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Equações de Campo de Einstein e Acreção de Massa em Buracos Negros, Teses (TCC) de Física

Este documento aborda as equações de campo de einstein e a teoria da acreção de massa em buracos negros, incluindo a métrica de schwarzschild, o tensor métrico e a distribuição isotrópica e monoenergética de partículas de gás. Além disso, discute a formação de singularidades no fluxo de gás e a solução trans-sónica.

Tipologia: Teses (TCC)

2010

Compartilhado em 21/09/2010

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Baixe Equações de Campo de Einstein e Acreção de Massa em Buracos Negros e outras Teses (TCC) em PDF para Física, somente na Docsity! Departamento de Matemática e Engenharias Acreção esférica de matéria por buracos negros de Schwarzschild José Laurindo de Góis Nóbrega Sobrinho Fevereiro de 2004 ii Abstract Um buraco negro de Schwarzschild isolado no meio acaba sempre por capturar alguma matéria da vizinhança mediante um processo de acreção com simetria esférica. Neste trabalho é revista a acreção esférica por buracos negros de Schwarzschild para as seguintes situações: gás sem colisões, regime hidrodinâmico adiabático (incluindo o tratamento relativista), regime quase-adiabático, regime não adiabático e regime não adiabático na presença de um campo magnético não desprezável. v Lista de Figuras 2.1 Estrutura do buraco negro de Schwarzschild................................................... 4 4.1 Variação do número de Mach com a distância na acreção esférica................. 25 7.1 Grau de ionização numa região HI.................................................................. 51 7.2 Taxa de arrefecimento do gás numa região HI................................................ 53 7.3 Taxa de arrefecimento do gás numa região HII............................................... 54 7.4 Velocidade radial do gás na acreção esférica.................................................. 61 7.5 Densidade do gás na acreção esférica.............................................................. 61 7.6 Temperatura do gás na acreção esférica.......................................................... 62 7.7 Espectro emitido na acreção esférica numa região HII................................... 63 7.8 Variação do grau de ionização com o raio numa região HI............................. 65 7.9 Espectro emitido na acreção esférica numa região HI..................................... 66 8.1 Velocidade radial do gás na acreção esférica na presença de um campo magnético......................................................................................................... 73 8.2 Densidade do gás na acreção esférica na presença de um campo magnético.. 74 8.3 Espectro da emissão de sincotrão na acreção esférica na presença de um campo magnético............................................................................................. 78 vi Acrónimos Constantes físicas Velocidade da luz no vazio c=2.99792458×108ms-1 Constante de Planck h=6.62620×10-34Js Carga elementar e=1.602189×10-19C Número de Avogadro No=6.0221367×1023mol-1 Constante universal dos gases R=8.31441Jmol-1K-1 Constante de Boltzmann k=1.380662×10-23JK-1 Constante de Stefan-Boltzmann σ=5.66956×10-8Wm-2K-4 Constante da gravitação G=6.6742×10-11Nm2kg-2 Massa de Planck mp=5.456×10-8kg Raio Solar RŸ =6.9599×108m Massa Solar MŸ =1.989×1030kg Luminosidade Solar LŸ =3.826×1026W vii Prefácio Um dos processos que poderá levar à detecção indirecta de buracos negros consiste na detecção da radiação emitida quando estes acretam matéria do meio circundante. Se tivermos um buraco negro isolado, mergulhado no meio interestelar, então o processo de acreção tem simetria esférica. Se o buraco negro fizer parte um sistema binário então poderá formar-se um disco de acreção de matéria. São conhecidos actualmente vários candidatos a buraco negro identificados, em parte, a partir da radiação emitida em discos de acreção de matéria. O primeiro candidato identificado por este processo, e provavelmente um dos mais bem conhecidos e estudados, é Cyg X1. Até a data não há registo de qualquer candidato a buraco negro isolado identificado a partir da radiação emitida no processo de acreção esférica (foram identificados alguns candidatos a buraco negro isolado mas pelo efeito de microlente gravitacional). De qualquer modo o estudo da acreção esférica de matéria por buracos negros reveste-se de grande importância. Conhecendo bem o mecanismo da acreção esférica, em diferentes cenários, poderemos entender melhor como evoluem buracos negros isolados e qual a sua influência no meio. Além disso o estudo da acreção esférica poderá também ser encarado como uma introdução para o estudo dos discos de acreção de matéria. Neste trabalho é feita uma introdução ao problema da acreção esférica de matéria por buracos negros de Schwarzschild (que são os mais simples). Embora existam modelos mais recentes o trabalho incide sobre os primeiros modelos desenvolvidos para a acreção esférica por buracos negros. Começa-se por descrever os processos de acreção esférica de um gás sem colisões e de acreção esférica hidrodinâmica em regime adiabático para os quais não há emissão de radiação. Depois é considerada a acreção esférica em regime quase-adiabático. Finalmente é discutida a acreção esférica em regime adiabático na presença de um campo magnético desprezável e na presença de um campo magnético não desprezável. 2 espectro de emissão. Verifica-se que no caso da região HI o processo é, em termos de luminosidade total emitida, muito mais eficiente, que no caso da região HII. Quando se considera a acreção esférica hidrodinâmica supõe-se a presença de um campo magnético capaz de manter as partículas juntas. Se esse campo magnético for fraco então podem ignorar-se outros efeitos do mesmo. No Capítulo 8 é descrita a acreção esférica por um buraco negro de Schwarzschild, em regime não adiabático, na presença de um campo magnético não desprezável. Verifica-se que o fluxo de partículas não é substancialmente alterado havendo um espectro de emissão semelhante ao verificado na acreção com campo magnético fraco. A novidade é que, para alem dessa emissão, temos também emissão de sincotrão. Neste trabalho pretende-se fazer uma introdução ao problema de acreção esférica de matéria por buracos negros de Schwarzschild tendo por referência principal os trabalhos pioneiros de Bondi (1952) e Shapiro (1973). A eficiência da conversão entre massa e energia é nestes modelos relativamente baixa (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). Ao longo dos últimos anos foram desenvolvidos outros modelos para a acreção esférica por buracos negros (e.g. Chakrabarti 1996) onde se procuraram atingir eficiências mais elevadas. 3 Capítulo 2 Buracos Negros de Schwarzschild A solução de Schwarzschild resulta da resolução das equações do campo no vácuo para um espaço-tempo com simetria esférica. Esta solução contém a descrição exacta de um buraco negro sem carga e sem rotação: buraco negro de Schwarzschild. A métrica correspondente, também conhecida por métrica de Schwarzschild, é normalmente escrita, em coordenadas esféricas, como se segue (e.g. d' Inverno 1992): 22222222 dsinrdrdr r m2 1 1 dt r m2 1ds ϕθ−θ− − −      −= (2.1) onde t é o tempo-coordenada, s representa um intervalo de espaço-tempo e: 2c GM m = (2.2) surge como uma constante de integração das equações do campo. Aqui G é a constante de gravitação universal, c é a velocidade da luz e M é a massa criadora do campo. É usual o recurso a unidades geometrizadas onde G=c=1. É importante notar que m tem as dimensões de uma distância. A métrica (2.1) apresenta singularidades nos pontos r=0 e r=2m. No caso r=2m é possível mostrar que a singularidade correspondente não é real, ou seja, não é uma singularidade física (e.g. d' Inverno 1992). De facto, mediante uma transformação adequada de coordenadas é possível remover esta singularidade. No caso r=0 não é possível estabelecer qualquer transformação de coordenadas capaz de remover a singularidade. Estamos perante uma singularidade real. A superfície r=2m corresponde ao chamado horizonte de acontecimentos do buraco negro. O raio de um buraco negro deste tipo, também designado por raio de Schwarzschild, é dado por: 4 Figura 2.1 - Estrutura do buraco negro de Schwarzschild 2s c GM2 m2r == (2.3) Ao ponto r=0 chamamos singularidade do buraco negro. Se extrapolarmos as soluções das equações do campo para o interior do buraco negro, verifica-se que elas acabam por quebrar na singularidade. Uma vez desenvolvida uma teoria quântica da gravitação, talvez se possa substituir a ocorrência de uma singularidade por um estado da matéria que agora desconhecemos. Seja como for, no presente estudo, estamos interessados apenas em processos que ocorrem do lado de fora do horizonte de acontecimentos e, portanto, longe da singularidade, onde a TRG é válida sem qualquer restrição. Na Figura 2.1 está representada a estrutura do buraco negro de Schwarzschild. Com os coeficientes da métrica (2.1) construímos o tensor métrico na forma covariante: ji ,0g ;θsinrg rg ; r m2 1g ; r m2 1g ij 22 33 2 22 1 1100 ≠=−= −=      −−=−= − (2.4) onde os índices 0, 1, 2 e 3 correspondem, respectivamente às coordenadas t, r, θ e ϕ. O tensor métrico na forma contravariante obtém-se a partir da relação: ( ) ij 3 0α iα jα δgg =∑ = (2.5) onde ijδ representa a função delta de Kronecker. No caso da métrica de Schwarzschild temos: 7 Capítulo 3 Acreção esférica de um gás sem colisões 3.1 Taxa de Captura de Partículas Consideremos uma nuvem de gás, cujas partículas, supostamente idênticas e de massa mo, não colidem entre si. Vamos determinar a taxa de acreção desse gás por um buraco negro de Schwarzschild, de massa M e em repouso no centro dessa nuvem. Para isso vamos seguir a abordagem feita por Shapiro & Teukolsky (1983). Seja t),v,rf( rr a função de distribuição das partículas de gás no espaço de fases. O número de partículas por elemento de volume vrdd 33 , centrado em r r e v r no instante t, é dado por: ( ) ( ) vd rdt,v,rft,v,rdN 33rrrr = (3.1) A densidade do número de partículas no espaço de coordenadas é dada por: ( ) ( )∫= v o todo 3vdt,v,rft,rn r rrr (3.2) e a velocidade quadrática média por: ( ) ( ) ( )∫= v o todo 322 vdt,v,rfv t,rn 1 t,rv r rr r r (3.3) Como não existem colisões, podemos considerar cada partícula de gás como um subsistema fechado dentro do sistema global que é a nuvem. O teorema de Liouville garante que para cada um desses subsistemas a função de distribuição é constante, no 8 tempo, ao longo da respectiva trajectória no espaço de fases. A função de distribuição é então determinada pela equação de Boltzmann, para um gás sem colisões, também conhecida por equação de Vlasov: 0f. dt vd f.v t f vr =∇+∇+∂ ∂ rr r r (3.4) Estamos interessados no caso em que a aceleração é derivada de um potencial gravitacional Φ: Φ dt vd −∇= r Para o potencial contribuem a massa central, M, bem como a massa total das próprias partículas de gás. Atendendo que esta última contribuição é muito pequena, vamos considerar: r GM−=Φ (3.5) onde r é a distância à massa central. Se considerarmos que a nuvem de gás tem simetria esférica, e que o fluxo de partículas é estacionário, somos levados a concluir que a função de distribuição não deve depender do tempo ( 0/ =∂∂ tf ). Para sistemas com estas características a função de distribuição deve depender apenas das constantes dinâmicas do movimento. Neste caso, essas constantes dinâmicas, são a energia E e a amplitude do momento angular L. Os valores de E e L, por unidade de massa, são dados pelas expressões: ( ) ( ) ( )rvv 2 1 rv 2 1 E 2t 2 r 2 Φ++=Φ+= trvL = (3.6) onde vr e vt representam as velocidades radial e tangencial das partículas. Dados E e L as trajectórias das partículas ficam completamente determinadas. 9 Se, por outro lado, admitirmos que a distribuição de velocidades é isotrópica, então a função de distribuição não pode depender de L pois este é proporcional à componente transversal da velocidade. Temos, portanto, f=f(E). Assim, para uma distribuição estacionária, esfericamente simétrica e com isotropia de velocidades, as equações (3.2) e (3.3) escrevem-se como: ( )[ ] ( )dEEfE24)r(n 2/1 ∫ ∞ Φ Φ−π= (3.7) ( ) ( ) ( )[ ] ( )dEEfE2rn 4 rv 2/3 2 ∫ ∞ Φ Φ−π= (3.8) A condição para que uma partícula vinda do infinito seja capturada por um buraco negro é que a sua energia E seja superior ao valor máximo do potencial efectivo V imposto pelo buraco negro. No caso de um buraco negro de Schwarzschild o potencial V é dado por (2.13). Se considerarmos que as partículas de gás permanecem sempre não relativistas então E2 é aproximadamente igual à unidade (em unidades geometrizadas), pelo que, a condição de captura pode escrever-se como 1V2máx > . Verifica-se que Vmáx=1 quando L=4m. Podemos assim escrever a condição de captura como se segue: c GM4 L < Partículas cuja amplitude do momento angular seja inferior a 4GM/c não têm velocidade tangencial suficiente para escaparem sendo por isso "consumidas" pelo buraco negro. O número de partículas por unidade de volume do espaço de fases com velocidade radial vr dirigida para dentro é dado por: ( ) vd rd f 2 1 v,rdN 33= (3.9) 12 Vamos agora determinar, de acordo com a distribuição (3.13), as expressões para a densidade, velocidade quadrática e temperatura como funções da distância r ao centro. Consideraremos apenas o caso r>>2m de forma a evitar as correcções relativistas com a aproximação ao horizonte de acontecimentos. Assim, substituindo (3.13) em (3.7), e tendo em conta as propriedades da função delta de Dirac, obtemos para a densidade: ( ) 2mr, rv GM2 1nrn 2 >>+= ∞ ∞ (3.15) Analogamente, substituindo (3.13) e (3.15) em (3.8), obtemos para a velocidade quadrática: ( ) 2mr, rv GM2 1vrv 2 22 >>      += ∞ ∞ (3.16) A expressão para a temperatura pode ser obtida substituindo este último resultado na relação 2/vm2/kT3 2o= (onde k é a constante de Boltzmann) resultando: ( ) 2mr, rv GM2 1TrT 2 >>      += ∞ ∞ (3.17) As equações (3.14) a (3.17) dão uma ideia geral acerca da acreção de matéria por um buraco negro central. Relembre-se, no entanto, que as mesmas são válidas para um gás sem colisões e cujas partículas são não relativistas. Além disso só são aplicáveis em regiões bastante distantes do horizonte de acontecimentos. Define-se raio de captura, ou raio de acreção, como sendo o raio para o qual a energia potencial da partícula iguala o valor da respectiva energia cinética no infinito: 2a v GM2 r ∞ = (3.18) Note-se que, por ser v∞<<c, o raio de acreção é muito superior ao raio do horizonte de acontecimentos (equação 2.3) pelo que os resultados anteriores são 13 também aplicáveis para r<<ra, desde que se mantenha r>>2m. Para r>>ra o potencial criado pela massa central é muito pouco significativo. Nessas regiões temos n(r)≈n∞, v(r)≈v∞ e T(r)≈T∞. Quando r<<ra o potencial gravitacional faz sentir o seu efeito actuando sobre a distribuição de partículas. A densidade e temperatura do gás aumentam. 3.3 Exemplo numérico Vamos tomar como densidade média do meio interestelar o valor 321 m mkg10ρ −−= , o que equivale a termos cerca de 600 átomos de hidrogénio por dm3, e como velocidade média desse meio o valor 14m ms10v −= . Defina-se densidade relativa ρr, velocidade relativa vr e massa relativa Mr como se segue: m r ρ ρ=ρ ∞ m r v v v ∞= (3.19) rM M M r = onde MŸ representa a massa do Sol. Com estas definições podemos escrever a equação (3.14) na forma: rMMvρKdt dM 2 r 1 rr0 −= onde a constante K0 é dada por: 123131 m m22 0 ano 1056.1 s 1095.4Mv ρ cGπ16K −−−−− ×=×== r 14 Se tivermos um buraco negro de Schwarzschild de massa igual a 5MŸ (Mr=5), mergulhado no meio interestelar galáctico (ρr=vr=1) a correspondente taxa de acreção tem o valor: 122 ano M1090.3 dt dM −−×= r Para termos uma ideia de quanto este valor é pequeno, note-se que seria necessário um tempo muito superior à idade (estimada) do Universo para que a massa capturada fosse da ordem de 0.01MŸ . Mais concretamente seriam necessários cerca de 2.5×1019 anos. Mesmo que o buraco negro fosse supermassivo, com uma massa da ordem de 106MŸ , continuaria a ser necessário um intervalo de tempo extremamente longo (cerca de 6.4×108 anos) para que fosse atingido o mesmo efeito. O raio de Schwarzschild (2.3), para o buraco negro em consideração, vale 14.7km. A relação entre o raio de captura (3.18) e o raio de Schwarzschild é de ≈9×108. Temos, portanto, que sa rr >> , pelo que, podem aplicar-se, sem grande incorrecção, as equações não relativistas (3.15), (3.16) e (3.17) para pontos bastante inferiores a ra, desde que os mesmos se situem também bastante aquém de rs. As equações (3.15) a (3.18) permitem determinar os valores da densidade, velocidade e temperatura das partículas de gás em arr = . Verifica-se assim que, em arr = , densidade e velocidade correspondem aos respectivos valores no infinito afectados do factor 2 , ao passo que a temperatura corresponde ao dobro do seu valor no infinito. 3.4 Considerações Finais As equações anteriores para dM/dt, n(r), v2(r) e T(r) aplicam-se apenas a partículas não ligadas (E>0) que se aproximem do buraco negro central. Considerando que não existem colisões podemos ter um número infinito de partículas ligadas (em orbitas elípticas em torno do buraco negro). Na função de distribuição (3.13) não existe 17 desembaraçando-se assim da constante K. A velocidade do som no gás, que desempenhará um importante papel neste estudo, é dada por: ρ γ= ρ = p d dp a (4.3) Para descrever o movimento do gás em direcção ao buraco negro utilizaremos as equações da mecânica dos fluídos, nomeadamente a equação da continuidade: ( ) 0v. t =ρ∇+ ∂ ρ∂ r (4.4) e a equação de Euler ( 2ª lei de Newton para os fluídos): Φ∇−∇ ρ −= p1 dt vd r (4.5) onde o potencial gravitacional Φ é da pela expressão (3.5). Se considerarmos que o fluxo de partículas é simetricamente esférico e constante no tempo podemos escrever as equações (4.4) e (4.5) na forma: ( ) 0ur dr d r 1 0u. 2 2 =ρ⇔=ρ∇ r (4.6) 2r GM dr dp1 dr du u − ρ −= (4.7) onde u é a componente radial da velocidade (dirigida para dentro). A integração da equação da continuidade (4.6) conduz a uma constante: uρrC 2= 18 Verifica-se facilmente que esta constante tem as dimensões kgs-1, ou seja, corresponde a uma taxa de acreção. Assim, vamos substituir C por dM/(4πdt), com o factor 4π introduzido por conveniência. Ficamos então com: uρrπ4 dt dM 2= (4.8) A expressão obtida para dM/dt depende implicitamente de r através das funções ρ e u. O passo seguinte será determinar uma expressão para dM/dt que dependa apenas das características do gás (já que dM/dt é constante). A equação de Euler (4.5) pode ser integrada, em ordem a r, de forma a obter-se a equação de Bernoulli: 22 2 a 1 1 r GM a 1 1 2 u ∞−γ =− −γ + (4.9) Podemos tratar as equações (4.6) e (4.7) de forma a obter-se: 0 r 2 u 'u' =++ ρ ρ (4.10) 0 r GM' a'uu 2 2 =+ ρ ρ+ (4.11) onde a pelica denota a derivação em ordem a r. Resolvendo o sistema formado por estas duas equações em ordem a ρ' e u' obtemos: D D 'u 1= D D ' 2−=ρ onde: 19 ρ      −= / r GM r a2 D 2 2 1 u/ r GM r u2 D 2 2 2       −= (4.12) ( ) ( )ρu/auD 22 −= Para garantir o aumento de u, à medida que r decresce, evitando a existência de singularidades no fluxo de partículas de gás, a solução deve passar por um ponto crítico: 0DDD 21 === Quando uma partícula de gás cai em direcção ao buraco negro a sua velocidade radial, u, aumenta. Quando u iguala a velocidade local do som, a, temos D=0. O raio correspondente a esse ponto diz-se raio sónico, será representado por rsn e pode ser determinado a partir de D1 ou D2. sn 2 sn 2 sn r GM 2 1 au == (4.13) Substituindo (4.13) na equação de Bernoulli (4.9) resulta: 2sn a GM 4 35 r ∞       γ−= (4.14) Substituindo este último resultado em (4.13) vem: 22 sn 2 sn a35 2 ua ∞      γ− == 22 ( ) yzxρaGMπ4 dt dM 2 32 = ∞ − ∞ Notando que, todo o lado esquerdo da equação anterior representa uma constante, designaremos essa constante por λt. Diremos que λt é o parâmetro adimensional para a taxa de acreção. Podemos então escrever a taxa de acreção (4.8), na forma adimensional, como se segue: t 2 λyzx = (4.20) A equação de Bernoulli (4.9) também pode ser escrita na forma adimensional obtendo-se: x 1 1 1z 2 y 12 = −γ −+ −γ (4.21) A resolução das equações (4.20) + (4.21) em ordem a y e a z não é possível, a não ser que seja introduzida uma variável auxiliar w tal que: ( ) 2 1γ yzw −− = (4.22) É interessante notar que esta variável introduzida por questões meramente matemáticas tem um significado físico específico. De facto temos a/uw = que é o número de Mach. Substituindo (4.22) em (4.20) e resolvendo em ordem a z obtemos: 1γ 2 2 t wx λ z +      = (4.23) Se, por outro lado, resolvermos em ordem a y vem: 23 1γ 1γ 2 t1γ 2 x λ wy + − +      = (4.24) Com estes dois últimos resultados a equação de Bernoulli pode ser escrita na forma: ( ) ( ) ( ) ( )xgλwf 1γ 1γ2 t + −− = (4.25) onde as funções f e g são dadas por: ( )       −γ += +γ 2 1 4 w 1 1 1 2 1 wwf ( ) ( ) ( ) 1γ γ351γ 1γ4 x 1γ x xg + −−+ − + − = O estudo das funções f e g permite determinar w como função de λt e x. Para encontrar y e z basta substituir w em (4.23) e (4.24) respectivamente. Quando 3/51 <γ< (deixaremos para depois os casos limite 1=γ e 3/5=γ ) ambas as funções, f e g, consistem na soma de uma potência positiva com uma potência negativa das respectivas variáveis. Assim sendo ambas devem ter um mínimo. No caso de f temos: ( ) 1 1 2 1 1f)w(ff minmin −γ +γ=== (4.26) e no caso de g é: ( ) ( ) ( ) 1γ γ35 minmin γ354 1 1γ 1γ 4 1 γ35 4 1 g)x(gg + −−     − − +=      −== (4.27) 24 O valor mínimo que o lado direito de (4.25) pode tomar ocorre quando mingg = . Quando isso acontece é também minff = . Para um regime onde são atingidos estes valores, o correspondente parâmetro λt é máximo, sendo o seu valor dado por: ( )1γ2 1γ min min maxt f g λ − +       = (4.28) Substituindo (4.26) e (4.27) em (4.28) verificamos que snmaxt λλ = , onde λsn, é o parâmetro adimensional para a acreção para a solução trans-sónica (4.18). Concluímos assim que a acreção é máxima no regime trans-sónico. A taxa de acreção dada por (4.17) corresponde à acreção máxima. 4.3 Regimes subsónico, trans-sónico e supersónico O regime de acreção trans-sónico é aquele no qual as partículas de gás começam por ter velocidades inferiores à velocidade (local) do som e à medida que se aproximam do centro a sua velocidade é, a partir de um determinado ponto, superior à velocidade (local) do som. A acreção esférica por buracos negros ocorre sempre neste regime (Capítulo 5). Isso significa que a acreção esférica por buracos negros é máxima. Convém aqui, contudo, situar o regime trans-sónico relativamente aos regimes subsónico e supersónico. Para isso consideremos o gráfico w=w(x), representado na Figura 4.1, onde estão contemplados os casos: (1) λt < λsn sub-sónico ou super-sónico (2) λt = λsn trans-sónico (3) λt > λsn não tem significado (pois snmaxt λλ = ) Analisemos os casos (1) e (2): 27 onde k é a constante de Boltzmann e m0 é a massa média por partícula de gás. A velocidade do som é obtida substituindo (4.29) em (4.3) ficando: 0 2 m kTγ a = (4.30) Substituindo este último resultado em (4.16) obtemos a expressão para a temperatura em função da densidade: 1 TT −γ ∞ ∞       ρ ρ= (4.31) Podemos agora determinar, para este caso específico, a constante de proporcionalidade K presente em (4.1). Para tal basta substituir (4.31) em (4.1) obtendo- se: 1γ 0 ρ m kT K −∞ ∞= Quando estamos muito aquém do raio sónico, snrr >> , o potencial gravitacional imposto pela massa central é muito pouco sentido. Os valores da temperatura, densidade e velocidade do som permanecem muito próximos dos respectivos valores assimptóticos. A expressão para a velocidade radial u pode ser obtida relacionando (4.8) com (4.17), obtendo-se: sn 2- 2 2sn rr r a GM au >>      λ≈ ∞ ∞ (4.32) Quando snrr << , ou seja, quando estamos muito além do raio sónico, o potencial gravitacional imposto pela massa central é fortemente dominante. Na equação de Bernoulli (4.9) podemos desprezar os termos proporcionais a ( )1/1 −γ em relação ao termo GM/r. Procedendo deste modo obtemos para a velocidade: 28       <γ≤<<≈ 3 5 1 e rr com r GM2 u sn (4.33) À medida que r vai diminuindo u tende para a velocidade de queda livre. A perda de velocidade por efeito da pressão do gás torna-se praticamente nula. O caso 3/5=γ será estudado mais adiante. Relacionando (4.8), (4.17) e (4.33) obtemos para a densidade:       <γ≤<<     λρ≈ρ ∞ ∞ 3 5 1 e rr com r a GM 2 sn 3/2- 2 3 2 sn (4.34) Quanto à temperatura, podemos substituir (4.34) em (4.31) obtendo-se: ( )       <≤<<               ≈ ∞ ∞ 3 5 γ1 e rr com r a GM 2 λ T T sn 2 1-γ3- 1-γ 2 3 2 sn (4.35) Ao tratar o problema do ponto de vista da teoria da relatividade geral (Capítulo 5) verifica-se que as equações (4.33), (4.34) e (4.35) estão relativisticamente correctas, desde que identifiquemos r com a coordenada radial de Schwarzschild, u com a 4- velocidade radial e ρ com a densidade própria (massa em repouso). 4.5 O caso gama = 1 Quando o índice adiabático do gás é igual à unidade o fluxo de partículas é isotérmico como se depreende a partir de (4.31). A equação de Bernoulli adimensional (4.21), para o caso 1=γ , pode ser escrita como: ( ) x 1 zlny 2 1 2 =+ 29 Com a ajuda de (4.19) podemos escrever esta equação na forma dimensional: ( ) ( )∞∞∞ ρ=−ρ+ lnar GM lnau 2 1 222 (4.36) Quando 1=γ o raio sónico, rsn, assume o seu valor máximo: 1 com a GM 2 1 r 2sn =γ= ∞ Quando r>>rsn os valores da temperatura, densidade e velocidade do som devem permanecer muito próximos dos respectivos valores assimptóticos. A expressão para a velocidade u, dada por (4.32), também continua a ser válida. Por outro lado, quando r<<rsn podemos desprezar, na equação (4.36) os termos logarítmicos em relação a GM/r. Procedendo deste modo recuperamos para a velocidade a expressão (4.33) e para a densidade e temperatura as expressões (4.34) e (4.35) respectivamente. 4.6 O caso gama = 5/3 Quando o índice adiabático do gás toma o valor 5/3 o raio sónico anula-se. O facto de rsn ser nulo significa que as partículas só atingem a velocidade do som na origem, decorrendo o processo de acreção sempre em regime subsónico. Para regiões muito distantes do centro os valores da densidade, temperatura e velocidade do som permanecem próximos dos respectivos valores assimptóticos, como de resto acontecia nos dois casos anteriores. Quando r é pequeno, as equações diferem das consideradas anteriormente para r<<rsn. A velocidade radial u, assim como a velocidade do som a, podem ser determinadas, de forma aproximada, a partir da expressão: 3 5 e a GM r com r GM 2 1 au 2 =γ<<≈≈ ∞ (4.37) 32 Se tivermos um buraco negro de Schwarzschild de massa igual a 5MŸ (Mr=5), mergulhado no meio interestelar galáctico (ρr=ar=1), temos, para um índice adiabático igual a 5/3 (λsn=1/4), a seguinte taxa de acreção: 114 ano M1019.2 dt dM −−×= r Embora este resultado seja muito superior ao registado para o caso do gás sem colisões (nas mesmas condições), não deixa de ser um valor relativamente pequeno. Para que a matéria capturada fosse da ordem das 0.01MŸ seriam necessários cerca de 4.5×1011anos. A acreção esférica é, regra geral, um processo de captura de matéria pouco eficiente. 33 Capítulo 5 Equações relativistas para a acreção esférica adiabática 5.1 As equações do problema Vamos tratar o problema da acreção esférica adiabática, não dependente do tempo, por um buraco negro de Schwarzschild, de massa M, de acordo com a Teoria da Relatividade Geral (e.g Shapiro & Teukolsky 1983). Como elemento de linha será considerada a métrica de Schwarzschild (2.1). Ao fazê-lo estamos a ignorar o efeito do gás que circunda o buraco negro bem como o aumento de massa deste último. A densidade massa-energia total do gás é dada por: i0 εnmρ += (5.1) onde n é a densidade bariónica, m0 é a massa bariónica média e εi é a densidade de energia interna. No infinito o gás é caracterizado por uma densidade bariónica n∞, por uma densidade de massa em repouso m0n∞ e por uma densidade massa-energia total ρ∞. Uma das equações chave do problema é a equação que traduz a conservação bariónica: ( ) 0nu ii =∇ (5.2) onde ui é a 4-velocidade. Esta equação é o análogo relativista da equação da continuidade (4.4). Quando é considerada a métrica de Schwarzschild a equação (5.2) pode ser escrita na forma: 0 r 2 u 'u n 'n =++ (5.3) 34 que é o análogo relativista da equação (4.10) onde a pelica representa a derivação em ordem a r. Outra equação chave do problema é a equação que traduz a conservação do momento: ( ) k ki iik k x p uu x p uupρ ∂ ∂− ∂ ∂−=∇+ (5.4) Esta equação é o análogo relativista da equação de Euler (4.5). Quando consideramos a métrica de Schwarzschild a equação (5.4) resulta numa trivialidade para i=2 ou i=3. Para i=0 ou i=1 obtemos a equação: 2 2 r m r m2 u1 r p pρ 1 'uu −      −+ ∂ ∂ + −= (5.5) Finalmente, no que respeita à identificação das equações chave do problema, temos a equação da conservação massa-energia (equação da entropia): 0TdS n 1 pd n ρ d ==     +      (5.6) O lado direito da equação anterior foi considerado nulo pelo facto de estarmos a considerar um regime adiabático (a perda de entropia devida à radiação é praticamente insignificante). Esta equação pode ser escrita numa forma mais simples como se segue: n pρ dn ρd += (5.7) Este último resultado permite escrever a velocidade do som (4.3) na forma: pρ n dn dp ρd dp a 2 + == (5.8) 37 5.3 Taxa de captura de partículas A equação (5.3) pode ser integrada, conduzindo a uma constante que corresponde à taxa de acreção de massa pelo buraco negro, como em (4.8). Neste caso fica: 2 0nurmπ4dt dM = (5.13) Como equação de estado, do gás, vamos adoptar novamente a equação (4.1), a qual, na presente notação, se escreve: γKnp = (5.14) Introduzindo esta equação de estado na equação da entropia (5.6) e integrando a mesma resulta: 1γ Kn nmρ γ 0 − += (5.15) onde a constante de integração m0 é obtida por comparação directa com (5.1). Somando (5.14) a ambos os membros de (5.15) e dividindo por n vem: 1γ 0 Kn1γ γ m n pρ − − +=+ (5.16) Substituindo (5.14) e (5.16) em (5.5) e atendendo a que, quando r tende para infinito tanto u como 2m/r tendem para zero, obtemos a seguinte lei da conservação: 2 2 2 n pρ u r m2 1 n pρ       +=      +−      + ∞ ∞∞ (5.17) 38 Esta é a equação relativista de Bernoulli. Vamos introduzir a velocidade do som nesta equação, por forma a obtermos o análogo relativista de (4.9). Assim, substituindo (5.14) e (5.16) em (5.8) tiramos que: 1γ a 1 ma Knγ 2 0 2 1γ − − =− (5.18) Combinando (5.16), (5.17) e (5.18) vem: 2 2 22 2 2 2 a1 a 1 a1 a 1u r m2 1       −−γ +=      −−γ +      +− ∞ ∞ (5.19) que é o pretendido, ou seja, a forma relativista da equação de Bernoulli (4.9). Invertendo ambos os membros desta equação e avaliando a mesma no ponto rsn, obtemos: ( ) 2222 sn2 sn 1 a 1 1 a 1a31       −γ −=      −γ −+ ∞ (5.20) Tendo em conta que a∞<<1 e admitindo que é também as<<1, vamos expandir esta última expressão desprezando os termos de ordem superior a (asn) 2 e (a∞) 2. Obtemos assim: 3 5 , a 35 2 a 22sn ≠γγ− ≈ ∞ (5.21) Combinando (5.21) com (5.12) obtemos para rsn, nesta aproximação, a expressão: 3 5 γ, a m 4 γ35 r 2 2 sn ≠ −≈ ∞ (5.22) que é igual à obtida para o caso Newtoniano (equação 4.14). Avaliando (5.18) no infinito e em rsn e dividindo as expressões obtidas uma pela outra, vem: 39 1γ 2 snsn a a n n − ∞∞       ≈ (5.23) Como dM/dt é constante pode ser avaliado em qualquer ponto. Em particular no ponto sónico, r=rsn, vem: 2 snsnsn0 runmπ4dt dM = sendo os valores de asn, rsn e nsn dados pelas expressões (5.21), (5.22) e (5.23) respectivamente. Sendo asn<<1 podemos escrever: 3 0 2 sn anmmπλ4dt dM − ∞∞= (5.24) onde o parâmetro de acreção adimensional λs continua a ser dado pela expressão (4.18). Comparando (4.17) com (5.24) verifica-se que, na aproximação considerada (ordem mais baixa), os resultados relativista e Newtoniano (para o caso trans-sónico) coincidem. Isso deve-se ao facto de a taxa de acreção ter sido determinada, em ambos os casos, no ponto sónico rsn o qual dista significativamente do horizonte de acontecimentos (rsn>>2m). Embora tenha conduzido ao mesmo resultado, para a taxa de acreção, o estudo relativista mostrou que a acreção esférica para um buraco negro é necessariamente trans-sónica. Vamos finalizar esta secção calculando os valores de asn e rsn no caso γ=5/3. Assim, fazendo γ=5/3 em (5.20) e desprezando 6sna face a 4 sna e 4a∞ face a 2a ∞ vem: 3 5 , a 3 2 a 2sn =γ≈ ∞ Substituindo o resultado anterior em (5.12) vem: 42 Capítulo 6 Radiação da acreção esférica no caso quase-adiabático 6.1 Introdução O cálculo do montante de radiação emitida durante a acreção esférica de matéria por um buraco negro não é, no caso geral, trivial. Devem ser resolvidas as equações hidrodinâmicas para o movimento do gás juntamente com as equações de transferência radiativa. Além disso, os resultados são fortemente dependentes das condições de fronteira a que o gás está sujeito no infinito. Numa primeira abordagem ao problema vamos supor que o fluxo hidrodinâmico do gás é aproximadamente adiabático. Nesse caso a perda de radiação (por emissão) pode ser vista como uma pequena perturbação (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). Continuam a ser aplicáveis as equações de Bondi para a acreção esférica em regime adiabático (Capítulo 4). A partir destas determinaremos a taxa de emissão de radiação. Todavia, para que o estudo seja consistente, essa taxa de emissão deve ser muito inferior à taxa de acreção. O nosso sistema consistirá num buraco negro de Schwarzschild mergulhado numa região HII. As regiões HII, típicas no meio interestelar, são compostas por hidrogénio completamente ionizado. A ionização é geralmente provocada por fotões ultravioleta provenientes de estrelas jovens situadas na vizinhança. A temperatura típica para uma região HII é T∞ ≈ 104K e a densidade típica é de 1 átomo/cm3. Consideremos as relações: 2 p p cm kT Θ = 43 2 e e cm kT Θ = A temperatura do gás que circunda o buraco negro varia desde os 104K até valores da ordem dos 1011K junto ao horizonte de acontecimentos. Verifica-se que 1p <<Θ para qualquer temperatura da gama anterior. Isto significa que durante todo o processo de acreção os protões permanecem não relativistas. No caso dos electrões temos que 1e <<Θ se T << 6×10 9K, mas 1e >>Θ se T >> 6×10 9K. Concluímos assim que, embora os electrões sejam não relativistas para pontos muito distantes do buraco negro, estes tornam-se relativistas com a aproximação ao horizonte de acontecimentos. O processo de acreção fica assim dividido em dois regimes: não relativista e relativista. 6.2 Densidade de energia e pressão do gás Para transformações adiabáticas a equação da entropia escreve-se na forma (5.6). Tendo em conta a equação de estado (4.1) podemos integrar a equação da entropia de forma a obter para a densidade de energia interna do gás (tanto no regime não relativista como no regime relativista) o seguinte resultado: constante γ com 1γ p ε i − = (6.1) No regime não relativista ( 1e <<Θ ) a densidade de energia interna do gás é dada por: 3nkTεi = (6.2) e a densidade total de massa-energia é dada por: ( ) 3nkTcmmnε 2ep ++= (6.3) 44 Note-se que electrões e protões contribuem da mesma forma, uma vez que as respectivas densidades numéricas são iguais. Próximo do buraco negro os electrões tornam-se relativistas ( 1e >>Θ ) enquanto que os protões permanecem não relativistas ( 1p <<Θ ). Para um gás de electrões relativistas a teoria da relatividade especial confere o seguinte resultado: ( )electrões os para 3nkTεε i == Assim, no regime relativista, a densidade de energia interna do gás pode escrever-se: nkT 2 9 ε i = (6.4) ficando a densidade total de massa-energia dada por: 2 pcnmnkT2 9 ε += (6.5) No que respeita à pressão temos, para ambos os regimes, a expressão: nkT2p = (6.6) 6.3 Índice adiabático efectivo Substituindo (6.2) em (6.1) obtemos o índice adiabático do gás para o caso não relativista: 1 , 3 5 e <<Θ=γ Quanto ao caso relativista obtemos, substituindo (6.4) em (6.1), o valor: 47 • RRΛ - recombinação radiativa • peΛ − - bremsstrahlung electrão-protão • eeΛ − - bremsstrahlung electrão-electrão As curvas características destas três funções estão representadas no Capítulo 7 (Figura 7.3). Verifica-se que a maior parte da radiação é originada junto ao horizonte de acontecimentos. Como RRΛ apenas contribui para )T(Λ II em regiões bastante distantes do horizonte de acontecimentos vamos considerar: )T(Λ)T(Λ)T(Λ eepeII −− += As expressões para peΛ − e eeΛ − podem obter-se a partir da electrodinâmica clássica. Vamos considerar:       −      +=− 577.0cm kT2 ln 2 3 ckTnnrZα12Λ 2 e pe 2 0 2 pe       −      +=− 577.0cm kT2 ln 4 5 ckTnrα24Λ 2 e 2 e 2 0ee onde )c/(eα 2 h= é a constante de estrutura fina, )cm/(er 2e 2 0 = é o raio clássico do electrão, Z é o número atómico, ne é a densidade numérica de electrões e np é a densidade numérica de protões. No caso do hidrogénio puro é Z=1 e ne=ni=n. A luminosidade total emitida é dada pelo integral: ∫ ∞ = hr 2 IIII drrπ4)T(ΛL Esta expressão não tem em conta os efeitos de relatividade especial, devidos à alta velocidade de queda do gás, nem de relatividade geral, devidos ao forte campo gravítico do buraco negro. 48 )T(Λ II é uma função implícita de r através de T. Atendendo a que a emissão é máxima sobre o horizonte de acontecimentos vamos considerar a seguinte aproximação: hrr 3 IIII rπ3 4 ΛL =      = Introduzindo neste resultado os valores de n e T verificados sobre o horizonte de acontecimentos obtemos o seguinte: (W) M M K10 T cm1 n 108L 3 43 13 II                  ×= ∞− ∞ r Para termos uma ideia acerca da eficiência da conversão de massa em radiação durante o processo de acreção podemos avaliar a relação: 2 II f c dt dM L ε = Para a acreção esférica quase adiabática, por um buraco negro de 1MŸ , o valor de εf ronda os 6×10-11. Este é, por isso, um processo muito pouco eficiente de conversão entre massa e energia. Mesmo que o buraco negro estivesse a rodar (com momento angular máximo) o valor anterior aumentaria apenas em cerca de 15%. Estes resultados contrastam altamente com a acreção esférica para uma estrela de neutrões onde εf≈0.1 (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). No caso dos discos de acreção de matéria por buracos negros o valor de εf é bem superior, podendo ir até os 0.42. 49 Capítulo 7 Espectro da radiação emergente na acreção esférica 7.1 Introdução Na acreção esférica o hidrogénio, que circunda o buraco negro, cai radialmente sob a influência do campo gravítico. Nesse processo o gás é comprimido à medida que energia gravitacional vai sendo convertida em energia interna e energia cinética do gás. Quando as partículas de gás colidem, inelasticamente, parte dessa energia é libertada, escapando sob a forma de radiação. Vamos centrar a nossa atenção no espectro de emissão resultante da acreção esférica por um buraco negro de Schwarzschild (e.g. Shapiro 1973a). O gás deverá ser considerado como um meio fluído, e não como um meio continuo, pois à medida que nos aproximamos do horizonte de acontecimentos o livre percurso médio das partículas, com respeito às colisões Coulombianas, torna-se superior à dimensão característica da região. Assim, as colisões junto ao horizonte de acontecimentos são, em geral, pouco frequentes. No entanto, a presença de um campo magnético, mesmo fraco, no plasma de hidrogénio, é suficiente para aglomerar partículas e provocar colisões. Esse campo pode ser mesmo várias ordens de grandeza inferior ao campo magnético interestelar médio o qual ronda os 10-6G. Vamos supor a existência de um campo magnético suficientemente forte para manter as partículas juntas, mas também suficientemente fraco para que possam ser ignorados os efeitos dinâmicos e radiativos do mesmo. Serão consideradas duas situações: • buraco negro mergulhado numa região HI • buraco negro mergulhado numa região HII 52 • EXΛ - excitação por colisão • RRΛ - recombinação radiativa • IZΛ - ionização por colisão • peΛ − - bremsstrahlung electrão-protão • eeΛ − - bremsstrahlung electrão-electrão O processo de aquecimento, para uma região do tipo HI, é devido aos raios cósmicos, os quais provocam a ionização dos átomos. No entanto este mecanismo é, para uma região deste tipo, praticamente insignificant6. Assim consideraremos ( )TIΓ aproximadamente zero. No gráfico da Figura 7.2 estão representadas as curvas características para os cinco processos de arrefecimento indicados. Verifica-se que a ionização por colisão, excitação por colisão e recombinação radiativa são processos que ocorrem apenas para o domínio não relativista (T<6×109K) contrariamente ao que acontece com a bremsstrahlung electrão-electrão e bremsstrahlung electrão-protão, que pontificam no domínio relativista e são claramente dominantes a partir dos 107K. A tracejado está representada a função ( )TΛ I que traduz a taxa de arrefecimento global do gás. Região HII Designaremos a taxa de arrefecimento do gás numa região HII por ( )TΛ II . Os processos que contribuem mais significativamente para esta função são os indicados na Secção 6.5. Note-se que, no caso de uma região HII, não temos o arrefecimento por excitação ou ionização. Isso deve-se ao facto de os átomos de gás estarem completamente ionizados. O processo de aquecimento numa região HII é provocado sobretudo pela fotoionização, dos átomos de hidrogénio, por fotões ultravioleta provenientes de estrelas vizinhas. A taxa de aquecimento, por unidade de tempo e de volume, é dada pela função ( )TIIΓ . No gráfico da Figura 7.3 estão representadas as curvas características para as funções IIΓ , RRΛ , eeΛ − , peΛ − e IIΛ . A taxa de aquecimento IIΓ foi traçada para uma temperatura de 10600K. Note-se que o comportamento desta função é praticamente 53 xxxxx Figura 7.2 - Curvas características para a taxa de arrefecimento do gás, por unidade de tempo e de volume, numa região do tipo HI. As diferentes curvas (linha contínua) correspondem aos vários processos responsáveis pelo arrefecimento: ΛEX - excitação por colisão, ΛRR - recombinação radiativa, ΛIZ - ionização por colisão, Λe-p - bremsstrahlung electrão-protão, Λe-e - bremsstrahlung electrão-electrão. A curva ΛI (a tracejado) representa a taxa de arrefecimento global (Shapiro 1973a). linear e apenas se faz sentir no domínio não relativista. O aquecimento afecta apenas as regiões mais exteriores da nuvem. As funções eeΛ − e peΛ − são praticamente idênticas às suas congéneres para a região HI (Figura 7.2). 7.4 Pressão e densidade de energia A temperatura do gás que circunda o buraco negro varia entre 100K (região HI) ou 10000K (região HII) até valores da ordem dos 1011K junto do horizonte de 54 xxxxxxxxxxx Figura 7.3 - Curvas características para a taxa de arrefecimento e de aquecimento do gás, por unidade de tempo e de volume, numa região do tipo HII. As diferentes curvas (linha contínua) correspondem aos vários processos responsáveis pelo arrefecimento: ΛRR - recombinação radiativa, Λe-p - bremsstrahlung electrão-protão, Λe-e - bremsstrahlung electrão-electrão. A curva ΓII (a ponteado) corresponde à taxa de aquecimento do gás e a curva ΛII (a tracejado) à taxa de arrefecimento global (Shapiro 1973a). acontecimentos. Para esta gama de temperaturas os protões permanecem sempre não relativistas. Quanto aos electrões começam por ser não relativistas, para pontos muito distantes do buraco negro, mas acabam por tornar-se relativistas com a aproximação ao buraco negro. Quando os electrões são não relativistas, a densidade de energia é dada por: ( ) ( ) ( ) 1Θ ,cmmnnIx1nkTx1 2 3 ε e 2 epH <<++−−+= (7.1) 57 onde ( )sξ é a relação entre a velocidade do fluxo u(s) e a velocidade do som a(s), sendo esta última dada pela expressão (4.3). O valor de ( )sξ é obtido a partir da equação paramétrica: ( ) ( ) λ += ξ +ξ 2s6 s 3 s 21 23 (7.7) O lado esquerdo desta equação tem um mínimo igual a 4 em 1=ξ enquanto que o lado direito tem um mínimo de valor λ/2 quando 0s = . Somos assim levados a concluir que o valor máximo que o parâmetro λ pode assumir é 0.25. Quando crr = a energia potencial gravítica das partículas é comparável à respectiva energia térmica, pelo que esta distância é normalmente designada por raio de captura. O respectivo valor numérico pode ser calculado a partir de: )m( x1 2 M M K000 10 T 1082.4 a GM r 1 11 2c       +            ×== ∞ − ∞ ∞ r (7.8) onde 0x =∞ , no caso de uma região HI, e 1x =∞ , no caso de uma região HII. Na região crr ≥ a temperatura do gás difere apenas ligeiramente do seu valor no infinito. Assim, podemos considerar que nesta região, o gás é não relativista e adiabático. Os efeitos de relatividade geral não têm qualquer relevo nesta região suficientemente distante do horizonte de acontecimentos do buraco negro. As equações (7.5), (7.6) e (7.7) representam a solução exacta para a acreção máxima nesta região. Para crr << o valor de λ permanecerá próximo de 0.25 se o gás mantiver características aproximadamente adiabáticas. De uma forma geral o parâmetro λ é um valor da ordem da unidade que deve ser determinado numericament6. Entre crr = e o horizonte de acontecimentos as soluções analíticas (7.5) a (7.7) já não são válidas. Há que integrar numericamente as equações. As condições de fronteira a impor são os valores correspondentes ao ponto crr = . 58 7.6 O espectro de frequências observado Vamos agora determinar o espectro de emissão continuo registado por um observador distant6. Dados n(r), T(r) e u(r), a partir da integração numérica das equações dos fluídos, a computação da luminosidade observada, ∞ν L , é imediata. Nos casos em estudo a maior parte da radiação observada deverá estar na banda dos raios X e raios gama. A contribuição de cada elemento do fluído para a radiação deve ser calculada a partir dos coeficientes de emissão conhecidos para o hidrogénio gasoso. As várias contribuições individuais devem ser somadas ao longo de todo o volume de gás, em acreção, de forma a obter-se ∞ν L . De forma a obter ∞ν L a partir da emissividade (isotrópica) do fluído, νj , medida no referencial local, há que proceder do seguinte modo: i) obter a emissividade do plasma ''j ν , como se fosse medida, por um observador estacionário, no referencial de Schwarzschild. Isso consiste na transformação de relatividade especial: ( ) 2 2 2 ν'ν 'θcos c v 1 c v 1 j'j       − − = (7.9) ( )'θcos c v 1 c v 1 ν'ν 2 2 − − = (7.10) onde v é a velocidade própria do fluído medida por um observador estacionário. Essa velocidade é dada pela expressão: ( ) ( ) ( ) r m2 1 c ru ru r m2 1 1 dt dr rv 2 2 −+ = − = (7.11) 59 onde 'θ é o ângulo entre a velocidade v, que aponta radialmente para dentro, e a linha de visão. ii) considerar o montante de energia recebido no infinito, no intervalo de tempo ∞δt e no intervalo de frequência ∞δν , de um elemento de gás, com volume próprio 'Vδ , emitindo num período 'tδ , no intervalo de frequência 'δν e no ângulo sólido 'Ωδ . Para isso temos a expressão: r m2 1't''V'jtL ' −δΩδδ=δνδδ ν∞∞ν∞ (7.12) onde o último factor se deve ao desvio para o vermelho de origem gravitacional (e.g. d'Inverno 1992) experimentado pela radiação emitida. iii) considerar que existe simetria esférica e que são válidas as relações de transformação: r m2 1 't t − δ=δ ∞ r m2 1' −δν=δν∞ r m2 1 rr4 'V 2 − δπ=δ que ao serem substituídas em (7.12) conduzem à expressão: 'rr4'jL 2' Ωδδπ=δ νν∞ iv) integrar o resultado anterior sobre r e 'Ω , tendo em conta (7.9) e (7.10), resultando: 62 dada por: Figura 7.6 - Temperatura do gás em acreção para um buraco negro de Schwarzschild, com 1MŸ , em função do raio, numa região HI e numa região HII (Shapiro 1973a). ( ) 2/3 c r r nrn      ≈ ∞ (7.15) Nesta região intermédia o aquecimento do fluido domina o arrefecimento causado pelos processos inelásticos. A temperatura aumenta adiabaticamente com a densidade, ou seja, T(r)∼n(r)γ-1, com o índice adiabático γ=5/3, pelo que fica: ( ) c*c rrr, r r TrT <<     ≈ ∞ (7.16) Na região entre r* e o horizonte de acontecimentos os electrões tornam-se relativistas, o índice γ cai abaixo dos 5/3 e u(r) torna-se supersónica. Aqui a pressão do gás desempenha um papel diminuto. A velocidade das partículas de gás tende para a velocidade de queda livr6. A densidade continua a ser dada por 7.15. Agora é γ=13/9, valor apropriado para um plasma no qual os protões são não relativistas e os electrões são ultra-relativistas, e a temperatura varia com n(r)4/9, pelo que fica: 63 Figura 7.7 - Espectro continuo emitido na acreção esférica, numa região HII, com um buraco negro de Schwarzschild de 1MŸ . Alem da luminosidade total são indicadas as luminosidades parciais devidas aos processos da recombinação radiativa (curva RR), bremsstrahlung electrão-electrão (curva e-e) e bremsstrahlung electrão-protão (curva e-p) (adaptado de Shapiro 1973a). ( ) * 2/3* * rr,2m r r )r(TrT <<      ≈ (7.17) Sobre o horizonte de acontecimentos a temperatura do gás é Th=10 11K, a densidade é nh=4×1011cm-3 e a velocidade radial é uh=2.8×108ms-1. Note-se que a velocidade própria do fluido sobre o horizonte de acontecimentos é, de acordo com (7.11), igual à velocidade da luz. Substituindo em (7.13) as emissividades (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983) relativas aos vários processos responsáveis pela emissão de radiação na região HII, podemos computar o espectro emitido. No gráfico da Figura 7.7 estão representados os espectros de cada um dos três processos bem como o espectro total. Verifica-se que este tem uma curva característica de bremsstrahlung com T≈1011K e uma luminosidade total L≈2×1014W. A fonte dominante na opacidade do gás, relativamente aos fotões X e gama, é a dispersão de Thomson. Para buracos negros de massa estelar e condições interestelares típicas, a profundidade óptica do gás, entre r=2m e r=rc, é sempre muito inferior à 64 unidade (e.g. Shapiro & Teukolsky 1983). Temos assim que o gás é opticamente fino para o fluxo de radiação emergent6. Apenas uma pequena fracção da energia térmica disponível é radiada no decurso da acreção, sendo a maior parte perdida para o buraco negro. A taxa de arrefecimento, num dado ponto r do fluído, pode ser escrita na forma: ( )ΓΛrπ 3 4 dt dE 3a −≈ e a taxa de transporte de energia térmica na forma: ( )kTx1 2 3 nurπ4 dt dE *2t +≈ onde x*=x, no domínio não relativista, e x*=2x, no domínio relativista. Os resultados mostram que é sempre: 1 dE dE t a << (7.18) Na região de alta temperatura e alta densidade, junto ao horizonte de acontecimentos, apenas uma fracção igual a 10-9 da energia térmica disponível é emitida como radiação. A acreção esférica, numa região HII, nas condições consideradas, revela-se como um processo pouco eficiente, no que respeita à libertação de energia para o exterior. O resultado (7.18) permite justificar o facto de o gás apresentar um comportamento tipicamente adiabático. 7.8 Resultados para a região HI Foi considerada a acreção de hidrogénio neutro, com n∞≈1cm-3 e T∞=100K, para um buraco negro de Schwarzschild com 1MŸ . Nos gráficos das Figuras 7.4, 7.5 e 7.6 estão representadas as funções u(r), n(r) e T(r) respectivamente, tanto para a região HI, como para a região HII (já considerada anteriormente). A juntar a estes temos o gráfico 67 7.9 Comparação entre os resultados para as regiões HI e HII Comparando os gráficos das Figuras 7.7 e 7.9 verificamos uma clara diferença no espectro de frequências continuo emitido para cada uma das regiões. A luminosidade total emitida é, na região HI, muito superior (por um factor de ≈104) à luminosidade total emitida na região HII. A temperatura é comparativamente mais baixa para a região HI (Figura 7.6). Isto acontece assim porque, na região HI, uma parte significativa da energia gravitacional é utilizada na ionização do hidrogénio neutro, havendo assim menos energia disponível para aquecer o gás. O raio de captura para as partículas de gás é, por isso, numa região HI cerca de 200 vezes superior ao verificado para uma região HII. Numa região HI a densidade de partículas junto ao horizonte de acontecimentos é muito superior (por um factor de 2500) à verificada no caso da região HII, sendo no entanto a temperatura mais baixa. 68 Capítulo 8 Acreção esférica na presença de um campo magnético 8.1 Introdução No Capítulo 7 foi desenvolvido o estudo da acreção esférica, do material do meio interestelar, por um buraco negro de Schwarzschild. Foi assumida a existência de um campo magnético, capaz de manter as partículas de plasma juntas num fluído, proporcionando assim uma acreção de matéria mais eficiente. No entanto, esse campo magnético foi suposto bastante fraco, por forma a que se pudessem ignorar outros efeitos do mesmo. Vamos proceder ao estudo da acreção esférica, não dependente do tempo, por um buraco negro de Schwarzschild, mergulhado numa região HII com um campo magnético não desprezável (e.g Shapiro 1973b). Teremos assim que considerar os efeitos desse campo magnético na dinâmica do fluxo de partículas e na radiação emitida, para além do efeito de coesão de partículas de plasma. Tomaremos para a região HII os valores n∞≈1cm-3 e T∞≈104K para a densidade bariónica e temperatura no infinito. Para intensidade do campo magnético interestelar, longe do buraco negro, vamos considerar B∞≈3×10-68. Atendendo ao facto de numa região HII a condutividade eléctrica ser bastante elevada, uma vez que o gás está completamente ionizado, vamos considerar, de forma a facilitar os cálculos, que a condutividade eléctrica é infinita. Foram propostos, por diversos autores, vários modelos para o campo magnético interestelar. Esses modelos visavam, sobretudo, explicar a isotropia observada nos raios cósmicos. Como estamos a considerar a condutividade eléctrica infinita, o campo magnético deve ficar, aparte ligeiras instabilidades, pregado (ou congelado) nas partículas de gás. De acordo com Jokipii & Parker (1969) o campo de velocidades do gás no meio interestelar é turbulento e aleatório. Assim, o próprio campo magnético 69 interestelar, deve ser aleatório. No entanto, para que o campo magnético se possa considerar aleatório no âmbito da acreção esférica, deve ser respeitada a relação: c.coer rL << onde Lcoer. é o comprimento de coerência do campo magnético e rc é o raio de captura de partículas pelo buraco negro (7.8). O valor de Lcoer. varia consoante a região. Observam-se flutuações significativas do campo magnético interestelar, em escalas que vão desde 1pc até distâncias da ordem das centésimas da unidade astronómica (e.g. Spapiro 1973b). No caso dos buracos negros supermassivos a condição anterior é sempre satisfeita. No caso de buracos negros estelares a condição será válida para regiões relativamente densas e com campos de velocidades turbulentos. 8.2 Força magnética e componentes do campo magnético Estando o campo magnético primorosamente emaranhado e aleatoriamente orientado no gás, são válidas, para qualquer par de componentes do campo, as expressões: 2 jijji BBB δ= (8.1) k 2 j ijk j i x B 2 1 x B B ∂ ∂ δ= ∂ ∂ (8.2) onde as médias espaciais são tomadas ao longo do interior de um pequeno elemento de fluído, com escala característica d, centrado no ponto r r . Para que as duas expressões sejam válidas, as linhas de campo devem mudar de direcção bastantes vezes no interior desse elemento. Na acreção esférica, desde que a condição Lcoer<<rc se verifique, é sempre possível encontrar um elemento de fluído pequeno (d<<r), interior ao raio de captura, onde (8.1) e (8.2) são válidas. 72 * 2 *t ** * 2 * 2 t 2 4 B r GMp 12 u 4 B r GMp 12 u πρ +− ρ−γ γ+= πρ +− ρ−γ γ+ (8.8) Esta é simplesmente uma generalização da equação de Bernoulli (4.9) por forma a incluir os efeitos de um campo magnético congelado no gás. Defina-se raio adimensional x, velocidade adimensional y e densidade adimensional z como se segue: 2 *a GM xr = *yau = *zρ=ρ onde a velocidade do som a* é determinada de acordo com (4.3). Substituindo estas grandezas adimensionais em (4.8) voltamos a obter a equação (4.20) onde surge o parâmetro adimensional para a acreção λ. Se as substituirmos na equação de Bernoulli (8.8) obtemos: * 2 * * 1γ2 x 1 2 y y 1 y 1 F x 1 1γ 1z 2 y −+      −−= − −+ − (8.9) onde F é uma constante adimensional que pode ser escrita como: 2 * * 2 ** 2 *t r GM u 2 1 8 B 4 F       ρ       ρ      π λ = (8.10) No ponto r=rc as densidades de energia gravitacional, térmica e cinética são comparáveis. Assim, se fixarmos o ponto de referência r* em rc, verificamos que F é xxxx 73 Figura 8.1 - Velocidade radial y do gás em acreção para um buraco negro na presença de um campo magnético. A constante F é a relação densidade de energia magnética/densidade de energia térmica. O raio de captura está localizado em x=1 e o horizonte de acontecimentos aproximadamente em 0.6×10-8 (Shapiro 1973b) uma medida da razão entre a densidade de energia magnética e a densidade de energia térmica do meio interestelar. Dados valores a λ e F resolve-se o sistema constituído pelas equações (4.20) e (8.9) em ordem a y e z como funções de x. Estamos interessados, para cada valor de F, na solução que corresponde à taxa de acreção máxima. As soluções y=y(x) e z=z(x) correspondentes à acreção máxima, com γ=5/3, estão representadas no gráficos das Figuras 8.1 e 8.2 respectivamente. Foram considerados vários valores de F entre 0 e 104. Dentro desta gama, verifica-se que λtmax.≈0.25 pelo que podemos considerar λtmax independente de 7. A taxa de acreção máxima não é assim afectada pela presença de um campo magnético. Ainda para a mesma gama de valores de F temos a relação: F22.2 kTn3 π8/B ε ε ** 2 *t *t *m == onde εm* é a densidade de energia do campo magnético transversal, avaliada em r*=rc, e εt* é a densidade de energia térmica total (protões + electrões), avaliada no mesmo ponto. Valores de F superiores a 104 conduzem a campos magnéticos pouco comuns para regiões do tipo HII. 74 Figura 8.2 - Densidade radial z do gás em acreção para um buraco negro na presença de um campo magnético. A constante F é a relação densidade de energia magnética/densidade de energia térmica. O raio de captura está localizado em x=1 e o horizonte de acontecimentos aproximadamente em 0.6×10-8 (Shapiro 1973b) O caso F=0 corresponde à acreção esférica na ausência de um campo magnético significativo, surgindo assim nos gráficos das Figuras 8.1 e 8.2 como termo comparativo. Verifica-se que quanto maior F, mais lento é o aumento na velocidade de queda do gás e mais rápido é o aumento da densidade do mesmo. O campo magnético actua assim como um travão sobre o fluxo de plasma para o interior. Contudo, à medida que se dá a aproximação ao horizonte de acontecimentos este efeito acaba por desaparecer. Quando x tende para zero, as curvas correspondentes aos vários valores de F convergem, muito antes de ser atingido o horizonte, tornando-se assim, tanto a velocidade y como a densidade z, independentes de 7. Esta convergência é uma consequência da diminuição da importância do termo magnético da equação de Bernoulli (8.8), em relação aos restantes termos, à medida que r decresce. O fluxo dinâmico do plasma de hidrogénio, para um buraco negro de Schwarzschild, numa região HII típica, não é substancialmente alterado pela presença de um campo magnético. A taxa de acreção máxima é semelhante à verificada para o caso não magnético. Para r<<rc a velocidade e densidade do gás são comparáveis ao caso não magnético. 77 Tendo em conta (8.11) e (8.12) integram-se numericamente as equações dos fluídos com vista a determinar a velocidade, densidade e temperatura do gás, em função da distância radial ao centro. Verifica-se que para β<<103 os resultados não diferem muito dos obtidos para o caso não magnético (Capítulo 7). Isto acontece porque, embora exista uma fonte adicional de radiação, continua a ser apenas uma pequena fracção da energia térmica disponível a ser emitida. Junto ao horizonte de acontecimentos, a relação entre a taxa de arrefecimento por radiação de sincotrão e a taxa de transporte de energia térmica é de apenas 2×10-3β. Concluímos assim que a acreção esférica, na presença de um campo magnético, é um processo muito pouco eficiente, quanto visto como uma fonte de energia. O espectro resultante da emissão de sincotrão incide sobretudo na região do infravermelho. No gráfico da Figura 8.3. estão representadas várias curvas para este espectro, correspondentes à acreção de hidrogénio ionizado para um buraco negro de 1MŸ , com T∞≈10000K e para vários valores de n∞. A luminosidade correspondente à radiação de sincotrão é: (W) cm1 n M M 000K 10 T 105L 2 3 33 18 s                  ×≈ − ∞ − ∞ r desde que seja β<<103. A juntar ao espectro de radiação de sincotrão temos, naturalmente, o espectro resultante da radiação dos processos bremsstrahlung electrão-electrão, bremmsstrahlung electrão-protão e da recombinação radiativa. Este, cuja linha pode ser observada na Figura 7.7, e que incide sobretudo nos raios gama e raios X, tem uma luminosidade total dada por: (W) cm1 n M M 000K 10 T 102L 2 3 33 14 f                  ×≈ − ∞ − ∞ r As duas expressões anteriores são válidas para buracos negros estelares mergulhados em regiões HII típicas. Verifica-se que Ls>L7. 78 Figura 8.3 - Espectro continuo da emissão de radiação de sincotrão resultante da acreção de gás para um buraco negro de 1MŸ mergulhado numa região HII. O valor indicado sob cada uma das linhas corresponde a n∞ em cm -3 (adaptado de Shapiro 1973b). O plasma foi considerado opticamente fino para a radiação emergente das regiões mais interiores. Esta consideração é válida para os fotões de raios X e de raios gama de (alta energia), bem como para os fotões infravermelhos (baixa energia). Também foi considerado que os efeitos do stress magnético são desprezáveis pois, como vimos, a dinâmica do fluxo de partículas não é muito alterada pela presença de um campo magnético. 79 REFERÊNCIAS Bondi H., 1952, MNRAS, 112, 195 Chakrabarti S. K., 1996, astro-ph/9605015v1 Chandrasekhar S., 1983, The Mathematical Theory of Black Holes, Clarendon Press, Oxford d'Inverno R. A., 1992, Introducing Einstein's Relativity, Oxford University Press, New York Jokipii J. R., Parker E. N., 1969, ApJ, 155, 777 Parker E. N., 1973, ApJ, 180, 247 Shapiro S. L., 1973a, ApJ, 180, 531 Shapiro S. L., 1973b, ApJ, 185, 69 Shapiro S. L., Teukolsky S. A., 1983, Black Holes White Dwarfs and Neutron Stars, John Wiley & Sons, New York Tucker W. H., Gould R. J., 1966, ApJ, 144, 244
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