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Guias e Dicas
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Saúde da Criança, Notas de estudo de Fisioterapia

Fala do desenvolvimento, crescimento, alimentação adequada e etc.

Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 23/11/2009

abisague-silva-de-carvalho-10
abisague-silva-de-carvalho-10 🇧🇷

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Baixe Saúde da Criança e outras Notas de estudo em PDF para Fisioterapia, somente na Docsity! MINISTÉRIO DA SAÚDE SAÚDE DA CRIANÇA: Nutrição Infantil Aleitamento Materno e Alimentação Complementar Brasília – DF 2009 Caderno de Atenção Básica, nº 23 APRESENTAÇÃO ............................................................................................................9 1 ALEITAMENTO MATERNO .........................................................................................11 1.1 Introdução ................................................................................................11 1.2 Tipos de Aleitamento Materno ...................................................................12 1.3 Duração da Amamentação.........................................................................12 1.4 Importância do Aleitamento Materno ........................................................13 1.4.1 Evita mortes infantis .....................................................................13 1.4.2 Evita diarréia .................................................................................14 1.4.3 Evita infecção respiratória .............................................................14 1.4.4 Diminui o risco de alergias .............................................................15 1.4.5 Diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes ................15 1.4.6 Reduz a chance de obesidade .......................................................15 1.4.7 Melhor nutrição ...........................................................................16 1.4.8 Efeito positivo na inteligência ........................................................16 1.4.9 Melhor desenvolvimento da cavidade bucal ...................................17 1.4.10 Proteção contra câncer de mama ................................................17 1.4.11 Evita nova gravidez ....................................................................17 1.4.12 Menores custos financeiros..........................................................17 1.4.13 Promoção do vínculo afetivo entre mãe e filho .............................18 1.4.14 Melhor qualidade de vida ...........................................................18 1.5 Produção do Leite Materno ........................................................................18 1.6 Características e Funções do Leite Materno ................................................20 1.7 Técnica de Amamentação ..........................................................................21 1.8 Aconselhamento em Amamentação nos Diferentes Momentos...................26 1.8.1 Pré-natal .......................................................................................28 1.8.2 Início da amamentação .................................................................29 1.9 Prevenção e Manejo dos Principais Problemas Relacionados à Amamentação ....................................................................37 1.9.1 Bebê que não suga ou tem sucção fraca .........................................37 1.9.2 Demora na “descida do leite” ........................................................38 SUMÁRIO 1.9.3 Mamilos planos ou invertidos .......................................................38 1.9.4 Ingurgitamento mamário ...............................................................39 1.9.5 Dor nos mamilos/mamilos machucados .........................................40 1.9.6 Candidíase (monilíase) ...................................................................42 1.9.7 Fenômeno de Raynaud ..................................................................43 1.9.8 Bloqueio de ductos lactíferos .........................................................44 1.9.9 Mastite .........................................................................................44 1.9.10 Abscesso mamário .......................................................................46 1.9.11 Galactocele .................................................................................48 1.9.12 Reflexo anormal de ejeção do leite ..............................................48 1.9.13 Pouco leite ..................................................................................48 1.10 Como Manejar o Aleitamento Materno em Situações Especiais? ...............50 1.10.1 Nova gravidez .............................................................................50 1.10.2 Gemelaridade ..............................................................................51 1.10.3 Crianças com más formações orofaciais .......................................54 1.10.4 Crianças portadoras de distúrbios neurológicos ...........................55 1.10.5 Refluxo gastroesofágico ..............................................................55 1.10.6 Mãe com necessidades especiais ..................................................56 1.11 Situações em que há Restrições ao Aleitamento Materno ..........................56 1.12 Apoio dos Serviços de Saúde à Amamentação ..........................................59 1.13 A Importância da Família e da Comunidade no Processo da Amamentação .......................................................................60 1.13.1 Quais os instrumentos de proteção do aleitamento materno no Brasil? ......................................................................62 1.14 Ajuda à Dupla Mãe/Bebê no Processo do Desmame .................................63 2 ALIMENTAÇÃO COMPLEMENTAR PARA CRIANÇAS MENORES DE DOIS ANOS ................................................................................66 2.1 Importância ...............................................................................................66 2.2 Problemas Nutricionais mais Prevalentes na Infância ...................................67 2.3 Formação dos Hábitos Alimentares ............................................................69 2.4 Alimentação Complementar Saudável ........................................................72 2.4.1 Os atributos da alimentação saudável ............................................72 2.4.2 Como orientar para que a criança receba alimentação complementar saudável .............................................75 2.5 Alimentos Processados ..............................................................................85 2.6 Ações do Serviço de Saúde que Podem Fortalecer a Alimentação Complementar ...........................................................................................87 2.6.1 Programa Nacional de Suplementação de Ferro (PNSF) ..................87 2.6.2 Programa Nacional de Suplementação de Vitamina A .....................89 2.6.3 Informações sobre outros micronutrientes .....................................90 2.7 Alimentação para Crianças não Amamentadas ...........................................90 2.8 Orientações Importantes de Acordo com a Idade da Criança ......................92 2.9 Indicadores para Avaliar as Práticas Alimentares nos Dois Primeiros Anos de Vida ..............................................................................93 2.10 Dez Passos para uma Alimentação Saudável: Guia Alimentar para Crianças Menores de dois anos .........................................94 REFERÊNCIAS ......................................................................................................97 ANEXOS ............................................................................................................. 108 ANEXO A – Receitas de Papas para Crianças .................................................. 108 ANEXO B – Marcadores Dietéticos para Avaliação do Consumo Alimentar ..... 110 10 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Este Caderno faz parte de um trabalho que o Ministério da Saúde vem desen- volvendo no sentido de sensibilizar e dar subsídio aos profissionais da Atenção Básica. Coincide com novas estratégias de abordagem do aleitamento materno e alimentação complementar num contexto de redes de atenção a partir da Atenção Básica. Dessa for- ma, visa a potencializar ações de promoção da alimentação saudável e de apoio ao alei- tamento materno, numa linha de cuidado integral à Saúde da Criança. Ministério da Saúde 11 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1 ALEITAMENTO MATERNO 1.1 INTRODUÇÃO Amamentar é muito mais do que nutrir a criança. É um processo que envolve inte- ração profunda entre mãe e filho, com repercussões no estado nutricional da criança, em sua habilidade de se defender de infecções, em sua fisiologia e no seu desenvolvimento cognitivo e emocional, além de ter implicações na saúde física e psíquica da mãe. Apesar de todas as evidências científicas provando a superioridade da amamenta- ção sobre outras formas de alimentar a criança pequena, e apesar dos esforços de diver- sos organismos nacionais e internacionais, as taxas de aleitamento materno no Brasil, em especial as de amamentação exclusiva, estão bastante aquém do recomendado, e o pro- fissional de saúde tem um papel fundamental na reversão desse quadro. Mas para isso ele precisa estar preparado, pois, por mais competente que ele seja nos aspectos técnicos relacionados à lactação, o seu trabalho de promoção e apoio ao aleitamento materno não será bem sucedido se ele não tiver um olhar atento, abrangente, sempre levando em consideração os aspectos emocionais, a cultura familiar, a rede social de apoio à mulher, entre outros . Esse olhar necessariamente deve reconhecer a mulher como protagonista do seu processo de amamentar, valorizando-a, escutando-a e empoderando-a. Portanto, cabe ao profissional de saúde identificar e compreender o processo do aleitamento materno no contexto sociocultural e familiar e, a partir dessa compreensão, cuidar tanto da dupla mãe/bebê como de sua família. É necessário que busque formas de interagir com a população para informá-la sobre a importância de adotar uma práti- ca saudável de aleitamento materno. O profissional precisa estar preparado para prestar uma assistência eficaz, solidária, integral e contextualizada, que respeite o saber e a his- tória de vida de cada mulher e que a ajude a superar medos, dificuldades e inseguranças. (CASTRO; ARAÚJO, 2006) Apesar de a maioria dos profissionais de saúde considerar-se favorável ao aleita- mento materno, muitas mulheres se mostram insatisfeitas com o tipo de apoio recebido. Isso pode ser devido às discrepâncias entre percepções do que é apoio na amamentação. As mães que estão amamentando querem suporte ativo (inclusive o emocional), bem como informações precisas, para se sentirem confiantes, mas o suporte oferecido pe- los profissionais costuma ser mais passivo, reativo. Se o profissional de saúde realmente quer apoiar o aleitamento materno, ele precisa entender que tipo de apoio, informação e interação as mães desejam, precisam ou esperam dele. 12 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.2 TIPOS DE ALEITAMENTO MATERNO É muito importante conhecer e utilizar as definições de aleitamento materno adotadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e reconhecidas no mundo inteiro (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2007a). Assim, o aleitamento materno costuma ser classificado em: Aleitamento materno exclusivo• – quando a criança recebe somente leite materno, direto da mama ou ordenhado, ou leite humano de outra fonte, sem outros líquidos ou sólidos, com exceção de gotas ou xaropes contendo vitaminas, sais de reidratação oral, suplementos minerais ou medicamentos. Aleitamento materno predominante• – quando a criança recebe, além do leite materno, água ou bebidas à base de água (água adocicada, chás, infusões), sucos de frutas e fluidos rituais1. Aleitamento materno• – quando a criança recebe leite materno (direto da mama ou ordenhado), independentemente de receber ou não outros alimentos. Aleitamento materno complementado• – quando a criança recebe, além do leite materno, qualquer alimento sólido ou semi-sólido com a finalidade de complementá-lo, e não de substituí-lo. Nessa categoria a criança pode receber, além do leite materno, outro tipo de leite, mas este não é considerado alimento complementar. Aleitamento materno misto ou parcial• – quando a criança recebe leite materno e outros tipos de leite. 1.3 DURAÇÃO DA AMAMENTAÇÃO Vários estudos sugerem que a duração da amamentação na espécie humana seja, em média, de dois a três anos, idade em que costuma ocorrer o desmame naturalmente (KENNEDY, 2005). A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde recomendam alei- tamento materno exclusivo por seis meses e complementado até os dois anos ou mais. Não há vantagens em se iniciar os alimentos complementares antes dos seis meses, po- dendo, inclusive, haver prejuízos à saúde da criança, pois a introdução precoce de outros alimentos está associada a: Maior número de episódios de diarréia;• 1 Embora a OMS não reconheça os fluidos rituais (poções, líquidos ou misturas utilizadas em ritos místicos ou religiosos) como exceção possível inserida na definição de aleitamento materno exclusivo, o Ministério da Saúde, considerando a possibilidade do uso de fluidos rituais com finalidade de cura dentro de um contexto intercultural e valorizando as diversas práticas integrativas e complementares, apóia a inclusão de fluidos rituais na definição de aleitamento materno exclusivo, desde que utilizados em volumes reduzidos, de forma a não concorrer com o leite materno. 15 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.4.4 Diminui o risco de alergias Estudos mostram que a amamentação exclusiva nos primeiros meses de vida dimi- nui o risco de alergia à proteína do leite de vaca, de dermatite atópica e de outros tipos de alergias, incluindo asma e sibilos recorrentes (VAN ODIJK et al., 2003). Assim, retardar a introdução de outros alimentos na dieta da criança pode prevenir o aparecimento de alergias, principalmente naquelas com histórico familiar positivo para essas doenças. A exposição a pequenas doses de leite de vaca nos primeiros dias de vida parece aumentar o risco de alergia ao leite de vaca. Por isso é importante evitar o uso desneces- sário de fórmulas lácteas nas maternidades. 1.4.5 Diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes Há evidências sugerindo que o aleitamento materno apresenta benefícios em longo prazo. A OMS publicou importante revisão sobre evidências desse efeito (HORTA et al., 2007). Essa revisão concluiu que os indivíduos amamentados apresentaram pressões sis- tólica e diastólica mais baixas (-1,2mmHg e -0,5mmHg, respectivamente), níveis menores de colesterol total (-0,18mmol/L) e risco 37% menor de apresentar diabetes tipo 2. Não só o indivíduo que é amamentado adquire proteção contra diabetes, mas tam- bém a mulher que amamenta. Foi descrita uma redução de 15% na incidência de diabetes tipo 2 para cada ano de lactação (STUEBE et al., 2005). Atribui-se essa proteção a uma melhor homeostase da glicose em mulheres que amamentam. A exposição precoce ao leite de vaca (antes dos quatro meses) é considerada um importante determinante do Diabetes mellitus Tipo I, podendo aumentar o risco de seu aparecimento em 50%. Estima-se que 30% dos casos poderiam ser prevenidos se 90% das crianças até três meses não recebessem leite de vaca. (GERSTEIN, 1994) 1.4.6 Reduz a chance de obesidade A maioria dos estudos que avaliaram a relação entre obesidade em crianças maiores de 3 anos e tipo de alimentação no início da vida constatou menor freqüência de sobre- peso/obesidade em crianças que haviam sido amamentadas. Na revisão da OMS sobre evidências do efeito do aleitamento materno em longo prazo, os indivíduos amamenta- dos tiveram uma chance 22% menor de vir a apresentar sobrepeso/obesidade (DEWEY, 2003). É possível também que haja uma relação dose/resposta com a duração do alei- tamento materno, ou seja, quanto maior o tempo em que o indivíduo foi amamentado, menor será a chance de ele vir a apresentar sobrepeso/obesidade. Entre os possíveis mecanismos implicados a essa proteção, encontram-se um melhor desenvolvimento da auto-regulação de ingestão de alimentos das crianças amamentadas e a composição única do leite materno participando no processo de “programação metabólica”, alterando, por exemplo, o número e/ou tamanho das células gordurosas ou induzindo o fenômeno de diferenciação metabólica. Foi constatado que o leite de vaca altera a taxa metabólica du- rante o sono de crianças amamentadas, podendo esse fato estar associado com a “pro- gramação metabólica” e o desenvolvimento de obesidade. (HAISMA et al., 2005) 16 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.4.7 Melhor nutrição Por ser da mesma espécie, o leite materno contém todos os nutrientes essenciais para o crescimento e o desenvolvimento ótimos da criança pequena, além de ser mais bem digerido, quando comparado com leites de outras espécies. O leite materno é capaz de suprir sozinho as necessidades nutricionais da criança nos primeiros seis meses e con- tinua sendo uma importante fonte de nutrientes no segundo ano de vida, especialmente de proteínas, gorduras e vitaminas. Ilustração da etnia Guarani/Kaiowá, localizada no Mato Grosso do Sul 1.4.8 Efeito positivo na inteligência Há evidências de que o aleitamento materno contribui para o desenvolvimento cognitivo. A maioria dos estudos conclui que as crianças amamentadas apresentam van- tagem nesse aspecto quando comparadas com as não amamentadas, principalmente as com baixo peso de nascimento. Essa vantagem foi observada em diferentes idades, (ANDERSON; JOHNSTONE; REMLEY, 1999) inclusive em adultos (HORTENSEN et "A mãe coloca o bebê no colo, da o peito diariamente, sempre que o bebê quiser, passando amor e carinho." 17 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A al., 2002). Os mecanismos envolvidos na possível associação entre aleitamento mater- no e melhor desenvolvimento cognitivo ainda não são totalmente conhecidos. Alguns defendem a presença de substâncias no leite materno que otimizam o desenvolvimento cerebral; outros acreditam que fatores comportamentais ligados ao ato de amamentar e à escolha do modo como alimentar a criança são os responsáveis. 1.4.9 Melhor desenvolvimento da cavidade bucal O exercício que a criança faz para retirar o leite da mama é muito importante para o desenvolvimento adequado de sua cavidade oral, propiciando uma melhor conforma- ção do palato duro, o que é fundamental para o alinhamento correto dos dentes e uma boa oclusão dentária. Quando o palato é empurrado para cima, o que ocorre com o uso de chupetas e mamadeiras, o assoalho da cavidade nasal se eleva, com diminuição do tamanho do es- paço reservado para a passagem do ar, prejudicando a respiração nasal. Assim, o desmame precoce pode levar à ruptura do desenvolvimento motor-oral adequado, podendo prejudicar as funções de mastigação, deglutição, respiração e articu- lação dos sons da fala, ocasionar má-oclusão dentária, respiração bucal e alteração mo- tora-oral. 1.4.10 Proteção contra câncer de mama Já está bem estabelecida a associação entre aleitamento materno e redução na prevalência de câncer de mama. Estima-se que o risco de contrair a doença diminua 4,3% a cada 12 meses de duração de amamentação. (COLLABORATIVE GROUP ON HORMONAL FACTORS IN BREAST CANCER, 2002) Essa proteção independe de ida- de, etnia, paridade e presença ou não de menopausa. 1.4.11 Evita nova gravidez A amamentação é um excelente método anticoncepcional nos primeiros seis me- ses após o parto (98% de eficácia), desde que a mãe esteja amamentando exclusiva ou predominantemente e ainda não tenha menstruado (GRAY et al., 1990). Estudos com- provam que a ovulação nos primeiros seis meses após o parto está relacionada com o número de mamadas; assim, as mulheres que ovulam antes do sexto mês após o parto em geral amamentam menos vezes por dia que as demais. 1.4.12 Menores custos financeiros Não amamentar pode significar sacrifícios para uma família com pouca renda. Em 2004, o gasto médio mensal com a compra de leite para alimentar um bebê nos primei- ros seis meses de vida no Brasil variou de 38% a 133% do salário-mínimo, dependendo da marca da fórmula infantil. A esse gasto devem-se acrescentar custos com mamadeiras, bicos e gás de cozinha, além de eventuais gastos decorrentes de doenças, que são mais comuns em crianças não amamentadas. 20 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Na amamentação, o volume de leite produzido varia, dependendo do quanto a criança mama e da freqüência com que mama. Quanto mais volume de leite e mais ve- zes a criança mamar, maior será a produção de leite. Uma nutriz que amamenta exclusi- vamente produz, em média, 800ml por dia no sexto mês. Em geral, uma nutriz é capaz de produzir mais leite do que a quantidade necessária para o seu bebê. 1.6 CARACTERÍSTICAS E FUNÇÕES DO LEITE MATERNO Apesar de a alimentação variar enormemente, o leite materno, surpreendente- mente, apresenta composição semelhante para todas as mulheres que amamentam do mundo. Apenas as com desnutrição grave podem ter o seu leite afetado na sua qualida- de e quantidade. Nos primeiros dias, o leite materno é chamado colostro, que contém mais proteí- nas e menos gorduras do que o leite maduro, ou seja, o leite secretado a partir do sétimo ao décimo dia pós-parto. O leite de mães de recém-nascidos prematuros é diferente do de mães de bebês a termo. Veja na Tabela 1 as diferenças entre colostro e leite maduro, entre o leite de mães de prematuros e de bebês a termo e entre o leite materno e o leite de vaca. Este tem muito mais proteínas que o leite humano e essas proteínas são diferen- tes das do leite materno. A principal proteína do leite materno é a lactoalbumina e a do leite de vaca é a caseína, de difícil digestão para a espécie humana. Tabela 1 – Composição do colostro e do leite materno maduro de mães de crianças a termo e pré-termo e do leite de vaca Nutriente Colostro (3–5 dias) Leite Maduro (26–29 dias) Leite de vaca A termo Pré-termo A termo Pré-termo Calorias (kcal/dL) 48 58 62 70 69 Lipídios (g/dL) 1,8 3,0 3,0 4,1 3,7 Proteínas (g/dL) 1,9 2,1 1,3 1,4 3,3 Lactose (g/dL) 5,1 5,0 6,5 6,0 4,8 A concentração de gordura no leite aumenta no decorrer de uma mamada. Assim, o leite do final da mamada (chamado leite posterior) é mais rico em energia (calorias) e sacia melhor a criança, daí a importância de a criança esvaziar bem a mama. O leite humano possui numerosos fatores imunológicos que protegem a criança contra infecções. A IgA secretória é o principal anticorpo, atuando contra microorganis- 21 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A mos presentes nas superfícies mucosas. Os anticorpos IgA no leite humano são um refle- xo dos antígenos entéricos e respiratórios da mãe, ou seja, ela produz anticorpos contra agentes infecciosos com os quais já teve contato, proporcionando, dessa maneira, prote- ção à criança contra os germens prevalentes no meio em que a mãe vive. A concentração de IgA no leite materno diminui ao longo do primeiro mês, permanecendo relativamente constante a partir de então. Além da IgA, o leite materno contém outros fatores de proteção, tais como anti- corpos IgM e IgG, macrófagos, neutrófilos, linfócitos B e T, lactoferrina, lisosima e fator bífido. Este favorece o crescimento do Lactobacilus bifidus, uma bactéria não patogênica que acidifica as fezes, dificultando a instalação de bactérias que causam diarréia, tais como Shigella, Salmonella e Escherichia coli. Alguns dos fatores de proteção do leite materno são total ou parcialmente destruídos pelo calor, razão pela qual o leite humano pasteurizado (submetido a uma temperatura de 62,5 oC por 30 minutos) não tem o mesmo valor biológico que o leite cru. 1.7 TÉCNICA DE AMAMENTAÇÃO Apesar de a sucção do bebê ser um ato reflexo, ele precisa aprender a retirar o leite do peito de forma eficiente. Quando o bebê pega a mama adequadamente – o que requer uma abertura ampla da boca, abocanhando não apenas o mamilo, mas também parte da aréola –, forma-se um lacre perfeito entre a boca e a mama, garantindo a for- mação do vácuo, indispensável para que o mamilo e a aréola se mantenham dentro da boca do bebê. A língua eleva suas bordas laterais e a ponta, formando uma concha (canolamento) que leva o leite até a faringe posterior e esôfago, ativando o reflexo de deglutição. A reti- rada do leite (ordenha) é feita pela língua, graças a um movimento peristáltico rítmico da ponta da língua para trás, que comprime suavemente o mamilo. Enquanto mama no pei- to, o bebê respira pelo nariz, estabelecendo o padrão normal de respiração nasal. O ciclo de movimentos mandibulares (para baixo, para a frente, para cima e para trás) promove o crescimento harmônico da face do bebê. A técnica de amamentação, ou seja, a maneira como a dupla mãe/bebê se posicio- na para amamentar/mamar e a pega/sucção do bebê são muito importantes para que o bebê consiga retirar, de maneira eficiente, o leite da mama e também para não machu- car os mamilos. Uma posição inadequada da mãe e/ou do bebê na amamentação dificulta o posi- cionamento correto da boca do bebê em relação ao mamilo e à aréola, resultando no que se denomina de “má pega”. A má pega dificulta o esvaziamento da mama, levando a uma diminuição da produção do leite. Muitas vezes, o bebê com pega inadequada não 22 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A ganha o peso esperado apesar de permanecer longo tempo no peito. Isso ocorre por- que, nessa situação, ele é capaz de obter o leite anterior, mas tem dificuldade de retirar o leite posterior, mais calórico. Pega adequada ou boa pega Pega inadequada ou má pega Além de dificultar a retirada do leite, a má pega machuca os mamilos. Quando o bebê tem uma boa pega, o mamilo fica em uma posição dentro da boca da criança que o protege da fricção e compressão, prevenindo, assim, lesões mamilares. 25 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A É sempre útil lembrar a mãe de que é o bebê que vai à mama e não a mama que vai ao bebê. Para isso, a mãe pode, com um rápido movimento, levar o bebê ao peito quando ambos estiverem prontos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) destaca quatro pontos-chave que carac- terizam o posicionamento e pega adequados: Pontos-chave do posicionamento adequado Rosto do bebê de frente para a mama, com nariz na altura do mamilo;1. Corpo do bebê próximo ao da mãe;2. Bebê com cabeça e tronco alinhados (pescoço não torcido);3. Bebê bem apoiado.4. Pontos-chave da pega adequada Mais aréola visível acima da boca do bebê;1. Boca bem aberta;2. Lábio inferior virado para fora;3. Queixo tocando a mama.4. Os seguintes sinais são indicativos de técnica inadequada de amamentação: Bochechas do bebê encovadas a cada sucção;• Ruídos da língua;• Mama aparentando estar esticada ou deformada durante a mamada;• 26 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Mamilos com estrias vermelhas ou áreas esbranquiçadas ou achatadas quando o • bebê solta a mama; Dor na amamentação;• Quando a mama está muito cheia, a aréola pode estar tensa, endurecida, dificul- tando a pega. Em tais casos, recomenda-se, antes da mamada, retirar manualmente um pouco de leite da aréola ingurgitada. 1.8 ACONSELHAMENTO EM AMAMENTAÇÃO NOS DIFERENTES MOMENTOS Não basta ao profissional de saúde ter conhecimentos básicos e habilidades em alei- tamento materno. Ele precisa ter também competência para se comunicar com eficiência, o que se consegue mais facilmente usando a técnica do aconselhamento em amamentação. Aconselhar não significa dizer à mulher o que ela deve fazer; significa ajudá-la a tomar de- cisões, após ouvi-la, entendê-la e dialogar com ela sobre os prós e contras das opções. No aconselhamento, é importante que as mulheres sintam que o profissional se inte- ressa pelo bem-estar delas e de seus filhos para que elas adquiram confiança e se sintam apoiadas e acolhidas. Em outras palavras, o aconselhamento, por meio do diálogo, ajuda a mulher a tomar decisões, além de desenvolver sua confiança no profissional. Os seguintes recursos são muito utilizados no aconselhamento, não só em ama- mentação, mas em diversas circunstâncias: Praticar a comunicação não-verbal (gestos, expressão facial). Por exem-• plo, sorrir, como sinal de acolhimento; balançar a cabeça afirmativamente, como sinal de interesse; tocar na mulher ou no bebê, quando apropriado, como sinal de empatia; Remover barreiras como mesa, papéis, promovendo uma maior aproxi-• mação entre a mulher e o profissional de saúde; Usar linguagem simples, acessível a quem está ouvindo;• Dar espaço para a mulher falar. Para isso, é necessário dedicar tempo para • ouvir, prestando atenção no que a mãe está dizendo e no significado de suas falas. Como sinal de interesse, podem ser utilizadas expressões como: “Ah é? Mmm... Aha!” Algumas mulheres têm dificuldades de se expressar. Nesse caso, algumas técnicas são úteis, tais como fazer perguntas abertas, dando mais espaço para a mulher se expressar. Essas perguntas em geral começam por: Como? O quê? Quando? Onde? Por quê? Por exemplo, em vez de perguntar se o bebê está sendo amamentado, perguntar como ela está alimentando o bebê. Outra técnica que pode incentivar as mulheres a falarem mais é devolver o que a mãe diz. Por exemplo, se a mãe relata que a criança chora muito à noite, o profissional pode fazer a mãe falar 27 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A mais sobre isso perguntando: “O seu bebê faz você ficar acordada à noite porque chora muito?”; Demonstrar empatia, ou seja, mostrar à mãe que os seus sentimentos são • compreendidos, colocando-a no centro da situação e da atenção do pro- fissional. Por exemplo, quando a mãe diz que está muito cansada porque o bebê quer mamar com muita freqüência, o profissional pode comentar que entende porque a mãe está se sentindo tão cansada; Evitar palavras que soam como julgamentos, como, por exemplo, certo, • errado, bem, mal etc. Por exemplo, em vez de perguntar se o bebê mama bem, seria mais apropriado perguntar como o bebê mama; Aceitar e respeitar os sentimentos e as opiniões das mães, sem, no entanto, • precisar concordar ou discordar do que ela pensa. Por exemplo, se uma mãe afirma que o seu leite é fraco, o profissional pode responder dizendo que entende a sua preocupação. E pode complementar dizendo que o lei- te materno pode parecer ralo no começo da mamada, mas contém muitos nutrientes; Reconhecer e elogiar aquilo em que a mãe e o bebê estão indo bem, por • exemplo, quando o bebê está ganhando peso ou sugando bem, ou mes- mo elogiá-la por ter vindo à Unidade Básica de Saúde, se for o caso. Essa atitude aumenta a confiança da mãe, encoraja-a a manter práticas saudáveis e facilita a sua aceitação a sugestões; Oferecer poucas informações em cada aconselhamento, as mais importan-• tes para a situação do momento; Fazer sugestões em vez de dar ordens;• Oferecer ajuda prática como, por exemplo, segurar o bebê por alguns mi-• nutos e ajudá-la a encontrar uma posição confortável para amamentar; Conversar com as mães sobre as suas condições de saúde e as do bebê, • explicando-lhes todos os procedimentos e condutas. A ênfase dada a determinados tópicos durante um aconselhamento em amamen- tação pode variar de acordo com a época e o momento em que é feito. A seguir são abordados alguns tópicos importantes relacionados à amamentação em diferentes mo- mentos e circunstâncias. 30 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A tensas, frustradas e ansiosas com o choro dos bebês tendem a transmitir esses sentimen- tos a eles, causando mais choro, podendo instalar-se um ciclo vicioso. É comum algumas mães rotularem os seus bebês de “bravos”. Uma atitude de so- lidariedade e entendimento das necessidades dos seus bebês traria mais tranqüilidade a ambos. A mãe provavelmente passaria a olhar de um modo diferente o seu bebê, não mais o rotulando de “bravo”, e sim como vivenciando uma experiência difícil em alguns momentos. Muitas mães queixam-se de que os seus bebês “trocam o dia pela noite”. Os re- cém-nascidos costumam manter, nos primeiros dias, o ritmo ao qual estavam acostuma- dos dentro do útero. Assim, as crianças que no útero costumavam ser mais ativas à noite vão necessitar de alguns dias para se adaptarem ao ciclo dia/noite. Portanto, as mães de- vem ser tranqüilizadas quanto a esse eventual comportamento do bebê. A interação entre a mãe e o bebê nos primeiros dias é muito importante para o sucesso da amamentação e uma futura relação harmônica. A mãe deve ser orientada a responder prontamente às necessidades do seu bebê, não temendo que isso vá deixá-lo “manhoso” ou “superdependente” mais tarde. Carinho, proteção e pronto atendimento das necessidades do bebê só tendem a aumentar a sua confiança, favorecendo a sua in- dependência em tempo apropriado. Hoje se sabe que os bebês têm competências que antes eram ignoradas, e as mães (e pais e familiares) devem saber disso para melhor interagirem com eles, além de tornar a interação mais gratificante. O melhor momento de interagir com a criança é quando ela se encontra no es- tado quieto-alerta. Nesse estado o bebê encontra-se quieto, mas alerta, com os olhos bem abertos, como se estivesse prestando atenção. Na primeira hora de vida, esse esta- do de consciência predomina, favorecendo a interação. A separação da mãe e do bebê e a sedação da mãe logo após o parto privam a dupla desse momento tão especial. Ao longo do dia e da noite a criança encontra-se no estado quieto-alerta vá rias vezes, por períodos curtos. Durante e após intensa interação, os bebês necessitam de freqüentes períodos de repouso. Para uma melhor interação com o bebê, é interessante que a mãe, o pai e outros familiares saibam que alguns recém-nascidos a termo, em situações especiais (principal- mente no estado quieto-alerta), são capazes de: Ir ao encontro da mama da mãe por si próprios logo após o nascimento, se • colocados no tórax dela. Dessa maneira eles decidem por si o momento da primeira mamada, que ocorre em média aos 40 minutos de vida; Reconhecer a face da mãe após algumas horas de vida. O bebê enxerga • melhor a uma distância de 20 a 25cm, a mesma que separa os olhos do bebê e o rosto da mãe durante as mamadas; 31 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Ter contato olho a olho;• Reconhecer e mostrar interesse por cores primárias – vermelho, azul e • amarelo; Seguir um objeto com os olhos e, às vezes, virar a cabeça na sua direção;• Distinguir tipos de sons, tendo preferência pela voz humana, em especial a • da mãe, e pelos sons agudos; Determinar a direção do som;• Reconhecer sabores, tendo preferência por doces;• Reconhecer e distinguir diferentes cheiros; com um ou dois dias de vida • reconhece o cheiro da mãe; Imitar expressões faciais logo após o nascimento;• Alcançar objetos.• 1.8.2.2 Número de mamadas por dia Recomenda-se que a criança seja amamentada sem restrições de horários e de tempo de permanência na mama. É o que se chama de amamentação em livre deman- da. Nos primeiros meses, é normal que a criança mame com freqüência e sem horários regulares. Em geral, um bebê em aleitamento materno exclusivo mama de oito a 12 ve- zes ao dia. Muitas mães, principalmente as que estão inseguras e as com baixa auto-es- tima, costumam interpretar esse comportamento normal como sinal de fome do bebê, leite fraco ou pouco leite, o que pode resultar na introdução precoce e desnecessária de suplementos. O tamanho das mamas pode exercer alguma influência no número de mamadas da criança por dia. As mulheres com mamas mais volumosas têm uma maior capacidade de armazenamento de leite e por isso podem ter mais flexibilidade com relação à freqüência das mamadas (DALY; HARTMANN, 1995). Já as mulheres com mamas pequenas podem necessitar amamentar com mais freqüência devido a sua pequena capacidade de arma- zenamento do leite. No entanto, o tamanho da mama não tem relação com a produção do leite, ou seja, as mamas grandes e pequenas em geral têm a capacidade de secretarem o mesmo volume de leite em um dia. 1.8.2.3 Duração das mamadas O tempo de permanência na mama em cada mamada não deve ser fixado, haja vista que o tempo necessário para esvaziar uma mama varia para cada dupla mãe/bebê e, numa mesma dupla, pode variar dependendo da fome da criança, do intervalo transcor- rido desde a última mamada e do volume de leite armazenado na mama, entre outros. O mais importante é que a mãe dê tempo suficiente à criança para ela esvaziar adequada- mente a mama. Dessa maneira, a criança recebe o leite do final da mamada, que é mais calórico, promovendo a sua saciedade e, conseqüentemente, maior espaçamento entre 32 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A as mamadas. O esvaziamento das mamas é importante também para o ganho adequa- do de peso do bebê e para a manutenção da produção de leite suficiente para atender às demandas do bebê. 1.8.2.4 Uso de mamadeira Água, chás e principalmente outros leites devem ser evitados, pois há evidências de que o seu uso está associado com desmame precoce e aumento da morbimortalidade infantil. A mamadeira, além de ser uma importante fonte de contaminação, pode influen- ciar negativamente a amamentação. Observa-se que algumas crianças, depois de expe- rimentarem a mamadeira, passam a apresentar dificuldade quando vão mamar no peito. Alguns autores denominam essa dificuldade de “confusão de bicos”, gerada pela diferença marcante entre a maneira de sugar na mama e na mamadeira. Nesses casos, é comum o bebê começar a mamar no peito, porém, após alguns segundos, largar a mama e cho- rar. Como o leite na mamadeira flui abundantemente desde a primeira sucção, a criança pode estranhar a demora de um fluxo maior de leite no peito no início da mamada, pois o reflexo de ejeção do leite leva aproximadamente um minuto para ser desencadeado e algumas crianças podem não tolerar essa espera. Não restam mais dúvidas de que a suplementação do leite materno com água ou chás nos primeiros seis meses é desnecessária, mesmo em locais secos e quentes (ASHRAF et al., 1993). Mesmo ingerindo pouco colostro nos primeiros dois a três dias de vida, recém-nascidos normais não necessitam de líquidos adicionais além do leite ma- terno, pois nascem com níveis de hidratação tecidual relativamente altos. 1.8.2.5 Uso de chupeta Atualmente, a chupeta tem sido desaconselhada pela possibilidade de interferir negativamente na duração do aleitamento materno, entre outros motivos. Crianças que chupam chupetas, em geral, são amamentadas com menos freqüência, o que pode com- prometer a produção de leite. Embora não haja dúvidas de que o desmame precoce ocorre com mais freqüência entre as crianças que usam chupeta, ainda não são totalmen- te conhecidos os mecanismos envolvidos nessa associação. É possível que o uso da chu- peta seja um sinal de que a mãe está tendo dificuldades na amamentação ou de que tem menor disponibilidade para amamentar. (VICTORA et al., 1997) Além de interferir no aleitamento materno, o uso de chupeta está associado a uma maior ocorrência de candidíase oral (sapinho), de otite média e de alterações do palato. A comparação de crânios de pessoas que viveram antes da existência dos bicos de bor- racha com crânios mais modernos sugere o efeito nocivo dos bicos na formação da ca- vidade oral. (PALMER, 1998) 35 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Após o retorno ao trabalho Amamentar com freqüência quando estiver em casa, inclusive à noite;• Evitar mamadeiras; oferecer a alimentação por meio de copo e colher;• Durante as horas de trabalho, esvaziar as mamas por meio de ordenha e guar-• dar o leite em geladeira. Levar para casa e oferecer à criança no mesmo dia ou no dia seguinte ou congelar. Leite cru (não pasteurizado) pode ser conservado em geladeira por 12 horas e, no freezer ou congelador, por 15 dias; Para alimentar o bebê com leite ordenhado congelado, este deve ser des-• congelado, de preferência dentro da geladeira. Uma vez descongelado, o leite deve ser aquecido em banho-maria fora do fogo. Antes de oferecê-lo à criança, ele deve ser agitado suavemente para homogeneizar a gordura; Realizar ordenha, de preferência manual, da seguinte maneira;• Dispor de vasilhame de vidro esterilizado para receber o leite, preferen-• cialmente vidros de boca larga com tampas plásticas que possam ser sub- metidos à fervura durante mais ou menos 20 minutos. Procurar um local tranqüilo para esgotar o leite; Prender os cabelos;• Usar máscara ou evitar falar, espirrar ou tossir enquanto estiver ordenhan-• do o leite; Ter à mão pano úmido limpo e lenços de papel para limpeza das mãos;• Lavar cuidadosamente as mãos e antebraços. Não há necessidade de lavar • os seios freqüentemente; 36 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Secar as mãos e antebraços com toalha limpa ou de papel;• Posicionar o recipiente onde será coletado o leite materno (copo, xícara, • caneca ou vidro de boca larga) próximo ao seio; Massagear delicadamente a mama como um todo com movimentos circu-• lares da base em direção à aréola; Procurar estar relaxada, sentada ou em pé, em posição confortável. Pensar • no bebê pode auxiliar na ejeção do leite; Curvar o tórax sobre o abdômen, para facilitar a saída do leite e aumentar • o fluxo; Com os dedos da mão em forma de “C”, colocar o polegar na aréola ACI-• MA do mamilo e o dedo indicador ABAIXO do mamilo na transição aréola- mama, em oposição ao polegar, sustentando o seio com os outros dedos; Usar preferencialmente a mão esquerda para a mama esquerda e a mão • direita para a mama direita, ou usar as duas mãos simultaneamente (uma em cada mama ou as duas juntas na mesma mama – técnica bimanual); Pressionar suavemente o polegar e o dedo indicador, um em direção ao • outro, e levemente para dentro em direção à parede torácica. Evitar pres- sionar demais, pois pode bloquear os ductos lactíferos; Pressionar e soltar, pressionar e soltar. A manobra não deve doer se a • técnica estiver correta. A princípio o leite pode não fluir, mas depois de pressionar algumas vezes o leite começará a pingar. Poderá fluir em jorros se o reflexo de ocitocina for ativo; Desprezar os primeiros jatos, assim, melhora a qualidade do leite pela re-• dução dos contaminantes microbianos; Mudar a posição dos dedos ao redor da aréola para esvaziar todas as áreas; • Alternar a mama quando o fluxo de leite diminuir, repetindo a massagem e • o ciclo várias vezes. Lembrar que ordenhar leite de peito adequadamente leva mais ou menos 20 a 30 minutos, em cada mama, especialmente nos primeiros dias, quando apenas uma pequena quantidade de leite pode ser produzida; Podem ser ordenhados os dois seios simultaneamente em um único va-• silhame de boca larga ou em dois vasilhames separados, colocados um embaixo de cada mama. O leite ordenhado deve ser oferecido à criança de preferência utilizando-se copo, xícara ou colher. Para isso, é necessário que o profissional de saúde demonstre como oferecer o leite à criança. A técnica recomendada é a seguinte: Acomodar o bebê desperto e tranqüilo no colo, na posição sentada ou se-• mi-sentada, sendo que a cabeça forme um ângulo de 90º com o pescoço; 37 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Encostar a borda do copo no lábio inferior do bebê e deixar o leite mater-• no tocar o lábio. O bebê fará movimentos de lambida do leite, seguidos de deglutição; Não despejar o leite na boca do bebê. • 1.9 PREVENÇÃO E MANEJO DOS PRINCIPAIS PROBLEMAS RELACIONADOS À AMAMENTAÇÃO Alguns problemas enfrentados pelas nutrizes durante o aleitamento materno, se não forem precocemente identificados e tratados, podem ser importantes causas de in- terrupção da amamentação. Os profissionais de saúde têm um papel importante na pre- venção e no manejo dessas dificuldades. A seguir são abordadas as principais dificuldades e seu manejo. 1.9.1 Bebê que não suga ou tem sucção fraca Quando, por alguma razão, o bebê não estiver sugando ou a sucção é ineficaz, e a mãe deseja amamentá-lo, ela deve ser orientada a estimular a sua mama regularmente (no mínimo cinco vezes ao dia) por meio de ordenha manual ou por bomba de sucção. Isso garantirá a produção de leite. Alguns bebês resistem às tentativas de serem amamentados e com freqüência não se descobre a causa dessa resistência inicial. Algumas vezes ela pode estar associada ao uso de bicos artificiais ou chupetas ou ainda à presença de dor quando o bebê é posicio- nado para mamar. O manejo desses casos se restringe a acalmar a mãe e o bebê, sus- pender o uso de bicos e chupetas quando presentes e insistir nas mamadas por alguns minutos cada vez. Alguns bebês não conseguem pegar a aréola adequadamente ou não conseguem manter a pega. Isso pode ocorrer porque o bebê não está bem posicionado, não abre a boca suficientemente ou está sendo exposto à mamadeira e/ou chupeta. Além disso, o bebê pode não abocanhar adequadamente a mama porque elas estão muito tensas, ingurgitadas, ou os mamilos são invertidos ou muito planos. O manejo vai depender do problema detectado. Em algumas situações o bebê começa a mamar, porém após alguns segundos larga a mama e chora. Nesses casos ele pode estar mal posicionado, ter adquirido preferência pela mamadeira ou, ainda, o fluxo de leite ser muito forte. Não é raro o bebê ter dificuldade para sugar em uma das mamas porque existe al- guma diferença entre elas (mamilos, fluxo de leite, ingurgitamento) ou porque a mãe não consegue posicioná-lo adequadamente em um dos lados ou, ainda, porque ele sente dor numa determinada posição (fratura de clavícula, por exemplo). Um recurso que se utiliza para fazer o bebê mamar na mama “recusada”, muitas vezes com sucesso, é o uso da po- sição “jogador de futebol americano” (bebê apoiado no braço do mesmo lado da 40 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A compressas frias não deve ultrapassar 20 minutos devido ao efeito rebo- te, ou seja, um aumento de fluxo sanguíneo para compensar a redução da temperatura local. As compressas frias provocam vasoconstrição tem- porária pela hipotermia, o que leva à redução do fluxo sangüíneo, com conseqüente redução do edema, aumento da drenagem linfática e menor produção do leite, devida à redução da oferta de substratos necessários à produção do leite; Se o bebê não sugar, a mama deve ser ordenhada manualmente ou com • bomba de sucção. O esvaziamento da mama é essencial para dar alívio à mãe, diminuir a pressão dentro dos alvéolos, aumentar a drenagem da linfa e do edema e não comprometer a produção do leite, além de prevenir a ocorrência de mastite. 1.9.5 Dor nos mamilos/mamilos machucados É comum a mulher sentir dor discreta ou mesmo moderada nos mamilos no co- meço das mamadas, devido à forte sucção deles e da aréola. Essa dor pode ser conside- rada normal e não deve persistir além da primeira semana. No entanto, ter os mamilos muito doloridos e machucados, apesar de muito comuns, não é normal e requer inter- venção. A causa mais comum de dor para amamentar se deve a lesões nos mamilos por posicionamento e pega inadequados. Outras causas incluem mamilos curtos, planos ou invertidos, disfunções orais na criança, freio de língua excessivamente curto, sucção não nutritiva prolongada, uso impróprio de bombas de extração de leite, não interrupção adequada da sucção da criança quando for necessário retirá-la do peito, uso de cremes e óleos que causam reações alérgicas nos mamilos, uso de protetores de mamilo (inter- mediários) e exposição prolongada a forros úmidos. O mito de que mulheres de pele clara são mais vulneráveis a lesões mamilares que mulheres com pele escura nunca se confirmou. Trauma mamilar, traduzido por eritema, edema, fissuras, bolhas, “marcas” brancas, amarelas ou escuras, hematomas ou equimoses, é uma importante causa de desmame e, por isso, a sua prevenção é muito importante, o que pode ser conseguido com as se- guintes medidas: Amamentação com técnica adequada (posicionamento e pega adequados);• Cuidados para que os mamilos se mantenham secos, expondo-os ao ar • livre ou à luz solar e trocas freqüentes dos forros utilizados quando há va- zamento de leite; Não uso de produtos que retiram a proteção natural do mamilo, como • sabões, álcool ou qualquer produto secante; 41 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Amamentação em livre demanda – a criança que é colocada no peito assim • que dá os primeiros sinais de que quer mamar vai ao peito com menos fome, com menos chance de sugar com força excessiva; Evitar ingurgitamento mamário;• Ordenha manual da aréola antes da mamada se ela estiver ingurgitada, o • que aumenta a sua flexibilidade, permitindo uma pega adequada; Introdução do dedo indicador ou mínimo pela comissura labial (canto) da • boca do bebê, se for preciso interromper a mamada, de maneira que a sucção seja interrompida antes de a criança ser retirada do seio; Não uso de protetores (intermediários) de mamilo, pois eles, além de não • serem eficazes, podem ser a causa do trauma mamilar. Lesão mamilar por má pega 1.9.5.1 Manejo As lesões mamilares são muito dolorosas e, com freqüência, são a porta de entra- da para bactérias. Por isso, além de corrigir o problema que está causando a dor mamilar (na maioria das vezes a má pega), faz-se necessário intervir para aliviar a dor e promover a cicatrização das lesões o mais rápido possível. Em primeiro lugar, podem-se sugerir as seguintes medidas de conforto, que visam a minimizar o estímulo aos receptores da dor localizados na derme do mamilo e da aréola: Início da mamada pela mama menos afetada;• Ordenha de um pouco de leite antes da mamada, o suficiente para desenca-• dear o reflexo de ejeção de leite, evitando dessa maneira que a criança tenha que sugar muito forte no início da mamada para desencadear o reflexo; 42 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Uso de diferentes posições para amamentar, reduzindo a pressão nos pon-• tos dolorosos ou áreas machucadas; Uso de “conchas protetoras” (alternativamente pode-se utilizar um coador • de plástico pequeno, sem o cabo) entre as mamadas, eliminando o conta- to da área machucada com a roupa. Esse artifício, no entanto, favorece a drenagem espontânea de leite, o que torna o tecido aréolo-mamilar mais vulnerável a macerações. Por isso, essa recomendação deve ser avaliada em cada caso, pesando-se os riscos e os benefícios; Analgésicos sistêmicos por via oral se houver dor importante.• É importante ressaltar que limitar a duração das mamadas não tem efeito na pre- venção ou tratamento do trauma mamilar. Têm sido utilizados dois tipos de tratamento para acelerar a cicatrização das lesões mamilares: tratamento seco e tratamento úmido. O tratamento seco (banho de luz, ba- nho de sol, secador de cabelo), bastante popular nas últimas décadas, não tem sido mais recomendado porque acredita-se que a cicatrização de feridas é mais eficiente se as ca- madas internas da epiderme (expostas pela lesão) se mantiverem úmidas. Por isso, atual- mente tem-se recomendado o tratamento úmido das lesões mamilares, com o objetivo de formar uma camada protetora que evite a desidratação das camadas mais profundas da epiderme. Para isso, pode-se recomendar o uso do próprio leite materno ordenhado nas fissuras. É preciso ter cautela ao recomendar cremes, óleos e loções, pois eles podem causar alergias e, eventualmente, causar obstrução de poros lactíferos. Existem muitas práticas de uso popular que visam a aliviar o sofrimento materno causado por machucadura de mamilos, como o uso de chá e casca de banana ou ma- mão, entre outras. Essas práticas devem ser evitadas até que haja estudos indicando a sua eficácia e inocuidade. A casca de banana, por exemplo, pode causar reação alérgica e ser fonte de contaminação. (NOVAK; ALMEIDA; SILVA, 2003) 1.9.6 Candidíase (monilíase) A infecção da mama no puerpério por Candida sp (candidíase ou monilíase) é bas- tante comum. A infecção pode atingir só a pele do mamilo e da aréola ou comprometer os ductos lactíferos. São fatores predisponentes a umidade e lesão dos mamilos e uso, pela mulher, de antibióticos, contraceptivos orais e esteróides. Na maioria das vezes é a criança quem transmite o fungo, mesmo quando a doença não seja aparente. A infecção por Candida sp costuma manifestar-se por coceira, sensação de queima- dura e dor em agulhadas nos mamilos que persiste após as mamadas. A pele dos mami- los e da aréola pode apresentar-se avermelhada, brilhante ou apenas irritada ou com fina descamação; raramente se observam placas esbranquiçadas. Algumas mães queixam-se de ardência e dor em agulhada dentro das mamas. É muito comum a criança apresentar crostas brancas orais, que devem ser distinguidas das crostas de leite (essas últimas são removidas sem machucar a língua ou gengivas). 45 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A da e terceira semanas após o parto e raramente após a 12a semana. A estase do leite é o evento inicial da mastite e o aumento de pressão intraductal causado por ela leva ao achatamento das células alveolares e formação de espaços entre as células. Por esse es- paço passam alguns componentes do plasma para o leite e do leite para o tecido inters- ticial da mama, causando uma resposta inflamatória. O leite acumulado, a resposta in- flamatória e o dano tecidual resultante favorecem a instalação da infecção, comumente pelo Staphylococcus (aureus e albus) e ocasionalmente pela Escherichia coli e Streptococcus (α-,β- e não hemolítico), sendo as fissuras, na maioria das vezes, a porta de entrada da bactéria. Qualquer fator que favoreça a estagnação do leite materno predispõe ao apa- recimento de mastite, incluindo mamadas com horários regulares, redução súbita no nú- mero de mamadas, longo período de sono do bebê à noite, uso de chupetas ou mama- deiras, não esvaziamento completo das mamas, freio de língua curto, criança com sucção fraca, produção excessiva de leite, separação entre mãe e bebê e desmame abrupto. A fadiga materna é tida como um facilitador para a instalação da mastite. As mulheres que já tiveram mastite na lactação atual ou em outras lactações têm mais chance de desen- volver outras mastites por causa do rompimento da integridade da junção entre as célu- las alveolares. Nem sempre é fácil distinguir a mastite infecciosa da não-infecciosa apenas pelos sinais e sintomas. Em ambas, a parte afetada da mama encontra-se dolorosa, vermelha, edemaciada e quente. Quando há infecção, costuma haver mal-estar importante, febre alta (acima de 38 oC) e calafrios. O sabor do leite materno costuma alterar-se nas mastites, tornando-se mais salga- do devido a um aumento dos níveis de sódio e uma diminuição dos níveis de lactose. Tal alteração de sabor pode ocasionar rejeição do leite pela criança. A produção do leite pode ser afetada na mama comprometida, com diminuição do volume secretado durante o quadro clínico, bem como nos dias subseqüentes. Isso se deve à diminuição de sucção da criança na mama afetada, diminuição das concentrações de lactose ou dano do tecido alveolar. As medidas de prevenção da mastite são as mesmas do ingurgitamento mamário, do bloqueio de ductos lactíferos e das fissuras, bem como manejo precoce desses problemas. Mastite 46 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.9.9.1 Manejo O tratamento da mastite deve ser instituído o mais precocemente possível, pois sem o tratamento adequado e em tempo oportuno a mastite pode evoluir para abscesso mamário, uma complicação grave. O tratamento inclui os seguintes componentes: Esvaziamento adequado da mama: esse é o componente mais importante • do tratamento da mastite. Preferencialmente a mama deve ser esvaziada pelo próprio recém-nascido, pois, apesar da presença de bactérias no leite materno, quando há mastite, a manutenção da amamentação está indicada por não oferecer riscos ao recém-nascido a termo sadio (AMERICAN ACA- DEMY OF PEDIATRICS, 2000). A retirada manual do leite após as mama- das pode ser necessária se não houve um esvaziamento adequado; Antibioticoterapia: indicada quando houver sintomas graves desde o iní-• cio do quadro, fissura mamilar e ausência de melhora dos sintomas após 12–24 horas da remoção efetiva do leite acumulado. As opções são: Ce- falexina 500mg, por via oral, de seis em seis horas, Amoxicilina 500mg ou Amoxicilina associada ao Ácido Clavulânico (500mg/125mg), por via oral, de oito em oito horas. Em pacientes alérgicas a essas drogas, está indicada a Eritromicina 500mg, por via oral, de seis em seis horas. Em todos os casos, os antibióticos devem ser utilizados por, no mínimo, 10 dias, pois tratamen- tos mais curtos apresentam alta incidência de recorrência; Se não houver regressão dos sintomas após 48 horas do início da antiobio- ticoterapia, deve ser considerada a possibilidade de abscesso mamário e de encaminhamento para unidade de referência, para eventual avaliação diag- nóstica especializada e revisão da antibioticoterapia. Diante dessa situação, é importante que o profissional agende retorno da mãe à unidade de saúde e que a unidade ofereça acesso sob demanda espontânea, para garantir a continuidade do cuidado; Suporte emocional: esse componente do tratamento da mastite é muitas • vezes negligenciado, apesar de ser muito importante, pois essa condição é muito dolorosa, com comprometimento do estado geral; Outras medidas de suporte: repouso da mãe (de preferência no leito); • analgésicos ou antiinflamatórios não-esteróides, como ibuprofeno; líquidos abundantes; iniciar a amamentação na mama não afetada; e usar sutiã bem firme. 1.9.10 Abscesso mamário O abscesso mamário, em geral, é causado por mastite não tratada ou com trata- mento iniciado tardiamente ou ineficaz. É comum após a interrupção da amamentação na mama afetada pela mastite sem o esvaziamento adequado do leite por ordenha . O diagnóstico é feito basicamente pelo quadro clínico: dor intensa, febre, mal-es- tar, calafrios e presença de áreas de flutuação à palpação no local afetado. No diagnóstico 47 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A diferencial do abscesso, devem-se considerar a galactocele, a fibroadenoma e o carcino- ma da mama. Todo esforço deve ser feito para prevenir abscesso mamário, já que essa condição pode comprometer futuras lactações em aproximadamente 10% dos casos. Qualquer medida que previna o aparecimento de mastite conseqüentemente vai prevenir o abs- cesso mamário, assim como a instituição precoce do tratamento da mastite se ela não puder ser prevenida. Abscesso Mamário 1.9.10.1 Manejo O abscesso mamário exige intervenção rápida e compreende as seguintes medidas: Drenagem cirúrgica, de preferência sob anestesia local, com coleta de se-• creção purulenta para cultura e teste de sensibilidade a antibióticos; Demais condutas indicadas no tratamento da mastite infecciosa, sobretudo • a antibioticoterapia e o esvaziamento regular da mama afetada; Interrupção da amamentação na mama afetada até que o abscesso tenha • sido drenado e a antibioticoterapia iniciada. Essa é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS); Manutenção da amamentação na mama sadia.• 50 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Oferecer as duas mamas em cada mamada;• Dar tempo para o bebê esvaziar bem as mamas;• Trocar de mama várias vezes numa mamada se a criança estiver sonolenta • ou se não sugar vigorosamente; Evitar o uso de mamadeiras, chupetas e protetores (intermediários) de mamilos;• Consumir dieta balanceada;• Ingerir líquidos em quantidade suficiente (lembrar que líquidos em excesso • não aumentam a produção de leite, podendo até diminuí-la); Repousar. • Apesar de haver controvérsias sobre o uso de medicamentos para o estímulo da lactação, muitas vezes o profissional de saúde, em casos selecionados e quando as medidas citadas não produziram o efeito desejado, sente necessidade de indicar algu- ma droga. Nesse caso, as mais utilizadas são: Domperidona (30mg três vezes ao dia) e Metoclopramida (10mg três vezes ao dia por aproximadamente uma ou duas semanas). A Domperidona tem a vantagem de não atravessar a barreira hemato-encefálica, o que a torna mais segura do que a Metoclopramida, com menos efeitos colaterais, podendo ser utilizada por tempo indeterminado. 1.10 COMO MANEJAR O ALEITAMENTO MATERNO EM SITUAÇÕES ESPECIAIS? 1.10.1 Nova gravidez É possível manter a amamentação em uma nova gravidez se for o desejo da mulher e se a gravidez for normal. Contudo, não é raro as crianças interromperem a amamenta- ção espontaneamente quando a mãe engravida. O desmame pode ocorrer pela diminui- ção da produção de leite, alteração no gosto do leite (mais salgado, por maior conteúdo de sódio e cloreto), perda do espaço destinado ao colo com o avanço da gravidez ou au- mento da sensibilidade dos mamilos durante a gravidez. Na ameaça de parto prematuro é indicado interromper a lactação. Se a mãe optar por continuar amamentando o filho mais velho após o nascimento do bebê, é importante orientá-la que ela deve dar prioridade à criança mais nova no que diz respeito à amamentação. 51 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.10.2 Gemelaridade Com o advento da inseminação artifi- cial, o nascimento de múltiplas crianças se tor- nou mais freqüente. Se por um lado o nasci- mento de gêmeos é uma dádiva, por outro é um grande desafio, que pode ser mais bem enfrentado se a família, em especial a mãe, receber ajuda, inclusive dos profissionais de saúde. Estes devem estar preparados para aconselhar as famílias nas diversas situações envolvendo gêmeos, incluindo o aleitamen- to materno. Além de todos os benefícios já ampla- mente reconhecidos do aleitamento materno, a amamentação de crianças gemelares tem vantagens adicionais tais como: maior econo- mia, haja vista o gasto com outros leites ser o dobro (ou mais) caso as crianças não sejam amamentadas; facilitar os cuidados de gême- os, já que o aleitamento materno previne do- enças, as quais exigem cuidados intensificados; auxiliar no atendimento das necessidades dos bebês com relação à atenção e ao afeto da mãe, pois por mais boa vontade que ela tenha, ela não tem condições de atender duas ou mais crianças da mesma maneira que atenderia uma só; e contribuir para o reconhecimento das necessidades individuais de cada gêmeo, acelerando o processo de enxergar cada criança como um indivíduo. Há séculos se sabe que é possível uma mãe amamentar plenamente dois ou mais bebês, uma vez que as mamas são capazes de responder às demandas nutricionais das crianças. Se há duas ou mais crianças sugando o peito da mãe, espera-se que ela produza leite suficiente para cada uma delas. O maior obstáculo à amamentação de bebês múlti- plos, na realidade, não é a quantidade de leite que pode ser produzida, mas a indisponi- bilidade da mulher. Assim, é fundamental que as mães de parto múltiplo tenham suporte adicional. Algumas orientações, além das habituais para qualquer gestante, são úteis para mu- lheres que estão esperando gêmeos. A “preparação física” das mamas (estimulação de qualquer tipo dos mamilos), não mais recomendada em qualquer gestação, deve ser par- ticularmente desaconselhada em gestações múltiplas, pelo risco de parto prematuro. É importante discutir com a gestante a necessidade de ajuda, principalmente após o nascimento das crianças. Ter alguém para ajudar nas tarefas de casa antes e após o nas- cimento de gêmeos não é um luxo, mas uma necessidade. 52 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Mães de gêmeos sugerem que as mulheres, na gestação, estabeleçam como meta inicial para a duração da amamentação das suas crianças pelo menos seis semanas, tempo mínimo necessário para que a mulher se recupere do parto e que todas as pessoas envol- vidas aprendam e se adaptem à situação especial que é amamentar duas ou mais crianças. O período de “aprendizagem” compreensivelmente é maior na amamentação de gêmeos quando comparado ao de recém-nascidos únicos. Após o período estipulado (que pode ser maior ou menor) a situação deve ser reavaliada e nova meta estipulada. O melhor momento de iniciar o aleitamento materno de gêmeos é logo após o nascimento, sempre que possível. Se um ou mais bebês não está em condições de ser amamentado, a mulher deve iniciar a extração manual ou com bomba de sucção o mais precocemente possível. Por mais difícil que possa ser, é muito importante que as crianças sejam amamen- tadas em livre demanda. Somente haverá produção de leite suficiente para cada uma das crianças se a mãe amamentar (ou retirar leite) com freqüência e em livre demanda. No caso de extração do leite, desenvolver uma rotina que mimetize as mamadas dos bebês é útil. Para isto, é necessário fazer o esvaziamento das mamas no mínimo 8 a 9 vezes ao dia, totalizando 100 a 120 minutos. Coordenar as mamadas de duas ou mais crianças pode parecer uma tarefa quase impossível, mas após um período de aprendizagem (que pode durar meses), muitas mu- lheres se surpreendem com a sua extraordinária capacidade de adaptação. Mães de gêmeos tendem a usar uma das seguintes variações para amamentar os seus bebês: Alternância de bebês e mamas em cada mamada. Desta maneira, se o • bebê “A” começou a mamar na mama direita em uma mamada, na próxima ele deverá iniciá-la na mama esquerda, independentemente se os bebês mamarem em uma só mama ou nas duas. Uma variação deste método é oferecer o peito mais cheio ao primeiro bebê que mostrar interesse em mamar. A alternância de bebês e mamas em cada mamada é muito utilizada nas primeiras semanas após o parto, especialmente se um dos bebês tem sucção menos eficiente ou quando um ou mais bebês querem mamar nas duas mamas. Alternância de bebês e mamas a cada 24 horas. Neste caso, o bebê “A” ini-• cia todas as mamadas do dia em uma determinada mama e, no dia seguin- te, inicia as mamadas na outra mama. Muitas mães gostam deste método por acharem mais fácil lembrar quem mamou, onde e quando. Escolha de uma mama específica para cada bebê. Nesta circunstância, cada • mama se adapta às necessidades de cada bebê. Porém, pode haver dife- rença no tamanho das mamas, diminuição da produção leite se uma das crianças não sugar eficientemente e recusa dos bebês em mamar na mama 55 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A engasgos do bebê, ganho de peso insuficiente, pouco leite, ingurgitamento mamário e trauma mamilar. Tais dificuldades podem ser minimizadas com a expressão manual do leite para amaciar mamilo e aréola; oclusão da fenda com o dedo da mãe, durante a ma- mada; aplicação de compressas mornas nas mamas para facilitar a saída do leite; posicio- namento do mamilo em direção ao lado oposto à fenda; e utilização do bebê em posição semi-sentada para evitar refluxo de leite pelas narinas. Na presença de fissuras labiopalatais, a dupla mãe/bebê necessita de orientação constante e de muito apoio por parte de equipe multiprofissional especializada. Quando a má formação é identificada durante a gestação, a equipe pode iniciar precocemente a orientação aos pais. Quando a mãe recebe apoio efetivo nos primeiros dias de vida, a du- ração da amamentação da criança com fenda labial é a mesma do que a das crianças sem esse tipo de má formação. (GARCEZ; GIUGLIANI, 2005) 1.10.4 Crianças portadoras de distúrbios neurológicos Crianças que sofreram asfixia perinatal grave, portadoras de síndromes genéticas, com diversos tipos de infecções congênitas e com más formações do sistema nervoso central podem ter distúrbios neurológicos. Freqüentemente elas têm incoordenação mo- tora-oral, dificuldades na deglutição e na sucção, na coordenação de ambas com a res- piração, refluxo gastroesofágico, além de eventualmente não aceitarem a alimentação, com risco de se desnutrirem. Quando a criança não tem condições de sugar a mama ou tem sucção fraca, a mãe deve ser orientada a realizar ordenha com freqüência e oferecer o leite ordenhado, além de estimular a região perioral da criança e incentivar a sucção introduzindo o dedo míni- mo na sua cavidade oral. Se a criança estabelecer coordenação entre sucção, deglutição e respiração, a mãe pode oferecer cuidadosamente o seio, com supervisão profissional. A hipotonia característica das crianças portadoras de síndrome de Down costuma ser um dos fatores que dificultam o aleitamento materno. Assim como nos diferentes distúrbios neurológicos, o acompanhamento cuidadoso da dupla mãe/bebê por equipe multiprofissional, somado a orientações adequadas e ajuda efetiva, favorece o estabele- cimento e a manutenção do aleitamento materno. 1.10.5 Refluxo gastroesofágico Uma das manifestações gastrointestinais mais comuns na infância é o refluxo gastroe- sofágico. Muitas vezes essa condição se resolve espontaneamente com a maturação do me- canismo de funcionamento do esfíncter esofágico inferior, nos primeiros meses de vida. Nas crianças amamentadas no peito, os efeitos do refluxo gastroesofágico costu- mam ser mais brandos do que nas alimentadas com leite não humano, devido à posição supina do bebê para mamar e aos vigorosos movimentos peristálticos da língua durante a sucção. Os episódios de regurgitação são mais freqüentes em lactentes com aleitamento artificial quando comparados a bebês amamentados no peito (GIOVANNI et al., 2000). Assim, é recomendado que a criança com refluxo gastroesofágico receba aleitamento ma- terno exclusivo nos primeiros seis meses e complementado até os dois anos ou mais. 56 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.10.6 Mãe com necessidades especiais Em algumas ocasiões o profissional de saúde pode se deparar com mães com ne- cessidades especiais como, por exemplo, limitações físicas, auditivas ou visuais que di- ficultem certas técnicas de amamentação. Essas situações exigem maior habilidade em relação à comunicação em saúde e maior suporte por parte da família e dos profissio- nais em relação às eventuais dificuldades inerentes ao manejo do aleitamento. O apoio do serviço de saúde também nessas circunstâncias concorre para o aumento do vínculo entre os profissionais e a dupla mãe-bebê e a família, bem como consolidam direitos hu- manos de forma inclusiva. Expressão "Aleitamento Materno Exclusivo", Traduzida para a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). 1.11 SITUAÇÕES EM QUE HÁ RESTRIÇÕES AO ALEITAMENTO MATERNO São poucas as situações em que pode haver indicação médica para a substituição parcial ou total do leite materno. Nas seguintes situações o aleitamento materno não deve ser recomendado: Mães infectadas pelo HIV;• Mães infectadas pelo HTLV1 e HTLV2;• Uso de medicamentos incompatíveis com a amamentação. Alguns fármacos • são citados como contra-indicações absolutas ou relativas ao aleitamento, como por exemplo os antineoplásicos e radiofármacos. Como essas infor- 57 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A mações sofrem freqüentes atualizações, recomenda-se que previamente à prescrição de medicações a nutrizes se consulte o manual "Amamentação e uso de drogas", disponível em <http://bvsms2.saude.gov.br/php/level.ph p?long=pt&component=51&item=26; Criança portadora de galactosemia, doença rara em que ela não pode in-• gerir leite humano ou qualquer outro que contenha lactose. Já nas seguintes situações maternas, recomenda-se a interrupção temporária da amamentação: Infecção herpética, quando há vesículas localizadas na pele da mama. A • amamentação deve ser mantida na mama sadia; Varicela: se a mãe apresentar vesículas na pele cinco dias antes do parto ou • até dois dias após o parto, recomenda-se o isolamento da mãe até que as lesões adquiram a forma de crosta. A criança deve receber Imunoglobulina Humana Antivaricela Zoster (Ighavz), disponível nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (CRIES) (BRASIL, 2006a), que deve ser ad- ministrada em até 96 horas do nascimento, aplicada o mais precocemente possível; Doença de Chagas, na fase aguda da doença ou quando houver sangra-• mento mamilar evidente; Abscesso mamário, até que o abscesso tenha sido drenado e a antibiotico-• terapia iniciada. A amamentação deve ser mantida na mama sadia; Consumo de drogas de abuso: recomenda-se interrupção temporária do • aleitamento materno, com ordenha do leite, que deve ser desprezado. O tempo recomendado de interrupção da amamentação varia dependendo da droga, de acordo com a tabela 2. Tabela 2 – Recomendação quanto ao tempo de interrupção do aleitamento materno após consumo de drogas de abuso. Droga Período recomendado de interrupção da amamentação Anfetamina, ecstasy 24–36 horas Barbitúricos 48 horas Cocaína, crack 24 horas Etanol 1 hora por dose ou até estar sóbria Heroína, morfina 24 horas LSD 48 horas Maconha 24 horas Fenciclidina 1–2 semanas Fonte: hale e hall (2005) 60 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.13 A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA E DA COMUNIDADE NO PROCESSO DA AMAMENTAÇÃO A prática da amamentação é fortemente influenciada pelo meio onde está inserida a nutriz. Para uma amamentação bem-sucedida, a mãe necessita de constante incentivo e suporte não só dos profissionais de saúde, mas da sua família e da comunidade. Não basta que ela opte pelo aleitamento materno. Ela deve estar inserida em um ambiente que a apóie na sua opção. A opinião e o incentivo das pessoas que cercam a mãe, sobre- tudo os maridos/companheiros, as avós da criança e outras pessoas significativas para a mãe são de extrema importância. Os pais têm sido identificados como importante fonte de apoio à amamentação. No entanto, muitos deles não sabem de que maneira podem apoiar as mães, provavel- mente por falta de informação. Alguns sentimentos negativos dos pais, comuns após o nascimento de um filho, poderiam ser aliviados se eles estivessem conscientes da impor- tância do seu papel, não apenas nos cuidados com o bebê, mas também nos cuidados com a mãe. Portanto, cabe ao profissional de saúde dar atenção ao novo pai e estimulá- lo a participar desse período vital para a família. Além dos pais, os profissionais de saúde devem tentar envolver as pessoas que têm uma participação importante no dia-a-dia das mães e das crianças, como as avós das crianças, outros parentes etc. A figura da avó é bastante presente na cultura brasileira, mesmo em populações urbanas. Elas costumam exercer grande influência sobre as mães, em especial as adolescentes, o que pode favorecer ou dificultar a amamentação. Muitas avós transmitem às suas filhas ou noras as suas experiências com amamentação, que em 61 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A muitos casos são contrárias às recomendações atuais das práticas alimentares de crian- ças, como por exemplo o uso de água, chás e outros leites nos primeiros seis meses. Por isso, é importante incluir as avós no aconselhamento em amamentação, para que práticas nocivas à criança não continuem sendo transmitidas às novas gerações de mães. Com in- formação adequada e diálogo que permitam às avós expor as suas experiências, crenças e sentimentos com relação à amamentação, elas podem exercer influência positiva para uma amamentação bem-sucedida de suas filhas ou noras. Os outros filhos também podem ser envolvidos nos momentos da amamentação aprendendo, desde cedo, que o aleitamento materno é a forma mais natu- ral e ideal de alimentar a criança pequena. No período de amamentação é difícil para a mu- lher cuidar do bebê, da casa, do marido e de outros fi- lhos. A família deve se reunir e procurar ajudar a mãe nas tarefas de casa para que ela possa se dedicar ao re- cém-nascido. Também é papel da família não levar para casa produtos que prejudicam a amamentação, como latas de leite, mamadeiras e chupetas. Muitas mães que estão amamentando estão na escola. Os profissionais de saúde podem contribuir para que as escolas apóiem as mães a manterem a lactação. 62 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 1.13.1 Quais os instrumentos de proteção do aleitamento materno no Brasil? A legislação do Brasil de proteção ao aleitamento materno é uma das mais avança- das do mundo. É muito importante que o profissional de saúde conheça as leis e outros instrumentos de proteção do aleitamento materno para que possa informar às mulheres que estão amamentando e suas famílias os seus direitos. Além de conhecer e divulgar os instrumentos de proteção da amamentação, é importante que o profissional de saúde respeite a legislação e monitore o seu cumprimento, denunciando as irregularidades. A seguir são apresentados alguns direitos da mulher que direta ou indiretamente protegem o aleitamento materno: Licença-maternidade – à empregada gestante é assegurada licença de 120 • dias consecutivos, sem prejuízo do emprego e da remuneração, podendo ter início no primeiro dia do nono mês de gestação, salvo antecipação por prescrição médica (Constituição Federal de 1988, artigo 7º, inciso XVIII). A Lei Federal nº. 11.770, de 09 de setembro de 2008, cria o Programa Empresa Cidadã, que visa a prorrogar para 180 dias a licença maternidade prevista na Constituição, mediante incentivo fiscal às empresas. A empre- gada deve requerer a licença até o final do primeiro mês após o parto e o benefício também se aplica à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança. As empresas tributadas com base no lucro real que aderirem ao Programa terão dedução do imposto devido ao conceder os 60 dias de prorrogação da licença às suas servidoras. É importante lembrar que muitos estados e municípios já concedem licença- maternidade de 6 meses, com o objetivo de fortalecer suas políticas de promoção e proteção do aleitamento materno; Direito à garantia no emprego – é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa • causa da mulher trabalhadora durante o período de gestação e lactação, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (Ato das disposições constitucionais transitórias – artigo 10, inciso II, letra b); Direito à creche – todo estabelecimento que empregue mais de 30 mu-• lheres com mais de 16 anos de idade deverá ter local apropriado onde seja permitido às empregadas guardar sob vigilância e assistência os seus filhos no período de amamentação. Essa exigência poderá ser suprida por meio de creches distritais, mantidas diretamente ou mediante convênios com outras entidades públicas ou privadas, como SESI, SESC, LBA, ou entidades sindicais (Consolidação das Leis do Trabalho, artigo 389, parágrafos 1º e 2º); Pausas para amamentar – para amamentar o próprio filho, até que ele • complete seis meses de idade, a mulher terá direito, durante a jornada de trabalho, a dois descansos, de meia hora cada um. Quando a saúde do filho exigir, o período de seis meses poderá ser dilatado a critério da 65 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A rejeição do seio pela criança, trabalho da mãe fora do lar, “leite fraco”, hospitalização da criança e problemas nas mamas. Muitos desses problemas podem ser evitados ou ma- nejados. Quando o profissional de saúde se depara com a situação de a mulher querer ou ter que desmamar antes de a criança estar pronta, é importante, em primeiro lugar, que ele respeite o desejo da mãe e a apóie nesse processo. Entre os fatores que facilitam o processo do desmame, encontram-se os seguintes: Mãe estar segura de que quer (ou deve) desmamar;• Entendimento da mãe de que o processo pode ser lento e demandar ener-• gia, tanto maior quanto menos pronta estiver a criança; Flexibilidade, pois o curso do processo é imprevisível;• Paciência (dar tempo à criança) e compreensão;• Suporte e atenção adicionais à criança – mãe deve evitar se afastar nesse • período; Ausência de outras mudanças, ocorrendo por exemplo controle dos • esficteres, separações, mudanças de residência, entre outras; Sempre que possível, fazer o desmame gradual, retirando uma mamada do • dia a cada 1–2 semanas. A técnica utilizada para fazer a criança desmamar varia de acordo com a idade. Se a criança for maior, o desmame pode ser planejado com ela. Pode-se propor uma data, oferecer uma recompensa e até mesmo uma festa. A mãe pode começar não oferecen- do o seio, mas também não recusando. Pode também encurtar as mamadas e adiá-las. Mamadas podem ser suprimidas distraindo a criança com brincadeiras, chamando ami- guinhos, entretendo a criança com algo que lhe prenda a atenção. A participação do pai no processo, sempre que possível, é importante. A mãe pode também evitar certas ati- tudes que estimulam a criança a mamar, como não sentar na poltrona em que costuma amamentar. Algumas vezes, o desmame forçado gera tanta ansiedade na mãe e no bebê que é preferível adiar um pouco mais o processo, se possível. A mãe pode, também, optar por restringir as mamadas a certos horários e locais. As mulheres devem estar preparadas para as mudanças físicas e emocionais que o desmame pode desencadear, tais como: mudança de tamanho das mamas, mudança de peso e sentimentos diversos como alívio, paz, tristeza, depressão, culpa e luto pela per- da da amamentação ou por mudanças hormonais. Concluindo, cabe a cada dupla mãe/bebê e sua família a decisão de manter a ama- mentação, até que a criança a abandone espontaneamente, ou interrompê-la em um determinado momento. Muitos são os fatores envolvidos nessa decisão: circunstanciais, sociais, econômicos e culturais. Cabe ao profissional de saúde ouvir a mãe e ajudá-la a tomar uma decisão, pesando os prós e os contras. A decisão da mãe deve ser respeita- da e apoiada. 66 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 2 ALIMENTAÇÃO COMPLEMENTAR PARA CRIANÇAS MENORES DE DOIS ANOS 2.1 IMPORTÂNCIA A introdução de alimentos na dieta da criança após os seis meses de idade deve complementar as numerosas qualidades e funções do leite materno, que deve ser man- tido preferencialmente até os dois anos de vida ou mais. Além de suprir as necessidades nutricionais, a partir dos seis meses a introdução da alimentação complementar aproxima progressivamente a criança aos hábitos alimentares de quem cuida dela e exige todo um esforço adaptativo a uma nova fase do ciclo de vida, na qual lhe são apresentados novos sabores, cores, aromas, texturas e saberes. O grande desafio do profissional de saúde é conduzir adequadamente esse proces- so, auxiliando a mãe e os cuidadores da criança de forma adequada, e estar atento às ne- cessidades da criança, da mãe e da família, acolhendo dúvidas, preocupações, dificuldades, conhecimentos prévios e também os êxitos, que são tão importantes quanto o conheci- mento técnico para garantir o sucesso de uma alimentação complementar saudável. Para tal, a empatia e a disponibilidade do profissional são decisivas, já que muitas inseguranças no cuidado com a criança não têm “hora agendada” para ocorrer e isso exige sensibilida- de e vigilância adicional não só do profissional procurado, mas de todos os profissionais da equipe, para garantir o vínculo e a continuidade do cuidado. Considera-se atualmente que o período ideal para a introdução de alimentos com- plementares é após o sexto mês de vida, já que antes desse período o leite materno é capaz de suprir todas as necessidades nutricionais da criança. Além disso, no sexto mês de vida a criança já tem desenvolvidos os reflexos necessários para a deglutição, como o reflexo lingual, já manifesta excitação à visão do alimento, já sustenta a cabeça, facilitando a alimentação oferecida por colher, e tem-se o início da erupção dos primeiros dentes, o que facilita na mastigação. A partir do sexto mês a criança desenvolve ainda mais o pala- dar e, conseqüentemente, começa a estabelecer preferências alimentares, processo que a acompanha até a vida adulta. O sucesso da alimentação complementar depende de muita paciência, afeto e su- porte por parte da mãe e de todos os cuidadores da criança. Toda a família deve ser esti- mulada a contribuir positivamente nessa fase. Se durante o aleitamento materno exclusivo a criança é mais intensamente ligada à mãe, a alimentação complementar permite maior interação do pai, dos avôs e avós, dos outros irmãos e familiares, situação em que não só a criança aprende a comer, mas também toda a família aprende a cuidar. Tal interação deve ser ainda mais valorizada em situações em que a mãe, por qualquer motivo, não é a principal provedora da alimentação à criança. Assim, o profissional de saúde também 67 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A deve ser hábil em reconhecer novas formas de organização familiar e ouvir, demonstrar interesse e orientar todos os cuidadores da criança, para que ela se sinta amada e enco- rajada a entender sua alimentação como ato prazeroso, o que evita, precocemente, o aparecimento de possíveis transtornos psíquicos e distúrbios nutricionais. A alimentação complementar deve prover suficientes quantidades de água, energia, proteínas, gorduras, vitaminas e minerais, por meio de alimentos seguros, culturalmente aceitos, economicamente acessíveis e que sejam agradáveis à criança. O profissional de saúde torna-se promotor da alimentação saudável quando con- segue traduzir os conceitos, de forma prática, à comunidade que assiste, em linguagem simples e acessível. Assim, na orientação de uma dieta para a criança, por exemplo, deve- se levar em conta conceitos adequados de preparo, noções de consistência e quantidades ideais das refeições e opções de diversificação alimentar que contemplem as necessidades nutricionais para cada fase do desenvolvimento. As práticas alimentares no primeiro ano de vida constituem marco importante na formação dos hábitos alimentares da criança. Esse período pode ser dividido em duas fa- ses: antes dos seis meses e após os seis meses. No primeiro semestre de vida objetiva- se que a criança mame por seis meses exclusivamente ou que, pelo menos, retarde pelo maior tempo possível a introdução de outros alimentos. A partir de seis meses a criança deve receber outros alimentos, além do leite materno. Assim é de fundamental importân- cia que as mães e a família, nesse período, recebam orientações para a adequada introdu- ção dos alimentos complementares, objetivo principal a ser trabalhado neste Caderno. 2.2 PROBLEMAS NUTRICIONAIS MAIS PREVALENTES NA INFÂNCIA A Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou a estratégia global para alimenta- ção de lactentes e crianças pequenas, que visa a revitalizar os esforços no sentido de pro- mover, proteger e apoiar adequadamente a alimentação das crianças. Em todo o mundo cerca de 30% das crianças menores de cinco anos apresentam baixo peso, como conse- qüência da má alimentação e repetidas infecções. Mesmo em países em desenvolvimen- to, com escassez de recursos, a ênfase em ações de orientação alimentar pode conduzir a melhores práticas alimentares, levando ao melhor estado nutricional. Nas últimas dé- cadas, avançou-se muito nas evidências das necessidades biológicas das crianças, o que possibilita recomendar práticas alimentares que propiciam o crescimento adequado das crianças (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2003). A partir dos seis meses de idade, a alimentação complementar, conforme o nome sugere, tem a função de complementar a energia e micronutrientes necessários para o crescimento saudável e pleno desenvolvimento das crianças. As situações mais comuns relacionadas à alimentação complementar oferecida de forma inadequada são: anemia, excesso de peso e desnutrição. 70 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A O olfato deve ser estimulado como adjuvante no reconhecimento dos alimentos. Assim como o cheiro da mãe e do leite materno durante o período de amamentação ajudam a criança a identificar a mãe, a criança aos poucos vai aprendendo a reconhecer suas preferências alimentares e a estimular seu apetite também de acordo com o aroma dos alimentos. Existem predisposições genéticas para gostar ou não gostar de determinados gostos, e diferenças nas sensibilidades para alguns gostos e sabores herdados dos pais. Essa influência genética vai sendo moldada por experiências adquiridas ao longo da vida. Sensibilidades específicas a algum gosto ou sabor podem influenciar preferências e es- colhas alimentares, mas parece não prevalecerem isoladamente (BARTOSHUK, 2000; DREWNOWSKI; HENDERSON; HANN, 2000). Sabores vivenciados nos primei- ros meses de vida podem influenciar as preferências alimentares subseqüentes. Uma vez que o alimento se torna familiar nessa fase, parece que a preferência se perpetua (LEATHWOOD; MAIER, 2005). O comportamento dos pais em relação à alimentação infantil pode gerar repercus- sões duradouras no comportamento alimentar de seus filhos até a vida adulta. As crianças tendem a não gostar de alimentos quando, para ingeri-los, são submetidos à chantagem ou coação ou premiação (BIRCH; MARLIN; ROTTER, 1984). Outro dado importante é que a restrição dos alimentos preferidos das crianças vai fazer com que elas os consumam exageradamente em situações de “liberdade” e que as mães que amamentaram seus fi- lhos por mais tempo apresentaram menor comportamento restritivo (TAVERAS et al., 2004; FISHER; BIRCH, 1999a, 1999b). Também foi demonstrado que as crianças têm autocontrole no consumo energético e que os pais devem ser orientados quanto a essa capacidade e que muitas vezes os próprios pais ou familiares a prejudicam, com práticas coercivas ou de restrição (FOZ et al., 2006; BIRCH, 1998). Os pais são responsáveis pelo que é oferecido à criança, e a criança é responsável por quanto e quando comer. Essa po- sição é pertinente, desde que os alimentos não ofereçam riscos nutricionais ou de saúde às crianças. Os pais podem ainda contribuir positivamente para a aceitação alimentar por meio da estimulação dos sentidos. Isso pode ser feito por meio de palavras elogiosas e incentivadoras, com o toque carinhoso e permitindo ambiente acolhedor, com pouco ruído, boa luminosidade e conforto à criança. O contato visual entre a criança e quem oferece o alimento é outro estímulo importante, pois, se a visão da mãe durante a ama- mentação transmite segurança à criança, o semblante alegre de quem oferece o alimento também pode influenciar na aceitação do alimento. 71 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Em geral as crianças tendem a rejeitar alimentos que não lhe são familiares (BIRCH, 1997) e esse tipo de comportamento manifesta-se precocemente. Porém, com exposi- ções freqüentes, os alimentos novos passam a ser aceitos, podendo ser incorporados à dieta da criança (ROZIN, 1977; BIRCH; MARLIN, 1982; BIRCH, 1997). Em média são necessárias de oito a dez exposições a um novo alimento para que ele seja aceito pela criança. Muitos pais, talvez por falta de informação, não entendem esse comportamen- to como sendo normal e interpretam a rejeição inicial pelo alimento como uma aversão permanente, desistindo de oferecê-lo à criança. Apesar de a aversão ao alimento poder ser um motivo de frustração entre os pais, ela não se constitui em rejeição permanente. 72 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 2.4 ALIMENTAÇÃO COMPLEMENTAR SAUDÁVEL 2.4.1 Os atributos da alimentação saudável A alimentação saudável deve contemplar os seguintes pontos básicos, são eles: Acessibilidade física e financeira: • ao contrário do que tem sido cons- truída socialmente, por meio de informação equivocada, veiculada princi- palmente pela mídia, a alimentação saudável não é cara, pois se baseia em alimentos in natura e produzidos regionalmente. A alimentação das crianças deve ser composta por alimentos básicos e devem ser evitados alimentos processados nos primeiros anos de vida. O apoio e o fomento aos agricul- tores familiares e às cooperativas para a produção e a comercialização de produtos saudáveis, como grãos, leguminosas, frutas, legumes e verduras, são importantes alternativas não somente para a melhoria da qualidade da alimentação, mas também para estimular a geração de renda em pequenas comunidades, além de sinalizar para a integração com as políticas públicas de produção de alimentos. Sabor: • o argumento da ausência de sabor da alimentação saudável é outro tabu a ser desmistificado, pois é e precisa ser necessariamente saborosa. As crianças, ao receberem a alimentação complementar, tendem a se acostu- mar com os alimentos na forma como são inicialmente oferecidos. A família deve resgatar o sabor como um atributo fundamental para a promoção da alimentação saudável. As práticas de marketing muitas vezes vinculam a ali- mentação saudável ao consumo de alimentos industrializados especiais para crianças e não privilegiam os alimentos naturais e menos refinados, como, 75 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Assim, a promoção da alimentação saudável, de modo geral, deve prever escopo amplo de ações que contemplem a formação de hábitos alimentares saudáveis desde a infância, com a introdução da alimentação complementar em tempo oportuno e de qua- lidade, respeitando as identidades cultural e alimentar das diversas regiões. Os profissio- nais da Atenção Básica, em especial os das equipes de Saúde da Família, com o apoio da comunidade, dos Conselhos de Saúde e em articulação com outros setores da socie- dade, podem ser indutores e estimuladores de políticas públicas que garantam o aces- so à alimentação saudável, considerando as especificidades culturais, regionais e locais (BRASIL, 2006c). 2.4.2 Como orientar para que a criança receba alimentação complementar saudável 2.4.2.1 Idade de introdução e freqüência A definição do período adequado para iniciar a introdução dos alimentos deve levar em consideração a maturidade fisiológica e neuromuscular da criança e as necessidades nutricionais. Até os quatro meses de idade, a criança ainda não atingiu o desenvolvimento fisiológico necessário para que possa receber alimentos sólidos. Apesar de o reflexo de protrusão (que faz com que o bebê jogue para fora tudo que é colocado em sua boca) estar desaparecendo, a criança ainda não senta sem apoio e não obtém o controle neu- romuscular da cabeça e do pescoço para mostrar desinteresse ou saciedade, afastando a cabeça ou jogando-a para trás. Portanto, em função dessas limitações funcionais, nessa fase ela está preparada para receber basicamente refeição líquida (leite materno somente) (STEVENSON; ALLAIRE, 1991). Por volta do quarto ao sexto mês de vida, a aceitação e tolerância da alimentação pastosa melhoram sensivelmente não só em função do desa- parecimento do reflexo de protrusão da língua, como também pela maturação da função gastrointestinal e renal e também do desenvolvimento neuromuscular (BARNESS, 1990). Com a aproximação do sexto mês de vida, o grau de tolerância gastrointestinal e a capaci- dade de absorção de nutrientes atingem um nível satisfatório e, por sua vez, a criança vai se adaptando física e fisiologicamente para uma alimentação mais variada quanto a con- sistência e textura (PIPES et al., 1993; HENDRICKS; BADRUDDIN, 1992). As crianças menores de seis meses que recebem com exclusividade o leite ma- terno já muito cedo começam a desenvol- ver a capacidade de autocontrole da inges- tão, aprendendo a distinguir as sensações de fome, durante o jejum, e de saciedade, após a alimentação. Essa capacidade per- mite à criança, nos primeiros anos de vida, assumir autocontrole sobre o volume de alimento que consome em cada refeição e 76 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A os intervalos entre as refeições, segundo suas necessidades. Posteriormente esse auto- controle sofrerá influência de outros fatores, como o cultural e social (BIRCH; FISHER, 1995). Deve-se sempre pesquisar a história familiar de reações alérgicas antes da intro- dução de novos alimentos. Após os seis meses, a criança amamentada deve receber três refeições ao dia (duas papas de fruta e uma papa salgada1/comida de panela). Após completar sete meses de vida, respeitando-se a evolução da criança, a segunda papa salgada/comida de panela pode ser introduzida (arroz, feijão, carne, legumes e verduras). Receitas de papas podem ser encontradas no anexo A. Entre os seis aos 12 meses de vida, a criança necessita se adaptar aos novos ali- mentos, cujos sabores, texturas e consistências são muito diferentes do leite materno. Durante essa fase, não é preciso se preocupar com a quantidade de comida ingerida; o mais importante é proporcionar introdução lenta e gradual dos novos alimentos para que a criança se acostume aos poucos. Além disso, como conseqüência do seu desen- volvimento e controle sobre os movimentos e da fase exploratória em que se encontra, a criança não se satisfaz mais em apenas olhar e em receber passivamente a alimenta- ção. É comum querer colocar as mãos na comida. É importante que se dê liberdade para que ela explore o ambiente e tudo que a cerca, inclusive os alimentos, permitindo que tome iniciativas. 1 Embora a expressão "papa salgada" seja utilizada diversas vezes ao longo do texto, por ser conhecida e de fácil tradução para os pais na orientação da composição da dieta da criança e para diferenciá-la da papa de frutas, é importante salientar que o objetivo do uso do termo "salgada" não é adjetivar a expressão, induzindo ao entendimento de que a papa tenha muito sal. Expressões como "papa de vegetais com carne" ou outra que dê idéia de consistência (de papa) e variedade também podem ser empregadas como outras estratégias para uma boa comunicação em saúde. 77 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A No quadro a seguir, apresenta-se uma proposta de esquema alimentar para crianças menores de dois anos de idade, elaborado a partir das recomendações atu- ais. Esse esquema não é rígido, apenas ser- ve de guia para a orientação das mães quan- to à época e freqüência de introdução da alimentação complementar. Embora a ama- mentação deva continuar em livre demanda após o sexto mês de vida, é possível esta- belecer um esquema para a administração da alimentação complementar, de forma a aproximar gradativamente os horários da criança aos da família. Na impossibilidade do aleitamento materno, oriente em tempo oportuno e de forma adequa- da a alimentação da criança, de acor- do com o preconizado na página 91. Quadro 1 – Esquema alimentar para crianças menores de dois anos que estão em aleitamento materno Após completar 6 meses Após completar 7 meses Após completar 12 meses • Aleitamento materno sob livre demanda • 1 papa de frutas no meio da manhã • 1 papa salgada no final da manhã • 1 papa de frutas no meio da tarde • Aleitamento materno sob livre demanda • 1 papa de frutas no meio da manhã • 1 papa salgada no final da manhã • 1 papa de frutas no meio da tarde • 1 papa salgada no final da tarde • Aleitamento materno sob livre demanda • 1 refeição pela manhã (pão, fruta com aveia) • 1 fruta • 1 refeição básica da família no final da manhã • 1 fruta • 1 refeição básica da família no final da tarde O leite materno deve ser oferecido em livre demanda, porém o intervalo entre a mamada que antecede as principais refeições deve ser espaçado, respeitando assim os sinais de fome e saciedade da criança. 80 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Tabela 3 – Esquema para introdução dos alimentos complementares Faixa etária Tipo de alimento Até completar 6 meses Aleitamento materno exclusivo Ao completar 6 meses Leite materno, papa de fruta, papa salgada, ovo, carne Ao completar 7 meses Segunda papa salgada Ao completar 8 meses Gradativamente passar para alimentação da família Ao completar 12 meses Comida da família Fonte: Adaptação da Sociedade Brasileira de Pediatria (2006) 2.4.2.3 Alimentação variada: garantir os grupos de alimentos A garantia do suprimento adequado de nutrientes para o crescimento e desenvol- vimento da criança após o sexto mês depende da disponibilidade de nutrientes no leite materno e na alimentação complementar. Ao orientar o planejamento da alimentação da criança, deve-se procurar respeitar os hábitos alimentares e as características socioeco- nômicas e culturais da família, bem como priorizar a oferta de alimentos regionais, levan- do em consideração a disponibilidade local de alimentos. A espécie humana necessita de dieta variada para garantir a nutrição adequada, pois os nutrientes estão distribuídos em quantidades diferentes nos alimentos. Estes são clas- sificados em grupos, de acordo com o nutriente que se apresenta em maior quantida- de. Os que pertencem ao mesmo grupo podem ser fontes de diferentes nutrientes. Por 81 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A exemplo, grupo das frutas: o mamão é fonte de vitamina A e o caju é fonte de vitamina C. Então, além de consumir alimentos de todos os grupos, é importante a variedade de cada grupo (BRASIL, 2002a, 2002b). Quadro 2 – Descrição dos grupos de alimentos G ru po Importância Recomen- dação diária 6–12 meses Recomen- dação diária 12–24 meses Uma porção equivale a C er ea is, p ãe s e tu bé rc ul os : Alimentos ricos em carboidratos devem aparecer em quantidades maiores nas refeições, principalmente nas papas, pois aumentam a densidade energética, além de fornecer proteínas. Três porções Cinco porções Arroz (60g) – 2 colheres das de sopa Mandioca (70g) – 1 colher das de servir Batata (100g) – 1 unida- de média Macarrão (50g) – 2 colheres das de sopa Amido de milho/farinhas (20g) – 1 colher das de sopa de amido de milho Pão francês (25g) – ½ unidade Pão de forma (25g) – 1 fatia Ve rd ur as e le gu m es : Alimentos ricos em vitaminas, mine- rais e fibras. Devem ser variados, pois existem diferentes fontes de vitaminas nesse mesmo grupo. Os alimentos de coloração alaranjada são fonte de betacaroteno (pró-vitami- na A). As folhas verde-escuras pos- suem, além de betacaroteno, ferro não heme, que é mais absorvido quando oferecido junto com alimentos com fonte de vitamina C. Três porções Três porções Legumes (20g) – 1 colher das de sopa do alimento picado Verduras (30g) – 2 folhas médias ou 4 pequenas Exemplos: Cenoura – 4 fatias Couve picada – 1 colher das de sopa Abobrinha picada – 1 ½ colher das de sopa Brócolis picado – 1 ½ colher das de sopa Chuchu picado – 1 ½ colher das de sopa Continua 82 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A G ru po Importância Recomen- dação diária 6–12 meses Recomen- dação diária 12–24 meses Uma porção equivale a Fr ut as : Alimentos ricos em vitaminas, minerais e fibras. São também importante fonte de energia. Após o sexto mês, a crian- ça deve receber duas frutas por dia e nenhuma fruta é contra-indicada. Três porções Quatro porções 60 a 80g (½ unidade média) Exemplos: Banana nanica – ½ unidade Maçã – ½ unidade Laranja – 1 unidade Mamão papaia – 1/3 unidade Abacaxi – ½ fatia Le ite s e pr od ut os lá ct eo s: Para crianças menores de dois anos, o leite materno pode ser o único alimen- to desse grupo. Para crianças maiores de quatro meses totalmente desmama- das, não se recomenda a oferta de leite de vaca (ou outro) na forma pura, e sim adicionado a cereais, tubérculos e frutas. Esse grupo é básico para crian- ças menores de um ano e complemen- tar para crianças maiores de um ano. Fornece cálcio e proteína. O cálcio é fundamental para o desenvolvimento ósseo da criança. Três porções Três porções Leite materno: LIVRE DEMANDA Leite artificial – 150ml (1 copo americano) Iogurte (150g) – 1 pote Queijo (30g) – 1 fatia fina C ar ne s, m iú do s e ov os : Esse grupo é fonte de proteína de ori- gem animal (carne e ovos). As carnes possuem ferro de alta biodisponibili- dade e, portanto, previnem a anemia. A oferta desses alimentos deve fazer parte da papa oferecida para a criança. As carnes são oferecidas trituradas, desfiadas ou cortadas em pedaços pequenos. Os miúdos contêm grande quantidade de ferro e devem ser reco- mendados para consumo no mínimo uma vez por semana. Não existem restrições para carnes e ovos a partir dos seis meses de idade. Duas porções Duas porções Carnes (frango, gado, peixe, porco etc.) e mi- údos (50g) – 2 colheres das de sopa Ovo (50g) – 1 unidade Continua Continuação 85 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 2.5 ALIMENTOS PROCESSADOS A criança aprende a gostar de alimentos que lhe são oferecidos com freqüência e passam a gostar da maneira com que eles foram introduzidos inicialmente. É desejável que ela ingira alimentos com baixos teores de açúcar e sal, de modo que esse hábito se mantenha na sua fase adulta. As versões doces ou mais condimentadas dos alimentos fa- zem com que as crianças não se interessem por consumir frutas, verduras e legumes na sua forma natural. É comum mães e cuidadores oferecerem a elas alimentos de sua pre- ferência e que são desaconselhados para crianças menores de dois anos. Foi constatado que o estabelecimento dos hábitos alimentares acontece durante os primeiros anos de vida, por volta de dois a três anos. (SKINNER et al., 2002) Açúcar, café, enlatados, frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos, biscoitos recheados e outros alimentos com grandes quantidades de açúcar, gordura e corantes devem ser evita- dos especialmente nos primeiros anos de vida (BRASIL, 2002a, 2002b). Já foi demonstrado que o consumo desses tipos de alimentos está associado ao excesso de peso e à obesidade ainda na infância, condições que podem perdurar até a idade adulta, além de provocarem dislipidemias e alteração da pressão arterial (OVERBY et al., 2003; KRANZ et al., 2005; DUBOIS et al., 2007). São também causa de anemia e alergias. As crianças já nascem com preferência ao sabor doce; portanto, oferecer alimentos adicionados de açúcar ou alimen- tos com grandes quantidades de energia faz com que a criança se desinteresse pelos cereais, verduras e legumes, alimentos que têm outros sabores e são fontes de nutrientes impor- tantes (OVERBY et al., 2003; KRANZ et al., 2005; DUBOIS et al., 2007) 86 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Os sucos artificiais não devem ser oferecidos ao lactente, pelo fato de não ofere- cerem nada além de açúcar, essências e corantes artificiais, que são extremamente pre- judiciais à saúde e podem causar alergias. A oferta de bebidas e líquidos açucarados deve ser desencorajada, já que foi demonstrada também a associação entre o consumo des- ses alimentos e o excesso de peso (MALIK; SCHULZE; HU, 2006; SANIGORSKI; BELL; SWINBURN, 2007) e com o surgimento precoce de cáries. As crianças devem receber suco de fruta natural após as principais refeições e, durante o dia, apenas água. O consumo de mel deve ser evitado no primeiro ano de vida. Apesar de suas ex- celentes propriedades medicinais e de seu valor calórico, tem sido implicado em fonte alimentar que pode conter esporos de Clostridium botulinum. Esses esporos são extre- mamente resistentes ao calor, portanto não são destruídos pelos métodos usuais de pro- cessamento do mel. O consumo do mel contaminado pode levar ao botulismo, devido às condições apropriadas no intestino da criança para germinação e produção da toxi- na. (ARNON; DAMOS; WOOD, 1979; MIDURA et al., 1979; HURTANEN; KNOX; SHIMANUKI, 1981; DECENTORBI et al., 1997). Os alimentos em conserva, tais como palmito e picles, e os alimentos embutidos, tais como salsichas, salames, presuntos e pa- tês, também constituem fontes potenciais de contaminação por esporos de C. botulinum e devem ser evitados, já que oferecem maior risco de transmissão de botulismo de ori- gem alimentar. (CERESER, 2008). O sal é tradicionalmente o tempero mais lembrado e utilizado no preparo das refei- ções para crianças e adultos. Seu valor histórico e cultural é inquestionável. Entretanto, é importante lembrar que a criança nos primeiros três meses demonstra maior predileção por alimentos doces, em virtude da familiaridade com o leite materno, ligeiramente ado- cicado nesse período, ao passo que, a partir do quarto mês, começa a desenvolver inte- resse por alimentos salgados, em virtude da modificação da composição do leite humano gradativamente mais salgado em função de quantidades maiores de cloretos (MENELLA, 1996). Assim, como o gosto por alimentos salgados é um aprendizado que se adquire, é recomendável sugerir a quem os prepara que administre quantidade mínima de sal, ob- servando a aceitação da criança. A quantidade inicialmente oferecida tende a ser memo- rizada e induz a criança a aceitar no mínimo as mesmas quantidades em suas próximas refeições. Além disso, o consumo precoce de sal está associado ao aparecimento de hi- pertensão arterial, inclusive na infância, e conseqüente aumento no risco cardiovascular, quando adulta. Há diversas opções de ervas e vegetais que podem ser utilizados para temperar as refeições, o que estimula a redução do uso do sal e evita a “necessidade” de adição de condimentos prontos, freqüentemente industrializados, e que apresentam em suas composições elevado teor salino e de gorduras, conservantes, corantes, adoçantes e outros aditivos que deveriam ser evitados. Alguns exemplos de temperos naturais que podem ser utilizados: alho, cebola, to- mate, pimentão, limão, laranja, salsa, cebolinha, hortelã, alecrim, orégano, manjericão, coentro, noz-moscada, canela, cominho, manjerona, gergelim, páprica, endro, louro, entre outros. 87 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A 2.6 AÇÕES DO SERVIÇO DE SAÚDE QUE PODEM FORTALECER A ALIMENTAÇÃO COMPLEMENTAR 2.6.1 Programa Nacional de Suplementação de Ferro (PNSF) Além da fortificação das farinhas de trigo e de milho e das ações educativas, o Ministério da Saúde desenvolve o Programa Nacional de Suplementação de Ferro, que se destina à suplementação preventiva de todas as crianças de 6 a 18 meses com sulfato ferro- so. Mais informações podem ser obtidas na publicação Manual Operacional do Programa Nacional de Suplementação de Ferro e no Caderno de Atenção Básica intitulado Carências de Micronutrientes, disponíveis no sítio <http://www.saude.gov.br/nutricao>. Como o PNSF prevê, a introdução da alimentação complementar deve ser orien- tada de forma adequada, uma vez que ela tem papel importante no suprimento de fer- ro durante a infância. É indiscutível que o leite materno nos primeiros seis meses de vida da criança previne anemia, apesar da sua baixa quantidade de ferro, pois a biodisponibi- lidade permite a absorção de 50% do ferro presente, enquanto a absorção do ferro do leite de vaca, que possui quantidades semelhantes, é de 10%. O ferro apresenta-se nos alimentos sob duas formas: heme e não heme. O ferro heme, presente na hemoglobina e mioglobina das carnes e vísceras, tem maior biodisponibilidade, não estando exposto a fatores inibidores. As carnes apresentam cerca de 2,8mg de ferro por 100g do alimen- to, sendo absorvidos em torno de 20% a 30% desse nutriente (MONSEN et al., 1978; HURREL, 1997). O ferro não heme, contido no ovo, cereais, leguminosas (ex. feijão) e hortaliças (ex. beterraba), ao contrário do ferro animal, é absorvido de 2% a 10% pelo organismo. Ele pode ter suas taxas de absorção aumentadas pela presença de agen- tes facilitadores da sua absorção, ou agentes que diminuem sua absorção (MONSEN et al., 1978; HALLBERG; BRUNE; ROSSANDER, 1988; ROSSANDER-HULTHEN; GLEERUP; HALLBERG, 1990). Três potentes facilitadores da absorção do ferro não heme são as carnes (ENGELMANN et al., 1998a; ENGELMANN et al., 1998b), o áci- do ascórbico – vitamina C – (COOK; REDDY, 2001) e a vitamina A (GARCIA-CASAL et al., 1998), contribuindo para diminuir a prevalência de anemia (VITOLO; BORTOLINI, 2007). Fitatos, taninos, cálcio e fosfatos, por outro lado, possuem efeito inibidor, dimi- nuindo a sua absorção. A necessidade diária de ferro em crianças de seis a 12 meses é de 11mg/dia e, para crianças de um a três anos, é de 7mg/dia (INSTITUTE OF MEDICINE, 2001). Atenção especial deve ser dada às crianças com idade entre 6 a 12 meses, pois a recomendação de ferro é elevada e difícil de ser consumida apenas pela alimentação normal. Assim, a criança fica vulnerável ao desenvolvimento de anemia por deficiência de ferro, que prejudica o seu crescimento e desenvolvimento. Por isso os esforços devem ser centrados na recomendação de alimentos que são fonte de ferro, com consumo diá- rio de carne, miúdos (no mínimo uma vez por semana) e suco de fruta natural, fonte de vitamina C, após o almoço e jantar, para aumentar a absorção do ferro não heme. Deve ser reforçada a recomendação da ingestão máxima de 500ml de leite por dia. Crianças de 6 a 18 meses devem receber o suplemento de ferro disponível nas unidades básicas de saúde de forma preventiva. A seguir estão listados alimentos comumente consumidos pelas crianças e fonte de ferro. 90 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Nordeste e no Estado de Minas Gerais (Vale do Jequitinhonha e Vale Mucuri). Essa distri- buição é feita associada às campanhas de vacinação, na rotina das unidades básicas de saú- de, ou ainda em visitas domiciliares feitas pelos Agentes Comunitários de Saúde. Maiores informações podem ser obtidas na publicação Manual Operacional do Programa Nacional de Suplementação de Vitamina A e no Caderno de Atenção Básica intitulado Carências de Micronutrientes, disponíveis no sítio <http://www.saude.gov.br/nutricao>. 2.6.3 Informações sobre outros micronutrientes 2.6.3.1 Vitamina D É pequena a contribuição do leite materno e dos alimentos complementares para o suprimento das necessidades de vitamina D, o qual primordialmente depende da ex- posição direta da pele à luz solar. Em bebês amamentados exclusivamente ao seio e não expostos à luz solar, os estoques de vitamina D existentes ao nascimento provavelmente seriam depletados em oito semanas. Porém, umas poucas horas de exposição à luz solar no verão – 30 minutos a 2 horas por semana (17 minutos por dia), com exposição apenas da face e mãos do bebê, e 30 minutos por semana (4 minutos por dia), se o bebê estiver usando apenas fraldas – produzem vitamina D suficiente para evitar deficiência por vários meses. Crianças com pigmentação escura da pele podem requerer três a seis vezes o tempo de exposição de bebês de pigmentação clara para produzir a mesma quantidade de vitamina D (MONTE; GIUGLIANI, 2004). Portanto, no Brasil, não há recomendação de rotina de suplementação oral dessa vitamina em virtude das necessidades diárias se- rem facilmente atingidas pela exposição solar. 2.6.3.2 Outras vitaminas O suprimento de vitaminas como riboflavina, niacina, tiamina, folato e vitamina C pode ser baixo em algumas populações, assim como o de vitamina E, mas não há evi- dência de benefício da indicação de suplementação dessas vitaminas de forma rotineira (MONTE; GIUGLIANI, 2004). 2.7 ALIMENTAÇÃO PARA CRIANÇAS NÃO AMAMENTADAS Quando o desmame não pôde ser revertido após orientações e acompanhamen- to dos profissionais ou em situações em que a mãe não está recomendada a amamentar, como no caso da mãe soropositiva para o vírus HIV e HTLV-1 e HTLV-2, a melhor op- ção para crianças totalmente desmamadas com idade inferior a 4 meses é a alimentação láctea, por meio da oferta de leite humano pasteurizado proveniente de Banco de Leite Humano, quando disponível. O uso de leite de vaca e/ou fórmula infantil deve ser avalia- do pelo profissional de saúde. 91 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A É conveniente evitar o leite de vaca não modificado no primeiro ano de vida em razão do pobre teor e baixa disponibilidade de ferro, o que pode predispor anemia, e pelo risco maior de desenvolvimento de alergia alimentar, distúrbios hidroeletrolíticos e predisposição futura para excesso de peso e suas complicações. Após os 4 meses de idade, as crianças não amamentadas devem receber outros alimentos segundo o esquema abaixo: Quadro 3 – Esquema alimentar para crianças menores de dois anos não amamentadas Menores de 4 meses 4–8 meses Maiores de 8 meses Alimentação láctea Leite + cereal ou tubérculo Leite + cereal ou tubérculo Alimentação láctea Papa de fruta Fruta Alimentação láctea Papa salgada Papa salgada ou refeição básica da família Alimentação láctea Papa de fruta Fruta ou pão Alimentação láctea Papa salgada Papa salgada ou refeição básica da família Alimentação láctea Leite + cereal ou tubérculo Leite + cereal ou tubérculo O Ministério da Saúde publicou em 2006 o Guia Prático de Preparo de Alimentos para crianças menores de 12 meses que não podem ser amamentadas, disponível em <http://www.saude.gov.br/nutricao>. Quadro 4 – Volume e número de refeições lácteas por faixa etária no primeiro ano de vida para as crianças que não podem ser amamentadas Idade Volume/Refeição Número de refeições/dia Do nascimento a 30 dias 60 – 120ml 6 a 8 30 a 60 dias 120 – 150ml 6 a 8 2 a 3 meses 150 –180ml 5 a 6 3 a 4 meses 180 – 200ml 4 a 5 > 4 meses 180 – 200ml 2 a 3 92 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Quadro 5 – Reconstituição do leite para crianças menores de quatro meses Leite em pó integral: 1 colher das de sobremesa rasa para 100ml de água fervida. 1 ½ colher das de sobremesa rasa para 150ml de água fervida. 2 colheres das de sobremesa rasas para 200ml de água fervida. Preparo do leite em pó: primeiro, diluir o leite em pó em um pouco de água fervida e, em seguida, adicionar a água restante necessária. Leite integral fluido: 2/3 de leite fluido + 1/3 de água fervida 70ml de leite + 30ml de água = 100ml 100ml de leite + 50ml de água = 150ml 130ml de leite + 70ml de água = 200ml Os valores indicados acima são aproximados, de acordo com a variação de peso corporal da criança nas diferentes idades. Após os quatro meses de idade, o leite integral líquido não deverá ser diluído e deve ser oferecido com outros alimentos. O preparo de fórmulas infantis deve seguir as recomendações do rótulo do produto. 2.8 ORIENTAÇÕES IMPORTANTES DE ACORDO COM A IDADE DA CRIANÇA A alimentação da criança desde o nascimento e nos primeiros anos de vida tem repercussões ao longo de toda a vida do indivíduo. A adequação nutricional dos alimen- tos oferecidos para as crianças após o sexto mês de vida é fundamental para a prevenção de anemia, sobrepeso e baixo peso. Nesse contexto, atingir a alimentação ótima para as crianças pequenas deve ser um componente essencial da estratégia global para assegurar a segurança alimentar e nutricional de uma população. Embora seja atribuição dos profis- sionais de saúde a sua promoção e da família a sua execução, o sucesso final da ação de- pende também da definição de políticas governamentais adequadas e da participação e apoio de toda a sociedade civil. O quadro 6 sumariza as principais orientações e condutas que devem ser preconizadas de acordo com a idade da criança. 95 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A sistemáticas no primeiro ano de vida e visitas para coleta de dados aos seis e 12 meses; o grupo controle, somente as visitas para coletas de dados. Ao final do estudo observou-se que a intervenção associou-se a maior proporção de aleitamento materno exclusivo aos quatro e seis meses e amamentadas aos 12 meses e a menor proporção de crianças que apresentaram diarréia, problemas respiratórios e uso de medicamentos na faixa etária de 12 a 16 meses. A intervenção associou-se também a menor prevalência de cárie dentária nas crianças que receberam a intervenção (FELDENS; VITOLO; DRACHLER, 2007). Em relação ao consumo de alimentos de baixo valor nutricional, o mesmo estudo mostrou que a intervenção baseada na orientação dos Dez passos é capaz de reduzir o número de crianças que receberam bala, refrigerante, mel, biscoitos do tipo recheado, chocolate e salgadinho na faixa etária de 12 a 16 meses. Os autores enfatizam que as orientações contidas nos Dez passos da alimentação saudável: guia alimentar para crianças menores de dois anos não requerem mudanças estruturais no âmbito econômico e social e, portanto, não há limitações para serem alcançadas no curto prazo imediato, desde que os profis- sionais de saúde passem a priorizar essas orientações na atenção primária. Os profissionais e as equipes de Saúde da Família podem estabelecer estratégias para sensibilizar e avaliar sua prática profissional, pensando na integralidade e interdisci- plinaridade do cuidado e, ao mesmo tempo, ajudar a família a adotar os dez passos. Eis algumas orientações (REIS JUNIOR, 2008), com base nos Dez Passos (BRASIL, 2002a, 2002b): Passo 1• : “Dar somente leite materno até os seis meses, sem oferecer água, chás ou qualquer outro alimento.” Dica ao profissional e à equipe: Rever se as orientações sobre aleita- mento materno são fornecidas desde o acompanhamento pré-natal até a época da alimentação complementar. Passo 2• : “A partir dos seis meses, introduzir de forma lenta e gradual outros alimentos, mantendo o leite materno até os dois anos de idade ou mais.” Dica ao profissional e à equipe: Antes de dar a orientação desse passo, perguntar à mãe/cuidador como ela (ele) imagina ser a alimentação correta da criança e, a seguir, convidá-la(lo) a complementar seus conheci- mentos, de forma elogiosa e incentivadora. Passo 3• : “Após seis meses, dar alimentos complementares (cereais, tubér- culos, carnes, leguminosas, frutas, legumes) três vezes ao dia, se a criança receber leite materno, e cinco vezes ao dia, se estiver desmamada.” Dica ao profissional e à equipe: Sugerir receitas de papas, tentando dar idéia de proporcionalidade, de forma prática e com linguagem simples. Passo 4• : “A alimentação complementar deve ser oferecida de acordo com os horários de refeição da família, em intervalos regulares e de forma a respeitar o apetite da criança.” 96 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A Dica ao profissional e à equipe: Uma visita domiciliar pode ser uma estratégia interessante para aumentar o vínculo e orientar toda a família sobre alimentação saudável. Passo 5: • “A alimentação complementar deve ser espessa desde o início e oferecida de colher; começar com consistência pastosa (papas/purês) e, gra- dativamente, aumentar a consistência até chegar à alimentação da família.” Dica ao profissional e à equipe: Organizar, em parceria com a comu- nidade, oficinas de preparação de alimentos seguros e/ou cozinhas comu- nitárias. Convidar famílias com crianças sob risco nutricional. Passo 6: • “Oferecer à criança diferentes alimentos ao dia. Uma alimentação variada é uma alimentação colorida.” Dica ao profissional e à equipe: Conversar sobre a estimulação dos sentidos enfocando que a alimentação deve ser um momento de troca afetuosa entre a criança e a família. Passo 7• : “Estimular o consumo diário de frutas, verduras e legumes nas refeições.” Dica ao profissional e à equipe: Pedir à mãe que faça uma lista das hortaliças mais utilizadas. Depois, aumentar essa lista acrescentando outras opções não lembradas, destacando alimentos regionais e típicos da estação. Passo 8• : “Evitar açúcar, café, enlatados, frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos e outras guloseimas nos primeiros anos de vida. Usar sal com moderação.” Dica ao profissional e à equipe: Articular com a comunidade e outros setores uma campanha sobre alimentação saudável. Passo 9• : “Cuidar da higiene no preparo e manuseio dos alimentos: garantir o seu armazenamento e conservação adequados.” Dica ao profissional e à equipe: Realizar grupo com pais, avós e/ou crianças sobre cuidados de higiene geral, alimentar e bucal. Passo 10• : “Estimular a criança doente e convalescente a se alimentar, ofe- recendo sua alimentação habitual e seus alimentos preferidos, respeitando a sua aceitação.” Dica ao profissional e à equipe: Avaliar em equipe como está a aces- sibilidade da criança doente ao serviço de saúde. 97 C A D E R N O S D E A T E N Ç Ã O B Á S IC A REFERÊNCIAS ALBERNAZ, E. P.; MENEZES, A. M.; CESAR, J. A. Fatores de risco associados à hospi- talização por bronquiolite aguda no período pós-natal. Rev. Saúde Pública, [S.l.], v. 37, p. 37, 2003. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS (AAP). Committee on Infectious Diseases. Red book 2000. [S.l.]: Elk Grove Village, 2000. ______. Policy Statement: Prevention of Pediatric Overweight and Obesity. Pediatrics, [S.l.], v. 112, n. 2, p. 424-430, 2003. ANDERSON, J. W.; JOHNSTONE, B. M.; REMLEY, D. T. Breast-feeding and cogni- tive development: a meta-analysis. American Journal of Clinical Nutrition, [S.l.], v. 70, p. 525-35, 1999. ARIFEEN, A. E. et al. 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