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A reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos, Notas de estudo de Química

A reação de Maillard de açúcares redutores com aminas tem profundas implicações químicas com as propriedades organolépticas dos alimentos e com a biodisponibilidade de aminoácidos. No processamento industrial dos alimentos, a reação confere aspectos positivos, como a formação do odor e sabor, mas trás conseqüências negativas como a perda de aminoácidos essenciais e a geração de substâncias mutagênicas e cancerígenas..l.

Tipologia: Notas de estudo

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Baixe A reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos e outras Notas de estudo em PDF para Química, somente na Docsity! A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos - Aderson de F. Dias, Ph. D. 2009 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos 01 – Introdução 02 – A química da reação de Maillard 03 – Formação do N–Glicosídeo: Aldose/Cetose + Grupo amina 04 – Rearranjo de Amadori 05 – Degradação de Strecker 06 – Formação da Acrilamida via degradação de Strecker da Metionina 07 – Fluxograma da reação de Maillard 08 – Melanoidinas de Maillard e Substâncias Húmicas 09 – Reação intrínseca de Maillard em produtos farmacêuticos 10 – Reação de Maillard no leite e derivados 11 – Reação de Maillard no Café 12 – Reações de Maillard no Colágeno do Cristalino 13 – Inibidores da Reação de Maillard: promovendo a saúde 14 – A estrutura química do aroma e do sabor dos alimentos 1 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos Glicosilação Avançada” – PFGA (Advanced Glycation End-product, AGE), de estrutura química polimérica, bem como forte contribuição a muitas doenças progressivas da velhice, incluindo doenças vasculares (tais como aterosclerose, hipertensão pulmonar e baixa circulação capilar), doenças renais, enrijecimento das juntas e da pele, catarata, retinopatia diabética, neuropatia, Doença de Alzheimer, incontinência urinária, cardiomiopatias e diabetes mellitus.4 AGEs se formam por modificação dos resíduos de arginina e lisina, ancorados nas proteínas, grupos amina de fosfolipídeos (fosfatidiletanolamina e fosfatidilserina) e guanil nucleotídeos do DNA. Típicos AGEs (Fig. 3) são hidroimidazolonas de proteínas e imidazopurinonas derivados do DNA, bis(lisil)-imidazólio (agentes de ligação cruzada de proteínas: GOLD, MOLD e DOLD), vesperlisinas A, B e C, produtos fluorescentes de proteínas (pentosidina e argpirimidina), derivados N-(1- carboxalkil)amino (Nε-carboxi-metil-lisina e Nε-carboxetil-lisina de proteínas; N- carboximetilfosfatidiletanolamina de fosfolipídeos; N2-(1-carboxietil) desoxiguanilato do DNA), pirralina – um derivado pirrol de proteínas, entre outros (Fig. 4).5 4 Monnier, V. M.; Sell, D. R.; Wu, X., and Rutter, K.: The prospects of health and longevity from the inhibition of the Maillard reaction in vivo, International Congress Series 1245, 9-19 (2002); Graham, L., Biochimica et Biophysica Acta, 1297, 9-16 (1996); Araki, N., Shibayama, R., Ejima, Y., Nagai, R., Araki, T., Saya, H., Horiuchi, S., International Congress Series 1223 49-58 (2001). 5 Thornalley, Paul J.: Biochemistry of Advanced Glycation Endproduct generation and its inhibition, in: SYMPOSIUM “Advanced Glycation End Products (AGEs)” May 12 – 14, 2000, Jena, Germany 4 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos β-D-Galactose α-D-Glicose β 1 OOH OH OH OH H O OOH OH OH H OH H 1 4 α Ligação β−1,4-glicosídica T er m in a re du to r α-D-Glicose α-D-Glicose Ligação α−1,4-glicosídica 1 α O OH OH OH OH H O OH O H OH OH H OH OH β-D-Frutose Ligação 1α,2β− glicosídica OOH OH OH OH H O O OH OH OH OH α-D-Glicose α-D-Glicose 1 1α Ligação α,α−glicosídica α-D-Glicose 12 34 2 β O OHOH OH OH O O OH OH H OH OH β 1 Ligação β−1,4-glicosídica 1 2 3 4 O OH OH OH OH O O OH OH OH OH β-D-Glicose β-D-Glicose T er m in a re du to r Ligação β−1,6-glicosídica 1 2 3 β-D-Glicose β-D-Glicose OOH OH OH OH O H OH O OH OH H OH CH2 4 5 61 β α−Lactose: O-β−D-Galactopiranosil-(1,4)-α−D-glicopiranose Maltose: 4-O-α−D-Glicopiranosil-β−D-glicopiranose Sacarose: β−D-Frutofuranosil-α−D-glicopiranosideo α,α−Trehalose: α−D-Glicopiranosil-α−D-glicopiranosideo Celobiose: 4-O-β−D-Glicopiranosil-D-glicose Gentiobiose: 6-O-β−D-Glicopiranosil-D-glicose Figura 2 – Estrutura química de alguns dissacarídeos: Lactose (leite), sacarose (plantas verdes) e trehalose (fungos e insetos) são os três dissacarídeos com abundante ocorrência natural fundamentais para o metabolismo de plantas e animais (a maltose, açúcar do Malte, é um produto da hidrólise do amido; tem 1/3 do poder adoçante da sacarose). Note que sacarose e trehalose são açúcares não-redutores, pois o grupo redutor do monossacarídeo foi usado na ligação glicosídica. Esses dissacarídeos não sofrem mutarrotação em solução e nem reduzem o reagente de Fehling. Dissacarídeos não-redutores reagem apenas após hidrólise. Os demais são hemiacetais e portanto açucares redutores. A celobiose é obtida através da hidrólise da celulose, é desprovida de qualquer sabor e é indigesta para humanos. Trehalose tem um sabor distinto, mas gentiobiose é amarga. Fonte: deMan, John M., Principles of Food Chemistry, 3rd Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999). A importância da reação de Maillard in vivo foi reconhecida pela primeira vez com a detecção de elevados níveis de hemoglobina no sangue diabético. Evidências posteriores sugeriam que os produtos finais da glicosilação avançada (AGEs) podiam estar implicados na etiologia de várias complicações diabéticas e o envelhecimento.6 6 Fatima, S.; Jairajpuri, D. S., and Saleemuddin, M.: A procedure for the rapid screening of Maillard reaction inhibitors, J. Biochem. Biophys. Methods, 70, 958–965 (2008). 5 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos NH N+ N O H ONH2 OH H NH N+ N O H ONH2 OH H CH3 NH N+ N O H ONH2 OH H OH OH OH G-Arg MG-Arg 3DG-Arg N O NH2 OH NN+ H OH CH3 CH3 H Argpirimidina (2MG + Arginina) Figura 3 – Formação de produtos finais da glicosilação avançada (AGEs) através de modificações na cadeia lateral da arginina: Imidazolonas formadas via reação do glioxal (G- Arg), metilglioxal (MG-Arg) e 3-desoxiglicosona (3DG-Arg) com a cadeia lateral da arginina. Argpirimidina é formada pela reação de duas moléculas de metilglioxal e arginina ligada a peptídeo. O termo “Advanced Glycosylation (Glycation) End product” (AGE) apareceu na literatura através do trabalho de Vlassara et al.7 com o propósito de descrever estruturas químicas amarronzadas, fluorescentes e que apresentam cruzamento covalente nas ligações entre as cadeias moleculares, resultando numa complexa rede polimérica e que são formados no estágio avançado das reações de Maillard entre açúcares e proteínas in vivo. Atualmente, o emprego do termo AGE (PFGA) abrange uma ampla gama de produtos avançadas da reação de Maillard, detectados na proteína dos tecidos, incluindo Nε−(Carboximetil)-lisina (CML), Nε−(Carboximetil) hidroxi-lisina (CMhL), Crossline (um par de compostos epiméricos derivados da glicose por reação cruzada lisina-lisina) e pirralina,8 compostos que não apresentam cor ou fluorescência e nem cruzamento de ligações entre cadeias moleculares das proteínas. Porém, como a pentosidina (produto de condensação da lisina, arginina e um precursor originado de açúcar redutor), CML, CMhL se acumulam no colágeno com a idade, particularmente no colágeno da pele em diabéticos, onde ocorre em maior concentração, estando implicados com a patofisiologia da velhice. Não se sabe se a pirralina se acumula nas proteínas com a idade avançada, mas no diabético sua concentração na proteína plasmática se encontra com índices elevados. Já se sabe 7 Vlassara, H., Brownlee, M., & Cerami, A., J. Exp. Med. 160, 197-207 (1984) 8 Pirralina (ε-2-(formil-5-hidroximetil-pirrol-1-il)-L-norleucina) é um produto avançado da reação de Maillard derivado da reação de glicose com o grupo amina da lisina presente nas proteínas . 6 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos N N N OH OH N H O NH2 OH O NH2 OH Glicosepane CH=O OHCH2OHOH OH OH D-Glicose OCH2OHOH OH OH H OH ∗ Aldose - H2O O NH2 NH2 OH (Lys) OH OH OH OH N O NH2 OH OH H ∗ ∗ C NH NNH2 NH2 H Aminoguanidine − 4H2O N N N NH2 N OH OH O NH2 OHH OH O OH O N O NH2 OH OH H H ∗ ∗ 1 6 1 6 ε Ataque intramolecular do εN ao C6=O N+ O OH OH O NH2 OH ∗ 1 6 − H2O NH O NH NH2 NH2 OH Arginine (Arg) L-Arginina L-Lisina Aminotriazina: N6-[4-(3-amino-1,2,4 -triazin-5-il)-2,3-di-hidroxibutil]-L-lisine Didesoxiosona Aldimina Figura 5 – Mecanismo de formação do glicosepane. Glicose marcada no C1 reage com lisina presente nas proteínas formando o produto de Amadori. Após sucessivos deslocamentos do grupo carbonila ao longo do esqueleto carbônico do açúcar, o intermediário α-dicarbonílico didesoxiosona é formado. Sua existência é experimentalmente confirmada através da reação com o reagente de captura aminoguanidina que produz a aminotriazina. O intermediário α- dicarbonílico sofre ataque intramolecular do εN ao grupo carbonila em C6, dando a aldimina, um precursor plausível para o agente de ligações cruzadas Lys-Arg, glicosepane (baseado em Schwack, 2004). O Oxigênio é um poderoso catalisador das reações de Maillard entre glicose e proteína. Todos os PFGA conhecidos por se acumular na proteína dos tecidos (pentosidina, CML, CMhL), requerem condições autoxidativas (oxigênio molecular e catálise por íons de metais de transição) para sua formação a partir de glicose, nos modelos estudados em laboratório. Na ausência do oxigênio o processo de formação desses compostos é inibido, o mesmo ocorrendo em condições aeróbicas na presença de agentes quelantes, redutores e bloqueadores de radicais livres (antioxidantes). Por essa razão, esses produtos que requerem glicosilação e oxidação na sua formação foram designados produtos da “glicoxidação”. A glicoxidação é um complexo processo in vitro, envolvendo oxidação direta da glicose (glicosilação autoxidativa) e autoxidação da base de Schiff e produtos de Amadori, 9 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos rotas conhecidas como Wolff, Namiki e Hodge.14 Produtos da glicoxidação se acumulam irreversivelmente das proteínas durante a reação de Maillard.15 Uma constelação de fatores exerce seu comando no curso da reação, entre os quais se incluem variada gama de compostos carbonílicos (açúcares redutores16, entre outros), amônia, grupos amina (presentes nos aminoácidos, peptídeos, proteínas), pH, temperatura, umidade, íons de metais pesados, luz e sulfitos, para citar os mais evidentes.17 Na reação de Maillard, o grupo amina (–NH2) dos aminoácidos desaparece. Quimicamente, esse grupo é o responsável pelas propriedades alcalinas dos aminoácidos e de outras classes de compostos nitrogenados. Conseqüentemente, o pH inicial do meio terá efeito decisivo no comportamento da reação de Maillard, pH- dependente. O acastanhamento (browning) diminui quando o pH aumenta podendo- se afirmar que essa reação é auto-inibitória à medida que o acastanhamento progride, em razão do desaparecimento dos aminoácidos (deMan, 1999). 14 Na etapa inicial da reação de Maillard, glicose reage com uma amina para formar a base de Schiff, a qual se rearranja para o produto de Amadori (ver Fig. 2). A base de Schiff é muito susceptível à oxidação e produção de radicais livres, o que leva à formação de oxaldeidos, glioxal e metilglioxal, ou seja, a assim chamada rota de Namiki da reação de Maillard. Esta forma da glicoxidação também pode provir da autoxidação da glicose catalisada por metais, que leva à formação de glioxal e arabinose. D-glicosona se decompõe rapidamente em ribulose e por isso não é observada in vivo. Nesse processo, H2O2 é liberado. Essa é a chamada rota de Wolff da reação de Maillard e é um processo importante in vitro, observado durante incubação de longa duração de proteínas com açúcares redutores em tampão fosfato. É atribuído à presença de íons dos sais de Cu2+ e Fe3+, contaminantes de todos os tampões baseados em fosfato. Fonte: Monnier, Vincent M.: Intervention against the Maillard reaction in vivo, Arch. Biochem. Bioph., 419 1–15 (2003). A rota de Hodge é a via clássica da reação de Maillard, na qual a base de Schiff reversível e os produtos de Amadori se rearranjam gradualmente resultando em modificações químicas permanentes em proteínas. Fonte: Metz, T. O.; Alderson, N. L.; Thorpe, S. R., and Baynes, John W., Pyridoxamine, an inhibitor of advanced glycation and lipoxidation reactions: a novel therapy for treatment of diabetic complications, Arch. Biochem. Biophys., 419, 41-49 (2003). 15 Litchfeld, John E.; Thorpea, Suzanne R., and Baynes, John W.: Oxygen is not required for the browning and crosslinking of protein by pentoses: relevance to Maillard reactions in vivo, International J. Biochem. & Cell Biol., 31 1297-1305 (1999) 16 Um açúcar redutor é capaz de reduzir determinados agentes oxidantes, dois dos quais são usados em métodos analíticos. Um é o sulfato de cobre alcalino (CuSO4 em tartarato de sódio e potássio – solução de Fehling) ou cloroamina-T (CH3C6H4SO2NClH). Um açúcar com um grupo aldeído, cetona, hemi-acetal ou um hemicetal é um açúcar redutor. Sem um desses grupos, é um açúcar não-redutor. 17 Montgomery, M. W. and Day, E. A., J. Food Sci., 30, 828-832 (1965). 10 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos A complexa química por trás dessas transformações somente começou a ser desvendada no início dos anos 50, quando Hodge18 publicou o primeiro esquema reacional compreensível da reação de Maillard. Uma das características da reação é a sua difícil controlabilidade, em razão da miríade de produtos e intermediários. Muitos desses produtos já foram caracterizados e o mecanismo de sua formação compreendido. Em termos nominais, a reação consiste numa condensação entre a função carbonila (grupo ceto, >C=O) de um açúcar redutor19 como a glicose e o grupo –NH2 (ou amônia, um aminoácido, peptídeo ou uma proteína) de uma amina biológica (freqüentemente o grupo ε-amina da lisina de uma proteína é o mais reativo dos aminoácidos que incluem no grupo além da lisina, a glicina, o triptofano e a tirosina20), formando um produto de condensação (imina ou base de Schiff, Fig. 6). Uma série de reações tem lugar a seguir, incluindo ciclizações, desidratações, retro- aldolizações, rearranjos, isomerizações e mais condensações culminando com a formação de polímeros castanhos nitrogenados conhecidos como melanoidinas.21 3 – Formação do N–Glicosídeo: Aldose/Cetose + Grupo amina D-Glicosamina (N-glicosídeo) - H2O Imina (Base de Schiff) O OH OH OH OH CH2OH H OH OH OH OH O CH2OH H OH OH OH OH OH CH2OH NH H CH2 R OH OH OH OH CH2OH N CH2 RRCHNH2 O OH OH OH CH2OH NH CH2R β-anômero O NH OH OH OH CH2OH CH2R D-Glucose OH N+ OH OH OH CH2OH H CH2R H+ Íon imônio O NHCH2R OH OH OH CH2OH α-anômero 18 Hodge, J. E.: Chemistry of browning reactions in model systems J. Agric. Food Chem., 1, 928-943 (1953). Agricultural and Food Chemistry, 1(15), 928–943. 19 Carboidrados não redutores tais como manitol, sacarose e trehalose não sofrem a reação de Maillard. 20 Ashoor, S. H. and Zent, J. B., J. Food Sci., 49, 1206-1207 (1984). 21 Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439 (1998) 11 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos compostos mutagênicos é a das imidazo-quinolinas (IQ), produtos da condensação de creatinina26 com açúcares e certos aminoácidos, tais como glicina, tirosina, alanina e lisina. Os três mais potentes mutágenos desta classe formados na carne e no peixe assados são mostrados na Fig. 8 (Fennema, O. R., 1996). N N N NH2 CH3 N N N NH2 CH3 CH3 N N N N NH2 CH3 CH3 CH3 3,4,8-trimethyl-3H-imidazo [4,5-f]quinoxalin-2-amine 3-methyl-3H-imidazo[4,5- f]quinolin-2-amine 2-Amino-3,4-dimetil-3H-imidazo [4,5-f]quinolina (MeIQ) Figura 8 – Compostos mutagênicos imidazo-quinolínicos presentes carne do peixe assado (Fennema, O.R., 1996) Dessas aminas heterocíclicas aromáticas (HAA, Heterocyclic Aromatic Hydrocarbons) mutagênicas e carcinogênicas, o PhIP (2-Amino-1-metil-6-fenil- imidazo[4,5-b]piridina, Fig. 9) é o representante mais importante sendo encontrado, além da carne e peixe assados, também no condensado da fumaça do cigarro, do escapamento dos automóveis, na cerveja e no vinho:27 PhIP: 2-Amino-1-metil-6-fenil-1H- imidazo[4,5-b]piridina N N N NH2 CH3O NH2 OH L-Fenilalanina (Phe) CH3 NH N NH2 O OH Creatinina + Calor durante o cozimento Figura 9 – Estrutura química do PhIP, substancia carcinogênica encontrada em alimentos ricos em proteína submetidos a altas temperaturas, mas também na fumaça do cigarro, na cerveja e CH3 NH N NH2 O OH 26 Nome químico: N-(Aminoiminomethyl)-N-methylglycine; fórmula molecular: C4H7N3O =113.1; CAS: 60-27- 5. Substância endógena encontrada principalmente nos músculos esqueletais dos vertebrados. Investiga-se seu uso terapêutico no tratamento de um grupo de desordens degenerativas progressivas que afetam os neurônios motores no cérebro e da medula espinhal (doença motora dos neurônios; exemplo: esclerose lateral amiotrófica ou doença de Lou Gehrig), da distrofia muscular de Duchenne e da doença de Huntington (Martindale: The Complete Drug Reference, 2007 The Pharmaceutical Press). Creatinina 27 Skog, K. I.; Johansson, M. A. E., and Jägerstad, M. I., Carcinogenic heterocyclic amines in model systems and cooked foods: A review on formation, occurrence and intake, Food Chem. Toxicol., 36, 879-896 (1998). 14 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos no vinho. Seu principal precursor é a creatinina, aminoácidos livres e açúcares. Sua formação aumenta com o aumento da temperatura e tempo de cozimento As aminas heterocíclicas aromáticas devem ser ativadas metabolicamente antes de se tornarem carcinogênicas. A ativação metabólica ocorre via o complexo enzimático P450 no fígado, através de N-hidroxilação pela isoenzima específica CYP1A2. O mesmo complexo enzimático P450 ativa os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (PAH – policyclic aromatic hydrocarbons), antes que se tornem carcinogênicos.28,29 A ativação do PAH se dá no reticulo endoplasmático da célula e é catalisada pelo sistema Citocromo-P450 ancorado na membrana. Isoenzimas específicas co-atuam no processo. Um dos mais conhecidos PAH é o benzopireno – Benzo[a]pireno, BaP. Sua ativação metabólica é mostrada na figura 10: 1 2 3 4 567 8 9 10 11 12 Benzo[a]pireno, BaP O (+)-BaP-7,8-Epóxido Epoxi- hidrolase OH OH (-)-BaP-7,8− diidrodiol CYP450−Monooxi- genase dependente OH OH O (+)-BaP-7,8-diol− 9,10-epóxido−2 CYP450−Monooxi- genase dependente OH OH O (−)-BaP-7,8-diol− 9,10-epóxido−1 CYP450−Monooxi- genase dependente O (−)-BaP-7,8-Epóxido CYP450−Monooxi- genase dependente Epoxi- hidrolase OH OH (+)-BaP-7,8− diidrodiol CYP450−Monooxi- genase dependente OH OH O (+)-BaP-7,8-diol− 9,10-epóxido−1 OH OH O (−)-BaP-7,8-diol− 9,10-epóxido−2 CYP450−Monooxi- genase dependente Figura 10 – Mecanismo da ativação metabólica do Benzo[a]pireno (BaP). A distribuição dos isômeros cancerígenos opticamente ativos é desigual, uma conseqüência das propriedades 28 Schut, H. A., J. and Snyderwine, E. G., DNA adducts of heterocyclic amine food mutagens: implications for mutagenesis and carcinogenesis. Carcinogenesis, 20, 353-368 (1999). 29 Turesky, R. J.; Lang, N. P.; Butler, M. A.; Teitel, C. H., and Kadlubar, F. F.: Metabolic activation of carcinogenic heterocyclic aromatic amines by human liver and colon, Carcinogenesis, 12, 1839-1845 (1991). 15 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos estereosseletivas do complexo Citocromo-P450-isoenzimas. As principais rotas de ativação do BaP são as que formam (+)-BaP-7,8-diol-9,10-epóxido-2 e (+)-BaP-7,8-diol-9,10-epóxido-1.30 Aminocetoses foram encontrados em alimentos aquecidos ou armazenados, em frutas desidratadas, produtos lácteos em geral, legumes, molhos de soja. Soluções contendo misturas de açúcar e aminoácidos usadas na alimentação parenteral (autoclavadas ou estéreis) também contem aminocetoses. Esses compostos são também encontrados no corpo humano e especialmente no diabético eles se encontram em profusão.31 Os mais importantes sintomas das reações de Maillard nos produtos da industria alimentícia incluem a formação da cor e a descoloração, a formação do aroma e o fedor, a produção de compostos com atividade anti-oxidante, a redução do valor nutricional e a formação de compostos com potencial propriedades tóxicas.32 Produtos da reação de Maillard, compostos de Amadori, α-dicarbonílicos, furanos, pirralinas e melanoidinas estão presentes em alimentos assados como carnes e peixes; panificação e pastelaria como torradas, cream-crackers e chips de batata e artigos da luxúria, como açúcar, café, cerveja e molhos de tomate.33 5 – Degradação de Strecker A reação de Strecker se refere a reações entre compostos α-dicarbonílicos, como a desoxiozona formada na reação de Maillard e aminas. Ocorre sob condições drásticas, requerendo altas temperaturas ou pressão. Transaminação ocorre numa das etapas da reação que produz aminocetonas, aldeídos e dióxido de carbono. O aldeído formado, chamado aldeído de Strecker, produz odores fortes. Aldeídos de Strecker mais comuns incluem o etanal, CH3CHO (aroma doce das frutas), 30 Rojas, M.; Cascorbi, I.; Alexandrov, K.; Kriek, E.; Auburtin, G.; Mayer, L.; Kopp-Schneider, A.; Roots, I. and Bartsch, H.: Modulation of benzo[a]pyrene diolepoxide-DNA adduct levels in human white blood cells by CYP1A1, GSTM1 and GSTT1 polymorphism. Carcinogenesis, 21, 35-41 (2000). 31 Ledl, F. und Schleicher, E., Angew. Chem.102, 597-626 (1990) 32 Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439 (1998) 33 Hayase, F.; Takahashi, Y.; Sasaki, S.; Shizuuchi, S., and Watanabe, H.: 3-Deoxyosone-related advanced glycation end products in foods and biological systems, International Congress Series, 1245, 217–221 (2002) 16 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos disparando as reações não-enzimáticas38 de Maillard responsáveis pelo atraente “douramento” do produto mas também pela formação de substâncias tóxicas oriundas da degradação térmica (pirólise).39 Os pesquisadores ingleses Donald S. Mottram e Bronek L. Wedzicha40 da The University of Readings, UK e Richard H. Stadler41 do Nestlé Research Center na Suíça descobriram que o aquecimento da asparagina (Fig. 1) com a glicose a 185oC produz quantidades significativas de acrilamida (Fig. 13). Na tecnologia dos alimentos a reação de Maillard desempenha um papel crucial no desenvolvimento do aroma, da cor, odor, textura e valor nutricional.42 Por milênios a reação tem sido usada para produzir alimentos com aparência, sabor e aroma atrativos, desde que o homem passou a cozê-los. A moderna indústria alimentícia se baseia na reação de Maillard para produzir alimentos que possuem a cor, o odor e o sabor exigidos pelo consumidor.43 Em processos tradicionais tais como a torrefação do café e do cacau, a fabricação do pão e do bolo, o preparo das carnes, do churrasco, a reação de Maillard controla uma rede complexa de transformações químicas que influem diretamente no paladar, no aspecto, na digestibilidade, além de estar associada à formação de compostos tóxicos, suspeitos de carcinogenicidade, como a acrilamida mencionada anteriormente.44 São conhecidos mais de 1000 compostos químicos 38 As assim chamadas reações de acastanhamento de Maillard, para diferenciá-la daquela catalisada por enzima que freqüentemente acontece com notável rapidez em frutos e vegetais recentemente cortados, como maçãs e batatas (fonte: Fennema, Owen R., 1996). 39 Pedreschi, F.; Kaack, K.; Granby., K., Lebensm.-Wiss. u.-Technol. April 2004 (in press) 40 Mottram, D. S.; Wedzicha, B. L.; Dodson, A. T., Acrylamide is formed in the Maillard reaction, Nature, 419, 448 (2002). 41 Stadler, R.H., Blank, I., Varga, N., Robert, F., Hau, J., Guy, P.A. , Robert, M-C, Riediker, S., Acrylamide from Maillard reaction products, Nature, 419, 449-450 (2002). 42 Friedman, M.: Food browning and its prevention: an overview, J. Agric. Food Chem., 44, 631-653 (1996). 43 Ames, Jennifer M.: Applications of the Maillard reaction in the food industry, Food Chemistry, 62, 431-439 (1998) 44 Stadler, R. H.; Blank, I.; Varga, N.; Robert, F.; Hau, J.; Guy, P.A.; Robert, M-C.; Riediker, S., Acrylamide from Maillard reaction products, Nature, 419, 449-450 (2002). 19 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos voláteis no café torrado.45 Quase 350 compostos heterocíclicos, incluindo tiofenos, tiazóis, pirróis, pirazinas e furanos foram identificados no aroma do café.46 OH N NH2 O OH CH2 OH H CH2R OH CH2 N NH2 O OH OH H CH2R - 2H2O OH N N N OH CH2 OH H CH2R OH CH2 N OH OH H CH2R OH N N N OH OH H CH2R OH N OH OH H CH2R Ox α-Amino-cetonas PirazinaCondensação Figura 14 – Autocondensação de duas aminocetonas formando derivados de pirazinas, que também são compostos com grande poder sensório aromático. As pirazinas são geralmente consideradas importantes componentes flavorizantes, ou seja, substâncias que conferem ou que intensificam o sabor e o aroma dos alimentos. Nos seres humanos a reação de Maillard contribui para o aumento da fluorescência, da cor e das ligações cruzadas47 das proteínas extracelulares durante o envelhecimento normal. A aceleração destas reações tem implicações no desenvolvimento de complicações diabéticas e em processos inflamatórios relacionados a doenças degenerativas e aterosclerose. As reações de Maillard que tem lugar espontaneamente no corpo (in vivo) chamadas coletivamente de glicosilação protéica ocorrem numa velocidade menor em vista da menor temperatura existente no corpo, mas seus produtos se acumulam durante o envelhecimento afetando especialmente os tecidos que contem proteínas de vida longa, como as lentes do cristalino (colágeno estrutural), colágeno da pele, artérias (colágeno vascular, exemplo: endurecimento da aorta – aterosclerose – devido à formação de produtos finais da glicosilação avançada, AGE, alguns dos quais P-NH2 + OHC-CH2-CHO P-N=CH-CH2-CH=N-P 45 Yanagimoto, K., Lee, K.-G., Ochi, H., Shibamoto, T., International Congress Series 1245, 335–340 (2002) 46 Flament, I., Chevalier, C., Chem. Ind. 592-596 (1988). 47 Exemplo de ligações cruzadas entre compostos α-dicarbonílicos e o aminoácido das proteínas (Fennema, O. R., 1996): Proteina Malonaldeido Ligações cruzadas 20 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos enrijecem as fibras do colágeno48), tendões, pulmões, cartilagem, membrana basal (exemplo, perda da permeabilidade da membrana basal dos rins) e cérebro (doença de Alzheimer49). As reações são irreversíveis e alteram as funções das proteínas. Essas alterações são responsáveis pelos fenômenos associados ao envelhecimento do corpo, sendo as rugas o sintoma mais visível.50 Um estudo apresentado no encontro anual da Diabetes Association de São Francisco, Califórnia, mostrou que a ingestão de alimentos escuros pode causar ataque cardíaco, derrame cerebral e dano nervoso. Há anos se sabe que aquecer proteínas com açúcar na ausência de água forma os produtos da glicosilação avançada (AGE) que podem causar danos aos tecidos do corpo. O diabético sofre de alta incidência de danos arterial, nervoso e renal porque os altos níveis de açúcar no sangue aceleram as reações químicas de Maillard que formam esses produtos. Ao contrário, o cozimento dos alimentos na água impede que o açúcar se ligue às proteínas.51 Entre os numerosos produtos finais da glicosilação avançada (PFGA) descritos, o que se acha melhor caracterizado é o CML (Nε-Carboximetil lisina) cujos níveis são usualmente mais elevados que os demais. A modificação do colágeno das cartilagens pelos produtos finais da glicosilação avançada como o CEL (Nε-Carboxietil lisina), o CML (Nε-Carboximetil lisina) e a pensosidina (Fig. 4) foi apontada como responsável pela rigidez das articulações com a idade avançada, a qual, juntamente com esses produtos, representam um mecanismo molecular aceitável para o desenvolvimento da 48 Slatter, David A.; Avery, N. C., and Bailey, A. J.: Collagen in its fibrillar state is protected from glycation, Int J. Biochem. Cell Biol., 40, 2253-2263 (2008). 49 Nagaraj, Ram H.; Sarkar, P.; Mally, A.; Biemel, K. M.; Lederer, M. O., and Padayattia, P. S.: Effect of pyridoxamine on chemical modification of proteins by carbonyls in diabetic rats: characterization of a major product from the reaction of pyridoxamine and methylglyoxal, Arch. Biochem.Biophys., 402 110–119 (2002). 50 Daniel, S.; Reto, M. and Fred, Z., Cosmetics and Toiletries Manufacture Worldwide, 118-124 (2002) 51 Vlassara, H., Picower Institute for Medical Research in Manhasset, N.Y. Annual Meeting of the American Diabetes Association, San Francisco, June, 1996. (http://www.drmirkin.com/archive/6847.html ADVANCED GLYCATION END PRODUCTS) 21 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos 7 – Fluxograma da reação de Maillard O mecanismo da reação de Maillard mostrado esquematicamente na figura 16, é geralmente dividido em três estágios para melhor compreensão: Inicial, avançado e final. 56 Aldose -CHO Grupo Amina, NH2 Glicosamina N-Substituida + H2O Fig. 1 Fig. 2 1-amino-1-desoxicetose (Produto de Amadori) Rearranjo de Amadori Base de Schiff de hidroximetilfurfural ou furfural -3H2O Hidroximetilfurfural ou furfural -2H2O Açúcar Redutonas -H +H Desidro-redutonas Produtos de fissão (acetol, diacetil, piruvaldeidos, etc) Aldois e polímeros não nitrogenados Aldeidos + Aminoácidos - CO2 (Degradação de Strecker) Fig. 3 a 6 Melanoidinas - Polímeros castanhos nitrogenadas e co-polímeros + Compostos aminados - Substrato aminado + H2O + Compostos aminados + Compostos aminados + Compostos aminados + Compostos aminados A B C C D E E F F F F G G G G G + Figura 16 – Esquema da complexa rede de transformações químicas envolvidas na reação de Maillard (baseado no trabalho de Hodge, Ref. 7). A – Fase Inicial O estágio inicial envolve a condensação amino-açúcar e o rearranjo de Amadori. Os compostos de Amadori não alteram nem a cor nem a fluorescência e tampouco a absorbância no U.V. próximo. Com o aquecimento prolongado, os produtos de Amadori sofrem desidratação e fissão dando redutonas incolores (Fig. 17) e 56 Mauron, J.: The Maillard Reaction in Food – a Critical Review from the Nutritional Standpoint, Prog. Food Nutr. Sci., 5, 5-35 (1981); Morales, J. F., and van Boekel, M. A. J. S.: A study on advanced Maillard reaction in heated casein/sugar solutions: Fluorescence accumulation, Int. Dairy Journal 7, 675-683 (1997). 24 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos substâncias fluorescentes, algumas das quais coloridas (Hodge). Compostos carbonílicos insaturados aumentam sua concentração nesta fase. Aldeídos formados pela degradação de Strecker é uma fonte adicional do acastanhamento em vista de sua reatividade, sofrendo autocondensação, reagindo com açúcares, com furfural e com outros produtos dando pigmentos castanhos. Principais reações: Condensações, enolização e rearranjo de Amadori. O rearranjo de Amadori é considerado etapa chave na formação dos principais intermediários que tomarão parte nas reações de formação dos produtos castanhos (browning reactions). Glicose e grupos amina livres se combinam com proteínas numa proporção 1:1 (produto incolor). CH2 C C C R2 O OHH H OH NH R1 1-amino-1-desoxi-2-cetose (Rearranjo de Amadori) Ceto - enolização 2,3-enodiol CH2 C C C R2 OH OH H OH NH R1 Desidroredutona CH3 C C C R2 O O H OH - R-NH2 CH3 C C C R2 O OH OH Ceto - enolização Redutona 2-Amino-2-desoxi-1-aldose (Intermediário de Heynes) OHCH2 C C R1 O H OH R-NH2 OH C C C R1 OH H OH NH R1 H H - H2O O C C C R1 H OH NH R1 H H Figura 17 – Reações de Maillard da fase inicial. B – Fase Intermediária O estágio avançado (intermediário) da reação de Maillard nos alimentos e nas reações modelo proteína-açúcar a formação de pigmentos é monitorada pela de absorção a 420 nm após digestão enzimática e extração com água. Principais reações desta fase: Desidratação e fragmentação (do açúcar a 3-desoxiglicosona e 25 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos seus 3- e 4-enos derivados, Hidroximetil furfural (HMF), formação de compostos α- dicarbonílicos, chamadas de redutonas – substancias com propriedades redutoras), degradação de aminoácidos via reação de Strecker, ciclizações, retro-aldolizações, rearranjos, isomerizações e mais subseqüentes condensações conduzem esta fase à etapa final, com o aparecimento dos produtos escuros, castanhos (melanoidinas). O teste de Élson-Morgan para amino-açúcar é positivo nesta fase. 1-amino-1-desoxicetose: Produto de Amadori OH N O OHOH OH H CH2R H HH Enolização 1, 2-Enolamina condições alcalinas OH - OH N O OH OH CH2R H OH N OH OHOH OH H CH2R H H OH - 2,3-Enolamina OH2 OH N O OH OH CH2R O H H 3-Desoxihexulose OH CHO O OH OH H H Eliminação do grupo amina OH CHO O OH OH H H −H2O O CH=O O OH H H −H2O O CH=O OH OH H −H2O O CH=O OH O CHOHOCH2 Hidroximetil-Furfural α-dicarbonílico Fig. 18 – Mecanismo de formação do hidroximetil-furfural (HMF) do estágio avançado intermediário. Note a presença da 3-desoxihexulose (3-desoxiglicosone), importante precursor de 2-furaldeidos. C – Fase final Grande parte da cor (vermelho castanho e marron escuro) é formada nessa fase. A cor aparece devido à formação de compostos poliméricos de alto peso molecular (>12.000 Daltons), conhecidos como melanoidinas. A cor observada é o resultado de elevada concentração de espécies ativas no UV. Nela se formam os produtos poliméricos, as Melanoidinas. Principais reações: condensações aldólicas, polimerizações, degradação de Strecker de alfa-aminoácidos a aldeídos e N- heterociclos a elevadas temperaturas. Evolução de gás carbônico é um indicativo desta fase final. Aqui aparecem os aromas da torração em geral. Melanoidinas coloidais e insolúveis se formam. 26 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos OH OH COOH OH O COOH N O HOOC R O O OH O O H NH O NH2 R N O O OH OH OH O OH O H O OH O O OH O OH COOH COOH Figura 21 – Modelo estrutural hipotético do ácido húmico de Stevenson (1982).60 Os ácidos húmicos são complexas macromoléculas que incorporam aminoácidos, peptídeos, amino- açúcares e grupos alifáticos nos anéis aromáticos, os quais exibem vários padrões de oxigenação na forma de quinonas, fenóis e ácidos carboxílicos quelados ou livres. OH COOHOH COOH HOOC HOOC COOH OH O CH3 COOH OH O Figura 22 – Modelo estrutural hipotético de Buffle do ácido fúlvico, contendo tanto estruturas aromáticas quanto alifáticas. O húmus do solo das florestas é caracterizado por um elevado conteúdo de ácidos fúlvicos enquanto no solo de turfas e de gramíneas é marcante a presença de elevada teor de ácidos húmicos (baseado do trabalho de Weber, ref. 33). Ácidos húmicos foram identificados no trato gastro-intestinal de humanos e animais, na circulação sanguínea e no condensado da fumaça do cigarro. Crê-se que o ácido húmico exista nos pulmões do fumante de cigarros devido à combustão incompleta do tabaco.61 60 Weber, Jerzy, “Properties of humic substances”, Agricultural University of Wroclaw, Institute of Soil Science and Agricultural Environment Protection, Grunwaldzka, 53, 50-357 Wroclaw, Poland. <http://www.ar.wroc.pl/~weber/humic.htm#start>. Online. June 9, 2004 61 Paciolla, M. D.; Davies, G., and Jansen, S., Environ. Sci. Technol., 33, 1814-1818 (1999) 29 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos O O COOH COOH OH OH OH O OH OH COOH COOH COOH MeO OH O OH OH O OH CH3 HOOC CH3 COOH O O OH COOH OH OH OH O OH O O OH HOOC COOH O O COOH OH OH OH NH2 H H Figura 23 – Fragmentos modulares de ácido húmico (Paciolla, 1999). As melanoidinas são substâncias escuras, amarronzadas, de estrutura química polimérica, alto peso molecular (>12.000 Daltons) e de difícil caracterização química. Numerosas tentativas foram empreendidas para isolar e purificar melanoidinas de alimentos como café, cerveja preta e molhos de soja. Identificação de estruturas coloridas, após cuidadosa hidrólise do esqueleto protéico fornece informação química útil sobre os grupos cromóforos responsáveis pela cor. A estrutura química de uma melanoidina chamada pronil-L-lisina (Fig. 24) foi identificada como um antioxidante, formado durante o tratamento térmico de misturas em reações do tipo Maillard. Essa espécie química resulta da reação entre a cadeia lateral da lisina e acetilformoina (CH3COCH(OH)COCOCH3), tendo sido detectado e quantificado na crosta e no miolo do pão por HRGC–MS (High-Resolution Gas Chromatography–Mass Spectrometry, cromatografia gasosa de alta resolução acoplada à um espectrômetro de Massa), no modo de ionização química. Foi confirmado que pronil-L-lisina modula uma enzima quimiopreventiva da fase II, a glutation S–transferase (GST). A indução dessa enzima pela pronil-L-lisina representa uma estratégia promissora na prevenção ao câncer. Recentemente, 30 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos Melanoidinas do pão e café foram descritas como ingredientes potenciais prebióticos (Castillo, 2006). N NNOH OHOH N N N N N N CH3 CH3 O R H R O H R O H O H R O H O H R O H O H R O N CH3 OH O CH3 OH N CH3 OH O CH3 OH NH2 Figura 24 – Pronil L-Lisina ancorado em proteína. A formação das melanoidinas, de um ponto tecnológico, é essencial ao sabor, cor e textura dos alimentos. Vários estudos demonstraram a alta capacidade antioxidante das melanoidinas, que contribuem substancialmente para a vida de prateleira (validade) dos produtos alimentícios termicamente tratados e de processos fisiológicos in vivo. As propriedades antioxidantes das melanoidinas foram demonstradas através de um mecanismo de quebra da cadeia, captura de oxigênio e quelação de metais sem mostrar efeitos citotóxicos. Atualmente se supõe que as melanoidinas presentes, por exemplo, no café ajam como antioxidantes mas também na ativação quimiopreventiva de enzimas. Ademais, vários compostos de Maillard identificados como constituintes de melanoidinas inibem o crescimento de células tumorais (Castillo, 2006). 9 – Reação intrínseca de Maillard em produtos farmacêuticos A reação de Maillard é de importância crucial na industria farmacêutica, visto que muitos medicamentos contem o grupo amina na sua estrutura química. Um exemplo disto é o largo empregado da lactose, um açúcar redutor, como excipiente ou diluente em formulações farmacêuticas de cápsulas e tabletes que freqüentemente incluem compostos contendo o grupo amina, devido ao baixo preço e às suas características físico-químicas (alta pureza, excelente compressibilidade e estabilidade). 31 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos 10 – Reação de Maillard no leite e derivados O carboidrato característico do leite70 é a lactose, único açúcar presente no leite de todas as espécies de mamíferos que o produzem, não ocorrendo em outro lugar, com raras exceções. O nome sistemático da α−Lactose (Fig. 27) é: O-β-D- galactopiranosil-(1→4)-α-D-glicopiranose e da β−Lactose: O-β-D-galactopiranosil- (1→4)- β-D-glicopiranose). A forma α da lactose existe tanto no estado anidro (C12H22O11 = 342.3) como no mono-hidratado (C12H22O11,H2O = 360.3) enquanto a forma β existe apenas no estado anidro.71 No leite em pó a lactose é o constituinte principal representando cerca de 50% dos sólidos totais. No leite de vaca in natura o conteúdo em lactose se situa na faixa dos 5% enquanto no dos humanos é de cerca de 7%.72 Devido à instabilidade do carbono anomérico C1 a configuração ali varia (mutarrotação) entre α e β na lactose em solução (ver explicações na nota 22). β-D-Galactose β-D-Glicose O OHOH OH OH O O OH OH OH H OH O-β−Galactopiranosil-(1 4)-α-D-Glicopiranose β 1 Ligação β−1,4-glicosídica 12 34 O O O OH α O O OOH β Galactose Glicose Galactose Glicose Carbono anomérico O OHOH OH OH O O OH OH H OH OH β-Lactose α 1 Ligação β−1,4-glicosídica 12 34 β-D-Galactose α-D-Glicose α-Lactose O-β−Galactopiranosil-(1 4)-β-D-Glicopiranose β (1 4) β (1 4) Figura 27 – Estrutura conformacional da α− e β−lactose 70 O leite de vaca contém traços de outros oligossacarídeos, formados de 2, 3 ou 4 unidades de lactose, glicose, galactose, ácido neuramínico, manose e acetil glicosamina (deMan, John M., 1999). O leite humano contém cerca de 0,3–0,6% de oligossacarídeos que contem o dissacarídeo lactose na sua estrutura química, alguns dos quais são importantes fontes de energia para o crescimento de uma variedade específica do Lactobacillus bifidus, microrganismo predominante da flora intestinal dos recém-nascidos na fase da amamentação – fator Bifidus. A utilização da lactose como fonte de energia deve ser precedida de sua hidrólise nos constituintes monossacarídeos D-glicose e D-galactose (Fennema, Owen R., 1996). 71 Sweetman, S. C. (Ed), Martindale: The Complete Drug Reference, London: Pharmaceutical Press (2007). 72 deMan, John M., Principles of Food Chemistry, 3rd Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999). 34 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos No leite a lactose (um dissacarídeo de galactose e glicose, ligados através de uma ligação β-1,4 glicosídica) reage com o aminoácido lisina da caseína durante o processamento e o armazenamento, dando, na sua fase inicial, o produto do rearranjo de Amadori (lactulosilisina, Fig. 28), cuja degradação leva à formação de todos os produtos avançados da reação de Maillard, tais como lisilpirralina, pentosidina,73 hidroximetilfurfural, metilfurfural, furfural, maltol e ácido fórmico (Fig. 30). A fase avançada da reação de Maillard dá lugar ao estágio final no qual se formam os pigmentos marrons – as melanoidinas (Van Boekel, 1998). Nessa fase, de grande complexidade química, ocorrem reações de polimerização das proteínas, dando produtos de pesos moleculares da ordem de milhares de Daltons. α-Lactose O OHOH OH OH O O OH OH OH H OH O OHOH OH OH O CH=O OH OH OH OH O NH2 NH2 OH Lisina (livre ou ligada à proteina) ω α O OHOH OH OH O OH OH OH OH N OH O NH2 OHH -H2O O OHOH OH OH O OH OH OH OH N+ O NH2 OHH H Base de Schiff (sofre o rearranjo de Amadori) O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OHH OH Enol-amina Lactulosillisina (Produto de Amadori) O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH O H Figura 28 – Reação de Maillard no leite levando ao produto de Amadori Lactulosilisina destruindo o aminoácido livre ou tornando a proteína a qual a lisina estava ligada inviável para o processo digestivo (Adaptado de van Boekel, 1998) Duas conseqüências indesejáveis da lactose: Intolerância – causada por uma insuficiência em β-galactosidase intestinal, na qual a lactose não é completamente hidrolisada no intestino delgado e como dissacarídeos não são absorvidos ela passa para o intestino grosso onde provoca um afluxo de líquido resultando em diarréia e fermentação por microrganismos 73 Pentosidina, um produto fluorescente de ligações cruzadas lisina-arginina que se acumula no colágeno e na lente do cristalino com a idade, foi o primeiro PFGA caracterizado quimicamente em 1989 por Vincent M. Monnier e David R. Sell (J. Biol. Chem. 264, 21597-21602.) 35 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos levando a cólicas e flatulência. Uma pequena proporção de bebês nascem com uma deficiência em β-galactosidase e são incapazes de digerir a lactose. Em recém- nascidos normais a atividade especifica da β-galactosidase intestinal alcança um máximo no pós-parto, declinando na infância, estimando-se que em 70% da população mundial essa diminuição é suficiente para causar intolerância nos adultos. A capacidade de metabolizar a lactose diminui após os 70 anos de idade levando à catarata (Fox, P. F. & McSweeney, 1998), e Galactosemia, incapacidade de metabolizar a galactose devido a uma deficiência hereditária em galactokinase, enzima cuja falta causa acúmulo de galactose no sangue e nos tecidos. O acúmulo de galactose força o metabolismo a usar outras vias resultando em outros produtos, como o galactol, que se acumula no cristalino dos olhos causando a catarata em humanos em 10 a 20 anos, se o consumo de produtos com galactose (leite, legumes) for continuado. A falta de uma segunda enzima da seqüência enzimática do metabolismo, a galactose-1-phosphate (Gal-1-P):uridyl transferase, causa o acúmulo de galactose e Gal-1-P. Este último interfere na biossíntese de glicoproteínas e glicolípideos (essenciais às membrana, por exemplo, das células do cérebro) e resulta em retardamento mental irreversível dentro de 2 a 3 meses se o consumo de alimentos contendo galactose não cessar (Fox, P. F. & McSweeney, 1998). Furosina e furfural são dois dos produtos da reação de Maillard usados como indicadores dos efeitos do aquecimento (leite UHT – Ultra-High-Temperature) na qualidade do leite. A lactulose74 (Fig. 29) é uma das modificações químicas induzidas pelo processo de esterilização do leite. Trata-se de um epímero da lactose, no qual o fragmento glicose do dissacarídeo foi isomerizado a frutose. A lactulose não ocorre na natureza mas pode ser obtida sob condições alcalinas através da reação de Lobry de Bruyn–Alberda van Ekenstein75 ou como um produto secundário de baixo 74 Nome Químico: 4-O-β-D-Galactopyranosyl-d-fructose; fórmula molecular: C12H22O11=342.3, CAS: 4618-18-2 Fonte: Sweetman, S. C. (Ed), Martindale (2007) 75 Um dos mais importantes rearranjos que sofrem monossacarídeos redutores em solução alcalina é esse descrito por Lobry de Bruyn e Alberda van Ekenstein numa série de artigos de 1890. A pesquisa teve origem numa observação feita por de Bruyn [De Bruynl, Obryr: Rec. Trav. Chim. 14, 156 (1895)] segundo a qual o poder rotatório óptico de soluções diluídas de glicose contendo hidróxido de sódio, em baixa concentração, diminuía de 36 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos O acastanhamento não-enzimático produzido pela reação de Maillard é um dos mais importantes fatores na deterioração dos alimentos. Essas reações dependem da atividade da água (water activity, aw)79 ou de alguma umidade no produto. O escurecimento do leite em pó mantido a 40º por 10 dias em função da água é um exemplo, assim como o desaparecimento da lisina, o mais reativo dos aminoácidos (ε−NH2 livre), como resultado das reações que tornam o produto amarronzado. A destruição da lisina, um aminoácido essencial, reduz o valor nutricional do produto.80 Esse “amarronzado” nos produtos alimentícios pode ser desejável ou indesejável. Na crosta dos pães é desejável, mas no leite evaporado e esterilizado é indesejável. Lactulosillisina (Produto de Amadori) O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH O H HH Condições ácidas O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OHH OH 1,2-enolização H+ H+ O OHOH OH OH O OH OH OH N+ O NH2 OHH OH H OH2 O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OHH OH H OH-H+ O OHOH OH OH O OH OH OH OH H O H -Lisina O OHOH OH OH O OH OH OH OH OH H O OHOH OH OH O OHOH OH O H O OHOH OH OH O OHOH O O H - H2O 3 3 3-Desoxosona Desidratação O OHOH OH OH OH FurfuraisGalactose N CHO OH NH2 COOH Lisinopirralina + + O CHOR Rota 1 Lactulosillisina (Produto de Amadori) O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH O H H Condições neutras 2,3-enolização 3 2 O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH OH H 3 2 O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH OH H - Lisina O OHOH OH OH O OH O OH OH O OHOH OH OH O CH3 OH O OH O 1-Desoxosona 1 β-Piranona O O-Gal OH CH3 O CH3 OH OO-Gal CH3 OH OO-Gal OH OH 3-Furanona O COCH3 O-Gal CiclopentenonaGalactosil-Isomaltol + + + + Galactose = O-Gal CH3 OH OH OH OH OH O OHOH OH OH OH+ Redutona Galactose Rota 2 79 Atividade da água (aw) é definida como a razão da pressão de vapor da água pura e uma solução: aw = p/po, onde p = pressão parcial da água no alimento e po = pressão de vapor da água na mesma temperatura. Um material com alto conteúdo de umidade, quando este excede a quantidade do sólido, aw é próximo ou igual a 1,0. Esse valor nos dá um parâmetro seguro para comparar processos químicos e bioquímicos. Exemplo: crescimento de microrganismos é zero quando aw = 0,2; bolores e leveduras começam a crescer quando aw se situa entre 0,7 e 0,8; crescimento bacteriano tem lugar quando aw alcança 0,8. Reações não-enzimáticas ou de Maillard, que formam produtos coloridos, não ocorrem na camada da água ligada (água de Langmuir), na faixa em que a aw = 0,0 a 0,25. Fonte: deMan, John M. (1999). 80 deMan, John M.; Principles of Food Chemistry, 3rd Ed., Aspen Publishers, Inc. Gaithersburg, Maryland (1999). 39 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos Lactulosillisina (Produto de Amadori) O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH O H H Condições alcalinas O OHOH OH OH O OH OH OH N O NH2 OH O H H OH - _Galactose OH O OH N O NH2 OH O H H OH O OH N O NH2 OH O H HH H OH O OH N O NH2 OH OH H H H 4-Desoxosona _OH- O OH N O NH2 OH O H H 4-Desoxiaminoredutona 4-Desoxosona N O NH2 OH O OH OH 5-desidro-3-hidroxipiridona 12 3 1 2 4 4 3 5 OH O OH N O NH2 OH O H H Rota 3 Figura 31 – Estágio avançado da Reação de Maillard, no qual o produto de Amadori (lactulosilisina, Fig. 27) sofre degradação via duas rotas: a rota da 3-desoxosona via formação de 1,2–enol que ocorre em pH menor que 7 e a rota da 1-desoxosona via formação de 2,3-enol que se dá em meio neutro. Em vista do pH do leite (pH = 6,6) a degradação dos compostos de Amadori deve ocorrer principalmente pela via da 2,3– enolização. Uma terceira rota via 4-desoxosona tem importância para dissacarídeos apenas em condições levemente alcalinas. Todas as rotas levam à formação de intermediários muito reativos, as desoxosonas (adaptado de Boekel, 1998). 11 – Reação de Maillard no Café O café é a segunda bebida mais consumida no mundo após a água.81 Como conseqüência os produtos da reação de Maillard formados durante o processo de torrefação dos grãos tem um impacto global sobre o bem estar da humanidade. Essa aceitabilidade mundial parece ser creditada ao aroma único do café torrado, uma conquista das reações de Maillard inicialmente baseada no olfato que logo se associou aos prazeres do efeito farmacológico da bebida. Embora, segundo a lenda vinda do Yêmen, o hábito de comer os grãos de café tenha se iniciado após observar o comportamento inquieto de cabras com insônia após ingerirem os frutos nas pastagens – o que atraiu seus observadores ao cardápio estimulante – parece óbvio que os animais foram seduzidos pelo cheiro. Num longo e minucioso tratado sobre o café publicado inicialmente em 1922, William H. Ukers,82 nos conta que a primeira menção segura sobre propriedades e usos da planta é de autoria de um médico Árabe (El Razi, 850-922 A.D.) do final do século 9 A.D., aparecendo posteriormente como planta selvagem na Abissínia e no 81 Nehlig, Astrid (editor): Coffee, Tea, Chocolate, and the Brain, CRC Press, (2004). 82 Ukers, William H.; All About Coffee, 2nd Ed., The Tea and Coffee Trade Journal Company, New York (1935) 40 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos Yêmen (distrito da Arábia). Outras autoridades acreditam que o primeiro cultivo do café foi no Yêmen e data de 575 A.D. Aos Árabes é concedido o crédito pela descoberta e promoção do café como uma bebida (qahvah, que através do Turco kahveh deu café), bem como a sua propagação, que se espalhou pelo mundo nos séculos seguintes. O prazer associado ao consumo do café se deve aos efeitos produzidos no cérebro pelos alcalóides da bebida, um grupo de compostos heterocíclicos com o esqueleto carbônico das purinas, as metilxantinas, das quais a cafeína é o principal componente e o mais importante (Fig. 32). N N N N H O O CH3 CH3 Cafeina Teofilina Teobromina 1 3 9 6 7 N N N N H O O CH3 CH3 N NH N N O O CH3 CH3 NH N N N O O CH3 CH3 Paraxantina N N N N O O CH3 CH3 CH3 CH3 O Teacrine N N N N H O CH3O CH3 CH3 O Liberina N N N N O CH3O CH3 CH3 O CH3 Metilliberina Figura 32 – Alcalóides do café exercem notável efeito sobre o cérebro que se manifesta no humor, performance, memória, sono e na cognição. Potenciais e incomuns efeitos terapêuticos relatados pelas pesquisas desta década incluem a doença de Parkinson, isquemia, epilepsia e até mesmo o câncer. Fonte: Flament, Ivon (2002). Sendo a segunda bebida mais ingerida, a cafeína é também a substância psico-ativa mais consumida do mundo (Flament, I., 2002), juntamente com milhares de outros compostos já caracterizados. Os constituintes não-cafeínicos formam uma plêiade de compostos de baixo peso molecular, entre os quais os mais conhecidos são os ácidos clorogênicos, ésteres derivados dos ácidos quínico, caféico e ferrúlico. A figura 33 mostra a estrutura química de alguns ácidos clorogênicos identificados no café torrado, sendo o primeiro deles, o ácido 5-cafeoil-quínico (5-CAQA) o mais abundante. (Nehlig, A., 2004). 41 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos acredita-se que o acúmulo progressivo de produtos finais da glicosilação avançada (PFGA) no cristalino contribui para acelerar a cataratogênese. O nível de PFGA parece estar diretamente relacionado com a pigmentação amarela na lente humana. Igualmente o grau de glicemia está diretamente relacionado ao conteúdo de PFGA em cães diabéticos. Ácido ascórbico, como ascorbato, e glicose mostram ser os principais agentes da glicosilação das proteínas da lente do cristalino humano. Esses carboidratos geram espécies de alta reatividade química, entre eles, compostos α- dicarbonílicos que propagam as reações de Maillard. Um desses compostos é o Metilglioxal (MG), CH3COCHO. A lente do cristalino humano normalmente contém 20 vezes mais MG que no plasma, porém no diabético a concentração de MG na lente é maior que a de indivíduos normoglicêmicos. MG é extremamente reativo com proteínas, dando não só PFGA, mas também radicais livres durante sua formação.84 Ácido Ascórbico está presente na lente do cristalino em quantidades relativamente elevadas (até 2 mM) onde, segundo estudos, sofre degradação oxidativa com a idade contribuindo para a formação da catarata. Vários produtos da reação de Maillard foram identificados na lente humana, entre os quais, pentosidina e carboximetil-lisina formados a partir de ascorbato. Estudos mostraram que o desenvolvimento da catarata pode ser impedido em animais com diabetes, induzida experimentalmente, através da inibição da reação de Maillard. Outro produto importante gerado via reação de Maillard entre proteínas e ascorbato é o Oxalato Mono-Alquilamida (OMA):85 O OH OH O OH OH Ácido L-ascórbico [Ο] O O O O OH OH Ácido L-Desidro-ascórbico COOH CH2OH O O H OH H OH 2,3-Dicetogulonato NH2R HOOC N O O R H R = Lisina Oxalato Mono-Alquilamida 84 Shamsi, Farrukh A.; Sharkey, E.; Creighton, D.; and Nagaraj, R. H.: Maillard Reactions in Lens Proteins: Methylglyoxal-mediated Modifications in the Rat Lens, Exp. Eye Res., 70, 369-380 (2000) 85 Nagaraj, H. R.; Shamsi, F. A.; Huber, B., and Pischetsrieder, Monika: Immunochemical detection of oxalate monoalkylamide, an ascorbate-derived Maillard reaction product in the human lens, FEBS Letters, 453, 327-330 (1999). 44 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos Figura 34 – Possível rota para Oxalato de Mono-Alquilamida (OMA) que foi identificado como um produto final da glicosilação avançada (PFGA) formado pela reação de Maillard entre ácido ascórbico e proteínas. Compostos α-dicarbonílicos provenientes de várias rotas metabólicas, como o glioxal (CHO-CHO) e o metilglioxal (CH3COCHO) foram reconhecidos como os principais intermediários e precursores na formação dos PFGA. Alguns desses PFGA que se derivaram diretamente do metilglioxal foram isolados, entre os quais estão a imidazol-lisina, Nε−carboxietil-lisina (CEL) e 5-hidroxi-imidazolona, detectados em proteínas in vivo. Quantidades significativamente maiores de imidazol-lisina MOLD e GOLD (Fig. 35) foram encontradas na lente do cristalino em humanos com catarata.86 O NH3 + NH2 O- Proteina O O CH3 H Metilglioxal O O H H Glioxal Lisina N N+ ONH3 + O- O NH3 +O- N N+ O NH3 + O- O NH3 + O- CH3 Glioxal-Lisina Metilglioxal-Lisina MOLDGOLD Figura 35 – Formação de ligações cruzadas intra- e intermoleculares envolvendo espécies α-dicarbonílicas altamente reativas (Glioxal e Metilglioxal) resultando na formação dos chamados produtos finais da glicosilação avançada (PFGA). Outros intermediários α-dicarbonílicos altamente reativos tanto in vivo quanto nos alimentos e que estabelecem ligações cruzadas entre proteínas, são mostrados na Fig. 36. Esses PFGA podem ativar receptores celulares.87 86 Chellan, P. and Nagaraj, R. H.: Protein Crosslinking by the Maillard Reaction: Dicarbonyl-Derived Imidazolium Crosslinks in Aging and Diabetes, Arch. Biochem.Biophys., 368, 98-104 (1999). 87 Reihl, O.; Rothenbacher, T. M.; Lederer, M. O., and Schwack, W.: Carbohydrate carbonyl mobility––the key process in the formation of α-dicarbonyl intermediates, Carbohydrate Research, 339, 1609–1618 (2004). 45 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos frag. lisina O O OH OH OH H O O OH CH3 OH OH O O OH OH N R H O OH N R O OH H H O OH N R O H H CH3 OH N R O O H O NH2 CH2 OHR = - 3-Desoxi hexos-2-ulose 1-Desoxi hexo-2,3-diulose N6-(5,6-Dihidroxi-2,3- dioxohexil)-L-lisina N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina N6-(2-Hidroxi-4,5- dioxopentil)-L-lisina N6-(2-Hidroxi-3,4- dioxopentil)-L-lisina Figura 36 – Intermediários dicarbonílicos responsáveis pelas ligações cruzadas intra- e intermoleculares nas proteínas. Em todos, o Nε da lisina se liga diretamente ao C1 do açúcar envolvido. N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina não só é essencial na formação do principal agente de ligação cruzada de Maillard, o glicosepane (Fig. 1), mas representa o intermediário chave para outros produtos de Maillard (Schwack, 2004). CH=O OHCH2OHOH OH OH D-Glicose OCH2OHOH OH OH H OH 1 1 Aldose Base de Schiff - H2O O NH2 NH2 OH (Lys) OH OH OH OH N O NH2 OH OH OH OH OH OH N O NH2 OH O H Produto Amadori OH OH OH OH N O NH2 OH OH H - H2O OH OH OH OH N R O H Rota B OH OH OH OH N R OH H O O OH N R OH H OH OH OH N R OH H OH OH O N R OH H O OH N R O OH H N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina (Didesoxiosona) OH OH OH N R OH H OH - H2O O OH OH N R OH H OH O OH OH N R OH H OH OH OH OH N R OH H O OH OH OH N R OH H OH OH O OH N R OH H OH Rota A Figura 37– Duas rotas prováveis para a formação do precursor do glicosepane (Fig. 1), o intermediário N6-(2,3-Dihidroxi-5,6 -dioxohexil)-L-lisina, α-dicarbonílico, de alta 46 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos C NH NHNH2 NH2 Aminoguanidina N OH N OH NH NH2 CH3 OH N N NH NH2 OH OH OH OH OH OH N N NH NH2 3-desoxi-D-eritro-hexos-2-ulose (3-Desoxiglucosone) OH O CH2OH OH O H OH CH3O CH2OH O OH + + 1-Desoxi-2,3-D-eritro-hexodiulose (1-Desoxiglucosone) + Figura 39 – Formação de aminotriazinas via reação de aminoguanidina com desoxiglicosonas. 13 – Inibidores da Reação de Maillard: promovendo a saúde Após haver estudado as múltiplas possibilidades de alvos moleculares em plantas, animais e microrganismos na promoção do bem estar físico e mental do homem, sem haver encontrado o elixir da juventude eterna, a ciência agora se volta para procurar nos vilões alimentares, no fruto produzido pela indústria,91 vestígio de algo benéfico à saúde. Quem procura, acha. Assim, vários produtos favoritos da humanidade vem sendo minuciosamente investigados, numa frenética busca pelo lado bom dos vilões. Na área dos alimentos, o café é talvez o mais pesquisado, por ser a segunda bebida mais consumida no mundo, depois da água. O patrocínio das pesquisas é indiretamente assegurado pela rede industrial do café. Ao descobrir propriedades benéficas num produto, todas as demais propriedades maléficas são esquecidas, um triunfo dos noticiários da mídia mundial sobre a vontade de todos. O consumo explode e essa é uma boa razão para se investir na ciência. O tabaco foi alvo dessa investigação, numa tentativa de justificar seu consumo. 91 “If man made, don´t eat it” – Se é feito pelo homem, não coma! diz o slogan eco-correto Americano. 49 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos O principal alvo da reação de Maillard nos alimentos é torná-lo palatável, estimular o apetite e o crescimento. Crê-se que o processamento dos alimentos crus através do fogo a temperaturas altas desempenhou um papel crucial na evolução permitindo aos humanos extrair grandes quantidades de calorias de sementes das angiospermas, de outra forma tóxicas ao consumo.92 Uma evidência, descoberta ao acaso, para o papel dos produtos de Maillard no controle do peso corporal e da glicemia mostra que indivíduos diabéticos submetidos a uma dieta com baixo conteúdo em AGEs (PFGA), por um período de 6 semanas, tiveram uma queda de peso corporal estatisticamente significativa, além do impacto na média da taxa glicêmica, resultando numa redução de 20%. Esses resultados evidenciam que restrições alimentares levam a uma diminuição no estresse carbonílico e por conseguinte nas proteínas modificadas de vários tecidos que se refletirá numa diminuição dos produtos de Amadori, carboximetil lisina (CML) e pentosidina, no colágeno da pele, enfim, na longevidade. Galinhas tratadas com a restrição alimentar mostraram diminuição da pentosidina no colágeno e melhora nos índices de firmeza do colágeno de tendão (Monnier, 2003). Métodos de prevenção ao “escurecimento” de produtos na indústria alimentícia se baseiam no controle da umidade, temperatura, pH, uso inibidores. Um dos mais efetivos inibidores é o dióxido de enxofre (SO2). Dióxido de enxofre combina-se com o grupo carbonila de uma aldose dando um produto de adição: NaHSO3 + RCHO RCHOHSO3Na Acredita-se que o dióxido de enxofre reaja com os produtos de degradação dos amino-açúcares impedindo a formação das melanoidinas. Uma grande desvantagem no uso do dióxido de enxofre é que ele reage com tiamina (Vitamina B1, atua como uma coenzima – cocarboxilase – agindo no metabolismo dos 92 Monnier, Vincent M.: Intervention against the Maillard reaction in vivo, Arch. Biochem. Bioph., 419 1–15 (2003). 50 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos carboidratos) e proteínas reduzindo o valor nutricional dos alimentos, não sendo permitido o seu uso nos produtos onde a tiamina esteja presente. (REFERENCIA) O acúmulo de AGEs pode ser prevenido através de intensa terapia da hiperglicemia, eliminação da cetose e prevenção da peroxidação de lipídeos e o estresse oxidativo por meio de terapia antioxidante. O acúmulo de AGEs pode ser prevenido através da captura de alfa-oxoaldeidos com aminoguanidina e compostos similares.93 Estudos experimentais in vitro indicam que a administração de antioxidantes eficientes resulta na prevenção ao aumento da acumulação dos produtos finais da glicosilação avançada (AGEs) e do cruzamento de ligações no colágeno em animais de laboratório. A incubação de colágeno com glicose sob reduzida concentração de oxigênio ou sob condições antioxidativas resultam na inibição da formação de carboximetil-lisina (CML – principal AGE do colágeno e lente) e pentosidina.94 Reagentes de captura de compostos α−dicarbonílicos Inibidores dos produtos finais da glicosilação avançada, PFGA, piridoxamina (PM) e aminoguanidina (AM), são nucleófilos que capturam instantaneamente os precursores de AGEs no momento que são gerados in vivo ou in vitro. O aspecto característico desses inibidores é a presença do grupo funcional nucleofílico amina ou hidrazina que pode interceptar compostos carbonílicos reativos, interrompendo a cadeia de reações que leva aos AGEs. Outros inibidores, tais como quelantes de íons metálicos como DTPA (ácido dietilenotriaminopentacético) e antioxidantes de captura de radicais livres, R-tocoferol e ácido ascórbico, exercem sua atividade limitando a aceleração oxidativa da glicosilação. Piridoxamina (PM) foi identificado como um inibidor de AGE do estágio final da glicosilação (Pós-Amadori) e como um 93 Thornalley, Paul J.: Biochemistry of Advanced Glycation Endproduct generation and its inhibition, SYMPOSIUM “Advanced Glycation End Products (AGEs)” May 12 – 14, 2000, Jena, Germany 94 Sajithlal, G. B.; Chithra, P., and Chandrakasan, Gowri: Effect of Curcumin on the Advanced Glycation and Cross-linking of Collagen in Diabetic Rats, Biochem. Pharmacol. 56, 1607–1614 (1998) 51 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos recentemente acreditava-se que a reação de Maillard in vivo era um processo inteiramente não-enzimático e unidirecional, isto é, irreversível. Contudo, essa perspectiva mudou após a descoberta de uma enzima desglicosilante nos eritrócitos humanos (FN3K, frutosamina-3-kinase que age sobre as cetosaminas) a qual especificamente reconhece e metaboliza produtos de Amadori ligados à proteína. Esse achado sugere que a reação de Maillard pode ser reversível in vivo através de um mecanismo ativo de desglicosilação que recupera aminas glicosiladas das proteínas, prevenindo a formação dos AGEs.98 N NH2 CH3 OH OH N NH2 CH3 OH OH (CH3)2N 6-Dimetilamina Piridoxamina Piridoxamina: 4-Aminometil-5-hidroxi-6 -metil-3-piridinemetanol N NCH3 N+ NH2 S CH3 OH Tiamina: 3-(4-Amino-2-metilpirimidin-5-ilmet il)-5-(2-hidroxietil)-4-metiltiazolio NH O OH Cl Cl Diclofenac: Ácido 2-(2,6-Dicloroanilino)fenil] acético COOH O O CH3 Aspirina: Ácido O-Acetilsalicilico NSH COOHO CH3 H Captopril: 1-[(2S)-3-Mercapto-2- metilpropionil]-L-prolina Ramipril: Ácido(2S,3aS,6aS)-1-{N-[(S)-1-Etoxicarbonil-3-fenilpropil] L-alanil}peridrociclopenta[b]pirrol-2-carboxilico O O N N CH3 H O COOH H H N N NH NH2 Hidralazina: 1-Hidrazinoftalazina C NH NNH2 NH2 H Aminoguanidine C NH NN HCH3 CH3 NH NH2 Metformina: 1,1-Dimetilbiguanida O N+ S CH3 CH3 O N+ S PTB: N-Fenacil-1,3-tiazolio, brometo de Br- ALT-711, ALAGEBRIUM: N-Fenacil-4,5-dimetil-1,3-tiazolio, cloreto de NH O S N H O N N CH3 CH3 OPB 9195 N H N COOH N NH2 O H Carnosina Figura 43 – Estrutura química de alguns inibidores dos produtos finais da glicosilação avançada (AGE) mais representativos. Esses inibidores podem ser classificados em três classes diferentes: 1 – Reagentes de captura carbonílica, que atenuam o estresse carbonílico; 2 – quelantes de íons metálicos, os quais suprimem reações de glicosilação e 3 – Bloqueadores de condensação cruzada, que revertem o cruzamento de AGEs. Aminoguanidina foi o primeiro inibidor de AGEs a iniciar ensaios clínicos, mas devido a efeitos colaterais (causa depleção da vitamina B6) foram interrompidos. Aminoguanidina inibe a formação de AGEs via reação com o produto de Amadori. Piridoxamina e ALT-711 são inibidores de AGEs. Os sais de Tiazolio OPB-9195 e ALT-711 são bloqueadores de enzimática de grupos amina nas proteínas, particularmente o εNH2 da lisina, seguida pela formação de compostos aromáticos policíclicos, designados como “Advanced Glycosylation End Product” (AGEs) Fonte: Robert, L.: Cellular and Molecular Mechanisms of Aging and Age Related Diseases, Pathol. Oncol. Research, 6, 3-9 (2000). 98 Szwergold, B.; Manevich, Y.; Payne, L., and Loomes, K., Fructosamine-3-kinase-related-protein phosphorylates glucitolamines on the C-4 hydroxyl: Novel substrate specificity of an enigmatic enzyme Biochem. Biophys. Res. Commun., 361 870–875 (2007). 54 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos condensação cruzada de AGEs. Piridoxamina, OPB-9195 e carnosina são quelantes de ions metálicos, atenuando o estresse oxidativo e suprimindo a glicoxidação subseqüente. OPB-9195 previne a neuropatia diabética e reduz os níveis de AGEs e carnosina é usada para reverter e prevenir a catarata senil. Metformina, um fármaco normalmente usado no diabetes também age como inibidor de AGEs. Tiamina: atividade bloqueadora de AGEs; Diclofenac: fármaco antinflamatório (Voltaren), inibidor dos produtos de Amadori; aspirina: retarda a catarata e diminui a glicosilação do cristalino in vivo e in vitro, diminui a pentosidina na pele; captopril: diminui a fluorescência associada com a glicosilação das proteínas; ramipril: inibe a fluorescência dos AGEs; hidralazina: fármaco anti-hipertensivo, reduz a pentosidina renal, captura carbonila, quelante de metais de transição. (Reddy, 2006; Monnier, 2003).99 ALT-711, um poderoso rompente de AGE-condensação cruzadas, tem a habilidade de reverter mesmo a condensação cruzada já formada. Administração oral de ALT-711 resulta em rápida melhora na elasticidade do miocárdio endurecido em animais de laboratório.100 14 – A estrutura química do aroma e do sabor dos alimentos A reação de Maillard nos alimentos ocorre quando proteínas desnaturadas na superfície da carne, por exemplo, se recombina com açúcares presentes. A combinação cria o odor característico da carne assada ou cozida e a cor se altera. A reação se dá prontamente numa temperatura entre 150-260º C. Os odores mais marcantes aparecem na superfície. Na década de 40 notou-se a ligação entre a reação de douramento e o odor. Durante a Segunda Guerra Mundial, os soldados reclamavam do pó de ovo da ração, que se tornava escuro e com um odor pouco atrativo. Pesquisadores descobriram que o sabor alterado e o odor abominável eram devido à reação de Maillard. Mesmo mantendo o produto à temperatura ambiente a concentração de aminoácidos e açúcares na mistura desidratada eram altos o suficiente para iniciar a reação. Grande parte das pesquisas realizadas entre 1940- 1950 se centrou na prevenção desta reação. Esse esforço científico resultou na descoberta do papel que a reação de Maillard desempenha na criação de aromas e sabores.101 A indústria moderna do pó de ovo desidratado se tornou possível quando se encontrou um método prático para eliminar a glicose do albúmem. A presença da glicose na clara do ovo leva ao rápido escurecimento, perda da solubilidade e desenvolvimento de fluorescência. A prevenção destas alterações indesejáveis no pó 99 Reddy, V. Prakash, and Beyaz, A.: Inhibitors of the Maillard reaction and AGE breakers as therapeutics for multiple diseases, Drug Discovery Today, 11, 646-654 (2006). 100 Vasan, Sara; Foiles, P., and Founds, H.: Therapeutic potential of breakers of advanced glycation end product–protein crosslinks, Arch. Biochem. Biophys., 419, 89–96 (2003). 101 http://www.exploratorium.edu/cooking/meat/activity-maillard.html 55 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos de ovo desidratado, foi possível comercialmente submetendo-se a clara do ovo a um processo de fermentação bacteriana antes de desidratá-la. Desta forma o produto se torna mais estável.102 A estrutura química do odor do “açúcar queimado” associado a produtos como caramelo, algodão-doce, fruta assada como abacaxi ou torrado como o café e a chicória apresentam similaridade molecular estrutural, notadamente um sistema carbonílico α,β-insaturado, com grupo –OH no carbono-α, é um aspecto comum. Maltol (3-hidroxi-2-metil-4H-piran-4-ona, Fig. 44), uma importante substância intensificadora do sabor e do aroma de alimentos e bebidas (flavorizante) está presente no cacao, caramelo, chicória, café, leite, malte torrado e pão, entre outros. O odor é comumente identificado como de “algodão-doce”. O análogo, etilmaltol (3- hidroxi-2-etil-4H-piran-4-ona) é 4-5 vezes mais ativo que o maltol. Furaneol103 ou 2,5-dimetil-4-hidroxi-2H-furan-3-ona é um dos principais princípios organolépticos do abacaxi. O furaneol desempenha um papel essencial na flavorização de inúmeras frutas, como goiaba, lichia, acabaxi, framboesa, morango, tomate, entre outras, bem como em produtos torrados como café, bife cozido, malte, avelã, amêndoa torrada e pipoca. Ciclotene ou 3-Metil-2-ciclopenten-2-ol-1-ona ocorre no cacao, café, raiz de licorice (Glycyrrhiza glabra, família Fabaceae), malte, amêndoa torrada e em quase todos os produtos torrados que continham açúcar. O O OH CH3 Maltol 3-hidroxi-2-metil- 4-pirona O O OH CH3 Etil Maltol 3-hidroxi-2-etil- 4-pirona O OH CH3OCH3 Furaneol 2,5-Dimetil-4-hidroxi -2H furan-3-ona O OH CH3 Ciclotene 3-Metil-2-ciclo- penten-2-ol-1-ona Maple furanona 5-Etil-3-hidroxi-4-metil- 5H-furan-2-ona O O OHCH3 CH3 Figura 44 – Estrutura química de alguns importantes compostos cujo aroma é característico dos produtos dos quais eles exalam. Maltol: Cacao, café, pão, malte; 102 Reilly, James M.: Role of the Maillard, or “Protein-Sugar” Reaction in Highlight Yellowing of Albumen Photographic Prints, http://albumen.stanford.edu/library/c20/reilly1982a.html 103 Marca comercial da Firmenich & Cia, Genebra, Suíça. 56 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos A nota do aroma no bife assado é em parte produzido pela 2-acetil-1-pirrolina (Fig. 45) e 2-acetiltiazol (Fig. 47). Muitos compostos que contribuem para o cheiro e o sabor da carne são produtos da decomposição de lipídeos. Ácidos graxos como linoleico e aracdônico se autoxidam a 9-hidroperóxido e 11-hidroperóxido, respectivamente, que podem formar 2,4-decadienal, 2-nonenal, 1-octen-3-ona, 2,4- nonadienal e 2-octenal via beta-cisão com 2-nonenal e 2,4-decadienal que tem um valor igual aos compostos de enxofre que contribuem para o aroma característico da carne. (Calkins, C. R., 2007). 2-Metil-3-furanotiol O SH CH3 O SH 2-Furfuriltiol O SH 3-Mercapto-2-pentanona O CH3 S N 2-Metil-furano Tiazol S CH3 S N CH3 O 2-Acetiltiazol2-Metil-tiofeno Figura 47 – Compostos formados durante a reação térmica da ribose com a cisteína (Calkins, C. R., 2007). CHO CHO CHO CHO 2,4-decadienal 2-nonenal 2,4-nonadienal 2-octenal 1-octen-3-ona O CHO 12-Metiltridecanal Figura 48 – A decomposição de lipídeos contribui para o cheiro e o sabor da carne. 12- metil-tridecanal é responsável pelo cheiro de gordura semelhante ao bife (Calkins, C. R., 2007). A oxidação do β−caroteno (Fig. 49),109 possivelmente presente na alimentação dos animais de corte, produz a β−ionona com intensas propriedades aromáticas. 109 Cerca de 500 carotenóides já foram encontrados e caracterizados em vegetais e frutos usados como alimento humano, porém o mais conhecido e o mais intensamente estudado dos carotenóides é o β-caroteno (fonte: Pokorny, Jan; Yanishlieva, N., and Gordon, M. [Editor]: Antioxidants in Food - Practical Applications, CRC Press, Cambridge, England (2001) 59 Aderson de F. Dias, Ph.D. A Reação de Maillard nos Alimentos e Medicamentos 60 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 β-carotene CH3 O CH3 CH3 CH3 β−Ionona Cheiro da mata, violeta (flor), frútico; framboeza silvestre (quando diluido) [Ox] Figura 49 – Formação da β−ionona à partir de β−caroteno via degradação oxidativa.
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