em 20% e, em 10%, o sexo não foi informado. 2.6. Letalidade Dos 81.611 casos notificados, houve registro de 359 óbitos. Excluindo-se os 2.361 casos informados como “não peçonhentos”, a letalidade geral para o Brasil foi de 0,45%. O maior índice foi observado nos acidentes por Crotalus, onde em 5.072 acidentes ocorreram 95 óbitos (1,87%) (tabela 3). Tabela 3 Letalidade dos acidentes ofídicos por gênero de serpente Brasil, 1990 - 1993 Gênero no Casos no Óbitos Letalidade (%) Bothrops Crotalus Lachesis Micrurus Não informado 59.619 5.072 939 281 13.339 185 95 9 1 69 0,31 1,87 0,95 0,36 0,52 Total 79.250 359 0,45 FUNASA - outubro/2001 - pág. 12 A letalidade do acidente ofídico não se mostrou uniforme nas regiões fisiográficas, como se observa no gráfico 4. O maior índice foi registrado no Nordeste, apesar desta região apresentar o menor coeficiente de incidência do país. Gráfico 4 Letalidade dos acidentes ofídicos por região fisiográfica Brasil, 1990 a 1993 Dos 359 óbitos notificados, em 314 foi informado o tempo decorrido entre a picada e o atendimento. Destes, em 124 (39,49%), o atendimento foi realizado nas primeiras seis horas após a picada, enquanto que em 190 (60,51%) depois de seis horas da ocorrência do acidente. Os dados aqui relatados demonstram a importância da precocidade do atendimento. 3. Serpentes de importância médica 3.1. Importância da identificação das serpentes Identificar o animal causador do acidente é procedimento importante na medida em que: - possibilita a dispensa imediata da maioria dos pacientes picados por serpentes não peçonhentas; - viabiliza o reconhecimento das espécies de importância médica em âmbito regional; - é medida auxiliar na indicação mais precisa do antiveneno a ser administrado. Apesar da importância do diagnóstico clínico, que orienta a conduta na grande maioria dos acidentes, o animal causador deve, na medida do possível, ser encaminhado para identificação por técnico treinado. A conservação dos animais mortos pode ser feita, embora precariamente, pela imersão dos mesmos em solução de formalina a 10% ou álcool comum e acondicionados em frascos rotulados com os dados do acidente, inclusive a procedência. No Brasil, a fauna ofídica de interesse médico está representada pelos gêneros: - Bothrops (incluindo Bothriopsis e Porthidium)* - Crotalus - Lachesis - Micrurus - e por alguns da Família Colubridae** * Estes novos gêneros resultaram da revisão do gênero Bothrops: As espécies Bothrops bilineatus, Bothrops castelnaudi e Bothrops hyoprorus passaram a ser denominadas Bothriopsis bilineata, Bothriopsis taeniata e Porthidium hyoprora, respectivamente. ** As serpentes dos gêneros Philodryas e Clelia, da família Colubridae, podem ocasionar alguns acidentes com manifestações clínicas locais. FUNASA - outubro/2001 - pág. 15 Fig. 6. a) Bothrops atrox. (Foto: G. Puorto) b) Distribuição da espécie no Brasil. Fig. 7. a) Bothrops erythromelas. (Foto: A. Melgarejo) b) Distribuição da espécie no Brasil. Fig. 8. a) Bothrops neuwiedi. (Foto: G. Puorto) b) Distribuição da espécie no Brasil. FUNASA - outubro/2001 - pág. 16 Fig. 9. a) Bothrops jararaca. (Foto: G. Puorto) b) Distribuição da espécie no Brasil. Fig. 10. a) Bothrops jararacussu. (Foto: A. Melgarejo) b) Distribuição da espécie no Brasil. Fig. 11. a) Bothrops alternatus. (Foto: G. Puorto) b) Distribuição da espécie no Brasil. FUNASA - outubro/2001 - pág. 17 Fig. 12. a) Bothrops moojeni. (Foto: A. Melgarejo) b) Distribuição da espécie no Brasil. b) Gênero Crotalus Agrupa várias subespécies, pertencentes à espécie Crotalus durissus (fig. 13). Popularmente são conhecidas por cascavel, cascavel-quatro-ventas, boicininga, maracambóia, maracá e outras denominações populares. São encontradas em campos abertos, áreas secas, arenosas e pedregosas e raramente na faixa litorânea. Não ocorrem em florestas e no Pantanal. Não têm por hábito atacar e, quando excitadas, denunciam sua presença pelo ruído característico do guizo ou chocalho. Fig. 13. a) Crotalus durissus. (Foto G. Puorto) b) Distribuição da espécie no Brasil. c) Gênero Lachesis Compreende a espécie Lachesis muta com duas subespécies (fig. 14). São popularmente conhecidas por: surucucu, surucucu-pico-de-jaca, surucutinga, malha-de-fogo. É a maior das serpentes peçonhentas das Américas, atingindo até 3,5m. Habitam áreas florestais como Amazônia, Mata Atlântica e algumas enclaves de matas úmidas do Nordeste. FUNASA - outubro/2001 - pág. 20 Fig. 18. Philodryas olfersii. (Foto: A. Melgarejo). Fig. 19. Clelia clelia. (Foto: G. Puorto). FUNASA - outubro/2001 - pág. 21 Acidente Botrópico 1. Introdução Corresponde ao acidente ofídico de maior importância epidemiológica no país, pois é responsável por cerca de 90% dos envenenamentos. 2. Ações do veneno 2.1. Ação “Proteolítica” As lesões locais, como edema, bolhas e necrose, atribuídas inicialmente à “ação proteolítica”, têm patogênese complexa. Possivelmente, decorrem da atividade de proteases, hialuronidases e fosfolipases, da liberação de mediadores da resposta inflamatória, da ação das hemorraginas sobre o endotélio vascular e da ação pró-coagulante do veneno. 2.2. Ação coagulante A maioria dos venenos botrópicos ativa, de modo isolado ou simultâneo, o fator X e a protrombina. Possui também ação semelhante à trombina, convertendo o fibrinogênio em fibrina. Essas ações produzem distúrbios da coagulação, caracterizados por consumo dos seus fatores, geração de produtos de degradação de fibrina e fibrinogênio, podendo ocasionar incoagulabilidade sangüínea. Este quadro é semelhante ao da coagulação intravascular disseminada. Os venenos botrópicos podem também levar a alterações da função plaquetária bem como plaquetopenia. 2.3. Ação hemorrágica As manifestações hemorrágicas são decorrentes da ação das hemorraginas que provocam lesões na membrana basal dos capilares, associadas à plaquetopenia e alterações da coagulação. 3. Quadro clínico 3.1. Manifestações locais São caracterizadas pela dor e edema endurado no local da picada, de intensidade variável e, em geral, de instalação precoce e caráter progressivo (fig. 20). Equimoses e sangramentos no ponto da picada são freqüentes. Infartamento ganglionar e bolhas podem aparecer na evolução (fig. 21), acompanhados ou não de necrose. FUNASA - outubro/2001 - pág. 22 Fig. 20. Fase aguda de acidente botrópico: sinais de picada, edema e equimose cerca de três horas após o acidente. (Foto: Acervo HVB/IB). 3.2. Manifestações sistêmicas Além de sangramentos em ferimentos cutâneos preexistentes, podem ser observadas hemorragias à distância como gengivorragias, epistaxes, hematêmese e hematúria. Em gestantes, há risco de hemorragia uterina. Podem ocorrer náuseas, vômitos, sudorese, hipotensão arterial e, mais raramente, choque. Com base nas manifestações clínicas e visando orientar a terapêutica a ser empregada, os acidentes botrópicos são classificados em: a) Leve: forma mais comum do envenenamento, caracterizada por dor e edema local pouco intenso ou ausente, manifestações hemorrágicas discretas ou ausentes, com ou sem alteração do Tempo de Coagulação. Os acidentes causados por filhotes de Bothrops (< 40 cm de comprimento) podem apresentar como único elemento de diagnóstico alteração do tempo de coagulação. b) Moderado: caracterizado por dor e edema evidente que ultrapassa o segmento anatômico picado, acompanhados ou não de alterações hemorrágicas locais ou sistêmicas como gengivorragia, epistaxe e hermatúria. c) Grave: caracterizado por edema local endurado intenso e extenso, podendo atingir todo o membro picado, geralmente acompanhado de dor intensa e, eventualmente com presença de bolhas. Em decorrência do edema, podem aparecer sinais de isquemia local devido à compressão dos feixes vásculo-nervosos. Manifestações sistêmicas como hipotensão arterial, choque, oligoanúria ou hemorragias intensas definem o caso como grave, independentemente do quadro local. FUNASA - outubro/2001 - pág. 25 6.2. Tratamento geral Medidas gerais devem ser tomadas como: a) Manter elevado e estendido o segmento picado; b) Emprego de analgésicos para alívio da dor; c) Hidratação: manter o paciente hidratado, com diurese entre 30 a 40 ml/hora no adulto, e 1 a 2 ml/kg/hora na criança; d) Antibioticoterapia: o uso de antibióticos deverá ser indicado quando houver evidência de infecção. As bactérias isoladas de material proveniente de lesões são principalmente Morganella morganii, Escherichia coli, Providentia sp e Streptococo do grupo D, geralmente sensíveis ao cloranfenicol. Dependendo da evolução clínica, poderá ser indicada a associação de clindamicina com aminoglicosídeo. 6.3. Tratamento das complicações locais Firmado o diagnóstico de síndrome de compartimento, a fasciotomia não deve ser retardada, desde que as condições de hemostasia do paciente o permitam. Se necessário, indicar transfusão de sangue, plasma fresco congelado ou crioprecipitado. O debridamento de áreas necrosadas delimitadas e a drenagem de abscessos devem ser efetuados. A necessidade de cirurgia reparadora deve ser considerada nas perdas extensas de tecidos e todos os esforços devem ser feitos no sentido de se preservar o segmento acometido. 7. Prognóstico Geralmente é bom. A letalidade nos casos tratados é baixa (0,3%). Há possibilidade de ocorrer seqüelas locais anatômicas ou funcionais. Quadro I Acidente botrópico Classificação quanto à gravidade e soroterapia recomendada * TC normal: até 10 min; TC prolongado: de 10 a 30 min; TC incoagulável: > 30 min. ** Manifestações locais intensas podem ser o único critério para classificação de gravidade. *** SAB = Soro antibotrópico/SABC = Soro antibotrópico-crotálico/SABL = Soro antibotrópico-laquético. Manifestações e Tratamento Leve Moderada Grave Classificação Locais • dor • edema • equimose Sistêmicas • hemorragia grave • choque • anúria Tempo de Coagulação (TC)* Soroterapia (nº ampolas) SAB/SABC/SABL*** Via de administração ausentes ou discretas ausentes ausentes evidentes intensas** presentes normal ou alterado normal ou alterado normal ou alterado 2-4 4-8 12 intravenosa FUNASA - outubro/2001 - pág. 26 Acidente Crotálico 1. Introdução É responsável por cerca de 7,7% dos acidentes ofídicos registrados no Brasil, podendo representar até 30% dos acidentes em algumas regiões. Apresenta o maior coeficiente de letalidade devido à freqüência com que evolui para insuficiência renal aguda (IRA). Observação: As informações que se seguem referem-se aos estudos realizados com as cascavéis das subespécies Crotalus durissus terrificus, C. d. collilineatus e C. d. cascavella e as observações clínicas dos acidentes ocasionados por estas serpentes nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. Os dados sobre acidentes com cascavéis da região Norte são ainda pouco conhecidos. 2. Ações do veneno São três as ações principais do veneno crotálico neurotóxica, miotóxica e coagulante. 2.1. Ação neurotóxica Produzida principalmente pela fração crotoxina, uma neurotoxina de ação pré-sináptica que atua nas terminações nervosas inibindo a liberação de acetilcolina. Esta inibição é o principal fator responsável pelo bloqueio neuromuscular do qual decorrem as paralisias motoras apresentadas pelos pacientes. 2.2. Ação miotóxica Produz lesões de fibras musculares esqueléticas (rabdomiólise) com liberação de enzimas e mioglobina para o soro e que são posteriormente excretadas pela urina. Não está identificada a fração do veneno que produz esse efeito miotóxico sistêmico. Há referências experimentais da ação miotóxica local da crotoxina e da crotamina. A mioglobina, e o veneno como possuindo atividade hemolítica “in vivo”. Estudos mais recentes não demonstram a ocorrência de hemólise nos acidentes humanos. 2.3. Ação coagulante Decorre de atividade do tipo trombina que converte o fibrinogênio diretamente em fibrina. O consumo do fibrinogênio pode levar à incoagulabilidade sangüínea. Geralmente não há redução do número de plaquetas. As manifestações hemorrágicas, quando presentes, são discretas. 3. Quadro clínico 3.1. Manifestações locais São pouco importantes, diferindo dos acidentes botrópico e laquético. Não há dor, ou esta pode ser de pequena intensidade. Há parestesia local ou regional, que pode persistir por tempo variável, podendo ser acompanhada de edema discreto ou eritema no ponto da picada. 3.2. Manifestações sistêmicas a) Gerais: mal-estar, prostração, sudorese, náuseas, vômitos, sonolência ou inquietação e secura da boca podem aparecer precocemente e estar relacionadas a estímulos de origem diversas, nos quais devem atuar o medo e a tensão emocional desencadeados pelo acidente. b) Neurológicas: decorrem da ação neurotóxica do veneno, surgem nas primeiras horas após a picada, e caracterizam o fácies miastênica (fácies neurotóxica de Rosenfeld) evidenciadas por ptose palpebral uni ou bilateral, flacidez da musculatura da face (fig. 23), alteração do diâmetro pupilar, incapacidade de movimentação FUNASA - outubro/2001 - pág. 27 do globo ocular (oftalmoplegia), podendo existir dificuldade de acomodação (visão turva) e/ou visão dupla (diplopia). Como manifestações menos freqüentes, pode-se encontrar paralisia velopalatina, com dificuldade à deglutição, diminuição do reflexo do vômito, alterações do paladar e olfato. Fig. 23. Acidente grave em criança de seis anos, atendida três horas após a picada: ptose palpebral bilateral (Foto: F. Bucaretchi). c) Musculares: a ação miotóxica provoca dores musculares generalizadas (mialgias) que podem aparecer precocemente. A fibra muscular esquelética lesada libera quantidades variáveis de mioglobina que é excretada pela urina (mioglobinúria), conferindo-lhe uma cor avermelhada ou de tonalidade mais escura, até o marrom (fig. 24). A mioglobinúria constitui a manifestação clínica mais evidente da necrose da musculatura esquelética (rabdomiólise). Fig. 24. Coleta de urina seqüencial entre a admissão e 48 horas após o acidente: diurese escurecida com mioglobinúria (Foto: F. Bucaretchi). FUNASA - outubro/2001 - pág. 30 2. Ações do veneno 2.1. Ação proteolítica Os mecanismos que produzem lesão tecidual provavelmente são os mesmos do veneno botrópico, uma vez que a atividade proteolítica pode ser comprovada in vitro pela presença de proteases. 2.2. Ação coagulante Foi obtida a caracterização parcial de uma fração do veneno com atividade tipo trombina. 2.3. Ação hemorrágica Trabalhos experimentais demonstraram intensa atividade hemorrágica do veneno de Lachesis muta muta, relacionada à presença de hemorraginas. 2.4. Ação neurotóxica É descrita uma ação do tipo estimulação vagal, porém ainda não foi caracterizada a fração específica responsável por essa atividade. 3. Quadro clínico 3.1. Manifestações locais São semelhantes às descritas no acidente botrópico, predominando a dor e edema, que podem progredir para todo o membro. Podem surgir vesículas e bolhas de conteúdo seroso ou sero-hemorrágico nas primeiras horas após o acidente (fig. 25). As manifestações hemorrágicas limitam-se ao local da picada na maioria dos casos. Fig. 25. Acidente laquético: edema, equimose e necrose cutânea (Foto: J. S. Haad). FUNASA - outubro/2001 - pág. 31 3.2. Manifestações sistêmicas São relatados hipotensão arterial, tonturas, escurecimento da visão, bradicardia, cólicas abdominais e diarréia (síndrome vagal). Os acidentes laquéticos são classificados como moderados e graves. Por serem serpentes de grande porte, considera-se que a quantidade de veneno por elas injetada é potencialmente muito grande. A gravidade é avaliada segundo os sinais locais e pela intensidade das manifestações sistêmicas. 4. Complicações As complicações locais descritas no acidente botrópico (síndrome compartimental, necrose, infecção secundária, abscesso, déficit funcional) também podem estar presentes no acidente laquético. 5. Exames complementares A determinação do Tempo de Coagulação (TC) é importante medida auxiliar no diagnóstico do envenenamento e acompanhamento dos casos. Dependendo da evolução, outros exames laboratoriais podem estar indicados (hemograma, dosagens de uréia, creatinina e eletrólitos). O imunodiagnóstico vem sendo utilizado em caráter experimental, não estando disponível na rotina dos atendimentos. 6. Diagnóstico diferencial Os acidentes botrópico e laquético são muito semelhantes do ponto de vista clínico, sendo, na maioria das vezes, difícil o diagnóstico diferencial. As manifestações da “síndrome vagal” poderiam auxiliar na distinção entre o acidente laquético e o botrópico. Estudos preliminares, empregando imunodiagnóstico (ELISA), têm demonstrado que a maioria dos acidentes referidos pelos pacientes como causados por Lachesis é do gênero botrópico. 7. Tratamento 7.1. Tratamento específico O soro antilaquético (SAL), ou antibotrópico-laquético (SABL) deve ser utilizado por via intravenosa (quadro III). Nos casos de acidente laquético comprovado e na falta dos soros específicos, o tratamento deve ser realizado com soro antibotrópico, apesar deste não neutralizar de maneira eficaz a ação coagulante do veneno laquético. 7.2. Tratamento geral Devem ser tomadas as mesmas medidas indicadas para o acidente botrópico. Quadro III Acidente laquético Tratamento específico indicado Orientação para o tratamento Soroterapia (no de ampolas) Via de administração Poucos casos estudados. Gravidade avaliada pelos sinais locais e intensidade das manifestações vagais (bradicardia, hipotensão arterial, diarréia) 10 a 20 SAL ou SABL* intravenosa * SAL - Soro antilaquético/SABL = Soro antibotrópico-laquético. FUNASA - outubro/2001 - pág. 32 Acidente Elapídico 1. Introdução Corresponde a 0,4% dos acidentes por serpentes peçonhentas registrados no Brasil. Pode evoluir para insuficiência respiratória aguda, causa de óbito neste tipo de envenenamento. 2. Ações do veneno Os constituintes tóxicos do veneno são denominados neurotoxinas (NTXs) e atuam da seguinte forma: 2.1. NTX de ação pós-sináptica Existem em todos os venenos elapídicos até agora estudados. Em razão do seu baixo peso molecular podem ser rapidamente absorvidas para a circulçaão sistêmica, difundidas para os tecidos, explicando a precocidade dos sintomas de envenenamento. As NTXs competem com a acetilcolina (Ach) pelos receptores colinérgicos da junção neuromuscular, atuando de modo semelhante ao curare. Nos envenenamentos onde predomina essa ação (M. frontalis), o uso de substâncias anticolinesterásticas (edrofônio e neostigmina) pode prolongar a vida média do neurotransmissor (Ach), levando a uma rápida melhora da sintomatologia. 2.2. NTX de ação pré-sináptica Estão presentes em algumas corais (M. coralliunus) e também em alguns viperídeos, como a cascavel sul- americana. Atuam na junção neuromuscular, bloqueando a liberação de Ach pelos impulsos nervosos, impedindo a deflagração do potencial de ação. Esse mecanismo não é antagonizado pelas substâncias anticolinesterásicas. 3. Quadro clínico Os sintomas podem surgir precocemente, em menos de uma hora após a picada. Recomenda-se a observação clínica do acidentado por 24 horas, pois há relatos de aparecimento tardio dos sintomas e sinais. 3.1. Manifestações locais Há discreta dor local, geralmente acompanhada de parestesia com tendência a progressão proximal. 3.2. Manifestações sistêmicas Inicialmente, o paciente pode apresentar vômitos. Posteriormente, pode surgir um quadro de fraqueza muscular progressiva, ocorrendo ptose palpebral, oftalmoplegia e a presença de fácies miastênica ou “neurotóxica” (fig. 26). Associadas a estas manifestações, podem surgir dificuldades para manutenção da posição ereta, mialgia localizada ou generalizada e dificuldade para deglutir em virtude da paralisia do véu palatino. A paralisia flácida da musculatura respiratória compromete a ventilação, podendo haver evolução para insuficiência respiratória aguda e apnéia. FUNASA - outubro/2001 - pág. 35 Acidentes por Colubrídeos 1. Introdução A maioria dos acidentes por Colubrídeos são destituídos de importância por causarem apenas ferimentos superficiais da pele, não havendo inoculação de peçonha. Os Colubrídeos de importância médica pertencem aos gêneros Philodryas (cobra-verde, cobra-cipó) e Cleia (muçurana, cobra-preta), havendo referência de acidente com manifestações locais também por Erythrolamprus aesculapii. A posição posterior das presas inoculadoras desses animais pode explicar a raridade de acidentes com alterações clínicas. 2. Ações do veneno Muito pouco se conhece das ações dos venenos dos Colubrídeos. Estudos com animais de experimentação mostraram que o veneno de Philodryas olfersii possui atividades hemorrágica, proteolítica, fibrinogenolítica e fibrinolítica estando ausentes as frações coagulantes. 3. Quadro clínico Acidentes por Philodryas olfersii e Clelia clelia plumbea podem ocasionar edema local importante, equimose e dor, semelhantes aos observados nos acidentes botrópicos, porém sem alteração da coagulação (fig. 27). Fig. 27. Acidente por Philodryas olfersii: edema extenso e equimoses em paciente picado no punho há dois dias (Foto: Acervo HVB/IB). FUNASA - outubro/2001 - pág. 36 4. Complicações Não são observadas complicações nesses casos. 5. Exames complementares A determinação do TC pode ser útil no diagnóstico diferencial com os envenenamentos botrópicos e laquéticos, uma vez que este parâmetro não deve se mostrar alterado nos acidentes por colubrídeos. 6. Tratamento O tratamento nos casos de acidentes por P. olfersii é sintomático. Tem sido relatada experimentalmente a neutralização da ação hemorrágica do veneno de Philodryas pelo soro antibotrópico. Este fato sugere a presença de antígenos comuns aos venenos dessas serpentes e algumas espécies de Bothrops. Em raros acidentes humanos por esses Colubrídeos, o soro antibotrópico foi empregado sem que se possa até o momento concluir sobre os eventuais benefícios decorrentes da sua utilização. FUNASA - outubro/2001 - pág. 37 II - Escorpionismo 1. Introdução Os acidentes escorpiônicos são importantes em virtude da grande freqüência com que ocorrem e da sua potencial gravidade, principalmente em crianças picadas pelo Tityus serrulatus. 2. Epidemiologia A partir da implantação da notificação dos acidentes escorpiônicos no país, em 1988, vem se verificando um aumento significativo no número de casos. Dados do Ministério da Saúde indicam a ocorrência de cerca de 8.000 acidentes/ano, com um coeficiente de incidência de aproximadamente três casos/100.000 habitantes. 0 maior número de notificações é proveniente dos estados de Minas Gerais e São Paulo, responsáveis por 50% do total. Tem sido registrado aumento significativo de dados provenientes dos estados da Bahia, Rio Grande do Norte, Alagoas e Ceará. Os principais agentes de importância médica são: T. serrulatus, responsável por acidentes de maior gravidade, T. bahiensis e T. stigmurus. Na região Sudeste, a sazonalidade é semelhante à dos acidentes ofídicos. ocorrendo a maioria dos casos nos meses quentes e chuvosos. As picadas atingem predominantemente os membros superiores, 65% das quais acometendo mão e antebraço. A maioria dos casos tem curso benigno, situando-se a letalidade em 0,58%. Os óbitos têm sido associados, com maior freqüência, a acidentes causados por T. serrulatus, ocorrendo mais comumente em crianças menores de 14 anos (tabela 4). Tabela 4 Distribuição, segundo faixa etária, do número de casos e óbitos devido a acidentes escorpiônicos - Brasil - jan/90 a dez/93 Faixa Etária (anos) N o Casos < 1 1- 4 5-14 15-24 25-49 > 50 Não informado Total 99 1.964 5.094 4.024 6.579 2.500 4.566 24.826 No Óbitos % 4 44 79 11 3 - 2 143 2,8 30,8 55,2 7,7 2,1 0,0 1,4 100,0 3. Escorpiões de importância médica Os escorpiões ou lacraus apresentam o corpo formado pelo tronco (prosoma e mesosoma) e pela cauda (metasoma). O prosoma dorsalmente é coberto por uma carapaça indivisa, o cefalotórax, e nele se articulam os quatro pares de pernas, um par de quelíceras e um par de pedipalpos. O mesosoma apresenta sete segmentos dorsais, os tergitos, e cinco ventrais, os esternitos. A cauda é formada por cinco segmentos e no final da mesma situa-se o telso, composto de vesícula e ferrão (aguilhão) (fig. 28). A vesícula contém duas glândulas de veneno. Estas glândulas produzem o veneno que é inoculado pelo ferrão. FUNASA - outubro/2001 - pág. 40 Espécies do gênero Tityus de importância médica no Brasil Fig. 30. Tityus serrulatus: tronco marrom-escuro; pedipalpos e patas amarelados, a cauda, que também é amarelada, apresenta uma serrilha dorsal nos dois últimos segmentos (daí o nome Tityus serrulatus) e uma mancha escura no lado ventral da vesícula. Comprimento de 6 cm a 7 cm. (Foto: R. Bertani) Distribuição geográfica: Bahia, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo. Fig. 32. Tityus stigmurus: tronco amarelo-escuro, apresentando um triângulo negro no cefalotórax, uma faixa escura longitudinal mediana e manchas laterais escuras nos tergitos. Comprimento de 6 cm a 7 cm (Foto: R. Bertani). Distribuição geográfica: estados da região Nordeste do Brasil. Fig. 31. Tityus bahiensis: tronco marrom-escuro, patas com manchas escuras; pedipalpos com manchas escuras nos fêmures e nas tíbias. Comprimento de 6 cm a 7 cm (Foto: R. Bertani). Distribuição geográfica: Goiás, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina. FUNASA - outubro/2001 - pág. 41 Fig. 33. Tityus cambridgei: tronco e pernas escuros, quase negros, Comprimento de aproximadamente 8,5 cm. (Foto: R. Bertani) Distribuição geográfica: região Amazônica. Fig. 34. Tityus metuendus: tronco vermelho-escuro, quase negro com manchas confluentes amarelo- avermelhadas; patas com manchas amareladas; cauda da mesma cor do tronco apresentando um espessamento dos últimos dois artículos. Comprimento de 6 cm a 7 cm (Foto: R. Bertani). Distribuição geográfica: Amazonas, Acre e Pará. Do ponto de vista de saúde pública, tem sido preocupante o aumento da dispersão do Tityus serrulatus. Esta espécie tem sido encontrada no Recôncavo Baiano, Distrito Federal, Minas Gerais, na periferia da cidade de São Paulo, no interior do estado de São Paulo e norte do Paraná. Esta dispersão tem sido explicada em parte pelo fato de a espécie Tityus serrulatus se reproduzir por partenogênese. No estado de Pernambuco (Recife), há relatos de óbitos provocados por T. stigmurus, espécie que também tem sido capturada em Alagoas. O T. cambridgei (escorpião preto) é a espécie mais freqüente na Amazônia Ocidental (Pará e Marajó), embora quase não haja registro de acidentes. 4. Ações do veneno Estudos bioquímicos experimentais demonstraram que a inoculação do veneno bruto ou de algumas frações purificadas ocasiona dor local e efeitos complexos nos canais de sódio, produzindo despolarização das terminações nervosas pós-ganglionares, com liberação de catecolaminas e acetilcolina. Estes mediadores determinam o aparecimento de manifestações orgânicas decorrentes da predominância dos efeitos simpáticos ou parassimpáticos. 5. Quadro clínico Os acidentes por Tityus serrulatus são mais graves que os produzidos por outras espécies de Tityus no Brasil. A dor local, uma constante no escorpionismo, pode ser acompanhada por parestesias. Nos acidentes moderados e graves, observados principalmente em crianças, após intervalo de minutos até poucas horas (duas, três horas), podem surgir manifestações sistêmicas. As principais são: FUNASA - outubro/2001 - pág. 42 a) Gerais: hipo ou hipertermia e sudorese profusa. b) Digestivas: náuseas, vômitos, sialorréia e, mais raramente, dor abdominal e diarréia. c) Cardiovasculares: arritmias cardíacas, hipertensão ou hipotensão arterial, insuficiência cardíaca congestiva e choque. d) Respiratórias: taquipnéia, dispnéia e edema pulmonar agudo. e) Neurológicas: agitação, sonolência, confusão mental, hipertonia e tremores. O encontro de sinais e sintomas mencionados impõe a suspeita diagnóstica de escorpionismo, mesmo na ausência de história de picada e independente do encontro do escorpião. A gravidade depende de fatores, como a espécie e tamanho do escorpião, a quantidade de veneno inoculado, a massa corporal do acidentado e a sensibilidade do paciente ao veneno. Influem na evolução o diagnóstico precoce, o tempo decorrido entre a picada e a administração do soro e a manutenção das funções vitais. Com base nas manifestações clínicas, os acidentes podem ser inicialmente classificados como: a) Leves: apresentam apenas dor no local da picada e, às vezes, parestesias. b) Moderados: caracterizam-se por dor intensa no local da picada e manifestações sistêmicas do tipo sudorese discreta, náuseas, vômitos ocasionais, taquicardia, taquipnéia e hipertensão leve. c) Graves: além dos sinais e sintomas já mencionados, apresentam uma ou mais manifestações como sudorese profusa, vômitos incoercíveis, salivação excessiva, alternância de agitação com prostração, bradicardia, insuficiência cardíaca, edema pulmonar, choque, convulsões e coma. Os óbitos estão relacionados a complicações como edema pulmonar agudo e choque. 6. Exames complementares O eletrocardiograma é de grande utilidade no acompanhamento dos pacientes. Pode mostrar taquicardia ou bradicardia sinusal, extra-sístoles ventriculares, distúrbios da repolarização ventricular como inversão da onda T em várias derivações, presença de ondas U proeminentes, alterações semelhantes às observadas no infarto agudo do miocárdio (presença de ondas Q e supra ou infradesnivelamento do segmento ST) e bloqueio da condução atrioventricular ou intraventricular do estímulo (fig. 35). Estas alterações desaparecem em três dias na grande maioria dos casos, mas podem persistir por sete ou mais dias. Fig 35. Eletrocardiograma de uma criança picada pelo escorpião Tityus serrulatus mostrando taquicardia sinusal e infradesnivelamento acentuado do segmento ST (padrão semelhante a infarto agudo do miocárdio) (Foto: C.F. Amaral). FUNASA - outubro/2001 - pág. 45 III - Araneísmo 1. Introdução No Brasil, existem três gêneros de aranhas de importância médica: Phoneutria, Loxosceles e Latrodectus. Os acidentes causados por Lycosa (aranha-de-grama), bastante freqüentes e pelas caranguejeiras, muito temidas, são destituídos de maior importância. 2. Epidemiologia Desde a implantação do Sistema de Notificação dos acidentes araneídicos, vem-se observando um incremento da notificação de casos no país, notadamente nos estados do Sul. Todos os atendimentos decorrentes de acidentes com aranhas, mesmo quando não haja utilização de soroterapia, deveriam ser notificados. Tal procedimento possibilitaria um melhor dimensionamento deste tipo de agravo, nas diversas regiões do país. Segundo os dados do Ministério da Saúde, o coeficiente de incidência dos acidentes araneídicos situa-se em torno de 1,5 casos por 100.000 habitantes, com registro de 18 óbitos no período de 1990-1993. A maioria das notificações provem das regiões Sul e Sudeste (tabela 5). Tabela 5 Distribuição dos acidentes araneídicos, segundo o gênero envolvido, por macrorregião Brasil – 1990 – 1993 3. As aranhas de importância médica As aranhas são animais carnívoros, alimentando-se principalmente de insetos, como grilos e baratas. Muitas têm hábitos domiciliares e peridomiciliares. Apresentam o corpo dividido em cefalotórax e abdome. No cefalotórax articulam-se os quatro pares de pernas, um par de pedipalpos e um par de quelíceras. Nas quelíceras estão os ferrões utilizados para inoculação do veneno (fig. 37). Phoneutria Loxosceles Latrodectus Outros Não informado Gênero N NE SE S CO Total 1 1 0 15 35 6 15 58 88 400 2.885 267 0 277 2.561 1.912 6.224 13 645 2.205 5 5 0 44 123 4.809 6.512 71 1.069 5.324 FUNASA - outubro/2001 - pág. 46 Fig. 37. Morfologia externa das aranhas 3.1. Phoneutria São conhecidas popularmente como aranhas armadeiras, em razão do fato de, ao assumirem comportamento de defesa, apóiam-se nas pernas traseiras, erguem as dianteiras e os palpos, abrem as quelíceras, tomando bem visíveis os ferrões, e procuram picar (figs. 38 e 39). Podem atingir de 3 cm a 4 cm de corpo e até 15 cm de envergadura de pernas. Não constroem teia geométrica, sendo animais errantes que caçam principalmente à noite. Os acidentes ocorrem freqüentemente dentro das residências e nas suas proximidades, ao se manusearem material de construção, entulhos, lenha ou calçando sapatos. As espécies descritas para o Brasil são: P. fera, P. keyserfingi, P. nigriventer e P. reidyi. Fig. 38. a) Phoneutria nigriventer (aranha armadeira), corpo coberto de pêlos curtos de coloração marrom- acinzentada; no dorso do abdome, desenho formado por faixa longitudinal de manchas pares mais claras e faixas laterais oblíquas; quelíceras com revestimento de pêlos avermelhados ou alaranjados, vista dorsal (Fotos: R. Bertani). b) Disposição característica dos olhos contados a partir das quelíceras(2:4:2). 2:4:2 FUNASA - outubro/2001 - pág. 47 Fig. 39. Phoneutria nigriventer (aranha armadeira) em posição de “ataque/defesa” (Fotos: R. Bertani). 3.1.1. Distribuição geográfica das espécies do gênero Phoneutria a) P. fera e P. reidyi - região Amazônica; b) P. nigriventer - Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Santa Catarina; c) P. keyserfingi - Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Santa Catarina. 3.2. Loxosceles Conhecidas popularmente como aranhas-marrons, constroem teias irregulares em fendas de barrancos, sob cascas de árvores, telhas e tijolos empilhados, atrás de quadros e móveis, cantos de parede, sempre ao abrigo da luz direta. Podem atingir 1 cm de corpo e até 3 cm de envergadura de pernas (fig. 40). Não são aranhas agressivas, picando apenas quando comprimidas contra o corpo. No interior de domicílios, ao se refugiar em vestimentas, acabam provocando acidentes. Várias são as espécies descritas para o Brasil. As principais causadoras de acidentes são: L. intermedia, L. laeta e L. gaucho. Fig. 40. a) Loxosceles gaucho (aranha marrom), corpo revestido de pêlos curtos e sedosos de cor marrom esverdeada com pequenas variações; no cefalotórax: desenho claro em forma de violino ou estrela, vista dorsal (Foto: R. Bertani). b) Disposição características dos olhos contados a partir das quelíceras (2:2:2). 2:2:2 FUNASA - outubro/2001 - pág. 50 Acidentes por Phoneutria 1. Introdução As aranhas do gênero Phoneutria são popularmente conhecidas como aranhas armadeiras. Embora provoquem acidentes com freqüência, estes raramente levam a um quadro grave. O foneutrismo representa 42,2% dos casos de araneísmo notificados no Brasil, predominantemente nos estados do Sul e Sudeste. Os acidentes ocorrem em áreas urbanas, no intra e peridomicílio, atingindo principalmente os adultos de ambos os sexos. As picadas ocorrem preferencialmente em mãos e pés. 2. Ações do veneno Estudos experimentais demonstram que o veneno bruto e a fração purificada PhTx2 da peçonha de P. nigriventer causam ativação e retardo da inativação dos canais neuronais de sódio. Este efeito pode provocar despolarização das fibras musculares e terminações nervosas sensitivas, motoras e do sistema nervoso autônomo, favorecendo a liberação de neurotransmissores, principalmente acetilcolina e catecolaminas. Recentemente, também foram isolados peptídeos do veneno de P. nigriventer que podem induzir tanto a contração da musculatura lisa vascular quanto o aumento da permeabilidade vascular, por ativação do sistema calicreína-cininas e de óxido nítrico, independentemente da ação dos canais de sódio. O conhecimento destas ações pode auxiliar na compreensão da fisiopatologia do envenenamento, principalmente em relação à presença da dor local, priapismo, choque e edema pulmonar. 3. Quadro clínico Predominam as manifestações locais. A dor imediata é o sintoma mais freqüente, em apenas 1% dos casos os pacientes se apresentam assintomáticos após a picada. Sua intensidade é variável, podendo se irradiar até a raiz do membro acometido. Outras manifestações são: edema, eritema, parestesia e sudorese no local da picada (fig. 44), onde podem ser visualizadas as marcas de dois pontos de inoculação. Fig. 44. Acidente por Phoneutria sp: edema discreto no dorso da mão em indivíduo picado há duas horas (Foto: Acervo HVB/IB). FUNASA - outubro/2001 - pág. 51 Os acidentes são classificados em: a) Leves: são os mais freqüentes, correspondendo a cerca de 91% dos casos. Os pacientes apresentam predominantemente sintomatologia local. A taquicardia e agitação, eventualmente presentes, podem ser secundárias à dor. b) Moderados: ocorrem em aproximadamente 7,5% do total de acidentes por Phoneutria. Associadas às manifestações locais, aparecem alterações sistêmicas, como taquicardia, hipertensão arterial, sudorese discreta, agitação psicomotora, visão “turva” e vômitos ocasionais. c) Graves: são raros, aparecendo em tomo de 0,5% do total, sendo praticamente restritos às crianças. Além das alterações citadas nas fornias leves e moderadas, há a presença de uma ou mais das seguintes manifestações clínicas: sudorese profusa, sialorréia, vômitos freqüentes, diarréia, priapismo, hipertonia muscular, hipotensão arterial, choque e edema pulmonar agudo. 4. Exames complementares Em acidentes graves envolvendo crianças, verificaram-se leucocitose com neutrofilia, hiperglicemia, acidose metabólica e taquicardia sinusal. Todavia, não existem estudos clínicos controlados visando avaliar o tempo necessário para normalização desses exames. É aconselhável a monitorização das condições cardiorrespiratórias nos acidentes graves. 5. Tratamento a) Sintomático: a dor local deve ser tratada com infiltração anestésica local ou troncular à base de lidocaína a 2% sem vasoconstritor (3 ml - 4 ml em adultos e de 1 ml - 2 ml em crianças). Havendo recorrência da dor, pode ser necessário aplicar nova infiltração, em geral em intervalos de 60 a 90 minutos. Caso sejam necessárias mais de duas infiltrações, e desde que não existam sintomas de depressão do sistema nervoso central, recomenda-se o uso cuidadoso da meperidina (Dolantina®), nas seguintes doses: crianças - 1,0 mg/kg via intramuscular e adultos 50 mg -100 mg via intramuscular. A dor local pode também ser tratada com um analgésico sistêmico, tipo dipirona. Outro procedimento auxiliar, útil no controle da dor, é a imersão do local em água morna ou o uso de compressas quentes. b) Específico: a soroterapia tem sido formalmente indicada nos casos com manifestações sistêmicas em crianças e em todos os acidentes graves. Nestas situações, o paciente deve ser internado para melhor controle dos dados vitais, parâmetros hemodinâmicos e tratamento de suporte das complicações associadas. No quadro VI estão resumidas as manifestações clínicas e as medidas terapêuticas recomendadas. Observação: Deve ser evitado o uso de algumas drogas anti-histamínicas, principalmente a prometazina (Fenergan®), em crianças e idosos. Os efeitos tóxicos ou idiossinerásicos destes medicamentos podem determinar manifestações como sonolência, agitação psicomotora, alterações pupilares e taquicardia, que podem ser confundidas com as do envenenamento sistêmico. 6. Prognóstico O prognóstico é bom. Lactentes e pré-escolares, bem como os idosos, devem sempre ser mantidos em observação pelo menos por seis horas. Os óbitos são muito raros, havendo relatos de 14 mortes na literatura nacional de 1926 a 1996. FUNASA - outubro/2001 - pág. 52 Quadro VI Foneutrismo Classificação quanto à gravidade e manifestações clínicas tratamento geral e específico * SAAr = Soro antiaracnídico: uma ampola = 5 ml (1 ml neutraliza 1,5 dose mínima mortal) Acidentes por Loxosceles 1. Introdução O loxoscelismo tem sido descrito em vários continentes. Corresponde à forma mais grave de araneísmo no Brasil. A maioria dos acidentes por Loxosceles notificados se concentra nos estados do Sul, particularmente no Paraná e Santa Catarina. O acidente atinge mais comumente adultos, com discreto predomínio em mulheres, ocorrendo no intradomicílio. Observa-se uma distribuição centrípeta das picadas, acometendo coxa, tronco ou braço. 2. Ações do veneno Há indicações de que o componente mais importante do veneno loxoscélico é a enzima esfingomielinase-D que, por ação direta ou indireta, atua sobre os constituintes das membranas das células, principalmente do endotélio vascular e hemácias. Em virtude desta ação, são ativadas as cascatas do sistema complemento, da coagulação e das plaquetas, desencadeando intenso processo inflamatório no local da picada, acompanhado de obstrução de pequenos vasos, edema, hemorragia e necrose focal. Admite-se, também, que a ativação desses sistemas participa da patogênese da hemólise intravascular observada nas formas mais graves de envenenamento. Evidências experimentais indicam diferença de atividade dos venenos das várias espécies de Loxosceles de importância médica no Brasil. Assim, o veneno de L. laeta tem-se mostrado mais ativo no desencadeamento de hemólise experimental quando comparado aos venenos de L. gaucho ou L. intermedia. 3. Quadro clínico A picada quase sempre é imperceptível e o quadro clínico decorrente do envenenamento se apresenta sob dois aspectos fundamentais: Classificação Manifestações Clínicas Tratamento Específico Leve* Dor local na maioria dos casos, eventual-mente taquicardia e agitação. - Moderado Dor local intensa asso- ciada a: sudorese e/ou vômitos ocasionais e/ou agitação e/ou hiperten- são arterial. • 2 - 4 ampolas de SAAr* (crianças) IV Além das anteriores, apresenta uma ou mais das seguintes manifes- tações: sudorese profu- sa, sialorréia, vômitos feqüentes, hipertonia muscular, priapismo, choque e/ou edema pulmonar agudo. 5 - 10 ampolas de SAAr* IV Grave Tratamento Geral Observação até seis horas Internação • Unidade de Cuidados Intensivos FUNASA - outubro/2001 - pág. 55 Tabela 6 Tipos de agente, formas clínicas e tratamento soroterápico * Acidentes de maior gravidade 6.1. Específico Soroterapia: as recomendações para utilização do antiveneno dependem da classificação de gravidade e estão contidas no quadro VII. 6.1.1. Outros a) Corticoterapia: embora não existam estudos controlados, tem sido utilizada a prednisona por via oral na dose de 40 mg/dia para adultos e em crianças 1 mg/kg/dia durante, pelo menos, cinco dias. b) Dapsone (DDS): tem sido testada, em associação com a soroterapia, como modulador da resposta inflamatória para redução do quadro local, na dose de 50 a 100 mg/dia via oral por duas semanas aproximadamente. Embora pouco freqüente, em face de risco potencial da Dapsone em desencadear surtos de metemoglobinemia, o paciente deve ser acompanhado do ponto de vista clínico-laboratorial durante o período de administração dessa droga. 6.1.2. Suporte a) Para as manifestações locais: - Analgésicos, como dipirona (7 a 10 mg/kg/dose); - Aplicação de compressas frias auxiliam no alívio da dor local; - Antisséptico local e limpeza periódica da ferida são fundamentais para que haja uma rápida cicatrização. A úlcera deverá ser lavada cinco a seis vezes por dia com sabão neutro, e compressas de KMn04 - 1:40.000 (um comprimido em quatro litros de água) ou água boricada 10% aplicados por cinco a dez minutos duas vezes ao dia; - Antibiótico sistêmico (visando à cobertura para patógenos de pele), havendo infecção secundária; - Remoção da escara deverá ser realizada após estar delimitada a área de necrose, que ocorre, em geral, após uma semana do acidente; - Tratamento cirúrgico pode ser necessário no manejo das úlceras e correção de cicatrizes. b) Para as manifestações sistêmicas: - Transfusão de sangue ou concentrado de hemácias nos casos de anemia intensa; - Manejo da insuficiência renal aguda, de acordo com as rotinas referidas no Capítulo X. 7. Prognóstico Na maioria dos casos, é bom. Nos casos de ulceração cutânea, de difícil cicatrização, podem ocorrer complicações no retorno do paciente às atividades rotineiras. A hemólise intravascular, quando presente, pode levar a quadros graves e neste grupo estão incluídos os raros óbitos. L. gaucho L. intermedia L. laeta* Loxosceles sp. UF Período (anos) 1984-93 1990-95 1984-96 1990-95 297 9.980 267 873 96,9 99,8 86,9 87,6 3,1 0,15 13,1 12,5 70,0 11,9 46,8 54,9 0,3 0,1 1,5 0,1 SP PR SC RS Agente mais comum No de Casos % Cutânea % Cut. Visceral % Uso de Soro % Letalidade FUNASA - outubro/2001 - pág. 56 Quadro VII Loxoscelismo Classificação dos acidentes quanto à gravidade, manifestações clínicas Tratamento geral e específico * Pode haver mudança de classificação durante esse período. ** SAAr = Soro antiaracnidico. Acidentes por Latrodectus 1. Introdução Os acidentes por Latrodectus têm sido relatados na região Nordeste (Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe), causados principalmente pela espécie L. curacaviensis. Ocorrem principalmente em pacientes do sexo masculino na faixa etária de 10 a 30 anos. 2. Ações do veneno A alpha-latrotoxina é o principal componente tóxico da peçonha da Latrodectus. Atua sobre terminações nervosas sensitivas provocando quadro doloroso no local da picada. Sua ação sobre o sistema nervoso autônomo, leva à liberação de neurotransmissores adrenérgicos e colinérgicos e, na junção neuromuscular pré-sináptica, altera a permeabilidade aos íons sódio e potássio. 3. Quadro clínico 3.1. Manifestações locais Geralmente, o quadro se inicia com dor local em cerca de 60% dos casos, de pequena intensidade, evoluindo para sensação de queimadura 15 a 60 minutos após a picada. Pápula eritematosa e sudorese localizada são observadas em 20% dos pacientes. Podem ser visualizadas lesões puntiformes, distando de 1 mm a 2 mm entre si. Na área da picada há referência de hiperestesia e pode ser observada a presença de placa urticariforme acompanhada de infartamento ganglionar regional. Classificação Manifestações Clínicas Tratamento Leve - Sintomático. Acompanhamento até 72 horas após a picada* Moderado - Lesão característica - Alteração no estado geral: anemia aguda, icterícia - Evolução rápida - Alterações laboratoriais indicativas de hemólise Grave - Com ou sem identificação da Loxosceles no momento da picada - Lesão sugestiva ou característica - Alterações sistêmicas (rash cutâneo, petéquias) - Sem alterações laboratoriais sugestivas de hemólise - Loxosceles identificada como agente causador do acidente - Lesão característica - Sem comprometimento do estado geral - Sem alterações laboratoriais - Soroterapia: cinco ampolas de SAAr** IV e/ ou - Prednisona: adultos 40 mg/dia crianças 1 mg/kg/dia durante cinco dias - Soroterapia: dez ampolas de SAAr IV e - Prednisona: adultos 40 mg/dia crianças 1 mg/kg/dia durante cinco dias FUNASA - outubro/2001 - pág. 57 3.2. Manifestações sistêmicas a) Gerais: aparecem nas primeiras horas após o acidente, sendo referidas: tremores (26%), ansiedade (12%), excitabilidade (11%), insônia, cefaléia, prurido, eritema de face e pescoço. Há relatos de distúrbios de comportamento e choque nos casos graves. b) Motoras: dor irradiada para os membros inferiores aparecem em 32%, acompanhada de contraturas musculares periódicas (26%), movimentação incessante, atitude de flexão no leito; hiperreflexia ósteo-músculo-tendinosa constante. É freqüente o aparecimento de tremores e contrações espasmódicas dos membros (26%). Dor abdominal intensa (18%), acompanhada de rigidez e desaparecimento do reflexo cutâneo-abdominal, pode simular um quadro de abdome agudo. Contratura facial, trismo dos masseteres caracteriza o fácies latrodectísmica observado em 5% dos casos. Fig. 47. Blefarite em paciente picado por Latrodectus (Foto: J. R. Oliveira). c) Cardiovasculares: opressão precordial, com sensação de morte iminente, taquicardia inicial e hipertensão seguidas de bradicardia. Outras manifestações menos freqüentes são: d) Digestivas: náuseas e vômitos, sialorréia, anorexia e obstipação; e) Geniturinárias: retenção urinária, dor testicular, priapismo e ejaculação; f) Oculares: ptose e edema bipalpebral, hiperemia conjuntival, midríase (fig. 47). 4. Complicações As complicações graves como edema pulmonar agudo e choque relatadas na literatura internacional não têm sido observadas. 5. Exames complementares As alterações laboratoriais são inespecíficas, sendo descritas alterações hematológicas (leucocitose, linfopenia, eosinopenia), bioquímicas (hiperglicemia, hiperfosfatemia), do sedimento urinário (albuminúria, hematúria, leucocitúria e cilindrúria) e eletrocardiográficas (arritmias cardíacas como fibrilação atrial e bloqueios, diminuição de amplitude do QRS e da onda T, inversão da onda T, alterações do segmento ST e prolongamento do intervalo QT). Essas alterações podem persistir até por dez dias. FUNASA - outubro/2001 - pág. 60 Acidentes por abelhas 1. Características anatômicas do grupo As abelhas e vespas apresentam o corpo dividido em cabeça, tórax e abdome. Fig. 48. Morfologia externa de abelha operária de Apis Mellifera 1 ocelos; 2 cabeça; 3 olhos compostos; 4 antena; 5 mandíbula; 6 probóscide; 7 glossa; 8 maxila; 9 toráx; 10 asas; 11 espiráculo; 12 abdome; 13 aguilhão; 14 pernas (adaptação do livro Anatomy of the Honey Bee. R.E. Snodgrass, 1978). As vespas diferem das abelhas principalmente por apresentarem o abdome mais afilado e entre o tórax e o abdome uma estrutura relativamente alongada, chamada pedicelo e popularmente conhecida como “cintura”. As abelhas possuem pêlos ramificados ou plumosos, principalmente na região da cabeça e tórax, e os outros himenópteros possuem pêlos simples. O ferrão dos Aculeata apresenta-se dividido em duas partes, sendo uma formada por uma estrutura muscular e quitinosa, responsável pela introdução do ferrão e do veneno e outra parte glandular, que secreta e armazena o veneno. A glândula de veneno dos Aculeata pode apresentar muitas variações mas geralmente é constituída por dois filamentos excretores, um reservatório de veneno e um canal que liga o reservatório ao ferrão. Quanto ao padrão de utilização do aparelho de ferroar, os Aculeata podem ser divididos em dois grupos: espécies que apresentam autotomia (auto-amputação) ou seja, quando ferroam perdem o ferrão, e espécies que não apresentam autotomia. As que possuem autotomia, geralmente injetam maior quantidade de veneno e morrem após a ferroada pela perda do aparelho de ferroar e parte das estruturas do abdome. Nas espécies sem autotomia, o aparelho de ferroar pode ser utilizado várias vezes. 1.1. Distribuição geográfica dos principais himenópteros de importância médica no país As abelhas de origem alemã (Apis mellifera mellifera) (fig. 49) foram introduzidas no Brasil em 1839. Posteriormente, em 1870, foram trazidas as abelhas italianas (Apis mellifera ligustica). Essas duas subespécies foram levadas principalmente ao sul do Brasil. Já em 1956, foram introduzidas as abelhas africanas (Apis mellifera scutellata), identificadas anteriormente como Apis mellifera adansonii. FUNASA - outubro/2001 - pág. 61 Fig. 49. Apis mellifera: rainha, zangão e operária. (Foto: Acervo do Depto. Expl. Animal/FMVZ/UNESP) As abelhas africanas e seus híbridos com as abelhas européias são responsáveis pela formação das chamadas abelhas africanizadas que, hoje, dominam toda a América do Sul, a América Central e parte da América do Norte. O deslocamento destas abelhas foi mais rápido no Nordeste do Brasil, aproximadamente 500 km/ano, onde o clima é tropical seco; de 200 a 250 km/ano em clima úmido, tais como florestas tropicais da Bacia Amazônica e Guianas; e, em direção ao Paraguai e Bolívia foi de aproximadamente 150 km/ano e tornou-se zero após os paralelos 33 e 34, entre as províncias de Entre Rios, Santa Fé, Córdoba e São Luiz, na Argentina. 2. Ações do veneno O veneno da A. mellifera é uma mistura complexa de substâncias químicas com atividades tóxicas como: enzimas hialuronidases e fosfolipases, peptídeos ativos como melitina e a apamina, aminas como histamina e serotonina entre outras. A fosfolipase A2, o principal alérgeno, e a melitina representam aproximadamente 75% dos constituintes químicos do veneno. São agentes bloqueadores neuromusculares. Podendo provocar paralisia respiratória, possuem poderosa ação destrutiva sobre membranas biológicas, como por exemplo sobre as hemácias, produzindo hemólise. A apamina representa cerca de 2% do veneno total e se comporta como neurotoxina de ação motora. O cardiopeptídeo, não tóxico, tem ação semelhante às drogas ß adrenérgicas e demonstra propriedades antiarrítmicas. O peptídeo MCD, fator degranulador de mastócitos, é um dos responsáveis pela liberação de histamina e serotonina no organismo dos animais picados. 3. Quadro clínico As reações desencadeadas pela picada de abelhas são variáveis de acordo com o local e o número de ferroadas, as características e o passado alérgico do indivíduo atingido. As manifestações clínicas podem ser: alérgicas (mesmo com uma só picada) e tóxicas (múltiplas picadas). 3.1. Manifestações 3.1.1. Locais Habitualmente, após uma ferroada, há dor aguda local, que tende a desaparecer espontaneamente em poucos minutos, deixando vermelhidão, prurido e edema por várias horas ou dias (fig. 50). A intensidade desta reação inicial causada por uma ou múltiplas picadas deve alertar para um possível estado de sensibilidade e exacerbação de resposta às picadas subseqüentes. FUNASA - outubro/2001 - pág. 62 3.1.2. Regionais São de início lento. Além do eritema e prurido, o edema flogístico evolui para enduração local que aumenta de tamanho nas primeiras 24-48 horas, diminuindo gradativamente nos dias subseqüentes. Podem ser tão exuberantes a ponto de limitarem a mobilidade do membro. Menos de 10% dos indivíduos que experimentaram grandes reações localizadas apresentarão a seguir reações sistêmicas. Fig. 50. Reação alérgica por picada de abelha: edema extenso uma hora após picada (Foto: Acervo HVB/IB). 3.1.3. Sistêmicas Apresentam-se como manifestações clássicas de anafilaxia, com sintomas de início rápido, dois a três minutos após a picada. Além das reações locais, podem estar presentes sintomas gerais como cefaléia, vertigens e calafrios, agitação psicomotora, sensação de opressão torácica e outros sintomas e sinais. a) Tegumentares: prurido generalizado, eritema, urticária e angioedema. b) Respiratórias: rinite, edema de laringe e árvore respiratória, trazendo como conseqüência dispnéia, rouquidão, estridor e respiração asmatiforme. Pode haver bronco-espasmo. c) Digestivas: prurido no palato ou na faringe, edema dos lábios, língua, úvula e epiglote, disfagia, náuseas, cólicas abdominais ou pélvicas, vômitos e diarréia. d) Cardiocirculatórias: a hipotensão é o sinal maior, manifestando-se por tontura ou insuficiência postural até colapso vascular total. Podem ocorrer palpitações e arritmias cardíacas e, quando há lesões preexistentes (arteriosclerose), infartos isquêmicos no coração ou cérebro. 3.1.4. Reações alérgicas tardias Há relatos de raros casos de reações alérgicas que ocorrem vários dias após a(s) picada(s) e se manifestaram pela presença de artralgias, febre e encefalite, quadro semelhante à doença do soro. FUNASA - outubro/2001 - pág. 65 A composição de seu veneno é pouco conhecida. Seus principais alérgenos apresentam reações cruzadas com os das abelhas e também produzem fenômenos de hipersensibilidade. Ao contrário das abelhas, não deixam o ferrão no local da picada. Os efeitos locais e sistêmicos do veneno são semelhantes aos das abelhas, porém menos intensos, e podem necessitar esquemas terapêuticos idênticos. Acidentes por formigas 1. Introdução Formigas são insetos sociais pertencentes à ordem Hymenoptera, superfamília Formicoidea. Sua estrutura social é complexa, compreendendo inúmeras operárias e guerreiras (formas não capazes de reprodução) e rainhas e machos alados que determinarão o aparecimento de novas colônias. Algumas espécies são portadoras de um aguilhão abdominal ligado a glândulas de veneno. A picada pode ser muito dolorosa e pode provocar complicações tais como anafilaxia, necrose e infecção secundária. A subfamília Ponerinae inclui a Paraponera clavata, a formiga tocandira, cabo-verde ou formiga vinte-e-quatro- horas de cor negra, capaz de atingir 3 cm de comprimento e encontrada nas regiões Norte e Centro-Oeste. Sua picada é extremamente dolorosa e pode provocar edema e eritema no local, ocasionalmente acompanhada de fenômenos sistêmicos (calafrios, sudorese, taquicardia). As formigas de correição, gênero Eciton (subfamília Dorilinae), ocorrem na selva amazônica, são carnívoras e se locomovem em grande número, predando pequenos seres vivos. Sua picada é pouco dolorosa. De interesse médico são as formigas da subfamília Myrmicinae, como as formigas-de-fogo ou lava-pés (gênero Solenopsis) e as formigas saúvas (gênero Atta). As formigas-de-fogo tornam-se agressivas e atacam em grande número se o formigueiro for perturbado. A ferroada é extremamente dolorosa e uma formiga é capaz de ferroar 10-12 vezes, fixando suas mandíbulas na pele e ferroando repetidamente em torno desse eixo, o que leva a uma pequena lesão dupla no centro de várias lesões pustulosas. As espécies mais comuns são a Solenopsis invicta, a formiga lava-pés vermelha, originária das regiões Centro- Oeste e Sudeste (particularmente o Pantanal Mato-Grossense) e a Solenopsis richteri, a formiga lava-pés preta, originária do Rio Grande do Sul, Argentina e Uruguai. A primeira é responsável pelo quadro pustuloso clássico do acidente. O formigueiro do gênero tem características próprias: tem inúmeras aberturas e a grama próxima não é atacada, podendo haver folhas de permeio à terra da colônia. As saúvas, comuns em todo o Brasil, podem produzir cortes na pele humana com as potentes mandíbulas. 2. Ações do veneno O veneno da formiga lava-pés (gênero Solenopsis) é produzido em uma glândula conectada ao ferrão e cerca de 90% é constituído de alcalóides oleosos, onde a fração mais importante é a Solenopsin A, de efeito citotóxico. Menos de 10% têm constituição protéica, com pouco efeito local mas capaz de provocar reações alérgicas em determinados indivíduos. A morte celular provocada pelo veneno promove diapedese de neutrófilos no ponto de ferroada. 3. Quadro clínico Imediatamente após a picada, forma-se uma pápula urticariforme de 0,5 a 1,0 cm no local. A dor é importante, mas, com o passar das horas, esta cede e o local pode se tornar pruriginoso. Cerca de 24 horas após, a pápula dá lugar a uma pústula estéril, que é reabsorvida em sete a dez dias (fig. 52). Acidentes múltiplos são comuns em crianças, alcoólatras e incapacitadas. Pode haver infecção secundária das lesões, causada pelo rompimento da pústula pelo ato de coçar. FUNASA - outubro/2001 - pág. 66 Fig. 52. Eritema, vesículas e pústulas em paciente picado por formiga do gênero Solenopsis (lava-pés). (Foto: Acervo HVB/IB) 4. Complicações Processos alérgicos em diferentes graus podem ocorrer, sendo inclusive causa de óbito. O paciente atópico é mais sensível. Infecção secundária é comum, podendo ocorrer abscessos, celulites, erisipela. 5. Diagnóstico O diagnóstico é basicamente clínico. 6. Tratamento O tratamento do acidente por Solenopsis sp (lava-pés) deve ser feito pelo uso imediato de compressas frias locais, seguido da aplicação de corticóides tópicos. A analgesia pode ser feita com paracetamol e há sempre a indicação do uso de anti-histamínicos por via oral. Acidentes maciços ou complicações alérgicas têm indicação do uso de prednisona, 30 mg, por via oral, diminuindo- se 5 mg a cada três dias, após a melhora das lesões. Anafilaxia ou reações respiratórias do tipo asmático são emergências que devem ser tratadas prontamente (vide Acidente por abelhas). Acidentes por Paraponera clavata (tocandira) podem ser tratados de forma semelhante. FUNASA - outubro/2001 - pág. 67 V - Acidentes por Lepidópteros 1. Introdução Os acidentes causados por insetos pertencentes à ordem Lepidóptera, tanto na forma larvária como na adulta, dividem-se em: 1.1. Dermatite urticante a) causada por contato com lagartas urticantes de vários gêneros de lepidópteros; b) provocada pelo contato com cerdas da mariposa Hylesia sp. 1.2. Periartrite falangeana por pararama 1.3. Síndrome hemorrágica por Lonomia sp 2. Epidemiologia Os acidentes por lepidópteros têm sido, de modo geral, subnotificados, o que dificulta seu real dimensionamento. Em virtude das particularidades apresentadas pelos três tipos de agravo, alguns aspectos epidemiológicos serão abordados nos tópicos específicos. 3. Lepidópteros de importância médica A Ordem Lepidóptera conta com mais de 150.000 espécies, sendo que somente algumas são de interesse médico no Brasil. 3.1. Morfologia Formas larvárias A quase totalidade dos acidentes com lepidópteros decorre do contato com lagartas, recebendo esse tipo de acidente a denominação de erucismo (erucae = larva), onde a lagarta é também conhecida por taturana ou tatarana, denominação tupi que significa semelhante a fogo (tata = fogo, rana = semelhante). As principais famílias de lepidópteros causadoras de erucismo são Megalopygidae, Saturniidae e Arctiidae. Família megalopygidae Os megalopigídeos são popularmente conhecidos por sauí, lagarta-de-fogo, chapéu-armado, taturana- gatinho, taturana-de-flanela (fig. 53). Apresentam dois tipos de cerdas: as verdadeiras, que são pontiagudas contendo as glândulas basais de veneno; e cerdas mais longas, coloridas e inofensivas. FUNASA - outubro/2001 - pág. 70 Formas adultas (mariposas-da-coceira) Somente as fêmeas adultas do gênero Hylesia sp (Saturniidae) (fig. 58) apresentam cerdas no abdome que, em contato com a pele, causam dermatite papulopruriginosa. Fig. 58. Saturnídeo - Hylesia paulex. (Foto: R. Moraes) 3.2. Biologia O ciclo biológico dos lepidópteros apresenta quatro fases distintas: ovo, larva, pupa e adulto. Em Lonomia sp foram observados os seguintes períodos: a) ovo - 30 dias de período embrionário; b) larva - encontrada nos troncos das árvores, alimentando-se de folhas, esta estapa dura 59 dias; c) pupa - permanece em dormência no solo por períodos de 45 dias; d) adultos - vive cerca de 15 dias. Após o acasalamento ocorre a oviposição. As lagartas alimentam-se de folhas, principalmente de árvores e arbustos. Os megalopigídeos são solitários, enquanto os saturnídeos apresentam hábitos gregários. Dermatite urticante causada por contato com lagartas de vários gêneros 1. Introdução Acidente extremamente comum em todo o Brasil, resulta do contato da pele com lagartas urticantes sendo, em geral, de curso agudo e evolução benigna. Fazem exceção os acidentes com Lonomia sp. Dados das regiões Sul e Sudeste indicam que existe uma sazonalidade na ocorrência desses acidentes, que se expressa mais nos meses quentes, relacionada possivelmente ao ciclo biológico do agente. 2. Ações do veneno Não se conhece exatamente como agem os venenos das lagartas. Atribui-se ação aos líquidos da hemolinfa e da secreção das espículas, tendo a histamina como principal componente estudado até o momento. FUNASA - outubro/2001 - pág. 71 3. Quadro clínico As manifestações são predominantemente do tipo dermatológico, dependendo da intensidade e extensão do contato. Inicialmente, há dor local intensa, edema, eritema e, eventualmente, prurido local (fig. 59). Existe infartamento ganglionar regional característico e doloroso. Nas primeiras 24 horas, a lesão pode evoluir com vesiculação e, mais raramente, com formação de bolhas e necrose na área do contato. Fig. 59. Acidente com lagarta na mão e tronco: edema, eritema nas áreas de contato. (Foto: Acervo HVB/IB) 4. Complicações O quadro local apresenta boa evolução, regredindo no máximo em dois-três dias sem maiores complicações ou seqüelas. 5. Tratamento • lavagem da região com água fria; • infiltração local com anestésico tipo lidocaína a 2%; • compressas frias; • elevação do membro acometido; • corticosteróides tópicos; • anti-histamínico oral. Por causa da possibilidade de se tratar de acidente hemorrágico por Lonomia sp, todo o paciente que não trouxer a lagarta para identificação deve ser orientado para retorno, no caso de apresentar sangramentos até 48 horas após o contato. FUNASA - outubro/2001 - pág. 72 Dermatite urticante provocada por contato com mariposa Hylesia sp 1. Introdução Fêmeas de mariposas de Hylesia sp têm causado surtos de dermatite papulopruriginosa. As mariposas, atraídas pela luz, invadem os domicílios e, ao se debaterem, liberam no ambiente as espículas que, atingindo a superfície cutânea, podem causar quadros de dermatite aguda. O contato com cerdas tóxicas de mariposas do gênero Hylesia ocasionou surtos de dermatite urticante inicialmente descritos no estado do Amapá. A partir da década de 1980, relatos ocasionais vêm sendo feitos em Minas Gerais, São Paulo e Paraná. 2. Ações do veneno Além do trauma mecânico provocado pela introdução das espículas, postula-se a presença de fatores tóxicos que, até agora, praticamente não foram estudados. 3. Quadro clínico Lesões papulopruriginosas acometendo áreas expostas da pele são observadas cerca de poucas horas após o contato com as cerdas (fig. 60). Acompanhadas de intenso prurido, as lesões evoluem para cura em períodos variáveis de sete a 14 dias após o início dos primeiros sintomas. Fig. 60. Acidente por Hylesia sp: lesões pápulo-pruriginosas extensas por contato há sete dias. (Foto: Acervo HVB/IB) 4. Tratamento O uso de anti-histamínicos, por via oral, está indicado para o controle do prurido, além de tratamento tópico com compressas frias, banhos de amido e, eventualmente, cremes à base de corticosteróides. FUNASA - outubro/2001 - pág. 75 Fig. 63. Hematúria macroscópica (Foto: A. Duarte)Fig. 62. Equimoses espontâneas à distância pós contato com Lonomia sp. (Foto: A. Duarte) De acordo com a intensidade dos distúrbios hemostáticos, o acidente pode ser classificado em: a) Leve: paciente com envenenamento local e sem alteração da coagulação ou sangramentos até 48 horas após o acidente, confirmado com a identificação do agente; b) Moderado: paciente com envenenamento local, alteração da coagulação somente ou manifestações hemorrágicas na pele e/ou em mucosas (gengivorragia, equimose, hematoma), hematúria e sem alteração hemodinâmica (hipotensão, taquicardia ou choque); c) Grave: paciente com alteração da coagulação, manifestações hemorrágicas em vísceras (hematêmese, hipermenorragia, sangramento pulmonar, hemorragia intracraniana), e com alterações hemodinâmicas e/ou falência de múltiplos órgãos ou sistemas. 4. Complicações A principal complicação é a insuficiência renal aguda que pode ocorrer em até 5% dos casos, sendo mais freqüente em pacientes acima de 45 anos e naqueles com sangramento intenso. A fisiopatologia é multifatorial, podendo estar relacionada a hipotensão, seqüestro de sangue e ação direta do veneno. 5. Exames complementares Não existem exames específicos. Podem ser observados: - alteração do Tempo de Coagulação - prolongamento do Tempo de Protrombina (TP) e Tempo de Tromboplastina Parcial Ativado (TTPA), observados no coagulograma; - diminuição acentuada do fibrinogênio plasmático; - elevação de Produtos de Degradação do Fibrinogênio (PDF) e dos Produtos de Degradação da Fibrina (PDFib); - número de plaquetas normal. 6. Diagnóstico Não existem métodos diagnósticos específicos. O diagnóstico diferencial com as dermatites urticantes provocadas por outros lepidópteros deve ser feito pela história clínica, identificação do agente e presença de distúrbios hemostáticos. FUNASA - outubro/2001 - pág. 76 Quadro IX Classificação de gravidade e orientação terapêutica nos acidentes por Lonomia 8. Prognóstico Tornam o prognóstico mais reservado: - acidentes com elevado número de lagartas e contato intenso com as larvas; - acidentes em idosos; - patologias prévias do tipo hipertensão arterial e úlcera péptica, entre outras, e traumatismos mecânicos pós-contato. a) Caso a lagarta seja capturada, deve-se fazer a sua identificação para estabelecer o diagnóstico diferencial com outros gêneros de lepidópteros. Sendo a lagarta identificada como Lonomia, deve-se verificar a presença de hemorragias e alteração na coagulação. Se o TC estiver normal e não houver sangramentos, o paciente deve ser acompanhado por 48 horas, com avaliação do TC a cada 12 horas. Se o TC estiver alterado ou houver evidências de sangramento, é confirmado o diagnóstico de síndrome hemorrágica. b) Caso a lagarta não seja identificada, deve-se fazer o TC e, se este mostrar-se normal, o acompanhamento por 48 horas deve seguir as mesmas orientações acima. 7. Tratamento O tratamento do quadro local segue as mesmas orientações para a dermatite urticante provocada por outros lepidópteros. Nos acidentes com manifestações hemorrágicas, o paciente deve ser mantido em repouso, evitando-se traumas mecânicos. Agentes antifibrinolíticos têm sido utilizados, como: - ácido épsilon-aminocapróico (Ipsilon, ampola de 1g e 4g) 30 mg/kg de peso como dose inicial por via IV, seguida de 15 mg/kg a cada quatro horas até a normalização da coagulação; - aprotinina (Trasylol), utilizada na Venezuela, porém não diponível no nosso meio. A correção da anemia deve ser instituída por meio da administração de concentrado de hemácias. Sangue total ou plasma fresco são contra-indicados pois podem acentuar o quadro de coagulação intravascular. O soro antilonômico (SALon) começa a ser produzido em pequena escala, estando em fase de ensaios clínicos, de utilização restrita. As doses utilizadas no momento, de acordo com a gravidade, estão contidas no quadro IX. Manifestações e gravidade Quadro local Tempo de coagulação Sangramento Tratamento presente presente ou ausente presente ou ausente normal alterado alterado ausente ausente ou presente em pele/mucosas presente em vísceras risco de vida sintomático sintomático soroterapia: 5 amp. de SALon IV sintomático soroterapia: 10 amp. de SALon IV Leve Moderado Grave FUNASA - outubro/2001 - pág. 77 Fig. 64. Paederus sp (Potó). (Foto: R. Moraes) VI - Acidentes por Coleópteros 1. Introdução Vários gêneros de coleópteros podem provocar quadros vesicantes. A compressão ou atrito destes besouros sobre a pele determina um quadro dermatológico, decorrente da liberação, por parte do inseto, de substâncias tóxicas de efeito cáustico e vesicante. O contato ocorre, muitas vezes, nas proximidades de luz artificial para a qual são fortemente atraídos. São descritas em torno de 600 espécies no mundo, sendo mais de 48 sul-americanas. Já foram registrados surtos epidêmicos. 2. Coleópteros de importância médica No Brasil, são descritos os acidentes por besouros do gênero Paederus (Coleoptera, Staphylinidae) nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e pelo gênero Epicauta (Coleoptera, Meloidae) no estado de São Paulo. O gênero Paederus (potó, trepa-moleque, péla-égua, fogo-selvagem) compõe-se de pequenos besouros de corpo alongado, medindo de 7 mm a 13 mm de comprimento (fig. 64); possuem élitros curtos, que deixam descoberta mais da metade do abdome. Vivem em lugares úmidos, arrozais, culturas de milho e algodão. Cinco espécies de Paederus são associadas a acidentes humanos no Brasil: P. amazonicus, P. brasiliensis, P. columbinus, P. fuscipes e P. goeldi. São espécies polífagas, predadoras de outros insetos, nematódeos e girinos. Quando molestados, os adultos se defendem com as mandíbulas, tentando morder, ao mesmo tempo em que encurvam o abdome, provavelmente também para acionar a secreção das glândulas pigidiais. As denominações de potó-grande, potó-pimenta, papa-pimenta, caga-fogo e caga-pimenta provavelmente correspondem ao gênero Epicauta (Coleoptera, Meloidae), as cantáridas do Novo Mundo (fig. 65), também dotadas de propriedades vesicantes (atribuídas à cantaridina) sendo causadoras de lesões menos evidentes, que regridem em cerca de três dias. FUNASA - outubro/2001 - pág. 81 VII - Ictismo 1. Introdução Acidentes humanos provocados por peixes marinhos ou fluviais são denominados de ictismo. Algumas espécies provocam acidentes por ingestão (acidente passivo), enquanto outras por ferroadas ou mordeduras (acidente ativo). Os acidentes ativos ocorrem quando a vítima invade o meio ambiente destes animais ou no seu manuseio. Na Amazônia existem ainda peixes que produzem descarga elétrica e outros que penetram em orifícios naturais dos banhistas. 2. Ações do veneno Pouco se conhece sobre os órgãos produtores e os venenos dos peixes brasileiros. Os acidentes acantotóxicos (arraias, por exemplo) são de caráter necrosante e a dor é o sintoma proeminente. O veneno das arraias é composto de polipeptídeos de alto peso molecular. Em sua composição já foram identificadas a serotonina, a fosfodiesterase e a 5-nucleotidase. É um veneno termolábil que ocorre na maioria desse grupo. Os acidentes sarcotóxicos ocorrem por ingestão de peixes e frutos do mar. Os baiacus (Tetrodontidae) produzem tetrodontoxina, potente bloqueador neuromuscular que pode conduzir a vítima à paralisia consciente e óbito por falência respiratória. Peixes que se alimentam do dinoflagelado Gambierdiscus toxicus podem ter acúmulo progressivo de ciguatoxina nos tecidos, provocando o quadro denominado ciguatera (neurotoxicidade). Acidentes escombróticos acontecem quando bactérias provocam descarboxilação da histidina na carne de peixes malconservados, produzindo a toxina saurina, capaz de liberar histamina em seres humanos. Acúmulo de metil-mercúrio em peixes pescados em águas contaminadas podem produzir quadros neurológicos em humanos, quando houver ingestão crônica. 3. Formas de ictismo Os acidentes por peixes podem se apresentar de acordo com a tabela 7. Tabela 7 Formas de Ictismo Ativo Passivo - Peçonhentos ou acantotóxicos - Não peçonhentos - Venenosos ou sarcotóxicos - Não venenosos - traumático ou vulnerante - descarga elétrica - contaminação química - peixes em decomposição - contaminação bacteriana Os acidentes considerados peçonhentos ou acantotóxicos são causados principalmente por arraias marinhas (Dasyatis guttatus, D. americana, Gymnura micrura, etc), arraias fluviais (Potamotrygon hystrix, P. motoro) (fig. 67), bagres (Bagre bagre, B. marinus, etc), mandi (Genidens genidens, Pimelodella brasiliensis), peixe escorpião, beatinha ou mangangá (Scorpaena brasiliensis, S. plumeri), niquim ou peixe sapo (Thalassophryne natterreri, T. amazonica). FUNASA - outubro/2001 - pág. 82 Os peixes acantotóxicos possuem espinhos ou ferrões pontiagudos e retrosserrilhados (fig. 68), envolvidos por bainha de tegumento sob a qual estão as glândulas de veneno existentes nas nadadeiras dorsais, peitorais ou na cauda, com exceção do niquim, cujas glândulas estão na base dos ferrões. Fig. 67. Potamotrygon sp: arraia fluvial. (Foto: P. Pardal) Fig. 68. Duplo ferrão de arraia. (Foto: P. Pardal) Os peixes venenosos ou sarcotóxicos são todos aqueles que, uma vez ingeridos, causam acidentes por conter toxinas na pele, músculos, vísceras e gônadas. As intoxicações mais encontradas são: tetrodontóxico, ciguatóxico e escombrótico. As suas toxinas são termoestáveis. O acidente tetrodontóxico é causado por peixes da família Tetraodontidae, popularmente conhecidos por baiacus (Colomesus psittacus, Lagocephalus laevigatus, Diodon hystrix, etc.). Algumas espécies de baiacu são usadas na alimentação mas o seu preparo deve ser feito por pessoa habilitada com a retirada das partes tóxicas. Os acidentes ciguatóxicos, também chamados de ciguatera, ocorrem principalmente no Oceano Pacífico e são causados por peixes comestíveis como: garoupa (Cephalopholis argus), barracuda (Sphyraena barracuda), bicuda (Sphyraena picudilla), etc., contaminados pela ciguatoxina. A ingestão de peixes contaminados por metil-mercúrio leva à doença denominada de Minamata. Peixes inadequadamente conservados podem causar o quadro denominado acidente escombrótico. FUNASA - outubro/2001 - pág. 83 Fig. 69. Acidente por arraia fluvial com cinco dias de evolução. (Foto: P. Pardal) 4.2. Vulnerante ou traumatogênico É o acidente causado por ferroadas ou mordeduras de peixes não peçonhentos. O sintoma principal é dor no local do ferimento, que pode ser puntiforme ou lacerante, acompanhados por sangramento local. Dependendo do local e extensão do trauma, pode ocorrer óbito. 4.3. Sarcotóxicos Os acidentes denominados de ciguatera e o tetrodontóxico produzem manifestações neurológicas e gastrintestinais. A sintomatologia neurológica é a primeira a aparecer. Em poucas horas o paciente queixa-se de sensação de formigamento da face, lábios, dedos das mãos e pés, fraqueza muscular, mialgias, vertigens, insônia, dificuldade de marcha e distúrbios visuais. Com o agravamento das manifestações nervosas, aparecem convulsões, dispnéia, parada respiratória e morte, que pode ocorrer nas primeiras 24 horas. A sintomatologia gastrintestinal instala-se em seguida ao início das manifestações neurológicas e é caracterizada por náuseas, vômitos, dores abdominais e diarréia. A recuperação clínica do envenenamento por peixes pode se estender de semanas a meses. Os acidentes traumáticos ou vulnerantes são causados por dentes, rostros e acúleos sem ligação com glândulas de veneno, determinando na superfície do corpo humano soluções de continuidade, de extensão e profundidade variáveis. Entre eles, temos: espadarte (Xiphias gladius), piranhas (fam. Serrasalmidae) e tubarões. Os candirus (Vandellia cirrhosa) são peixes pequenos e que podem penetrar em qualquer orifício natural de banhistas nos rios da Amazônia, produzindo acidente traumático. Os acidentes por descarga elétrica são provocados por contato com peixes que possuem órgãos capazes de produzir eletricidade. Entre eles, estão o poraquê (Electrophorus electricus) e a arraia treme-treme (Narcine brasiliensis). 4. Quadro clínico 4.1. Acantotóxico No acidente por peixe peçonhento ou acantotóxico pode haver um ferimento puntiforme ou lacerante acompanhado por dor imediata e intensa no início, durando horas ou dias. O eritema e edema são regionais, em alguns casos acomete todo o membro atingido (fig. 69). Nos casos graves segue-se linfangite, reação ganglionar, abscedação e necrose dos tecidos no local do ferimento (fig. 70). As lesões, quando não tratadas, podem apresentar infeção bacteriana secundária, levando semanas para curar e deixando cicatrizes indeléveis. Podem ocorrer manifestações gerais como: fraqueza, sudorese, náuseas, vômitos, vertigens, hipotensão, choque e até óbito. FUNASA - outubro/2001 - pág. 87 VIII - Acidentes por Celenterados 1. Introdução O filo Coelenterata é composto por animais simples, de estrutura radial, apresentando tentáculos que se inserem em volta da cavidade oral. Esses tentáculos capturam presas e apresentam células portadoras de um minúsculo corpo oval chamado nematocisto, capaz de injetar veneno por um microaguilhão que dispara quando a célula é tocada (fig. 71). Compreende 3 classes: a) Classe Anthozoa: anêmonas e corais. As anêmonas lembram flores aquáticas. b) Classe Hydrozoa: são as hidras (pólipos fixos) e colônias de pólipos de diferenciação maior (caravelas ou Physalias). c) Classe Scyphozoa: medusas, formas livres, popularmente conhecidas como águas-vivas. Acidentes com anêmonas e corais são pouco freqüentes e de pouca gravidade: o contato é rápido e existem poucos nematocistos. Corais podem produzir cortes e introduzir fragmentos calcários. O gênero Anemona é o mais comum no Brasil. Corais são pólipos concentradores de cálcio e formam grandes recifes (gênero Orbicella e Oculina, os populares corais brancos). Os acidentes mais importantes ocorrem devido às classes Hydrozoa (caravelas) e Scyphozoa (águas-vivas). As caravelas apresentam um balão flutuador de coloração azul-purpúrica, de onde partem inúmeros tentáculos. A caravela do Oceano Atlântico é a Physalia physalis que atinge 30 cm de comprimento do corpo e pode ter tentáculos de 30 metros (fig. 72). A freqüência dos acidentes é maior no verão, quando podem atingir a praia em grande número, provocando centenas de acidentes. A caravela (Physalia) é sem dúvida a responsável pelo maior número e pela maior gravidade dos acidentes desse gênero no Brasil. As medusas também provocam acidentes. As mais perigosas, capazes de matar um homem em minutos, são as do gênero Chironex (box jellyfish), encontradas na Austrália. No Brasil, os acidentes mais graves são causados pela Chiropsalmus quadrumanus, da mesma família da Chironex e pela Carybdea alata, menos perigosa. Existem ainda as espécies Tamoya haplonema e a Cyanea sp. As medusas preferem águas de fundo arenoso e estuários de rios, recolhendo- se em águas profundas nas horas mais quentes do dia. Fig. 71. Nematocisto. (Desenho: M. Aloise) FUNASA - outubro/2001 - pág. 88 2. Ações do veneno O veneno de celenterados é uma mistura de vários polipeptídeos que tem ações tóxicas e enzimáticas na pele humana podendo provocar inflamação extensa e até necrose. Outra ação importante é a neurotoxicidade que provoca efeitos sistêmicos, desorganiza a atividade condutora cardíaca levando a arritmias sérias, altera o tônus vascular e pode levar à insuficiência respiratória por congestão pulmonar. Atividade hemolítica foi descrita para o veneno de Physalia. 3. Quadro clínico 3.1. Manifestações locais São as mesmas para todos os celenterados, ocorrendo ardência e dor intensa no local, que podem durar de 30 minutos a 24 horas. Placas e pápulas urticariformes lineares aparecem precocemente, podendo dar lugar a bolhas e necrose importante em cerca de 24 horas. Neste ponto as lesões urticariformes dos acidentes leves regridem, deixando lesões eritematosas lineares, que podem persistir no local por meses. (fig. 73). 3.2. Manifestações sistêmicas Nos casos mais graves há relatos de cefaléia, mal-estar, náuseas, vômitos, espasmos musculares, febre, arritmias cardíacas. A gravidade depende da extensão da área comprometida. A ingestão de celenterados pode levar a quadros gastrintestinais alérgicos e quadros urticariformes. Podem aparecer urticárias e erupções recorrentes, estas a partir de um único acidente, além de reações distantes do local do acidente. O óbito pode ocorrer por efeito do envenenamento (insuficiência respiratória e choque) ou por anafilaxia. 4. Diagnóstico O diagnóstico é clínico. O padrão linear edematoso é muito sugestivo, se acompanhado de dor aguda e intensa. O acidente deve ser diferenciado da fitofotomelanose. Fig. 72. Phisalia physalis (caravela). (Desenho: M. Aloise) FUNASA - outubro/2001 - pág. 89 Fig. 73. Lesões eritematosas lineares dois dias após contato com “água-viva”. (Foto: Acervo HVB/IB) 5. Tratamento a) Fase 1 - repouso do segmento afetado. b) Fase 2 - retirada de tentáculos aderidos: a descarga de nematocistos é contínua e a manipulação errônea aumenta o grau de envenenamento. Não usar água doce para lavar o local (descarrega nematocistos por osmose) ou esfregar panos secos (rompe os nematocistos). Os tentáculos devem ser retirados suavemente levantando-os com a mão enluvada, pinça ou bordo de faca. O local deve ser lavado com água do mar. c) Fase 3 - inativação do veneno: o uso de ácido acético a 5% (vinagre comum), aplicado no local, por no mínimo 30 minutos inativa o veneno local. d) Fase 4 - retirada de nematocistos remanescentes: deve-se aplicar uma pasta de bicarbonato de sódio, talco e água do mar no local, esperar secar e retirar com o bordo de uma faca. e) Fase 5 - bolsa de gelo ou compressas de água do mar fria por 5 a 10 minutos e corticóides tópicos duas vezes ao dia aliviam os sintomas locais. A dor deve ser tratada com analgésicos. FUNASA - outubro/2001 - pág. 93 2.1.1. Prevenção das RP A SAV não é um procedimento isento de riscos, havendo possibilidade do aparecimento de RP, semelhantes à reação “anafilática”. O teste de sensibilidade, cutâneo ou ocular, tem sido excluído da rotina do tratamento de acidentes por animais peçonhentos em vários serviços no Brasil e no exterior. Além de apresentar baixa sensibilidade e baixos valores preditivos das RP, este procedimento retarda o início do tratamento específico. Diante destas considerações, não está indicada a realização do teste de sensibilidade. Não existem estudos clínicos controlados atestando a eficácia dos diferentes pré-tratamentos em prevenir e diminuir a freqüência das RP à SAV. Em estudo clínico controlado recente, demonstrou-se que a prometazina, injetada pela via intramuscular, 15 minutos antes da SAV, não reduziu a freqüência de reações precoces à soroterapia antibotrópica. Baseados em outras experiências, alguns autores indicam o pré-tratamento com antagonistas, dos receptores H 1 da histamina e corticosteróides. Embora estas drogas não previnam a liberação de histamina e ativação de Complemento, poderiam antagonizar o efeito da histamina nos órgãos-alvo, bem como diminuir a freqüência de reações tardias à SAV. Em razão das indicações de que a vasodilatação periférica, o rubor facial e a hipotensão arterial observadas após a liberação da histamina são dependentes, tanto da estimulação dos receptores H 1 , quanto dos receptores H 2 , foi associado ao esquema anterior à droga Cimetidina, antogonista dos receptores H 2 da histamina. Aconselha-se seguir a seguinte rotina antes da administração dos soros antivenenos: a) Garantir um bom acesso venoso. b) Dentro das possibilidades, é conveniente deixar preparado: • laringoscópio com lâminas e tubos traqueais adequados para o peso e idade. • frasco de soro fisiológico (SF) e/ou solução de Ringer lactato. • frasco de solução aquosa de adrenalina (1:1000) e de aminofilina (10 ml = 240 mg). Caso seja feita a opção da pré-medicação, deve-se administrá-la 10 a 15 minutos antes de iniciar a soroterapia: a) Drogas anti-histamínicas (antagonistas H 1 e H 2 ) por via parenteral: • Antagonistas H 1 : maleato de dextroclorofeniramina (disponível em farmácia de manipulação) na dose de 0,05 mg/kg por via intramuscular (IM) ou IV, aplicar no máximo 5,0 mg; ou prometazina (Fenergan ®) na dose de 0,5 mg/kg IV ou IM, aplicar no máximo 25 mg. • Antagonistas H 2 : cimetidina (Tagamet ®) na dose de 10 mg/kg, máximo de 300 mg, ou ranitidina (Antak ®) na dose de 3 mg/kg, máximo de 100 mg, IV lentamente. b) Hidrocortisona (Solu-Cortef ®) na dose de 10 mg/kg IV. Aplicar no máximo 1.000 mg. 2.1.2. Tratamento das RP Apesar de se desconhecer qual a patogênese das reações precoces, o tratamento preconizado é semelhante àquele indicado para reações alérgicas e de anafilaxia sistêmica. Caso o paciente apresente intensa reação urticariforme, pode-se indicar um anti-histamínico e, se não houver boa resposta, adrenalina milesimal pela via subcutânea, na dose de 0,01 ml/kg, não excedendo 0,3 ml. As RP mais graves são o choque “anafilático” e a insuficiência respiratória obstrutiva, devendo, nestas situações, serem tomadas as seguintes condutas: • Suspender temporariamente a infusão da SAV • Tratar as reações a) Tratamento do choque • Adrenalina (1:1000) - diluída a 1:10 na dose de 0,1 ml/kg, até 3,0 ml por via IV ou intratraqueal ou subcutânea, por ordem de eficácia. Repetir, se necessário, até três vezes com intervalo de cinco minutos. É a droga de escolha para o tratamento inicial. Os antagonistas H 1 e os corticosteróides devem ser usados associados à adrenalina e nunca para substituí-la. FUNASA - outubro/2001 - pág. 94 • Hidrocortisona - 30 mg/kg IV com dose máxima de 1.000 a 2.000 mg. • Prometazina - 0,5 mg/kg IV ou IM com dose máxima de 25 mg. • Expansão da volemia - soro fisiológico ou solução de Ringer lactato. Iniciar a infusão rapidamente na dose de 20 ml/kg peso. b) Tratamento da insuficiência respiratória • Manter oxigenação adequada - Caso ocorra edema de glote, proceder a introdução de uma sonda adequada pela via orotraqueal, que consiga ultrapassar o orifício da fenda glótica ou, se não for possível, realizar a cricotomia ou traqueostomia de emergência. Para uma crise asmatiforme, pode ser realizada inalação com uma droga broncodilatadora tipo beta b 2 , como fenoterol, ou aminofilina, por via intravenosa, na dose de 3 a 5 mg/kg por dose, em intervalos de seis horas numa infusão entre 5 a 15 minutos. • Reiniciar a SAV - Uma vez controlada a RP grave, a SAV deve ser reiniciada. O soro pode ser diluído em SF ou soro glicosado a 5%, numa razão de 1:2 a 1:5 e infundido mais lentamente. 2.2. Reações tardias Também conhecidas como “Doença do Soro”, ocorrem de cinco a 24 dias após o uso da SAV. Os pacientes podem apresentar febre, artralgia, linfoadenomegalia, urticária e proteinúria (fig. 74). Fig. 74. “Doença do Soro”: lesões urticariformes generalizadas dez dias após soroterapia. (Foto: J. C. Valencia) FUNASA - outubro/2001 - pág. 95 A incidência real destas manifestações é subestimada, pois muitos pacientes não retornam ao serviço em que foram tratados ou não lhes foi chamada a atenção para, em caso de aparecimento da sintomatologia citada, procurar novamente o médico. Os mecanismos mais prováveis incluem a formação de complexo imune entre antiveneno e veneno, com ativação e consumo de Complemento. Dependendo da intensidade das manifestações clínicas, pode-se utilizar um corticosteróide, como a prednisona, na dose de 1 mg/kg dia (máximo de 60 mg) por cinco a sete dias. FUNASA - outubro/2001 - pág. 101 XII - Aplicabilidade do método de ELISA no estudo do envenenamento por animais peçonhentos Métodos imunoenzimáticos para a detecção de veneno e antiveneno estão sendo desenvolvidos para auxiliar o estudo do envenenamento por animais peçonhentos. Estes testes, contudo, ainda não estão disponíveis para uso de rotina, sendo atualmente empregados em estudos piloto. A técnica utilizada com maior freqüência é a do ensaio imunoenzimático de fase sólida (ELISA), em razão de sua sensibilidade, reprodutibilidade, facilidade de execução e custo não muito elevado. Os ELISAs têm sido atualmente empregados para: 1. Detecção de veneno Esta técnica tem sido utilizada na detecção de veneno em sangue, urina e outros fluidos corporais de pacientes recentemente picados. Como principal método imunodiagnóstico, permite a caracterização do gênero do animal envolvido no acidente, como nos casos de envenenamento botrópico e laquético que apresentam quadros clínicos semelhantes. Além disso, esta técnica pode ser ainda empregada na quantificação e determinação da cinética do veneno circulante, possibilitando a sua correlação com a gravidade do envenenamento. Alguns destes testes estão em fase de padronização e têm sido utilizados para o diagnóstico diferencial dos acidentes por Bothrops atrox e Lachesis muta na região Norte do país, e para a detecção de veneno em pacientes picados por Tityus serrulatus e por Crotalus durissus. 2. Detecção de soro heterólogo A disponibilidade de ELISAs para a detecção de veneno e de antiveneno (IgG de cavalo contra veneno botrópico, laquético, crotálico e escorpiônico) tem possibilitado a avaliação da eficácia das doses de antiveneno necessárias para neutralizar o veneno circulante em pacientes de diferentes tipos de envenenamento com o objetivo de fornecer subsídio para racionalizar a terapêutica com antivenenos específicos. FUNASA - outubro/2001 - pág. 103 XIII - Prevenção de acidentes e primeiros socorros 1. Ofidismo 1.1. Como prevenir acidentes a) o uso de botas de cano alto ou perneira de couro, botinas e sapatos evita cerca de 80% dos acidentes; b) cerca de 15% das picadas atinge mãos ou antebraços. Usar luvas de aparas de couro para manipular folhas secas, montes de lixo, lenha, palhas, etc. Não colocar as mãos em buracos; c) cobras gostam de se abrigar em locais quentes, escuros e úmidos. Cuidado ao mexer em pilhas de lenha, palhadas de feijão, milho ou cana. Cuidado ao revirar cupinzeiros; d) onde há rato há cobra. Limpar paióis e terreiros, não deixar amontoar lixo. Fechar buracos de muros e frestas de portas; e) evitar acúmulo de lixo ou entulho, de pedras, tijolos, telhas, madeiras, bem como mato alto ao redor das casas, que atraem e abrigam pequenos animais que servem de alimentos às serpentes. 1.2. Primeiros socorros • lavar o local da picada apenas com água ou com água e sabão; • manter o paciente deitado; • manter o paciente hidratado; • procurar o serviço médico mais próximo; • se possível, levar o animal para identificação. 1.2.1. Não fazer • não fazer torniquete ou garrote; • não cortar o local da picada; • não perfurar ao redor do local da picada; • não colocar folhas, pó de café ou outros contaminantes; • não oferecer bebidas alcoólicas, querosene ou outros tóxicos. 2. Aracnídeos (escorpiões e aranhas) 2.1. Como prevenir acidentes a) manter jardins e quintais limpos. Evitar o acúmulo de entulhos, folhas secas, lixo doméstico, material de construção nas proximidades das casas; b) evitar folhagens densas (plantas ornamentais, trepadeiras, arbusto, bananeiras e outras) junto a paredes e muros das casas. Manter a grama aparada; c) limpar periodicamente os terrenos baldios vizinhos, pelo menos, numa faixa de um a dois metros junto das casas; d) sacudir roupas e sapatos antes de usá-los pois as aranhas e escorpiões podem se esconder neles e picam ao serem comprimidos contra o corpo; e) não pôr as mãos em buracos, sob pedras e troncos podres. É comum a presença de escorpiões sob dormentes da linha férrea; f) o uso de calçados e de luvas de raspas de couro pode evitar acidentes; FUNASA - outubro/2001 - pág. 104 g) como muitos destes animais apresentam hábitos noturnos, a entrada nas casas pode ser evitada vedando-se as soleiras das portas e janelas quando começar a escurecer; h) usar telas em ralos do chão, pias ou tanques; i) combater a proliferação de insetos, para evitar o aparecimento das aranhas que deles se alimentam; j) vedar frestas e buracos em paredes, assoalhos e vãos entre o forro e paredes, consertar rodapés despregados, colocar saquinhos de areia nas portas, colocar telas nas janelas; l) afastar as camas e berços das paredes. Evitar que roupas de cama e mosquiteiros encostem no chão. Não pendurar roupas nas paredes; examinar roupas principalmente camisas, blusas e calças antes de vestir. Inspecionar sapatos e tênis antes de usá-los; m)acondicionar lixo domiciliar em sacos plásticos ou outros recipientes que possam ser mantidos fechados, para evitar baratas, moscas ou outros insetos de que se alimentam os escorpiões; n) preservar os inimigos naturais de escorpiões e aranhas: aves de hábitos noturnos (coruja, joão-bobo), lagartos, sapos, galinhas, gansos, macacos, coatis, etc. (na zona rural). 2.2. Primeiros socorros • lavar o local da picada; • usar compressas mornas ajudam no alívio da dor; • procurar o serviço médico mais próximo; • se possível, levar o animal para identificação. 3. Abelhas e vespas 3.1. Como prevenir acidentes a) a remoção das colônias de abelhas e vespas situadas em lugares públicos ou residências deve ser efetuada por profissionais devidamente treinados e equipados; b) evitar aproximação de colméias de abelhas africanizadas Apis mellifera sem estar com vestuário e equipamento adequados (macacão, luvas, máscara, botas, fumigador, etc.); c) evitar a aproximação dos ninhos quando as vespas estiverem em intensa atividade, cujo o pico é atingido geralmente entre 10 e 12 horas; c) evitar caminhar e correr na rota de vôo percorrida pelas vespas e abelhas; d) evitar aproximar o rosto de determinados ninhos de vespas pois algumas esguicham o veneno no rosto do operador, podendo provocar sérias reações nos olhos; e) evitar a aproximação dos locais onde as vespas estejam coletando materiais: hortaliças e outras plantações, onde procuram por lagartas e outros insetos para alimentar sua prole; flores (coleta de néctar); galhos, troncos e folhas (coletam fibras para construir ninhos de celulose); locais onde haja água principalmente em dias quentes, outras fontes de proteína animal e carboidratos tais como frutas caídas, caldo de cana-de-açúcar (carrinhos de garapeiros), pedaços de carne e lixo doméstico; f) barulhos, perfumes fortes, desodorantes, o próprio suor do corpo e cores escuras (principalmente preta e azul-marinho) desencadeiam o comportamento agressivo e conseqüentemente o ataque de vespas e abelhas. 3.2. Primeiros socorros • em caso de acidente, provocado por múltiplas picadas de abelhas ou vespas, levar o acidentado rapidamente ao hospital e alguns dos insetos que provocaram o acidente; • a remoção dos ferrões pode ser feita raspando-se com lâminas, evitando-se retirá-los com pinças, pois provocam a compressão dos reservatórios de veneno, o que resulta na inoculação do veneno ainda existente no ferrão.
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